sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Capítulo 115

- Bom dia – toda a sala cumprimentou o professor em uníssono,mas eu não falei mada.
O cara colocou as coisas em cima da mesa, pegou uma folha de sulfite e entregou ao aluno que estava sentado na frente de sua mesa. O que seria aquilo?
Pelo que pude perceber, o professor deveria ser um pouco rígido porque toda a sala ficou calada com a chegada dele. De qual matéria ele seria?
- Algum aluno novo hoje? – ele tirou o paletó, colocou no encosto da cadeira e olhou para a sala.
Como eu estava no fundão, tive uma visão panorâmica de todos os alunos e pude perceber que um garoto e uma garota ergueram as mãos. Um estava na ponta e outro no meio da sala. Eu também ergui a minha mão.
- Só vocês 3? – ele olhou nos nossos rostos. Algumas pessoas viraram e encontraram a minha mão erguida. – Então sejam todos muito bem-vindos.
Não agradeci. Eu estava tímido e intimidado. Não sabia o que deveria fazer, como deveria agir nem me portar. Me senti um peixinho fora d’água.
- Para vocês que não me conhecem, eu sou o Profº Élcio e leciono Comportamento Organizacional.
“Que diabo é isso?” – perguntei a mim mesmo.
- Não sei se o nome de vocês já está na lista de presença. Se não estiver, podem escrever no verso da página.
Do que ele estava falando? Eu estava todo perdido.
- Abram os livros na página 57 – mandou o Profº Élcio.
Que livro? Eu não tinha livro!
- Quem ainda não tem o livro pode se juntar em dupla para acompanhar o conteúdo.
Dupla? Quem seria a minha dupla?
Eu acompanhei metade da sala arrastar as carteiras e fiquei me perguntando quem poderia me ajudar.
- Ei, psiu – eu virei para a minha direita e vi uma loirinha me fitando. – Você quer se juntar comigo?
- Ah, quero sim... – nem me fiz de rogado, mas fiquei com vergonha. – Muito obrigado...
Levantei, ergui a minha carteira e coloquei suavemente ao lado da desconhecida. Odiava carteira unitária. Me lembrou muito o seriado “Chaves”, pois as mesas de estudos eram bem similares às que apareciam na série de televisão.
- Imagina – ela me olhou. – Como se chama?
- Caio e você?
- Marcela. Muito prazer, Caio.
- O prazer é todo meu, Marcela.
- Você fez o vestibular quando?
- Não fiz vestibular, eu sou bolsista do ProUni.
- Ah, que legal. Bacana.
- Você começou faz tempo?
- Comecei desde o primeiro dia de aula. Se você quiser, depois eu te passo todas as matérias que perdeu.
- Poderia fazer isso? Eu ficaria muito agradecido.
- Posso sim, claro.
- Puxa, nem sei como te agradecer.
- Imagina. Estamos aqui pra isso. Agora vamos prestar atenção, esse professor é um porre!
Gostei da garota. Ela parecia ser bem legal. A menina era bem loirinha e parecia que não era oxigenada. Para ser mais linda do que já era, só faltava ter os olhos claros, mas isso ela não tinha. Ainda bem, porque se tivesse, com certeza eu ia ficar pensando no Bruno.
Tentei me concentrar na aula, mas meu celular começou a vibrar feito um louco. Era outra mensagem do número desconhecido:
.
“Você não vai me responder?”
.
Que porcaria era essa? Eu não estava com saco pra ficar respondendo mensagem de quem eu não conhecia!
- Quer um conselho? – Marcela sibilou baixinho.
- O quê? – eu também falei em voz baixa.
- Deixa o celular no vibratório. Se o Élcio for interrompido ele fica louco.
- Sério?
- É sim. É só um conselho, tá?
- Obrigado pela dica.
Deixei o celular no vibracall imediatamente. Eu não queria irritar o professor logo no meu 1º dia de aula, né?
A aula dele durou cerca de 1 hora. O sinal que tocou informando o final da 1ª aula era igualzinho ao sinal da escola onde eu estudei em Sampa. Bons tempos!
- Obrigado por me ajudar com o livro, Marcela – eu levantei e comecei a colocar a carteira no lugar.
- Por nada, Caio. Sempre que precisar, é só falar.
- Te agradeço muitíssimo.
A 2ª aula também foi com um homem. Ele se chamava Getúlio e era professor de Direito Empresarial.
Era uma matéria mais esquisita que a outra, mas enfim... Português e matemática eu não ia aprender, né?
- Juntem-se em trios. Eu vou passar uma atividade – disse o cara.
- Caio, cola aí – Marcela riu.
- Valeu, Marcela – eu ri.
A outra pessoa que ficou com a gente foi uma menina chamada Jéssica. Ela não era nada bonita comparada à Marcela, mas isso não me importava. Para mim o que importa é o caráter.
- Esse é o Caio, Jéssica. Caio, essa é a Jéssica.
- Prazer – ela falou.
- Prazer é meu – senti minha pele queimar.
Realizamos uma atividade e eu fiquei mais perdido que cego em tiroteio. Para não ficar sem fazer nada, eu perguntei se podia ficar responsável pela escrita das respostas e as meninas aceitaram.
- Sua letra é linda – disse Jéssica. – Parece até letra de mulher!
- Obrigado – fiquei sem jeito.
- Linda mesmo – concordou Marcela. – Parabéns.
- Obrigado.
Que coisa mais chata. Sempre fiquei ouvindo essa história que a minha letra parecia letra de mulher. Qual o preconceito? Um homem não pode ter letra bonita?
- Você pode me emprestar as matérias, Marcela? – fiquei muito envergonhado. – Eu estou todo perdido.
- Lógico! Se quiser, pode até levar para casa.
