Aquela frase me soou antiquada, mas ao mesmo tempo bonitinha e até charmosa.
Não falei absolutamente nada, apenas finquei meus dedos no cabelo macio dele e o puxei para mais um beijo. Aquela era a minha resposta e ele entendeu perfeitamente o recado.
O Carlos beijava muito bem. Ele tinha cuidado para não me machucar, nem morder forte demais os meus lábios e isso me deixava com mais vontade ainda de levar aquela situação adiante.
Bem lentamente, ele tirou a minha camiseta e começou a beijar o meu pescoço. Senti um arrepio delicioso percorrer a minha pele e é claro que eu já comecei a ficar excitado.
- Prometo que vai ser perfeito – ele sussurrou no meu ouvido e mordeu o lóbulo da minha orelha direita. – Eu te adoro!
Arranhei as costas dele com as minhas unhas, que naquele momento estavam um pouco acima do tamanho normal para um homem.
Rolamos na cama e eu fiquei por cima. Da mesma forma que ele fez comigo, beijei o seu pescoço e fui descendo lentamente a minha boca pelo tórax do garoto.
Ele estava cheiroso. Usava um perfume amadeirado, que fazia com que ele ficasse másculo, com cheiro de homem de verdade!
Foi tudo meio rápido demais. Eu cheguei no cós da calça e já fui logo abrindo o botão e o zíper. Me deparei com uma cueca lilás. Nunca tinha visto uma cueca naquela cor.
Tirei a calça dele e voltei para beijá-lo novamente. O pênis do Henrique estava tão duro quanto o meu.
Eu adorava ver a fisionomia de tesão que os caras faziam quando eu tomava as rédeas da situação. Isso era um ponto a mais para eu liberar todos os meus instintos mais selvagens.
Desci o corpo novamente e tratei de tirar a cueca que ele estava usando. Vi um dote absolutamente normal.
Era reto. A cabeça estava totalmente exposta e ele tinha pelos por todos os lados, mas eram aparados. Não era grande e nem grosso. Deveria ter uns 16 ou 17 centímetros no máximo.
Estava muito duro, mais duro do que eu almejava. Eu segurei com a minha mão direita e quando não aguentei mais, coloquei tudo na boca.
Chupei bem devagar e adorei ouvir o primeiro gemido que ele soltou. Lembrou um pouco o gemido do Vinícius, mas não muito.
Foi bom. Fazia tempo que eu não fazia aquilo de uma forma como a que estava acontecendo. Pelo que eu estava me lembrando, as últimas vezes que eu tinha feito sexo com alguém que eu tinha um pouco mais de intimidade, foi com o Vinícius e o Rogério. Ou será que a minha memória estava me traindo?
Não sei quanto tempo fiquei experimentando o pau do Carlos, só sei que em determinado momento, ele soltou um gemido alto demais e eu pensei que ele ia gozar. Foi aí que eu decidi parar e dei uma atenção especial ao saco do garoto.
E foi nesse momento que eu o fiz pirar de vez. O moleque se contorcia todo, parecia até uma cobra na areia quente do deserto. O lençol da cama já estava todo bagunçado e ele não parava mais de gemer, era um grito atrás do outro.
- Delícia, cara...
Levantei as pernas dele e continuei o que estava fazendo. Ele me xingou um monte de vezes, mas eu nem liguei. Só o que eu queria era proporcionar um momento de prazer ao meu namorado.
Quando de fato me cansei, subi o meu corpo por cima do dele e foi a hora da revanche. Ele me despiu em menos de um minuto e imitou tudo o que eu fiz.
Sentir uma boca quente no meu pau me deixou alucinado. Ele chupou bem, mas não tão bem como eu imaginava. Talvez ele não fosse tão experiente como eu esperava que fosse.
Eu também soltei uns gritos. Era impossível não soltar. Quando fiquei mais afoito, prendi mais uma vez os meus dedos nos cabelos dele e forcei a cabeça pra baixo.
Carlos me olhou com ar de safado. O meu pinto estava começando a ficar melado e se ele continuasse com aquele sexo oral, não ia demorar para o meu orgasmo chegar.
Contudo ele parou. Parou de me chupar e foi me beijar. E que beijo foi aquele... Foi quente, foi selvagem, foi incrível... Há muito tempo que não beijava alguém daquela forma...
Não tive como segurar os meus pensamentos e o Bruno entrou na minha mente com a velocidade de um furacão.
O rosto, os olhos, o cabelo, a pele, o cheiro, o toque e o sabor do meu ex se fizeram presentes naquele momento. Acho que foi a primeira vez desde que ele saíra do Brasil que eu pensei nele enquanto fazia sexo com outro cara. Isso me deixou com sensação de culpado.
- Delicioso – ele beijou meu pescoço. – Vira de costas pra mim, vira?
Obedeci. É claro que eu obedeci. Eu queria aquilo tanto quanto ele. Eu necessitava daquilo. Era meu instinto que estava falando naquele momento, não eu.
Carlos subiu a minha perna esquerda e eu senti aquele negócio duro pincelar a minha entrada. Será que ele não ia usar camisinha?
- Cadê a camisinha? – virei o rosto e perguntei.
- Não pode ser sem?
- Não – abaixei a minha perna. – Sem borracha não vai rolar.
- Espera aí então...
Ele levantou da cama e foi pegar o preservativo. Enquanto o cara procurava, eu fiquei olhando pra bunda dele e fiquei com uma vontade louca de experimentá-la.
- Quantas você acha que é necessário?
- Todas que você tiver aí.
Ele voltou sorrindo e com o negócio mais duro do que nunca. Que delícia...
Ainda bem que ele também voltou o lubrificante. Eu não sei se ia aguentar levar à seco...
Fiquei com um pouquinho de vergonha quando ele passou o gel em mim. Embora a gente estivesse namorando, ainda não tínhamos total intimidade e eu fiquei um pouco constrangido naquele momento.
- Se doer você avisa, tá bom?
Lembrei do Bruno novamente. Por que ele invadiu a minha mente naquele momento? Será possível que até quando eu estava transando eu tinha que pensar nele?
Mas foi impossível não ligar uma coisa à outra. O Bruno foi meu primeiro namorado e ele também teve cuidado para não me machucar... Como eu não podia pensar nele?
O pau do Henrique entrou com bastante dificuldade. Não vou negar que senti dor, mas aguentei firme e forte e sem reclamar.
- Posso parar aqui?
- Pode – falei. – Já entrou tudo mesmo, safado.
- Você não sabe o quanto!
E então o vai e vem começou. Em ritmo lento, mas não deixou a desejar em nada. Talvez ele fosse experiente no assunto...
- Ui! – gemi baixinho.
- Está gostando, seu putinho?
- Uhum – falei.
“Caio...” – ouvi a voz do Bruno dentro da minha mente e não acreditei no que estava acontecendo.
- Então agora aguenta essa rola aqui, seu...
Seu o quê? Do que ele ia me chamar? Eu fingi não ouvir nada e me concentrei no que estava acontecendo.
“Caio...”.
Comecei a sentir tanto prazer que não consegui mais me segurar. Era bom demais... Bom demais mesmo...
“Caio...”. Aquela voz... Aquela voz tão deliciosa... O que estava fazendo na minha cabeça naquele momento?
- UH – ele gemeu um pouco mais alto. – Fica de 4 pra mim, fica?
- Não – falei.
- Por que não?
- Porque não quero!
Não me senti à vontade para fazer aquilo. Eu queria tomar as rédeas da situação e não ia deixar que ele literalmente montasse em cima de mim.
Desgrudei do Carlos e fiz com que ele deitasse de barriga pra cima. Se ele queria sexo, era sexo que ele ia ter. Foi complicado sentar naquele pau, mas até que eu consegui.
- Puta que pariu – ele jogou a cabeça pra trás.
“Caio...”. Abri meus olhos e juro ter visto o rosto do
Bruno na minha frente, mas não era ele... Era outro...
De repente senti uma vontade louca de gritar o nome dele. Naquele momento, só naquele momento, eu tive uma dimensão do quanto ele estava me fazendo falta e do quanto eu aindagostava dele.
Não tinha como negar, não dava pra esconder. Não sei explicar o motivo pelo qual eu estava pensando no Bruno enquanto transava com o Henrique. Talvez tenha sido pelo simples fato do Rodrigo ter tocado no nome dele, talvez não.
Não ficamos muito tempo nessa posição, eu fiquei bastante incomodado. ?
- Levanta – falei.
- Hã?
- Levanta logo!
Ele ficou de pé no colchão mesmo. Foi difícil me segurar no espelho da cama, mas quando eu obtive equilíbrio, ele mandou ver nas investidas.
E se fosse o outro que estivesse ali naquele momento? Com certeza eu estaria sentindo algo muito mais prazeroso do que sentia naquele momento. Com certeza estaria com meu coração em chamas, com todo o meu corpo e meus sentimentos em erupção...
Carlos segurou na minha cintura e deu várias bombadas mais forte que o normal. Em seguida, ele anunciou que ia gozar.
- Vou gozar, Caio... Vou gozar!
Me ajoelhei na cama e ele jogou a camisinha longe. O pau dele estava vermelho e muito duro, mais duro que nunca.
Por um momento cheguei a pensar que o Bruno estava nu na minha frente e não o Henrique. Mas eu sabia que aquilo não era verdade e que tudo não passava de uma ilusão, de uma alusão da minha mente.
Eu segurei e bati uma bem de leve pro cara. Os jatos de esperma voaram longe, mas eu não deixei nenhum acertar o meu rosto, muito menos a minha boca.
- ARGH – ele deu um tapinha na minha cara. – CACHORRO!
Meu namorado caiu de costas na cama e quase foi parar no chão. Mesmo depois de um tempinho, ele não parou de soltar ruídos com a boca, porém esses bem mais baixos que os anteriores.
Puxei o corpo dele pra cima da cama e comecei a beijá-lo. Era a minha vez. Eu também tinha que sentir prazer.
Em uma fração de segundos eu cheguei a sentir o sabor do beijo do meu ex, mas em seguida mais uma vez percebi que era o Henrique que estava comigo e não o desgraçado do Bruno. Por que aquilo estava acontecendo?
- Agora é a minha vez! – falei já com a camisinha na mão.
- NÃO! – ele arregalou os olhos.