- Verdade? Me ajudaria muito! Eu perdi muita coisa?
- Bastante, viu? Vai demorar uns dias para deixar em ordem, mas você dá conta.
- Deus te ouça!
- Está gostando?
- Perdidinho, mas parece ser bem legal.
- É muito bom. Eu adoro estudar. Sou suspeita nesse assunto.
- Disso eu não sou muito fã não, mas é preciso né?
- Com certeza. Agora é o intervalo, você vai ficar aí?
- Não. Eu vou atrás do meu irmão.
- Seu irmão estuda aqui?
- Sim – eu não ia falar que ele era meu amigo/irmão. Estava com preguiça.
- Ah, entendi. Então a gente se vê na próxima aula.
- Sim, a gente se vê.
Ainda bem que ela resolveu me ajudar. O que seria de mim se eu ficasse sem toda a matéria passada? E o que seria de mim se algum fllho de Deus não me emprestasse os livros? Eu estava lascado...
Achar o Rodrigo no meio de tanta gente foi como procurar uma agulha no palheiro. Tive que ligar pra ele para saber onde ele estava.
- Eu estou no pátio. Perto da biblioteca.
- E onde fica essa biblioteca?
- Onde você está?
- Sei lá!
Ele riu.
- Descreve o lugar onde você está, Caio.
- Ah... Eu estou perto de uma sala com porta verde.
- Mas em que prédio?
- E eu vou saber?
- Sabe onde é a secretaria? Onde você fez a matrícula?
- Acho que sei.
- Vai até lá que eu te mostro o campus inteiro.
- Beleza. Eu estou indo pra lá.
Meu melhor amigo chegou primeiro que eu. Meu coração bateu aliviado quando eu o vi parado, encostado em uma pilastra.
- Bons olhos que o veem – senti vontade de agarrá-lo.
- E aí? – ele abriu aquele velho sorriso que eu conhecia. – Como está sendo o seu primeiro dia de aula na faculdade?
- Complexo. Eu estou mais perdido que caipira em cidade grande.
- Normal. O meu primeiro dia também foi assim.
- Mas pra mim está sendo um pouco pior, porque eu cheguei no final do mês quase.
- Isso é. Você já perdeu mais de 2 semanas na verdade, né?
- Então! Mas graças a Deus uma moça vai me emprestar a matéria.
- Já fez amizade?
- Não é bem uma amizade, mas pode virar eu acho. Ela é legal.
- Hum, que bom. Assim que tem que ser. Vamos lá, eu vou te apresentar todo o campus.
- Beleza.
O meu guia turíristico estava tão cheiroso, mas tão cheiroso que foi difícil prestar atenção em qualquer coisa que fosse, a não ser no seu perfume.
- E aqui é o pátio – ele disse.
- Hum...
- Que foi?
- Não, nada – nos olhamos fixamente.
- Algum problema?
- Nenhum. Por quê?
- Você está calado demais.
- Só estou admirando.
- Admirando? Admirando o quê?
- A faculdade, oras. Posso te fazer uma pergunta?
- Sim!
- Que perfume é esse que você está usando?
- Um importado que não me lembro o nome. Por quê?
- Porque é bom. Você não tinha esse, tinha?
- Ganhei do meu pai no final do ano – ele sorriu.
- Ah! Está explicado. Se é importado, deve ser os olhos da cara, né?
- É nada, para de graça.
- Enfim. Você está muito cheiroso hoje.
- Obrigado, Caio – ele me olhou de novo.
Não desviei meus olhos dos dele um segundo sequer. Ficamos calados, um olhando pro outro sem esboçar nenhuma reação.
- É... Então é isso – ele falou depois de um tempo. – Essa é a universidade.
- Obrigado por me mostrar tudo.
- De nada.
O sinal informando o final do intervalo tocou. Eu olhei para todos os lados e depois pro Rodrigo. Já tinha esquecido como fazia para chegar na minha sala.
- Como eu chego na minha sala? – perguntei, já com as bochechas coradas.
Ele abriu um sorriso muito lindo.
- É por ali, meu... – ele apontou o caminho que eu tinha que percorrer.
- Obrigado. Você é demais.
- Eu sei, mamãe e papai capricharam e eu saí assim – ele sorriu.
- Besta – sorri em retribuição.
- Volta lá, senão você se atrasa. A gente se vê na hora da saída.
- Você me espera?
- Lógico que eu te espero, né?
- Você é DEMAIS!
- Eu sei que sou. Volta lá. Boa aula!
- Pra você também, mister MODÉSTIA.
Saí andando, mas fiquei com o perfume dele no meu nariz. Quando ele saiu de casa, não estava tão cheiroso daquele jeito. Será que tinha passado o perfume na faculdade mesmo?
Minha 3ª aula foi de TGA com o Profº Álvaro. Um cara ainda jovem e boa praça. Pelo jeito eu ia me dar muito bem com ele.
Álvaro também percebeu a minha presença e a dos outros alunos novos. Ele perguntou nossos nomes, idades e profissões. Fiquei com vergonha de me apresentar daquele jeito.
- Seja bem-vindo, Caio. Espero que goste do curso.
- Obrigado, professor.
Que mico! Ele não precisava fazer aquilo, não mesmo.
A 4ª e última aula foi de Matemática e eu entrei em desespero. O nome da professora era Marília, uma jovem senhora com seus 40 e poucos anos e com alguns fios de cabelos brancos. Ela também parecia ser gente fina, mas eu odiei a matéria dela.
- O primeiro aluno que acertar a resolução dessa equação de 2º grau vai ganhar 1 décimo na P2.
O que era P2? Por que aquelas pessoas só falavam em códigos? Eu não estava entendo bulhufas e ninguém teve a decência de me explicar o que era P2.
- Marcela? Me explica o que é P2?