- Ué, por que não? Só você vai sentir prazer? Nem a pau! Eu também quero...
- Não, não! Não, por favor...
- O que foi? Está com medo?
- Estou! Estou sim. Eu nunca fiz isso...
- Sério?
- Sério! Não me obriga, por favor...
- Não vou te obrigar, mas não é justo só você fazer.
- Eu tenho medo...
- Mas eu não vou te machucar, eu prometo!
Empurrei o corpo dele pra cama e ele deitou de bruços.
- Não sei se vou aguentar... – ele parecia mesmo amedrontado.
- Se doer eu prometo que paro!
Tive a confirmação que o Henrique era virgem quando comecei a penetração. Ele soltou um grito de dor e eu parei de imediato. Só depois que o marmanjo conseguiu relaxar eu continuei o meu trabalho.
Para quem estava com medo, até que ele foi bem liberal. Eu fui cauteloso com a penetração. Coloquei com muito cuidado e sempre que percebia que ele ficava um pouco arredio, tirava, dava um tempo para depois colocar de novo.
- Está doendo?
- Um pouco, mas continua que eu estou gostando...
- Está? – eu beijei a nuca dele. – Você quer mais?
- Quero – ele parecia constrangido.
Eu ia dar o que ele queria. Tive que ter muita paciência, mas depois que penetrei tudo, não fui bobo e já comecei a investir.
- Bruno... – falei o nome dele em um som quase inaudível. Tive certeza que Henrique não ouviu o que eu disse.
Claro que assim como ele tinha feito, eu também fiz. No começo fui com cuidado, mas do meio pro fim eu não me segurei mais e literalmente tirei todo o atraso.
Estoquei com força, sem dó nem piedade. Sentir meu pau dentro dele foi tão gostoso, alivou tanto o meu estresse que eu aproveitei cada segundo daquele momento.
Aproveitamos mais de uma posição. Eu o peguei de ladinho, de frango assado e também de pé. Para quem não queria dar, até que ele deu bastante. E deu gostoso!
- Que bundinha gostosa, hein? – dei um tapa nas nádegas do Henrique.
- Ah, delícia...
- Está gostando?
- Estou... Quero mais...
- Quer? – eu coloquei tudo pra dentro. – Desse jeito?
- É!
“Bruno...”. foi a vez de ouvir a minha própria voz chamando o nome dele.
Não demorou e eu senti vontade de gozar. Fiz o Henrique deitar na cama, joguei a camisinha pra trás e coloquei meu pau dentro da boca dele.
- Chupa tudo!
Ele chupou. Eu fechei meus olhos e o rosto daquele infeliz entrou de novo na minha mente. Fiquei pensando nele com tanta força, que quase gritei o nome dele quando cheguei ao orgasmo.
- AAAAAAAH, BRU... – me calei a tempo de cometer uma bobagem.
Pensei que ele ia cuspir meu esperma, mas não. Ele engoliu tudo, até a última gota. Eu caí de joelhos na cama e em seguida desmoronei de vez no colchão.
Estava sem fôlego, com o coração acelerado e o corpo muito cansado.
- Putz, não pensei que fosse tão bom – ele deitou a cabeça no meu peito.
- Você gostou mesmo?
- Você foi demais.
- Que bom que gostou, eu também curti muito. Posso pedir uma coisa?
- O que você quiser, seu lindo – ele me olhou.
- Posso tomar um banho? Estou sujo demais.
- Só se for comigo! – ele sorriu.
Eu retribuí o sorriso e é claro que aceitei.
- Vou ser bonzinho e aceitar a sua condição.
Contudo eu estava cansado demais e não tive coragem de fazer mais nada aquele dia. Naquele momento, a única coisa que eu queria era a minha cama. Deitar, dormir e descansar.
- Você é bem gostosinho, hein Caio? – ele ficou olhando meu corpo.
- Você acha? Eu me acho magricelo demais.
- Nâo, não é não. É bem gostosinho... Meu número!
Dei risada.
- Ah, é? Sou seu número?
- Orra! Você é perfeitinho pra mim.
- Seu bobo, não é pra tanto!
- Estou falando sério.
Nos beijamos debaixo do chuveiro, mas foi só. Depois que acabei meu banho, Carlos me emprestou uma toalha seca, eu me enxuguei, vesti a minha roupa e fiquei pronto para voltar pro meu palácio. Como eu estava precisando da minha cama naquele momento...
- Não me diga que você já vai querer ir embora? – ele franziu a testa. – logo agora depois que a gente fez amor?
- Amor? Amor não, pra mim aquilo foi apenas sexo!
- Ah, querer eu não quero, porém eu preciso. Eu estou há um mês sem folga, estou extremamente cansado. Preciso da minha cama, seu lindo. Me entende?
- Pior que eu te entendo. Posso imaginar que você esteja se sentindo um trapo.
- Você disse tudo. Um trapo. Pois é exatamente assim que eu estou me sentindo. Ainda mais depois dessa doença do Rodrigo. Tenho ficado duas vezes mais cansado que o norma.
- Você precisa de uma folga, lindo. Não pode ficar trabalhando direto desse jeito. Faz mal pra saúde.
- Eu vou juntar 5 folgas. Falta pouco para isso, daí vou descansar uma semana seguida e recobro as minhas forças.
- Hum, que bom. Vai dar para descansar mesmo. Quer comer alguma coisa? Não está com fome?
- Não – menti. – Eu só quero a minha cama mesmo.
Se importa se eu já for?
- Me importar eu me importo, mas você precisa descansar tadinho.
Ele me beijou bem devagar.
- E eu não vou te obrigar a ficar aqui sendo que você está acabadinho. E outra: eu também estou cansado. Vou deitar e dormir feito uma pedra hoje, ainda mais depois dessa foda deliciosa.
- Deliciosa mesmo – mordi o lábio dele bem de leve. – Mal posso esperar pela próxima.
- Eu também.
Rolou o último beijo e em seguida ele me levou até o portão.
- Desculpa não te ajudar com a bagunça aí.
- Não tem problema – o garoto coçou a nuca e bocejou. – Vai dormir que você merece.
- Vou mesmo. Até amanhã então.
- Até, lindão. Obrigado por ter vindo.
- Por nada. Eu adorei!
- Não mais do que eu.
Eu mandei um beijo pra ele, virei as costas e saí andando. Estava me sentindo leve, mesmo estando com o corpo pesado de cansaço.
A única coisa que eu não estava antendendo naquilo tudo, era o fato de ter pensando no Bruno enquanto transava com o Henrique. Aquilo nunca tinha acontecido antes, por que acontecera naquele momento?
Será que era pelo simples fato do Rodrigo ter contado o que me contou? Ou será que eu ainda era tão ligado no cafajeste que não consegui frear meus pensamentos enquanto rolou a primeira vez com o Henrique?
Tanto uma coisa quanto a outra estavam erradas. Eu não tinha que ficar pensando no Bruno em momento algum, muito menos durante uma noite de sexo com meu namorado.
O Bruno fazia parte do passado e era no passado que ele deveria ficar. Não adiantava ficar pensando nele porque nada faria com que ele voltasse pros meus braços e eu também não queria que isso acontecesse.
Não nego que fiquei com raiva de mim mesmo por ter pensado naquele desgraçado naquela noite, mas foi inevitável. Eu simplesmente não pude controlar os meus pensamentos, seria demais pedir isso para mim mesmo.
Quando cheguei em casa, me deparei com um delicioso cheiro de comida caseira. O que será que os meninos estavam aprontando?
- Olá, Caio – a mãe do Rodrigo me recepcionou com um sorriso.
- Dona Inês? Pensei que a senhora estivesse no hospital.
- Não. Eu fiquei lá até agora. O Vinícius vai passar a noite com o Rodrigo.
- Vai, é? – eu sentei, apoiei meu cotovelo na mesa e segurei meu queixo com a mão. O que será que ela estava cozinhando?
- Vai. Ele foi muito bonzinho. Acho que percebeu o meu cansaço.
- A senhora precisa mesmo descansar um pouco.
- Você gosta de almôndegas com arroz branco?
- Ah, eu adoro! A senhora não precisava ter se preocupado...
- Imagina, é um prazer cozinhar. Você aceita?
- Ah, nem vou me fazer de rogado. Eu aceito sim, estou faminto!
- Então eu vou te servir...
- Não, Dona Inês! Pode deixar que eu mesmo me sirvo. Imagina, não vou te dar esse trabalho.
- É trabalho coisa nenhuma. Fica sentadinho aí onde você está que eu te sirvo, faço questão!
- Mas...
- Não seja teimoso e me obedeça, senão eu vou puxar a sua orelha!
Sorri e sentei de novo. Como ela era boazinha...
- Quer muito ou pouco?
- Quero muito não, já está um pouco tarde e eu já vou dormir em seguida. Estou super cansado.
- Faço ideia. Posso ser indiscreta?
- Pode.
- Onde você estava que só chegou agora? Estava preocupada! Não me diga que ficou até essa hora no trabalho? Mas não deve ser isso porque você está com os cabelos molhados! Estava na academia?
- Não – eu sorri. – Eu estava namorando um pouquinho.
- Hum, você namora! Que legal.
- É, namoro sim. Nossa Senhora, Dona Inês! É muita comida! Pode tirar metade desse prato!
- Que muita comida que nada, garoto. Você está só o couro e o osso. Precisa se alimentar direitinho!
- Mas eu já vou dormir, Dona Inês. Não posso comer tudo isso agora senão vou passar mal!/
- Vai passar mal nada, não seja reclamão. Ande, coma logo antes que esfrie.
- Meu Deus, quanta comida...
Ela encheu o prato. Encheu não, estufou. Estava caindo arroz pelas laterais.
- Coma tudo, viu? – ela era tão boazinha!
- E a senhora? Não vai jantar?
- Vou sim, já vou fazer meu prato.
- Onde estão os meninos? A senhora sabe?
- Eles foram jogar futebol. Disseram que já voltam.
- A essa hora?
Já era quase 10 da noite.
- Pois é. Ah, não me chame de senhora não. Pode me chamar de Inês mesmo.
- Ah, sei lá... É tão esquisito.
- Não, não. Senhora está no céu. Pode me chamar de você mesmo.
- Como quiser então, Dona Inês – eu falei. – Hum, que comida deliciosa!
- Você gostou?
- Demais! Muito boa mesmo...
- Que bom que gostou. Deixa eu experimentar para ver se ficou bom mesmo.
Enquanto nós jantamos, eu perguntei como o filho dela estava e nós ficamos proseando sem parar. Conversei tanto com a Dona Inês que nem percebi que comi todo o prato de comida que ela colocou pra mim.
- Viu só? Nem era muita comida.
- Era sim, Dona Inês. Eu nem percebi, comi tudo. Agora não vou conseguir dormir direito.
- Consegue sim, é só esperar fazer a digestão.
- É, vou aproveitar para lavar as minhas roupas.
- Quer que eu faça isso pra você? Vou lavar as roupas do Rodrigo amanhã e aproveito e já lavo as suas...
- De jeito nenhum! Pode deixar que eu faço isso, imagina que eu vou deixar a senhora lavar minhas roupas sujas!
- O que tem demais nisso?
- Não, não vou te dar esse trabalho não. Deixe que eu mesmo faço isso. E os meninos também lavam as deles, a senhora pode se preocupar só com as do Digow mesmo.
- Queria só ajudar!
- Eu sei, Dona Inês. Não me leve a mal, não é questão de não querer a sua ajuda, eu só não quero que a senhora fique mexendo com roupa dos outros. Seria pedir demais.
- Não, não. Eu te entendo, querido.
- Mas obrigado pela oferta. Você é muito boazinha!
Não tinha muita roupa suja, mas como eu tinha batido um prato de pedreiro, fui obrigado a me extender em pé até o meu estômago digerir toda a comida. Foi complicado me manter acordado por tanto tempo.
Os caras só voltaram depois das 23:00. Todos muito suados e fedorentos. Não tinha um que se salvasse naquela noite.
- Correram na São Silvestre? – perguntei.
- Quase – respondeu Maicon. – Já que você está com a mão na massa, bem que poderia lavar minhas roupas, né?
- Não mesmo! Eu só estou lavando as minhas para fazer digestão.
- Você é muito ruim, Caio – ele bufou.
- Sou nada, sou justo.
- Foi você que cozinhou? – perguntou Éverton.
- Não. Foi a Dona Inês.
- E o que ela fez?
- Almôndegas. Está bom pra caralho.
- O Fabrício, o Éverton e o Maicon praticamente saíram no tapa para ver quem ia tomar banho primeiro. Mais do que nunca eu comecei a achar que a nova casa onde nós iríamos morar deveria ter dois banheiros.
- Então não demora – reclamou Fabrício.
Quem venceu foi o Maicon. O Éverton ficou lá na porta, parado feito uma estátua só esperando a hora dele entrar. O meu companheiro de quarto ficou ao meu lado no tanque, me fazendo companhia.
- Quer ajuda? Eu posso colocar no varal pra você se você quiser.
- Orra, claro que eu quero!
Que perfeito cavalheiro. Eu fui tirando as roupas da máquina e ele já foi colocando-as no varal. Com a ajuda do Fabrício, eu consegui terminar o trabalho mais cedo e assim, pude ir pro quarto antes do esperado.
- Valeu pela ajuda, Fabrício. Amanhã eu te pago um chocolate como recompensa.
- Putz, eu vou cobrar, hein?
- Pode cobrar!
Antes de deitar eu resolvi colocar o celular para carregar. O aparelho não estava completamente descarregado, mas a carga não ia demorar muito e eu queria poupar esforços no dia seguinte.
Deitei, fechei os olhos e não vi mais nada. Só acordei na manhã seguinte, com um barulho ensurdecedor de buzinas vindas da avenida próximo a minha casa.
- Que porra é essa? Será que não posso mais dormir em paz? – Fabrício também acordou.
- Parece que aconteceu alguma coisa...
- Cacete! Que horas são? Já é hora de levantar?
- Pior que já.
Eu estava tão acostumado em vê-lo pelado que nem ligava mais para nada. Será que na nova república eu ia continuar dividindo quarto com o Fabrício?
Mais uma vez foi a maior disputa pra entrar no banheiro. Até a Dona Inês entrou na fila, mas como ela era a única mulher na casa e era visita, a gente resolveu ser camarada com ela e a deixamos passar na nossa frente.
- Não quero atrasar ninguém, meninos – ela falou.
- Não vai atrasar não, Dona Inês – falou o Maicon.
Mas ela atrasou. Atrasou e atrasou bonito. Desde que eu havia começado a trabalhar na loja de móveis, aquele dia foi o primeiro que eu cheguei depois das 10:00.
- Me desculpa a demora, Duda – falei. – Tive um contratempo no trânsito.
- Tudo bem, Caio. Se preocupa não. E aí, como você está?
- Bem e você?
- Estou ótima! Preparado para mais uma semana?
- Estou sim!
- Essa semana temos que conversar sobre suas folgas, hein? Já está quase completando os 5 dias.
- É. E eu já estou precisando tirá-los.
- Imagino! Por mais jovem que você seja, precisa descansar.
- É.
.
Ele estava mais bonitinho que nunca. Depois que voltei do almoço, a primeira coisa que fiz foi falar com o meu namorado.
- Boa tarde, quanto é a televisão?
- Pra você é de graça – ele sorriu.
- Aí eu gostei, hein? E aí, belezinha?
- Melhor agora e você?
- Bem também, obrigado. Como dormiu essa noite?
- Pensando em você – disse Carlos. – E você?
- Também – menti descaradamente. – Pensando na nossa noite ontem.
- É? Você pensou mesmo?
- Pensei sim, foi bom demais! Eu quero de novo!
Foi bom mesmo, mas pensar eu não pensei. Pensei no Bruno e em tudo o que o Digow me contou, menos no nosso sexo.
- Eu também quero, lindo. Vamos combinar um dia bacana para a gente, tá bom?
- Vamos sim, Henrique! Bom, vou nessa que agora é hora de trabalhar, né?
- Verdade. E tem cliente no seu setor.
- Vou nessa. Depois a gente se fala, beleza?
- Combinado!
.
Quando eu vi a Alexia acabada, senti vontade de dar um soco na cara do Gabriel. Ela estava inconsolável.
- Nâo entendo, sabe? Não fiz nada de errado para ele terminar comigo – ela falava.
- Não fica mais pensando nele – aconselhou a Janaína. – Agora é hora de pensar em você. Ele não merece o seu amor.
- Mas eu gosto dele, Jana!
- Eu sei, amiga. Eu sei, mas você vai ter que deixar de gostar. Vai ter que gostar de você agora.
Era fácil falar. Eu sabia exatamente o que a Alexia estava sentindo. Já tinha passado pela mesma dor que ela. Em outras circunstâncias, é verdade, mas mesmo assim eu sabia a dor que ela estava sentindo.
- Não fica assim – eu falei. – Nós vamos te arranjar um bofe muito melhor que esse aí. Não é Jana?
- Com certeza!
- Mas eu quero ele, Caio!
- O Gabriel não te merece, Alexia – eu suspirei. – Ele é um canalha, um tremendo cafajeste.
Eu estava começando a acreditar naquela história que diz que mulher adora um cafajeste. Será que isso é verdade?
Janaína e eu tivemos um trabalho lascado para tentar animar a nossa amiga, porém tudo o que tentamos fazer foi em vão. A Alexia não se animou com nada.
- Ânimo, branquela azeda – a Janaína sacodiu a vendedora de colchões no meio da loja. – Tem uma cliente lá no seu setor. Vai lá ajudar, vai? Vai ganhar dinheiro!
- Nem pra isso eu tenho coragem – a ruiva nos fitou.
- Tem que ter, minha filha! – eu incentivei a moça. – Se não quiser a sua comissão, pode depositar na minha conta que eu aceito!
- Isso nunca – Alexia saiu andando e nos deixou sozinhos.
- Estou com medo que ela entre em depressão – Janaína disse isso quando Alexia se afastou o suficiente para não nos ouvir mais.
- Ai, nem brinca! Nem brinca com isso. Já passei por isso e é horrível.
- Já? Já ficou em depressão?
- Já minha flor. Já fiquei sim e não desejo isso nem pro meu pior inimigo.
- Mas por que? Tão novinho e já sofreu com isso?
- Sofri sim. Já sofri demais nessa vida, Janaína!
- Mas o que te deixou em depressão? A sua família?
- Não. Foi o meu ex.
- Seu ex?
- É. Ele me abandonou faltando uma semana pro meu aniversário. Foi morar na Espanha e não me explicou nada. Até hoje eu não faço ideia do que aconteceu.
- Mentira?
- Verdade, gata. Fiquei acabado. Acabado é pouco, fiquei morto. Até tentei me matar.
- Brincou? – ela ficou boquiaberta.
- Nada! Nunca falei tão sério em toda a minha vida. Foi uma época punk pra mim.
- Caralho, Caio! Com 18 anos você já passou por muito mais coisa que eu, meu.
- Pra você ver.
- Sua vida merece ser contada na novela das 8! Vou mandar um e-mail pra Glória Perez pra ela te contratar, meu.
- Besta – dei risada.
- É verdade. Vou escrever sua história e publicar em um livro de receitas de cozinha. Vai dar dinheiro.
- Livro de receita de cozinha? Não entendi!
- É que a cunhada de um primo do amigo de uma vizinha minha escreve livros de receitas. É a única forma que eu conheço de publicar um livro, entendeu?
- Ah, Janaína, cala a boca vai? Vai atender aquele cliente ali que você ganha mais.
- Aonde? É bofe?
- Pior que é. Um bofe de 4.587 anos de idade.
- Puta que pariu, Caio! Agora você foi fundo demais, hein?
Fiquei dando risada e também fui atender um cliente, mas o meu era mais jovem.
.
Antes de ir pro hospital passar a noite com meu amigo, liguei pro Vini e perguntei como era a estadia no hospital.
- Não é ruim não. Tem um sofá bem confortável e dá pra dormir lá tranquilamente. Só tem que levar cobertor porque o de lá é muito fino e não esquenta nada.
- Mas é frio?
- Eu senti frio.
- Ah, carioca reclama de qualquer brisa mais gelada. Nem deve fazer tanto frio assim.
- Você que pensa! Eu só fiquei ontem porque não tive aula na faculdade. Espero não ter que ficar novamente.
Isso porquê ele disse que não era ruim. Imagina se fosse.
- Eu vou hoje. Me sinto no dever de ficar ao lado dele.