- Ah, sim – ela me fitou. – Aqui na faculdade existem 2 provas. A primeira é chamada de P1 e acontece no meio do semestre e a segunda é a P2 e acontece todo final de semestre.
- Ah, entendi. E são fáceis será?
- Isso eu já não sei.
Que pergunta idiota eu fiz. Como ela ia me responder aquilo se também estava no 1º semestre? Eu tinha que perguntar isso para quem estava adiantado, como os meus amigos por exemplo.
Louvei a Deus quando o sinal tocou e acabou o meu 1º dia na faculdade. Eu estava cansado, com muita fome e também com sono. A aula de matemática me deixou extremamente irritado.
- Caio? Você quer levar meu caderno pra casa? – perguntou Marcela.
- Não vou te incomodar?
- De jeito nenhum! Pode levar.
- Puxa, fico te devendo essa. Você não vai usar?
- Não, não tem nenhum trabalho pra fazer. Pode levar sem medo.
- Amanhã eu te trago, prometo.
- Por favor – ela riu. – Amanhã sim eu vou precisar.
Abri um sorriso sem graça e fiquei vermelho, porque minha pele esquentou muito.
- Então muito obrigado, Marcela.
- Por nada, Caio! Até amanhã.
- Até amanhã.
Eu precisava comprar urgentemente uma mochila. Comprei tudo no dia anterior e acabei esquecendo do mais importante...
Quando eu saí da sala, percebi que o Rodrigo estava me esperando em frente a mesma. Ele estava com óculos escuros, encostado novamente em uma pilastra e estava com os braços cruzados e a perna feito “X”. Eu até arrepiei quando vi meu amigo daquele jeito.
- Pensei que não ia sair mais – Rodrigo sorriu.
- Estava arrumando as minhas coisas. O que está fazendo aqui?
- Te esperando, oras – ele manteve o mesmo sorriso. – Ou será que eu não posso buscar meu irmão na sala dele?
Meu amigo tirou os óculos e me fitou de uma forma esquisita. Pela primeira vez eu percebi que algo diferente estava acontecendo. Nós estávamos nos olhando muito, eu estava pensando muito nele e estava me arrepiando demais em determinadas situações. Será que eu estava... Nãããããããão!
- E aí? E as aulas, como foram? Quais foram as suas matérias? – Rodrigo colocou os óculos e nós começamos a andar.
Contei como foi o meu dia, quais foram as matérias que tive, o nome dos meus professores, o que achei das aulas, das matérias, da faculdade em si e depois ele me contou tudo sobre o curso dele.
Desde que o conhecera, nunca tinha conversado com ele sobre esse assunto. Nunca me interessei em saber detalhes do curso dele, mas quando ele começou a falar, um interesse esquisito brotou dentro de mim.
- Fala mais – falei.
- O que você quer saber? – ele me olhou.
- Tudo – como era bom olhar nos olhos dele.
- Tudo o quê? – ele riu.
- Ah, sei lá. Achei da hora esses negócios do seu curso. Essas matérias parecem ser legais.
- Legais? Só se for na sua terra, porque isso é um tédio!
- É mesmo? Parece ser tão legal.
- Legal deve ser TGA. Acho tão chique “TGA”. Queria fazer TGA.
- Bobo. Como você é bobo, Digow!
- Até amanhã, Digão – um cara passou e deu um tapinha amigável no braço do Rodrigo.
- Até amanhã, Rafa!
- Digão? Que história é essa de Digão? – perguntei.
- Os caras me chamam assim. Pegou.
- Gostei. Digão é legal, Digão combina com você. É melhor que Digow. Posso te chamar assim?
- Hum... Deixa eu pensar – ele colocou o indicador e o polegar no queixo. – CLARO QUE PODE, CAIO!
Rodrigo passou o braço pelo meu ombro e me prensou contra o corpo dele. Senti de novo o cheiro do perfume invadir as minhas narinas e isso me deixou doidinho, doidinho.
- Hum – ele respirou fundo duas vezes. – Você falou de mim, mas também está bem cheiroso, hein?
- Você acha? – olhei para ele de canto de olho.
- Tenho certeza. Acho que vou roubar esse seu perfume pra mim.
- Você quer de presente? Eu te dou.
- Claro que não, Caio – ele riu. – É brincadeira!
- Estou falando sério! Eu te dou... Enjoei. Foi o idiota que me deu, só não jogo fora porque tenho dó...
- Para! Larga a mão de ser bobo, usa seu perfume. Não importa que tenha sido presente dele, usa e já era.
- Estou enjoado. De verdade.
- Como pode enjoar de uma delícia dessas? É importado não é?
- Aham.
- Vai desperdiçar um perfumão desses?
- Não vou desperdiçar, vou dar para alguém que eu amo!
Rodrigo ficou com as bochechas mega vermelhas e eu achei isso muito fofo!
- Obrigado pela parte que me toca. Onde você vai agora? – ele mudou bruscamente de assunto.
- Pra academia. Ainda tenho tempo. Você vai pra casa?
- Não. Eu vou com você.
- Vai comigo? – me animei.
- Vou. Quero conhecer essa academia. Eu disse que ia perder esses quilos que adquiri, não disse?
- Esses quilinhos não estragaram sua beleza, Digão.
- Valeu, Cacs. Só que eu estou incomodado com essa barriguinha que adquiri. As meninas não curtem.
“Mas eu curto” – pensei comigo mesmo.
- Bobão – falei baixinho.
- Sou nada! A academia fica longe daqui?
- Que nada, fica perto do shopping onde eu trabalho.
- Ah, tranquilo.