- Por quê?
- Pra dar uma folga pra mãe dele e também porque ele é meu melhor amigo. Eu tenho que ajudar. Tenho certeza que ele faria a mesma coisa se fosse comigo.
- Não tenho dúvidas – ele falou.
- Então tá bom, Vini. Era só. Boa aula aí.
- Ah, obrigado. Segunda-feira é o pior dia da semana.
- Então boa sorte!
- Valeu. Um abraço.
- Outro.
Desliguei e fui logo arrumando a minha mochila. Por via das dúvidas, coloquei uma roupa frio. Se o que o Vinícius disse fosse verdade, eu não ia sofrer tanto.
Antes de sair de casa, tomei um banho morno e jantei o resto de almôndegas que sobrou do almoço. A comida da Dona Inês era boa mesmo.
Ainda bem que foi fácil achar o quarto dele. Quando eu entrei e vi meu amigo sentado no leito, senti um alívio tão grande! Só de saber que ele estava fora de perigo e não estava mais na UTI, me senti muito contente.
- Caio! – Rodrigo sorriu.
- Oi, Digow! Oi, Dona Inês!
- Como vai, querido?
- Bem e a senhora?
- Bem também. Já lhe disse para não me chamar de senhora – ela sorriu.
- Ah, desculpa. É a força do hábito! E aí, Digow? Como você está?
- Muito melhor, graças a Deus! Que mochilão é esse? Vai acampar ou fazer trilha?
- Não, eu vou passar a noite aqui com você!
- Vai? – os olhos dele brilharam.
- Vou!
- Mas, Caio e o seu trabalho amanhã?
- O que tem, Dona Inês?
- Como você vai passar a noite aqui e trabalhar amanhã, querido? Você não vai dar conta!
- Ah, dou sim! Pode ter certeza que dou conta sim. O Vini me falou que esse sofá é bem confortável e que dá pra dormir nele.
- É verdade, o Vini dormiu bem aí – disse Rodrigo.
- Mas eu fico preocupada!
- Não fique, Dona Inês. De verdade, está tudo bem. Eu faço questão de passar a noite aqui com o Digow.
- Tem certeza?
- Absoluta!
- Sendo assim, não me resta alternativa a não ser aceitar.
- Vai descansar, mãe. Você está cansada, precisa se cuidar um pouco.
- Vou mesmo filho. Já que vou te deixar em boas mãos, eu vou despreocupada.
- Isso mesmo. Vai, mas deixa meu celular comigo.
- Pode deixar.
Em 10 minutos a Dona Inês arrumou as coisinhas dela. A mulher estava mesmo parecendo muito cansada.
- Boa noite, Caio – ela me deu um beijo no rosto. – Obrigada por ficar e cuidar do meu filho.
- Não tem nada que agradecer, eu faço de coração. Bom descanso pra você!
- Muito obrigada. Tchau, filho – ela deu um beijo na bochecha do Rodrigo também. – Se cuida, tá bom?
- Pode deixar, mãe.
- Qualquer coisa que você sentir, chama um médico ou uma enfermeira.
- Uhum, pode deixar.
- Se acontecer qualquer coisa, me liga que eu volto correndo.
- Pode deixar, mãe. Vai descansar, vai princesa.
- Já vou, príncipe. Boa noite!
- Boa noite, fica com Deus e obrigado por tudo.
- Deus te abençoe, filho.
- Amém.
Que bonitinho a relação dos dois! Se a minha relação com minha mãe fosse desse jeito, eu estava com a faca, o queijo e a goiabada!
- Que lindo o amor de vocês – eu fiquei com uma pontada de inveja, não vou negar.
- Minha mãe é um anjo.
- Ela é mesmo! Acredita que ontem ela colocou comida pra mim?
- Ah, normal. Ela sempre faz isso mesmo. É uma mãezona.
- Verdade. Quem me dera a minha fosse assim.
Ele ficou calado, mas depois de um tempo disse:
- Eu te empresto a minha mãe, tá bom?
- Empresta mesmo?
- Claro! Mas só aos finais de semana – ele sorriu.
- Seu bobo! E aí, como está se sentindo?
- Bem melhor. De verdade.
- E a infecção?
- Sob controle.
- Graças a Deus. Mas nada de anormal, né? Nenhuma dor, nada?
- Graças a Deus não. Só o que me deixa incomodado são esses pontos. Está grudando na camiseta.
- E por que não fica sem camiseta?
- Ah, tenho vergonha!
- Vergonha de quê?
- Ah, sei lá... Não consigui ficar sem camiseta na frente da minha mãe.
- Mas nunca consegue? Ou só depois da cirurgia?
- Só depois da cirurgia. Ela fica olhando muito pros pontos, fica com dó e eu me irrito.
- Mas agora se você quiser tirar, pode tirar. Eu não ligo.
- Você está doidinho pra me ver sem camisa, né?
- Você não sabe o quanto – brinquei.
- Palhaço!
- Se quiser ficar peladinho eu também não vou ligar.
- Vai sonhando! Já fiquei pelado demais nesse lugar. Graças a Deus só meu pai viu isso. Bom, só ele e alguns médicos e enfermeiros.
- Pena que eu não aproveitei esse momento.
- Se você tivesse visto, eu teria quebrado seus dentes, moleque.
- Qual o problema? O que você tem aí eu também tenho aqui.
- Mas o meu é meu é só pessoas altamente selecionadas podem conferir, o que não é seu caso!
- Bocó – mostrei a língua. – O que está passando aí nessa televisão?
- “Jornal Nacional”, mas já está acabando. Vai começar a novela já.
- Novela? E desde quando você assiste novela?
- É a minha única opção. Só a Globo pega bem nessa televisão.
- Então, que venha a novela!
O folhetim em questão é “Paraíso Tropical”. De cara eu me identifiquei com a trama pois tinha gêmeas nos personagens. Isso me lincou automaticamente ao Cauã. Como será que ele estava?
- Essa é a gêmea má – falou Rodrigo. – É o Cauã!
Eu caí na risada. Como ele era bobo.
- E eu sou quem?
- Você é a outra, pô. É que eu não sei o nome das personagens.
- Hum... Deve ser Rute e Reaquel.
- Não! Essas daí eram daquela novela velha. Como era mesmo o nome?
- Não sei! Nâo me lembro.
- “Mulheres de Areia”. Minha avó era louca por essa novela.
- Ah, é mesmo. É muito antiga, nem me lembro direito.
- Vai deitar não? – Rodrigo mudou de assunto. – Vai ficar aí sentado a noite toda?
- Ah, é mesmo!
Nem tinha pensado nisso. Fiquei tão focado na novela que perdi a noção do que estava fazendo.
O sofá era mesmo bem confortável. Era molinho e não tinha nada que impedisse o meu sono. A única coisa que deixava a desejar era no tamanho. Eu ia ter que ficar com minhas pernas encolhidas a noite toda, mas isso era o de menos.
- É verdade que aqui faz frio? – perguntei ao meu amigo.
- Um pouco, mas nada comparado ao frio do Paraná.
- Ah, pelo jeito você está melhor mesmo. Já está até brincando.
- Eu estou bem, não vejo a hora de sair desse hospital e voltar a minha vida normal.
- Eu também não vejo a hora de ver você em casa.
- Pois é.
Depois que a novela acabou, Rodrigo e eu ficamos assistindo a “Tela Quente”. O filme era de ação e nós ficamos entretidos do começo ao fim.
- Acho que agora eu vou dormir, Caio – ele se espreguiçou e bocejou.
- Quer alguma coisa?
- Não, obrigado. Eu só vou ter que esperar a enfermeira trazer meu remédio e depois vou capotar.
- E você está tomando muitos remédios?
- Dois. Um de manhã e outro à noite.
- Ah, entendi. Rodrigo, onde fica o banheiro?
- É nessa portinha aí ao lado do sofá, menino.
- Ah, é? Quer dizer que você tem uma suíte?
- Pois é, parceiro. Sou chique, né?
- Bastante.
- E tem chuveiro e tudo. Se quiser pode tomar banho aí, não tem problema.
- É mesmo? Que hospital porreta esse, hein?
- É. Graças a Deus meu pai resolveu fazer esse convênio pra mim. Já pensou se eu fosse depender de atendimento público?
- Na boa? Já teria passado dessa para uma melhor – eu bati na madeira. – Não quero nem pensar nessa possibilidade.
- Nem brinca com isso, Caio! Eu quero morrer não...
- Vamos mudar de assunto. Pensamoentos negativos atraem coisas negativas.
- Agora você falou uma grande verdade.
- Já volto.
Entrei no banheiro para tirar a água do joelho e me deparei com um cubículo. Era minúsculo, eu nunca tinha visto um banheiro tão pequeno como aquele, mas estava bom. Antes um micro-sanitário do que nada.
- Isso não é um banheiro, é um cubículo – falei quando saí.
- Pequeno, né?
- Pequeno é apelido, mas tá valendo.
A porta foi aberta suavemente e uma mulher muito bonita entrou com um copo de plástico na mão.
- Com licença.
- Toda, Andreia – falou Rodrigo.
- Boa noite – ela me olhou.
- Boa noite.
- Seu comprimido, Rodrigo.
Ele engoliu a pílula e bebeu todo o copo de água.
- Obrigado.
- Se precisar de alguma coisa é só chamar.
- Uhum, pode deixar.
- Com licença.
- Toda.
Eles se olharam muito rapidamente. Era impressão minha ou estava rolando um clima entre os dois?
- É impressão minha – eu levantei e fiquei ao lado dele. – Ou o senhor está interessado nessa enfermeira?
- Eu? Interessado? – ele sorriu.
- Safado! Cachorro, sem vergonha – eu dei um peteleco na orelha dele. – Você está convalescendo, está moribundo e ainda fica pensando em mulher?
- Nossa, mais um pouco você decreta minha morte – ele riu. – Quem disse que eu estou pensando nela? Eu só estou admirando a paisagem.
- Cachorro! – eu ri e sentei de novo. – Você não vale nada.
- Valho sim, peste. Cara, é impossível não olhar pra essa gostosa. Ela é boa demais!
- Não faz meu tipo, desculpa.
- Fico inconformado. Como você não pode gostar de mulher?
- Eu gosto de mulher. Eu gosto muito delas. Para serem minhas amigas, no máximo – sorri.
- Como pode, Senhor? Como pode?
- Ah, pode sim. Estou muito feliz com minha sexualidade.
- Ah, que bom. Ainda bem que você é bem-resolvido e leva as brincadeiras numa boa.
- Eu não ligo mais não. Já sofri com preconceito pela minha própria família, hoje em dia isso não me atinge mais. E mesmo se alguém me xingar, me maltratar, eu não ligo mais.
- Será que não liga mesmo?
- Não, não ligo.
- Então por que você não assume logo pra todo mundo que você é gay?
- Mas eu sou assumido!
- Pra algumas pessoas. Pra sua família, pra mim, pro Vini e praquele tal de Víctor. E pro resto? Pro Fabrício? Pro Éverton? Pro Maicon?
- Não acho que eles precisam saber disso.
- Porque você tem medo! Medo de ser rejeitado de novo.
Ele tinha razão. Eu tinha mesmo medo. No fundo, no fundo, esse era o motivo pelo qual eu não abria o jogo com todos os meus amigos.
- Você acha que é necessário? – perguntei.
- Depende do ponto de vista.
- Como assim?
- Particularmente eu não vejo necessidade de você esconder. Os caras são mente aberta, tenho certeza que não vão te julgar e a amizade vai continuar a mesma.
- Será?
- Acredito que sim, mas isso daí depende de você. Se não quiser falar, não fale.
- Até agora eu não vejo motivos para falar. Se eu ver que é necessário, depois converso com eles.
- Uhum. Mas que aquela enfermeira é gostosa, ah isso é.
- Não acho não. Agora, se fosse um negão com 2 metros de altura e o braço da grossura da minha coxa, você estaria falando a minha língua!
- CRUZES!!!
Fazia tempo que eu não dava tanta risada. Ele fez uma cara tão engraçada, mas tão engraçada que foi impossível segurar a gargalhada.
- Do que ri? Posso saber?
- De você.
- Isso é bullying. Vou te processar!
- Cala a boca, Rodrigo. Vai dormir, vai?
- O meu sono passou. A gostosa me deixou excitado.
- Excitado? Tá duro aí, é?
- Opa!
- Deixa eu ver? – brinquei.
- Nem a pau. Sonha!
- Deixa, vai?
- Na-na-ni-na-não.
- Quando você dormir eu vou dar uma conferida, pode deixar.
- Até parece!
Eu sorri e fechei meus olhos. Ainda bem que o Rodrigo e eu brincávamos e não confundíamos as coisas. É claro que se ele curtisse, eu ia partir pro abraço, mas já que não curtia, eu o respeitava e ele a mim. E é isso que é amizade verdadeira.
- Agora eu vou dormir – ele falou. – O sono já voltou.
- Baixou aí?
- Aham! Vai dormir também?
- Uhum. Estou cansado.
- Coitado, estou com dó de você nesse sofá apertado. Não precisava ter se preocupado comigo.
- Cale-se. É claro que eu ia vir ficar com você.
- Nunca tive um amigo como você, sabia?
- Eu também não.
- Espero que essa amizade dure pra sempre – Rodrigo bocejou de novo.
- Isso depende unicamente de nós dois. No que depender de mim, só iremos nos separar quando um de nós morrer.
- E isso vai demorar muito a acontecer, se Deus quiser.
- Verdade.
- Mas Caio, mais cedo ou mais tarde os nossos caminhos vão se separar.
- Por que diz isso?
- Porque eu vou me formar daqui 2 anos. E vou voltar pro Paraná.
- E o que tem demais nisso? A distância é o de menos!
- Mas a gente não vai se ver diariamente, mano.
- Mas poderemos nos falar pelo celular, por mensagem, por e-mail...
- Não vai ser a mesma coisa.
- Quer parar de sofrer por antecipação? – reclamei. – Até o final de 2.009 tem chão. E tem mais: quem nasceu de 7 meses aqui fui eu e não você; portanto, sossegue o facho e vá dormir.
- Quer dizer que era pra você ter nascido em outubro?
- No começo de novembro pra ser mais exato. É que eu quis ser virgem pra sempre, sabe? Daí resolvi estrear no final de agosto.
- Idiota. Enfim, vamos parar de conversar senão não vamos conseguir dormir.
- Verdade. E amanhã tem mais um dia de trabalho pela frente.
- Está gostando do trabalho?
- Uhum, bastante. Já me acostumei com a rotina e a empresa é muito boa.
- Que bom. Se eu não conseguir meu estágio, vou tentar entrar lá.
- E vai para São Paulo fazer treinamento de 21 dias úteis? Como fica a faculdade?
- Poxa, Caio! Se você não quer que eu trabalhe com você, fala logo mano. Fica colocando obstáculos aí...
- Não é obstáculo, seu idiota. Só estou sendo racional. Eu iria amar que você voltasse a trabalhar comigo.
- Não ia prestar. É melhor eu continuar procurando meu estágio mesmo.
- Bom, o futuro a Deus pertence. Quem sabe mais pra frente a gente divida de novo a mesma empresa?
- Né?
E assim foi indo. Um papo puxou o outro. Parecia que o Rodrigo e eu estávamos sem conversar há meses de tanto que falamos naquela noite.
- Caio, vai dormir. Amanhã você trabalha e eu não. Não vou te atrapalhar mais.
- Não está me atrapalhando, bobão.
- É sério, tenta descansar que você precisa. Se eu pudesse, trocava de lugar com você, mas infelizmente não posso.
- Nem pensar, fica aí na sua cama que eu estou muito bem aqui.
- Desliga a luz, por favor?
- Desligo sim!
- - Boa noite, Caio.
- Boa noite, Digow. Se precisar de alguma coisa, qualquer coisa, é só me chamar.
Pode deixar. Obrigado por tudo.
.
Se eu falar que tive uma noite perfeita naquele estofado, eu estarei mentindo. Dormi, mas não dormi tão bem como acontecia na minha cama.
Amanheci com uma baita dor no pescoço e não era pra menos. O apoio pra minha cabeça foi o braço do sofá e ele era alto demais. Essa dor era inevitável.
Fui o primeiro a acordar. Levantei no mesmo horário que já estava habituado, porém ainda estava sentindo muito sono.
O banheiro era apertado mesmo. Eu tive a prova definitiva – não que eu precisasse – quando fui tomar banho. Meu corpo ficou esmagado dentro do recinto, mas pelo menos a água do chuveiro era boa.
- Caio? – ouvi ele me chamando.
- Oi, Digow? Precisa de algo? Você está se sentindo mal?
- Não, mano. Não é nada.
Mas esse chamado dele me deixou alerta. Acho que o garoto queria usar o banheiro ou tomar banho também; por esse motivo, acabei o meu momento de higiene um pouco mais cedo.
- Bom dia – eu falei.
- Bom dia! Você dormiu bem?
- Dormi sim – menti um pouquinho. – E você?
- Eu também. Que bom que dormiu bem, fico mais aliviado.
- O sofá é bem confortável.
A única coisa ruim, foi ficar com torcicolo. De resto, tirei de letra.
- Pode me ajudar a descer? Eu quero escovar os dentes...
- Claro que ajudo!
Como ele estava recém-operado, todo cuidado era pouco. Eu segurei no braço dele e com muita lentidão, meu melhor amigo ficou de pé.
- Horrível ficar muito tempo deitado. Meu corpo dói todo.
- Eu posso imaginar! – concordei. – Quer ajuda com alguma coisa?
- Não, não precisa. Vou aproveitar e tomar um banho também. Já volto.
- Se precisar de ajuda, é só avisar. Não fique com vergonha.
- Você está doidinho pra me ver pelado, né?
- Pior que estou – brinquei.
- Vai sonhando!
Por melhor que ele estivesse, eu ainda não estava totalmente seguro em deixá-lo sozinho, portanto fiquei bem próximo da porta do banheiro. Se ele precisasse, ficaria mais fácil para acodí-lo.
-- Tem coisa melhor que banho? – ele saiu rapidinho. – Acho que só sexo.
- Essa internação está te fazendo subir pelas paredes, minha nossa. Quantos dias você está sem gozar?
- Isso é pergunta que se faça, garoto? – Rodrigo ficou roxo de vergonha.
- É porque tipo, você não pensa em mais nada!
- Sem sexo eu estou há um mês e sem gozar desde que fui internado. Não estou aguentando mais, Caio!
- Já ouviu falar em algo chamado punheta? Sua mão também serve pra isso, sabia?
- Eu sei, eu sei disso, idiota. Mas como você quer que eu faça isso? Nunca me deixam sozinho!
- Quer que eu saia? – sorri. – Aí você vai poder curtir e aliviar a tensão.
- Não, eu me aguento. E daqui a pouco a minha mãe vai chegar também.
E não deu outra. Não demorou nem 15 minutos para a Dona Inês dar o ar da graça.
- Bom dia, meu filho – ela beijou o Rodrigo. – Como você está?
- Bem, mãe. E você?
- Bem também. E você, Caio? – ela também me beijou. – Dormiu bem?
- Dormi, Dona Inês.
- que bom. Querido, obrigada por ter feito companhia ao Rodrigo. Eu assumo à partir de agora, já está liberado.
- Que bom que você chegou, eu preciso mesmo ir trabalhar – falei.
- Eu sei, por isso eu tentei chegar o mais rápido possível.
- Só vou arrumar a minha mochila e já vou nessa.
- Enquanto você faz isso eu vou comprar um café. Já volto tá bom, filho?
- Vai lá mãe. Mãe?
- Diga?
- Compra um pão de queijo pra mim?
- Ai, ai, ai, ai, ai! Você sabe que não pode...
- Ah, mãe...
- Sem choro nem vela, não quero que você piore!
- Droga, viu?
- Paciência, filho! Paciência. Em primeiro lugar a sua saúde.
- Mas eu estou com muita fome...
- Logo a enfermeira aparece com o seu café da manhã.
- Uma bolacha seca com um pedaço de mamão azedo? Grande café da manhã!
- Tadinho, eu fico morrendo de dó, mas não posso fazer nada. A mãe já volta.
- Você está com dieta, é? – perguntei.
- Não necessariamente, é a minha mãe que fica regulando um pão de queijo.
- Mas o médico proibiu?
- Que eu saiba não. Vou perguntar pra ele quando ele passar aqui.
- Faça isso. Digow, preciso ir. O dever me chama.