Meu chapa e eu andamos pelas ruas da Barra da Tijuca e não paramos de conversar um segundo sequer. Eu contei como era o meu treino e ele ficou me torrando de perguntas a respeito de mulheres:
- E as gatinhas ficam de 4 pra malhar a bundinha? – ele mordeu os lábios.
- Ficam – revirei meus olhos e senti o meu estômago embrulhar.
- Delícia. Isso não vai prestar!
- Como se você fosse fazer alguma coisa – senti um ciúme imenso do Rodrigo.
- Você não sabe! E se alguma me der mole e rolar um sexo gostoso?
- Affe. Só pensa nisso, menino?
- Ultimamente eu tenho pensado mais com a cabeça de baixo do que com a de cima. Até parece que voltei a ter 17 anos de idade.
- Zoado – sorri. – Quando você tinha 17 era muito acelerado?
- Meu... Eu era louco. Só pensava em sexo e punheta, sexo e punheta, sexo e punheta, Foi uma fase muito intensa da minha vida, até porque na época eu namorava e tinha uma boa vida sexual. Saudades!
- Como se hoje em dia você não tivesse, né?
- E não tenho mesmo. Quase não faço sexo! Tenho que ficar mais nos 5 contra 1.
- Engrqçado – parei pra pensar. – Nesses 2 anos que moro com vocês, nunca peguei ninguém na punheta.
Salvo o dia que ouvi o Vinícius transando com aquela menina da faculdade. Mas isso o Rodrigo não ia precisar saber.
- E está doidinho pra pegar, né?
- Certeza, principalmente se for você – falei.
- Vai sonhando. Eu só faço isso quando estou sozinho ou quando estou no banheiro, querido.
- Um dia você vai esquecer e eu vou te pegar no flagra. Vou torcer pra isso acontecer.
- Não vai acontecer, mas tudo bem.
- E você? Já pegou algum dos caras batendo uma?
- Deus me livre e guarde – ele se benzeu. – Não curto essas coisas não, Caio!
- Queria pegar. Vou dar um jeito disso acontecer, ficarei mais atento.
- Para de ser safado, garoto – ele deu um peteleco na minha nuca. – Se fecha!
- Eu não... Sou safado mesmo, quer experimentar?
- Não... Obrigado...
- Tem certeza? – eu abri um sorrisinho maléfico.
Rodrigo suspirou.
- Absoluta.
- Não é o que parece... – falei mais para mim mesmo.
- Qual é, Caio? Está me estranhando?
- Não – olhei pra ele de rabo de olho. – Não estou te estranhando.
7- Acho bom! Que caderno cor-de-rosa é esse? Não pensei que você fosse sair do armário desse jeito, cara.
- Como você é idiota – eu suspirei. – Esse é o caderno da menina lá da minha sala. Ela me emprestou para eu pegar a matéria atrasada.
- Ah! Entendi. Então está explicado. Pensei que fosse seu.
- Claro que não, né? Não é porque eu sou homossexual que eu vou usar tudo rosa.
- É brincadeira, seu estressadinho – ele me prensou contra o corpo dele.
- Por que estamos abraçados?
- É? Por que estamos abraçados? – ele fez a mesma pergunta e me largou imediatamente.
- Quem me abraçou foi você!
- Mentira, você que me abraçou!
- Vai começar?
- Você que começou – ele mostrou a língua e riu em seguida.
Como era moleque, meu Deus. E como era lindo também...
- A academia está longe?
- Bem na sua frente – eu respondi.
- Ah!!! É essa aqui? Já ouvi falar. Meus parceiros da faculdade treinam aqui.
- Quem são seus parceiros da faculdade?
- Voce ainda não os conhece.
- Eles são bonitos? São jovens? Têm o corpo da hora?
- Caio! Que coisa feia!
- Só estou perguntando. Pode me responder?
- Não! – ele ficou enraivado. – Se fecha, meu...
- Calma – eu ri. – É só uma brincadeira!
- Assim espero.
- Ficou com ciúmes de mim?
- Ciúmes? Que ciúmes? Está louco?!
- Então por que você está com essa cara amarrada?
- Porque sim! Com quem eu falo pra fazer matrícula nessa porra?
- Ih... Estressou! Com quem estiver na recepção.
- Ah... E eu já posso começar hoje?
- Acho que não, Digão... Tem que ver aí.
- Beleza. Eu vejo. Vai entrar já?
- Vou sim. A gente se fala depois?
- Claro que sim, Caio. Não vai mais querer falar comigo, é isso?
- Bebeu? Até parece que eu vou ficar sem falar com você.
- Acho bom, eu ficaria muito triste se isso acontecesse.
- Ai que lindo... – senti vontade de agarrá-lo ali mesmo, mas me policiei.
- Bobo! Vai treinar, mais tarde a gente conversa em casa.
- Beleza. Se matricula aí, amanhã a gente treina junto.
- Com certeza.
- Então até mais tarde.
Eu coloquei meu indicador no sensor e a catraca foi liberada.
- Caio???
- Hã?
- Não vai se despedir de mim? Cadê meu abraço?
Abri um sorriso imenso. Ele estava me pedindo aquilo mesmo? Voltei até onde ele estava, passei meus braços pelo corpo dele, senti os braços dele me envolverem e ambos suspiramos ao mesmo tempo.
- Bom treino – Rodrigo falou baixinho.
- Obrigado. Bom descanso pra você.
- Valeu, Caio!
Nos desgrudamos. Ainda bem que não tinha quase ninguém na academia e não fomos vistos nesse momento de intimidade.
- Agora eu posso ir? – mantive o sorriso no rosto.
- Agora sim você pode – ele também sorriu e ficou me olhando fixamente.
- Então tá. Até mais!
- Até mais.
Fitei aqueles olhos mais um momento e depois eu passei pela catraca. O que será que estava acontecendo? Ou eu estava ficando louco, ou estava rolando um clima entre nós dois???