- Vai lá, Cacs. – às vezes ele me chamava assim. – Muito obrigado por ter feito companhia pra mim, cara. Você é um parceiraço!
- Não tem nada que agradecer. Eu faço de coração, porque gosto muito de você. E você sabe que eu me preocupo.
- Você é um amigão mesmo. O irmão que nunca tive.
Onde estava o cunhado que era irmão? Já não existia mais?
- E você é o irmão que eu sempre quis ter.
Nos abraçamos, mas eu tive muito cuidado para não machucar os pontos dele.
- Obrigado por salvar a minha vida – ele falou.
- Obrigado por salvar a minha também!
- Nosso segredo, beleza?
- Pra sempre!
- Vai lá. Bom trabalho.
- Obrigado. Hoje de noite eu volto para te visitar e se der, eu passo a noite aqui de novo.
- Não! Não precisa, eu não quero que você se prejudique por minha causa.
- Não vou me prejudicar em nada. É um prazer te fazer companhia.
- O prazer é todo meu em ter você aqui, mas de verdade, não se preocupe.
- Não se fala mais nisso. Nos veremos mais tarde. Se comporte, não cante as enfermeiras e se cuide.
- Vou tentar não cantar nenhuma, pode deixar.
- Até mais então.
- Até. Bom dia!
- Bom dia.
.
Quando eu entrei na filial, a Eduarda foi logo me puxando pelo cotovelo.
- Guarde logo a sua mochila e volte correndo que eu preciso de sua ajuda.
- Ajuda? Pra quê?
- Pra encher bexigas.
- Encher bexigas? Vamos ter uma festa? – perguntei na maior inocência.
- Não, Caio – Duda riu. – É para fazer um arco de bexigas na entrada da loja. Hoje é dia de promoção.
- É, é? Sabia não.
- Está sabendo agora. Ande logo, guarde as suas coisas e venha me ajudar.
Será que ela estava me achando com cara de bombinha de ar? Só era o que me faltava, deu vontade de pedir um adicional no salário por cada bexiga enchida.
- Azul e branco? – questionei. – Que cores sem graça!
- Que cor quer?
- Vermelho, laranja, amarelo... Cores alegres!
- Claro que não, vermelho é cor do concorrente!
Nem me toquei que azul e branco eram as cores do logotipo da empresa onde trabalhava.
- Ah, é. Agora eu entendi!
- Liga não, patroa – Janaína meteu o bedelho. – Esse daí é lesado por natureza. Ele só começa a funcionar depois das 3 da tarde.
- Fica quieta, Morro do Alemão – fechei a cara, mas só de brincadeira.
- Quem mora lá é a Alexia, não eu.
- Não briguem, crianças. Ainda falta muito, vamos acelerar que os clientes já estão chegando. Ingrid, troca com o Gabriel, por favor? Pede pra ele vir pra cá e você fica lá na telefonia?
- Pode deixar, Eduarda.
- Obrigada. Bem que o Jonas poderia ter deixado isso pronto ontem à noite.
- Mas não murcharia? – perguntou Renato.
- Acho que não. Não muito. Ah, sei lá...
- Chamou, chefa? – o bombado apareceu e eu já fiquei nervoso. Toda vez que eu olhava pra ele, sentia a maior raiva.
- Chamei, Gabriel. Ajuda a gente a encher essas bexigas, por favor?
- Claro!
Mas ele até que foi bem-vindo porque encheu as bexigas bem rapidinho. Meus dedos já estavam ardendo de tanto que dei nó nas pontas dos balões.
- Acho que está bom. Jana e Letícia, me ajudem com o arco, por favor...
- Posso voltar pro meu setor? – perguntei. – Tem cliente lá.
- Pode sim, Caio. Obrigada.
- Disponha.
.
Quando o Carlos Henrique e eu nos encontramos na tarde daquela terça-feira, foi inevitável não pensar no nosso momento de intimidade.
- Boa tarde, gatinho – ele me puxou e me deu um abraço rápido.
- Boa tarde. Tudo bom?
- Melhor agora e você?
- Estou bem.
- Ficou legal esse arco de balões aí na porta, né?
- Ah, nem me lembra disso. Eu fiquei meia hora enchendo essas porcarias.
- Sério? Coitadinho do meu namorado...
- Fala baixo, louco! Quer que as pessoas ouçam?
- É mesmo, desculpe. Quer dizer que hoje está tendo promoção e ninguém nos avisou?
- Pois é. Segundo a Eduarda, quem decidiu isso foi o Tácio.
- Bacana. Vendeu muito já?
- Pior que a promoção está fazendo sucesso, viu? Já vendi quase pra dez pessoas.
- Sério mesmo? Pô, tu vai tirar a maior nota preta no final do mês, Caio!
- Deus te ouça. A comissão do primeiro mês já fechou, né?
- Uhum. Agora é a de agosto.
- Putz, vou me matar de trabalhar, agosto é meu aniversário e eu preciso de grana.
- Então vai lá para perto das máquinas que têm logo três pessoas lá.
- Vou mesmo. Depois a gente se fala.
.
Animar a Alexia foi quase uma missão impossível. Nada que eu e a Janaína tentamos deu certo. Nem chocolate fez ela sair da fossa.
- Quero não, Caio. Obrigada.
- Pega, vai te animar um pouco.
- Não quero, estou chateada.
- Mas você tem que melhorar, bebê. Não pode ficar desse jeito.
- Eu sei, estou tentando. Vai ficar tudo bem, só preciso de um tempinho. Vou atender um cliente. Até mais.
Eu estava preocupado. Não gostava de ver os meus amigos passando por momentos difíceis.
- Caio, posso falar com você? – perguntou Jonas.
- Pode, Jonas. Aconteceu alguma coisa?
- Vem comigo.
- Eu fiz algo de errado?
- Não.
- Vai me mandar embora?
- Claro que não! Quer parar de paranoia?
- O que é então?
- Só quis te trazer aqui pra Alexia não ouvir a nossa conversa. Eu queria entender se está acontecendo alguma coisa com ela...
- Ah, entendi! Por que pergunta isso?
- Porque o rendimento dela caiu nesses últimos dias. E eu tenho visto que ela está meio tristonha. Como você é amigo, pensei que soubesse de algo.
- Sei sim. Sei e vou te contar porque não acho certo ela ficar desse jeito. Ela vai acabar se prejudicando aqui dentro por conta disso.
- O que aconteceu?
- Não sei se você sabe – cocei o queixo –, mas ela e o Gabriel são, ou melhor, eram namorados.
- Qual Gabriel? O da telefonia ou do som e imagem?
- O da telefonia. Eles namoravam, mas terminaram esses dias aí.
- Ah, então é isso?
- Uhum.
- Sei que não tem nada a ver, mas você sabe o motivo do término? Prometo que ninguém vai saber...
- Pior que sei. E isso não me desce até agora. O Gabriel terminou com ela porque enjoou.
- Como assim enjoou? Fácil desse jeito? Namoravam há muito tempo?
- Pois é. Que nada, namoravam há pouquíssimo tempo. E ele enjoou só porque já comeu. Comeu e não quer mais.
- Ah, fala sério?
- Foi ele mesmo que me disse isso.
- Puta que pariu. Que moleque ele é!
- Verdade, patrão. Eu fiquei muito bravo com ele, aliás eu estou bravo ainda.
- Não é pra menos. Bom, vamos torcer que nada de mais sério aconteça. Vou conversar com ela.
- Vai?
- Vou sim, mas fica calmo que não vou falar que você me contou o que aconteceu.
- Sem crise, chefe.
- Agora, que o Gabriel foi um moleque, ele foi. Nada contra os moleques, hein? – ele sorriu.
- Qual é, chefe? Tá me tirando? Só porque eu tenho 18 aninhos?
- Mano, você é um neném – ele continuou sorrindo. – Mas pelo jeito não é tão imaturo como o seu amigo.
- Não, não sou. Sou bem ajuizado.
- Ainda bem. Então tá, Caio. Era só isso...
- Beleza.
- Agora vai embora que já está dando seu horário. Se bem que você vendeu tão bem hoje que poderia fazer uma horinha extra.
- Só domingo, chefe. Só domingo. Tenho que visitar meu amigo no hospital.
- Amigo? Não era seu irmão?
- É amigo-irmão. Meu irmão mesmo está em São Paulo.
- Ah, é! Eu esqueço que você é paulista.
- Sou sim.
- Mas o seu amigo está bem? Foi muito grave mesmo?
- Foi, cara. Foi grave sim, mas graças a Deus ele já está fora de perigo. Já saiu da UTI e tudo.
- É, com apendicite não se brinca. Uma conhecida da minha mãe morreu disso aí.
- Deus me livre.
- Vai lá, Caio. Não quero te prender mais aqui. Domingo a gente está junto, hein?
- Demorou, chefe.
Eu não sabia quem era mais legal: o Jonas ou a Eduarda. Tive sorte de ter dois chefes maravilhosos.
- Alexia, eu vou embora – me aproximei –, mas se precisar de alguma coisa, me liga. Tá bom?
- Pode deixar, lindo. Obrigada!
- E força, vai dar tudo certo.
- Espero que sim.
- Vai melhorar, tenho certeza.
- Já vai, Caio? – perguntou Carlos.
- Já sim, Carlos. E aí como foram as vendas até o momento?
- Excelentes. Hoje a promoção está show de bola.
- Verdade. Fechei o dia com 17 clientes.
- Uau! Parabéns.
- Obrigado, moço. Vou nessa, tá bom? Tenho que visitar o Rodrigo ainda.
- Ele ainda está no hospital?
- Está sim. Não sei quando vai receber alta.
- Espero que seja em breve. Você está ficando cansado demais com essa correria toda.
- Pior que estou mesmo. Tudo dará certo.
- Se Deus quiser. Boa noite, lindo. Fica com Deus e se cuida.
- Você também. Quando sair, me manda mensagem.
- Pode deixar. Beijo!
- Outro.
.
Cheguei em casa sentindo a maior vontade de ficar deitado na minha cama. O reflexo da noite mal-dormida ainda estava no meu pescoço. O torcicolo ainda não tinha melhorado totalmente.
- Coragem, Caio Monteiro. Coragem.
Tomei um banho rápido, jantei e já fui logo arrumar minha mochila para mais um dia no hospital, mas antes mesmo de fechar o zíper, meu celular começou a tocar e eu recebi uma notícia que mudou a minha noite:
- Oi, Fabrício? – atendi.
- E aí, mano. Beleza?
- Tranquilo e você?
- Bem. Deixa eu te falar, eu vou passar a noite com o Rods hoje, beleza?
- Vai?
- Vou! Nem precisa de preocupar que eu vou ficar com ele.
- Sério mesmo? Que bom, você salvou a minha vida.
- Sério sim, ainda não fiz isso e gosto muito dele. Quero dar uma força.
- Mandou bem! Ele vai gostar bastante.
- Demorou! Então é isso, nem faça as malas, tá bom?
- Já fiz, mas desfaço. Sem problema algum.
- Falou então – ele riu.
- Falou, garoto. Ah, manda um salve pro Digow, por favor!
- Pode deixar. Falou. Até.
Que bom receber essa notícia. Dormir na minha cama seria bom. Mesmo não tendo que passar a noite, eu ia ter que visitá-lo. Queria saber de notícias e ia acabar me sentindo culpado se não fosse falar com ele.
- Não acredito que você veio de novo – Rodrigo não acreditou quando eu entrei no quarto do hospital.
- Eu disse que viria, não disse?
- Você é louco mesmo, só pode.
- Mas não vou dormir aqui hoje.
- Não? – ele achou estranho e pareceu desapontado.
- Não. Quem vem é o Fabrício.
- O Fabrício? Mas e a faculdade?
- Ele vem depois da faculdade, acredito eu.
- Eu preciso ter alta logo, odeio dar trabalho pros outros.
- Calma, filho! – falou Dona Inês. – Logo você volta pra casa!
- Oi, Dona Inês! Desculpe, nem falei com a senhora. Que mal-educado...
- Tudo bem, não esquenta! Como você está?
- Ótimo e a senhora?
- Bem. Não me chame de senhora, por favor! Eu me sinto uma velha.
- Desculpe. É a força do hábito. Irei me policiar.
- Vou cobrar, hein?
- Pode cobrar! E aí, Rodrigão? Como você está hoje?
- Do mesmo jeito de hoje de manhã. Só estou preocupado com a faculdade.
- Será que perdeu muita coisa?
- Perdi sim. Os meus amigos vieram me visitar hoje à tarde e me passaram as lições. Eu estou lascado.
- Vai ter que conversar com os professores – falei.
- Certeza. A culpa não foi minha. Eu já comecei a deixar as coisas em ordem, minha mãe trouxe meus materiais hoje cedo.
- Trouxe? Nem percebi!
- Trouxe sim – falou Dona Inês. – Temos que pensar em tudo, não é mesmo?
- É verdade.
- E o senhor? – Rodrigo cutucou meu braço. – Está estudando pro Enem?
- Com que tempo? Só se for de madrugada, daí eu não durmo!
- Vai fazer Enem, Caio? – perguntou a mãe do Rodrigo.
- Sei não, Dona Inês. Estou pensando ainda.
- Vai sim, mãe – falou Rodrigo. – Eu inscrevi o Caio, porque se depender dele, ele não faz faculdade nunca, sabe?
- Fez muito bem, filho! Por isso eu me orgulho de você.
- Ele quer me obrigar a estudar, vê se pode, Dona Inês?
- Acho ótimo! – a mulher sorriu. – Tem que estudar mesmo.
- Por isso eu começaria a estudar se fosse você – disse meu amigo.
- Vou fazer isso. Vou levar os livros pra debaixo do chuveiro, pro ônibus, pra loja...
- Boa ideia, pode estudar enquanto vai trabalhar, enquanto volta pra casa... Nada mal!
Única e exclusivamente pelo cansaço que estava sentindo, só fiquei pouco mais de 40 minutos com o Rodrigo. A mãe dele resolveu esperar o Fabrício chegar para ficar de acompanhante. Não era legal deixar meu amigo sozinho.
- Boa noite, Caio! Obrigado pela visita.
- Você sabe que não precisa agradecer.
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DOIS DIAS DEPOIS..
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Não sabia, juro que não sabia que o Rodrigo havia recebido alta. Quando eu cheguei em casa e vi o cara sentado no sofá, quase tive um troço de tanta felicidade.
- NÃO ACREDITO!
- Oi, Cacs – ele abriu um sorriso largo.
- Digow! Digow, que maravilha! Você está bem?
- Muito bem, muito bem. Tanto é que tive alta, tá vendo?
- Louvado seja Deus! Nem acredito que você está aqui...
- Eu também não. Estava contando os minutos pra esse dia chegar.
- Ah, que bênção. Agora é só se cuidar...
- Com certeza!
- Que horas você chegou?
- Agora no começo da noite.
- Onde está sua mãe?
- Ela foi comprar pão. Eu estou com muita vontade de comer pão.
- E ela sabe onde fica a padoca?
- Eu expliquei direitinho pra ela, espero que não se perca.
- Ah, Digow! – abracei meu amigo com gosto, mas cuidado. – Eu estou tão feliz de te ver aqui, sabia?
- Não mais que eu, Cacs. Não mais que eu. Senti muito a falta da minha casinha.
- E nós também sentimos a sua falta. Sua casa e seus amigos.
- Obrigado pelo carinho. Vou passar toda a minha vida agradecendo por tudo o que você fez por mim.
- Larga a mão de ser bobo, menino. Já cansei de falar que não precisa me agradecer em nada!
- Preciso sim, sou um menino muito educado.
- Pior que é mesmo, às vezes dá até raiva!
Ele foi literalmente o centro das atenções. Quando os outros 4 componentes da república chegaram, todos ficaram tão surpresos quanto eu com a presença do Rodrigo na nossa casa.
- Que bom que voltou – falou Vinícius. – Está melhor?
- Graças a Deus, Vini!
- Que bom. Precisando de algo, é só falar.
- O Vini vai ser médico, mãe. Você sabia? – perguntou o menino.
- Já fiquei sabendo – comentou Dona Inês. – Linda profissão.
- Obrigado, Dona Inês – Vinícius ficou radiante.
Naquela noite eu dormi feliz. Feliz demais. Ter o meu amigo de volta em casa e com a saúde em dia, me deixou realmente contente. Fazia tempo que eu não tinha um sono tão gostoso como aquele.
E assim as coisas foram acontecendo. Já na manhã seguinte o Rodrigo voltou pra faculdade. Ele já podia ter uma vida normal e isso fez com que a mãe dele ficasse despreocupada para voltar de vez ao Paraná, mas isso só aconteceu depois de uma semana da alta do rapaz.
- A senhora já vai? – perguntou Éverton.
- Já sim. Eu já permaneci tempo demais fora de casa. E o Rodrigo agora já está melhor.
- Que pena, a senhora vai fazer falta.
- Ah, obrigada! Vá nos visitar quando quiser. Todos vocês estão convidados!
Eu não pude acompanhá-la ao aeroporto, então fui obrigado a me despedir da Dona Inês em casa mesmo:
- Obrigada, obrigada, obrigada, muito obrigada, obrigada mesmo por ter salvo o meu filho, Caio – ela me deu um abraço muito gostoso.
- Imagina, Dona Inês! Fiz com todo carinho do mundo, já disse que ele é um irmão pra mim.
- E você também é um irmão pra ele! Meu marido e eu seremos gratos para sempre por tudo o que você fez por ele. Para sempre.
- Não foi nada, foi um prazer cuidar do meu amigo.
- Você é um menino de ouro, Caio. Um menino de ouro!
- Obrigado! Desejo que faça boa viagem e que volte mais vezes.
- Obrigada! Eu vou esperar você em casa nas férias de final de ano.
- Não posso, Dona Inês! Nessa época eu ainda não vou estar de férias no trabalho.
- É uma pena, mas assim que entrar de férias, vá nos visitar. Nem que seja sozinho!
- Pode deixar – eu abri um sorriso. – Eu irei com certeza.
- Obrigada novamente por tudo.
- Não foi nada, eu que agradeço pelas comidas, por tudo que a senhora fez aqui em casa.
- Foi um prazer ajudar! Até mais, Caio. Fique com Deus, Deus te abençoe.
- Amém! Boa viagem.
- Obrigada!
.
- Eu pensei que a gente não fosse ficar a sós nunca mais – Carlos me puxou para um abraço.
- Como você é exagerado! – cafunguei no pescoço dele. Estava tão cheiroso!
- Eu estava morrendo de saudades, sabia?
- É? Então prova! – o desafiei.
E então rolou nosso primeiro beijo. Foi um beijo alucinante. Em questão de segundos, ele me jogou em cima da cama e não precisou de muito para ambos ficarmos totalmente pelados.
- Que delícia de moleque! – ele não parou de me olhar.
- Hoje eu sou todo seu – falei. – E quero aproveitar cada segundo ao seu lado!
- Todinho meu? – ele mordeu meus lábios.
- Todinho seu!
Isso não era verdade. Meu coração brigou comigo e de imediato o infeliz do Bruno entrou na minha mente. Mais uma vez eu estava pensando nele enquanto estava ficando com o outro. Por que aquilo estava acontecendo?
Naquele domingo ele foi o primeiro a me chupar e como fez isso bem. Melhor até que na primeira vez que a gente transou.
- Ui – senti um arrepio quando ele passou a língua no meu saco.
- Delícia – Henrique sussurrou.
- Chupa tudinho, vai? – mandei.
E nem foi preciso falar mais nada. Meu namorado abocanhou tudo de uma vez e ficou com meu pau na boca por quase meia hora.
- Vou gozar – anunciei em meio a gemidos.
Mas ele não deixou e nós invertemos os papeis. Caí de boca como gostava de fazer. Primeiro chupei as bolas pra depois dar atenção ao pau.
Ele gemeu na mesma intensidade do dia anterior. Foi bom demais sentir o prazer que ele estava sentindo. Não podia ter nada melhor que aquilo naquele momento.
Foi uma noite quente onde nós definitivamente curtimos tudo o que tínhamos que curtir. Mais uma vez eu fui ativo e passivo, mas a diferença foi que naquele dia, ao invés de um orgasmo eu acabei tendo dois e o Carlos também.
- AH, AH, AH, AH, AAAAAAAAAAAAAAAAH... – ele urrou de prazer.