Será??? Será que o Digão estava interessado em mim? será que o meu melhor amigo estava “virando a casaca”? “Mudando de time”?
Isso não existe. Uma vez hetero, sempre hetero; uma vez bi, sempre bi e uma vez gay, sempre gay. Eu não sou do tipo de pessoa que acredita na cura gay ou em heterossexuais que se decepcionam e ficam com pessoas do mesmo sexo.
Se ele estava interessado em mim, é porque algo existia atrás daquela heterossexualidade toda que ele tinha.
Será que no fundo ele não era hetero? Será que aquilo não passava de uma máscara? Eu mesmo fiquei mascarado por tanto tempo!!!
Será? Será que era isso? Fiquei mais de 10 minutos sentado no banco do vestiário me fazendo esses questionamentos.
- Não é possível que isso seja verdade... – falei comigo mesmo. – Não é possível!
E se fosse? Qual seria o problema? O que teria de errado nisso? NADA!
Muito pelo contrário. Se o Digão fosse mesmo gay ou até mesmo bi, para mim seria muito vantajoso. Vantajoso no sentido de que se rolasse algo entre nós dois, eu ia sair ganhando nessa história.
O Rodrigo era um príncipe. Todo perfeitinho, todo preocupado com a outra pessoa... Ele era um verdadeiro cavalheiro, ele era daquele tipo de cara que a gente poderia contar a hora que fosse...
Será, Deus? Será que ele estava gostando de mim? Será que aquela cumplicidade que nos unia na verdade era algo a mais que uma grande amizade?
E eu? O que sentia por ele? Será que também estava interessado no meu melhor amigo? isso é, se ele estivesse interessado em mim, porque eu ainda não tinha certeza disso...
E se rolasse? Será que ia ser bom? Será que eu seria o primeiro dele? Será que ele ia gostar?
Fiquei zonzo com tantas perguntas sem respostas. Isso já era rotina na minha vida, mas essas perguntas me deixaram preocupado. Eu estava com medo de estar confundindo as coisas. Talvez o Rodrigo fosse apenas meu melhor amigo, apenas o meu irmão e nada mais que isso...
Ou não! Talvez as minhas dúvidas tivessem um fundinho de verdade, talvez as minhas dúvidas tivessem fundamento. O Rodrigo poderia estar interessado em mim sim e eu também poderia me interessar por ele.
Ele era bonito, um verdadeiro anjo na minha vida e tinha um ar de safado que me deixava louco de curiosidade para saber se ele era tudo aquilo mesmo.
Ele era doce, era terno, atencioso, preocupado com meu bem estar, sincero, amigo de verdade, uma pessoa espetacular!
Por que não? Por que tinha que ser paraonia da minha cabeça? Por que não poderia ser verdade?
Tive até dificuldade para me concentrar no treino. Pensei tanto no Digão que nem sequer notei quando o Felipe foi falar comigo:
- Está dormindo, Caio?
- Hã? Ah, desculpa. Tudo bom, “Felipón”?
- Bem e você?
- Aham.
- Posso cuidar do seu treino à partir de hoje?
- Claro! Claro que pode.
- Que horas você vai vir e que horas vai embora?
- Então, eu só vou poder fazer 40 minutos por dia, porque daqui a pouco eu vou trabalhar.
- Só isso? Pouco tempo, hein?
- É...
- Então sendo assim eu vou montar um treino mais puxado nesses 40 minutos, pra você manter tudo o que já conseguiu.
- Eu quero ganhar mais massa, ainda não estou satisfeito.
- Ah, é? Então eu vou intensificar alguns exercícios. Você está tomando suplemento?
- Bomba? Quero não, obrigado.
- Não é bomba, é suplemento. É diferente.
- O que seria isso?
- Um suplemento alimentar. Como se fosse um achocolatado que você coloca no leite, entendeu?
- Hã e quanto é isso?
- Depende do qual você vai querer. Nós comercializamos aqui, quer dar uma olhada?
- Quero sim.
- Então vem comigo.
Pulei da máquina e segui o Felipe. Ele estava ainda mais gostoso desde a última vez que o vira, anos antes.
- Pensei que nunca mais ia te ver. Sem mais nem menos você sumiu lá da outra academia...
- Meu contrato com a empresa tinha acabado, eu não consegui continuar lá.
- Hum... Faz tempo isso, não faz não?
- 1 ano e meio já.
- Bastante tempo. Então, são esses aqui. Se você comprar e começar a tomar, vai ter resultados muito melhores.
- Isso não é anabolizante não, né?
- Claro que não, Caio! Se quiser pode perguntar para um médico.
- Olha lá, hein? Isso ajuda mesmo?
- Pra caramba.
- Qual você recomenda?
- Todos são bons, mas esse aqui – ele pegou um potinho meio grande – é o melhor de todos.
- E quanto custa?
Quando o Felipe falou o preço eu quase caí de costas.
- Isso é um assalto? – perguntei. – Que caro!
- É meio caro mesmo, mas vai dar um excelente resultado.
- Não sei não, hein? Eu vou ter que ver com meu amigo que é médico se isso é bom ou não para a saúde.
- Pode ver com ele. Te garanto que não é bomba. Nós não trabalhamos com isso.
- Quero só ver. Anota o nome pra mim, por favor?
- Anoto!
Quando eu voltei pro salão, percebi que o Rodrigo ainda estava na recepção. Ele não me viu, mas eu fiquei parado por uns segundos e o analisei. Como meu melhor amigo era lindinho...
- O que você vai fazer agora?
- Hã? – olhei pro Felipe.
- Qual o seu treino hoje? O que vai fazer agora?
- Ah, entendi... – ri. – É perna. Hoje é perna. Vou pra panturrilha agora.
- Então eu vou te acompanhar.
- Está sem aluno?
- Pois é, “man”. Por isso vou colar em você, tem problema?
- Claro que não, Felipe.
Bem que ele poderia colar no sentido literal da palavra...
Deitei no aparelho e comecei a trabalhar minhas panturrilhas. O Felipe ficou ao meu lado e o meu rosto ficou bem perto do pau dele. Que delícia!
- Certinho. É isso mesmo.
- O Well me orientou muito direitinho.
- Ele é um excelente profissional.
- Bem que ele poderia trabalhar de manhã.
- Qual é? Não ficou satisfeito comigo? – ele sorriu.
- Não é isso, palhaço. Os dois poderiam me auxiliar.
- Você não quer mais nada, né?
- Não! – sorri.
Na verdade eu até queria, mas não podia falar. Eu queria os dois na cama comigo. Seria um sonho!
- Vou falar pra ele que eu te roubei – falou o professor.
- Pode falar. Mande um abraço pra ele.
- Pode deixar.
- Agora eu vou pras coxas.
- Então vamos.
E foi assim até o final do meu treino. Quando o relógio macou 12:30, eu me despedi do Felipe e fui ao vestiário pra tomar banho. Eu não podia me atrasar pro trabalho.
Assim que peguei meu celular, vi mais uma mensagem do número desconhecido. Dessa vez eu fiquei com raiva de verdade.
- Quem será essa pessoa? – bufei e abri a mensagem:
.
“Queria tanto ouvir a sua voz...”
.
Ouvir a minha voz? Para quê? Que brincadeira idiota era aquela? Eu bufei e respondi ao SMS da seguinte forma:
.
“Olá. Não sei quem você é, portanto gostaria que se identificasse. Se isso for uma brincadeira, eu não estou gostando. Até mais!”.
.
Quem quer que fosse teria que se identificar se quisesse continuar trocando ideia comigo. Eu não tinha tempo – nem paciência – para ficar falando com um desconhecido. Ou desconhecida.
O cheiro de suor no vestiário estava intenso, ainda mais na parte dos chuveiros. Eu até fiquei arrepiado só de pensar em sentir aqueles homens perto de mim...
Abri um dos boxes, entrei e liguei logo o chuveiro. Deixei a água lavar todo o meu suor e em seguida comecei a me ensaboar. Lavei os cabelos duas vezes, esfreguei todo o meu corpo e por fim saí. Não encontrei quase ninguém pelado naquele dia.
Uma vez na rua, senti o sono me envolver e fiquei com vontade de tirar uma soneca. Pena que aquilo não era possível.
No meio do barulho do trânsito da cidade, do falatório das pessoas ao meu redor, do vai-e-vem da multidão por todos os lados, algo me chamou a atenção. Era o barulho de um avião.
Eu olhei pro céu e vi a aeronave voando, imponente e magestosa. Não sei por qual motivo, razão ou circunstância, só sei que nesse momento a imagem do Bruno veio na minha cabeça.
- Pé de pato, bangalô, três vezes – falei. – Tô fora!!!
.
O bom de fazer academia antes do trabalho era que eu já saía de lá uniformizado para o trabalho. Não tinha que perder tempo me trocando e isso fazia com que eu chegasse mais cedo na loja.
- Boa tarde, Caio – Jonas estava perto da entrada, conversando com dois vendedores.
- Boa tarde, Jonas. Boa tarde, rapazes.
- Boa tarde – disseram os outros vendedores.
- Preparado para o novo setor?
- Lógico!
- Ah! Como foi seu primeiro dia de aula? – meu gerente sorriu.
- Esquisito. Me senti um peixinho fora d’água e não gostei porque logo de cara tive aula de matemática.
- Sério? – ele riu. – Aí é complicado, hein? Mas você logo acostuma!
- Assim espero. Vou bater o ponto, até mais.
- Até!
Ver a Alexia na minha mesa me deixou entristecido, mas ao mesmo tempo feliz. Eu sabia que no fundo eu estava fazendo o bem para a minha amiga e era exatamente isso que me confortava.
Como ela estava atendendo, não pude cumprimentá-la de imediato. Bati o ponto e fui atrás da Janaína, mas ela também estava atendendo.
De longe eu vi o Gabriel. Ele estava muito, mas muito abatido. Os olhos estavam inchados e com olheiras profundas. Provavelmente ele já tinha descoberto a gravidez da Camila.
- E aí, Gabo? – falei com ele. – Tudo bom, mano?
- E aí, Caio? – a voz dele estava muito grave. Até me arrepiou. – Mais ou menos, cara e você?
- Estou bem.
- Fiquei sabendo da faculdade, parabéns.
- Obrigado. O que você tem? Está tudo bem?
Ele suspirou e colocou as duas mãos no rosto.
- Não, Caio. Nada bem.
- É sobre o que aconteceu ontem à noite?
- Já está sabendo, né?
- A loja toda, na boa...
- Fera, nem sei o que eu vou fazer, na moral!
- Eu imagino. Não queria estar na sua pele.
- Ontem eu nem dormi. Não preguei os olhos um segundo sequer.
- Dá pra notar.
- Estou frito, Caio. Frito, frito, frito.
- Calma, Gabo. Tudo vai se resolver.
- As meninas estão me pressionando muito, cara. Eu estou quase surtando.
- Cadê elas?
- Ainda não chegaram.
- Ah, é. Elas entram agora também.
- Você mudou com a Alexia, né?
- Mudei.
- Puxa, mais uma que vai ficar no meu pé agora...
- Ela já sabe? – perguntei.
- Já e já veio falar comigo a respeito. Me deu os parabéns e me chamou de safado. Disse que era isso que eu merecia por ter largado ela.
- Ah, tenta entender. Ela está com raiva.