A outra diferença foi que na nossa 2ª vez, eu consegui ficar um pouco de tempo a mais na casa dele. Isso foi bom para estreitar de vez a nossa relação.
Mas não houve diferença quando o quesito foi pensamentos. Eu estava transando com o Henrique, mas pensando no maldito do Bruno.
Eu não queria pensar nele, juro que não. Porém, por mais que eu tentasse fazer com que ele desaparecesse da minha mente, isso nunca acontecia. Eu não entendia o motivo.
- Foi ótimo, Carlos – eu puxei ele para um beijo. – Você foi demais.
- Você também foi. Eu amei!
- Me leva no portão, por favor?
- Claro que sim, mas não queria que você fosse embora.
- Eu também não queria ir, mas tenho. Os meninos não sabem que eu estou aqui e vão se preocupar se eu não dormir na república.
- Então vamos marcar um dia para você vir dormir aqui?
- Com certeza – concordei na hora. – Vai ser bom demais...
- Vai sim!
- Boa noite então, lindão.
- Boa noite – ele coçou a nuca e ficou me olhando. – Você é muito lindo!
- Você que é. Beijo!
- Outro.
Caminhei me sentindo bem mais leve e quando cheguei em casa, me surpreendi ao ver que o lixo não havia sido colocado na calçada.
Quem teria esquecido? Havia dois sacos enormes e uma caixa de leite vazia. Primeiramente eu me desfiz dos sacos pretos e quando fui pegar a caixa, tive uma baita surpresa: ela não estava vazia.
Não acreditei no que meus olhos estavam vendo. O gato que tinha feito cocô na porta da minha casa não era um gato. Era uma gata. Isso tratando-se do mesmo felino que estava dentro daquela caixa de leite vazia.
Mas o pior – ou melhor – de tudo, era que a gatinha não estava sozinha. Ela estava com nada mais, nada menos que 7 filhotinhos e pelo jeito, tinha acabado de dar a luz.
- RODRIGO? RODRIGO, VEM AQUI! RODIGÔ?
Que coisinha mais linda! Será que eu podia segurar um filhotinho? Será que ela ia me morder? Fiz carinho na cabeça da mamãe e ela soltou um miado muito rouco. Como era bonita, meu Deus!
- RODRIGO? VINI? ALGUÉM VEM AQUI...
- O que foi, Caio? – Vinícius apareceu. – Que gritaria é essa?
Eu olhei para trás e todos estavam se aproximando.
- Venham ver isso.
- CRUZES – Rodrigo deu um berro de susto. – QUE PORCARIA É ESSA NO MEU QUINTAL?
- Que coisinha mais linda – Maicon ajoelhou ao meu lado. – Como você veio parar aqui, moça?
- Miau – a gata olhava nos nossos olhos e miava.
- Eu acho que ela está com fome – disse Fabrício. – Vou pegar um potinho de leite.
- De quem será essa gata? – perguntou Vinícius.
- Ela parece ser bem dada, né? – Éverton comentou. – Pra ter logo 7 filhos de uma vez?
- JOGUEM ISSO NO LIXO! – mandou Rodrigo.
- Claro que não! – não concordei. – Ela acabou de dar a luz, ela precisa de cuidados! E você para de gritar que está operado.
- Odeio gatos – ele se afastou.
- Também não gosto – concordou Éverton. – Essa nojenta deve ser de algum vizinho!
Os gatinhos estavam miando sem parar. Eram 3 cinzas, 3 siameses e 1 preto. Eles pareciam mais ratinhos do que gatos.
- Aqui, será que ela vai beber? – Fabrício voltou com uma caixinha de margarina cheia de leite.
E não deu outra. Assim que sentiu o cheiro, a gata deu um pulo, largou os filhos e foi se alimentar. Ela tomou boa parte do líquido e em seguida voltou para a caixa.
- Como ela é linda, né? – falou Maicon. – Toda cinza com os olhos verdes. Linda mesmo.
- Verdade – concordei.
- Deve ter sido essa nojente que cagou aqui na porta de casa – reclamou Rodrigo.
- A coitada não tem culpa – a defendi e fiz carinho novamente. Mais uma vez ela miou.
- Querem saber de uma coisa? – Éverton foi pro portão. – Eu vou sair perguntando de quem é essa gata. Eu é que não vou ficar tomando conta de bicho dos outros!
- Vou com você, cara – Rodrigo seguiu os passos do amigo.
Eu estava rezando para eles não acharem o dono, mas acharam. Era uma mulher de mais ou menos 30 e poucos anos e eu já a havia visto algumas vezes na minha rua.
- Severina! Severina, você está aí! – ela falou com a gata.
Severina? SEVERINA? S-E-V-E-R-I-N-A? Eu tinha ouvido bem? Era esse o nome da coitada da gatinha?
- Ela é sua? – perguntei. Que pergunta óbvia!
- É sim e eu estava doida atrás dela. Sabia que ela ia dar a luz esses dias e ela fugiu sem mais nem menos. É uma danada!
- Ela é muito linda! – Maicon a elogiou.
- Obrigada! Ai, Deus que coisinhas mais lindas... Logo 7, Severina? Pra que tudo isso, mulher? – a dona da gata acariciou a cabeça dela e de novo ela miou.
- Moça? O que você vai fazer com os gatinhos?
- Vou doar – respondeu a mulher. – Queria ficar com todos, mas não posso.
- E já tem dono? – perguntou Fabrício.
- Não. Nenhum está encomendado. Vocês querem um?
- Sim – respondemos Maicon e eu.
- NÃO! – Rodrigo se revoltou. – Não, não e não!
- Por que não? – eu perguntei. – Eu quero ficar com um sim!
- NÃO CONCORDO – ele ficou transtornado. – Se esse bicho ficar, eu vou embora dessa república!
- Calma, Rodrigo – disse Vinícius. – Você não pode se exaltar, lembre-se que você está operado.
- Foda-se! Eu não aceito um bicho desses aqui em casa.
- Eu também não concordo – falou Éverton.
- Por mim não tem problema. Eu gosto de gatos – Fabrício ficou do meu lado e do lado do Maicon.
- Mas eu não gosto! – Rodrigo estava decidido. – Estou falando sério!
- Calma, Rods – falou Vinny. – Em outro momento a gente decide isso, beleza?
- Comigo não tem acordo – ele reclamou e em seguida entrou em casa.
- Tão lindinhos – eu suspirei. – Quero um sim.
- Quer um machinho ou uma fêmea? – perguntou a dona dos felinos.
- Um macho. O ciamês.
- Vou deixar reservado. Se quiserem mesmo, é só buscar em 45 dias. Sabem onde é a minha casa, né?
- Sabemos sim – falou Vinícius. – Vamos pensar a respeito e qualquer coisa a gente fala.
- Tudo bem. Espero que o amigo de vocês mude de ideia...
A mulher pegou os filhotinhos e colocou no centro da caixa que havia trazido de casa. Quando o último foi colocado na nova caixa, a gata miou e deu um salto atrás dos filhos. Impressionante como mesmo sendo um animal, ela tinha instinto maternal.
- Obrigada por cuidarem dela – a vizinha agradeceu. – Eu já estava preocupada.
- Imagina – Maicon falou. – Não esqueça de reservar um pra gente.
- Pode deixar!
.
Ainda naquela semana o Vinícius apareceu com uma notícia que interessou a todos: ele tinha encontrado uma nova república.
- Mas tem um probleminha.
- Era bom demais pra ser verdade! Qual o “probleminha”? – perguntou Maicon.
- Fica meio longe daqui.
- Fica onde? – perguntou Rodrigo.
- Lá no Realengo.
- Você já foi lá ver como é? – perguntei.
- Não! Quero ir com vocês, pô. O que acham de passarmos lá no domingo?
- Por mim, beleza – concordei.
- Por mim também – disse Rodrigo.
- Também concordo – falou Éverton.
- Sem problema – concordou Maicon.
- Então combinado – finalizou Fabrício.
E assim fizemos. No domingo pela manhã nós fomos averiguar as condições da república e fomos trocar ideia direto com a proprietária, uma mulher de meia idade que se chamava Esmeralda.
- Olá, bom dia – ela nos esperou no começo da rua.
- Bom dia – nós respondemos ao mesmo tempo.
- Podem vir comigo, a casa fica ali na frente.
Nós a acompanhamos e nos deparamos com uma frente de casa um pouco grande. Será que o imóvel era espaçoso?
Esmeralda abriu uma portinha de madeira que ficava ao lado da entrada de um bazar e uma escada apareceu na nossa frente.
- É aqui. Antes de subir, eu preciso falar uma coisa.
- Que coisa? – perguntou Fabrício.
- A casa é para 8 pessoas. E já têm 2 meninos morando aí.
Meus amigos e eu nos entreolhamos. Essa era uma informação que nós não tínhamos até então.
- Mas eles são muito legais, vocês vão gostar deles. Por favor, podem entrar...
Fui o último a subir a escada. Quando cheguei ao último degrau, me deparei com uma sala maior do que eu esperava.
Era ampla, com dois sofás, uma estante e uma televisão. Pelo jeito a casa era mesmo bem espaçosa.
- Aqui fica a sala. A casa é bem grande, vocês vão gostar bastante. Querem que eu chame os outros moradores?
- Se possível – Vinícius deu de ombros.
- Só um momento.
- E aí? O que achou disso? – Éverton perguntou ao Vini.
- Ela poderia ter falado antes, né? Vamos ver como fica.
Rapidamente a dona da casa voltou com dois marmanjos. Um deles era branco, alto, com corpo normal, olhos castanhos e cabelos negros.
Já o outro tinha a pele bronzeada, era um pouco mais baixo que o primeiro, olhos castanho-claros e cabelos castanhos com luzes.
Meus olhos grudaram com os olhos do segundo e imediatamente o meu “gaydar” começou a piscar, acender e emitir alarme. Não sei explicar o motivo, mas logo de imediato eu tive certeza que aquele garoto era gay.
- Meninos, esses daqui são o Vinícius, o Fabrício, o Éverton, o Maicon, o Rodrigo e o Caio – não sei como a Esmeralda lembrou o nome de todos nós. – E meninos, esses daqui são o Miguel e o Kléber.
Não, não tinha como negar. O carinha era do babado. Eu tinha certeza. Tanta certeza quanto a certeza de que um dia eu não vou mais fazer parte do mundo dos vivos!
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