- Eu sei, mas a última coisa que eu preciso nesse momento é de alguém me recriminando, né?
- Sei disso, Gabo – suspirei. – Eu te entendo. Posso só falar uma coisa?
- Vai me repreender também?
- Um pouquinho. Só vou dizer que você foi burro em não ter usado camisinha.
- Eu só não usei com a Paty, com a outra eu usei, mas estourou.
- Putz, fala sério?
- É estourou. Isso nunca tinha acontecido antes.
- Então foi castigo de Deus – soltei de uma vez.
- Poxa, Caio! Até você?
- Me perdoa, me perdoa, mas é verdade. Enfim, não vou te repreender até mesmo porque eu acho que não tenho o direito de fazer isso. Se precisar de qualquer coisa, fale comigo.
- Pode deixar. Obrigado, mano.
- Às ordens.
Eu andei pro meu novo departamento e suspirei quando cheguei lá. Aquele não era o meu lugar, eu sabia que tinha que me acostumar, mas isso ia ser complicado.
- Olá pessoal – falei.
- Oi, Caio – disse uma mulher que eu não lembrava o nome.
- Veio pra cá no lugar da Alexia? – perguntou outra.
- Isso mesmo.
- Ah, legal.
- Sair da linha branca é complicado, hein? – um cara riu.
- Pois é, mas eu vou me acostumar.
Menos de 15 minutos depois uma gritaria começou na loja. Era a Patrícia e a Camila que estavam brigando. O Gabriel estava junto, mas com a cabeça baixa.
- JÁ CHEGA – gritou Jonas.
Elas pararam, mas ficaram se olhando com a cara feia. Eu não queria ser o Jonas naquele momento...
Para complicar a situação, o Tácio apareceu na loja. Nós não sabíamos que ele ia naquele dia, provavelmente foi uma visita surpresa.
Ele interferiu no assunto e rapidamente, as duas saíram da filial.
- O que será que aconteceu? – perguntou uma das vendedoras de estofados.
- Será que elas foram mandadas embora? – perguntou a outra.
- Acho que só foram suspensas – comentei.
E eu acabei acertando. Pouco tempo depois a fofoca rolou solta na loja. Camila e Patrícia foram suspensas por 3 dias cada uma.
Para resolver o assunto de uma vez por todas, os três foram transferidos de loja, o que me deixou meio entristecido porque não ia mais ter tanto contato com o Gabriel.
- Eu vou para uma loja de rua – ele me falou depois do meu almoço.
- Qual loja?
- Uma de Copacabana.
- E as meninas?
- Uma vai pro Shopping Botafogo e a outra vai lá pro Catete.
Ah, que saudade do Catete!
- Hum... Separaram todos.
- O Jonas que decidiu isso e o regional aceitou. Ainda bem que não aconteceu nada comigo.
- É verdade. Bom, te desejo boa sorte então. Se precisar de mim, me liga.
- Nem sei como te agradecer por essa ajuda.
- Sempre às ordens.
- Obrigado, parceiro!
Coitado do Gabriel. Ele estava todo desnorteado e sem saber o que fazer, mas também não era pra menos. Eu na pele dele, também ficaria daquela forma.
- Quer dizer que só porque você é um universitário resolveu não falar mais com os pobres? – Janaína se aproximou e me abraçou. – É isso mesmo, assistente de palco?
- Oi, amiga. Muito pelo contrário: eu ia falar com a senhora, mas a senhora não parou quieta um segundo hoje.
- Desculpa, meu bem! Eu sou assim.
- Metida!
- E a facul?
- Ah, da hora, mas ao mesmo tempo muito esquisito. Me senti um peixinho fora d’água e ainda por cima já tive aula de matemática hoje. Deu vontade de sair correndo e só parar de correr quando chegasse em Miami.
- Puta que pariu, que exagero – ela riu. – Mas gostou?
- Ah... É diferente. Até eu me adaptar vai demorar uns dias.
- Isso é verdade. Melhor a gente circular que o manda chuva está aí hoje.
- Verdade. Depois a gente se fala.
Não consegui trocar ideia com a Alexia, só mandei um beijo pra ela e ela acenou pra mim discretamente. Será que ela estava se dando bem na linha branca?
- Olá, boa tarde – me aproximei de uma cliente que estava afundando o dedo em um sofá. – Posso ajudá-la?
- Esse sofá é bom?
Que pergunta difícil! Eu não sabia dizer qual era melhor ou pior.
- Sim senhora – respondi sem saber se isso era verídico ou não. – A senhora está em dúvida?
- É estou sim, pode me auxiliar?
- Claro! Qual modelo a senhora gostou?
Ela me mostrou quais os modelos gostou mais e eu tentei explicar a diferença entre eles.
- Ah... Então eu vou levar esse daqui que é mais caro.
- Como desejar – eu abri um sorriso. – A senhora já é cliente?
- Sou sim.
- Pode me acompanhar, por favor?
E assim eu fechei a minha primeira venda no setor novo. Foi complicado, mas eu me virei bem e sem a ajuda de ninguém.
Só para completar, a cliente decidiu levar dois anos de garantia complementar e isso me deixou super contente, afinal era um dinheirinho a mais que ia entrar na minha comissão.
- Por favor, dirija-se ao crediário com esse papel. Lá eles farão o seu carnê. A data de entrega será depois de amanhã em horário comercial.
- Mais já? Que maravilha! Obrigada, Caio.
- Por nada, Dona Carmen. Boa tarde e volte sempre!
- Obrigada.
.
Ver os meus amigos irem embora me deixou meio desesperado. Como eu não tinha muita intimidade com as pessoas do meu setor novo, eu ia ficar sozinho e foi isso mesmo que aconteceu.
Se bem que eu não tive oportunidade de falar com ninguém durante todo o dia porque o chato do regional estava circulando pela loja. Ainda bem que ele só foi falar comigo no final do dia:
- Você não era da linha branca?
- Sim, mas agora eu sou daqui.
- E mudou por quê?
- Porque eu precisei mudar de horário e troquei com uma colega minha.
- Ah, entendi. E está gostando do setor novo?
- Hoje é meu primeiro dia, ainda estou me adaptando.
Porém, eu já tinha a resposta e ela era NÃO.
- Boa sorte então.
- Obrigado – abri um sorriso amarelo.
Nâo estava gostando e era só pelo fato de não ter me identificado com o local e com os produtos. Ou talvez fosse apenas uma questão de tempo, eu ainda não sabia explicar o que estava sentindo, mas de cara, foi isso que aconteceu.
- Graças a Deus, menos um dia – disse uma das vendedoras.
- Amém – falei.
Desliguei meu computador, arrumei a minha mesa, guardei minha agenda na gaveta, passei a chave e me dirigi ao vestiário.
- E aí, como foi seu primeiro dia? – Jonas estava lavando o rosto.
- Sinceramente? Diferente. Pareceu até meu primeiro dia na loja.
- Sabia que ia ficar com essa sensação.
- Mas com o tempo eu me acostumo – abri meu armário e peguei minha roupa esporte.
- Aceita uma carona? – meu gerente ofertou.
- Já conversamos sobre isso, não? Disse que não quero incomodar.
- Já mesmo e eu disse que ia te levar. Então se troca aí pra gente ir.
- Como você é teimoso!
- Está desrespeitando a minha ordem? – ele sorriu. – Posso te sancionar, hein?
- Opa, não está mais aqui quem falou – tirei minha camisa. – Vamos então, só espera eu me trocar.
Me troquei na frente de todos mesmo, nem me preocupava mais em me trancar em um dos banheiros para mudar de roupa. Com o passar do tempo, a minha timidez foi embora e eu fiquei sem vergonha, no bom sentido da palavra.
- Pronto? – Jonas saiu do mictório e lavou as mãos.
- Pronto, vamos embora?
- Bora – ele deu dois tapinhas no meu ombro e saiu na frente.
Dei boa noite aos caras que continuaram no vestiário. Não entendi por qual motivo o Jonas tinha saído sendo que era ele que fechava a loja e sempre era o último a sair de lá – era isso que eu sabia, foi a Alexia que me contou.
- Por que está saindo primeiro hoje? – perguntei.
- É o Tácio que vai fechar a filial. Quando ele vem, é ele que fecha.
- Ah! Que bom pra você, né?
- Bom demais, não aguentava mais ficar lá dentro. Hoje o dia foi complicado, principalmente com relação as meninas.
- Imagino. Nâo queria estar na sua pele naquela hora.
- Vai se preparando aí, um dia eu tenho certeza que você vai ficar no meu lugar.
- Nem quero, obrigado.
- Hoje eu não estou de Fusca – ele riu. – Estava sem paciência pra ele hoje cedo.
- Só você mesmo pra ter 2 carros.
- 1 e meio, né? Meu Fusquinha é só meu hobby mesmo, aquilo não pode ser considerado um carro.
- Tem certeza que não vou atrapalhar?
- Já te disse que quando eu for sair com uma gatinha, eu te aviso. Relaxa que hoje eu só quero saber da minha cama.
- Ah, então tá bom...
Meu chefinho destravou as portas e nós entramos ao mesmo temó. Eu fiquei grato por sentar um pouco, estava tão cansado naquele dia... Coloquei o cinto de segurança e dei uma ajeitada no meu cabelo pelo espelho do retrovisor. Estava na hora de dar uma aparada na juba.
- Só arrumando o cabelo, né?
- Ele tá meio grande, acho que vou cortar nesse final de semana.
- Ah, saquei. Preciso aparar o meu também.
Jonas ligou o motor e deu a ré no automóvel.
- Já tem carta, Caio?
- Ainda não, Jonas. Nem tenho carro então ainda não sinto necessidade de tirar carta.
- Ah, entendi. Posso ligar o rádio?
- Claro que pode, o carro é seu!
- Mas se ficar incomodado, eu posso desligar, beleza?
- Nada! Adoro música.
- Eu também. Que tipo de músicas você curte?
- Eu só não gosto, aliás, eu só odeio funk e não gosto de rap também. De resto, ouço tudo numa boa.
- Entendi.
Jonas apertou os botões do rádio até achar uma emissora que lhe agradasse. Percebi que era a mesma sintonia que ficava ligada na loja.
- Essa é a mesma que fica na loja – falei.
- É. Quer que troque?
- Não, não. Pode deixar aí. Eu gosto.
- Eu também gosto.
Foi naquela rádio que eu ouvi aquela música que me lembrou o Bruno. Até então eu não sabia quem cantava e nem o nome da canção.
- Hoje eu estou com uma dor nas costas...
- Eu estou cansado também e com sono – até bocejei.
- É por causa da faculdade. Você não está acostumado ainda.
- Verdade. E quando chegar em casa vou ter que fazer um monte de lição.
- Já? Nossa!
- É que eu perdi umas 3 semanas de aulas, né? Preciso deixar tudo em dia.
- Ah, é verdade. Você entrou em meados de fevereiro.
- Pois é, mas está valendo.
Fiquei distraído, olhando pela janela do carro do meu patrão quando a música começou a tocar. Assim que ouvi a primeira palavra, percebi que era a mesma dupla que cantava a outra música que eu não sabia o nome:
.
“Você não sabe o que é amor, nem tampouco paixão
Se soubesse de verdade, não maltratava meu coração
Parece um beija-flor que vai de boca em boca por aí...
Que suga todo o meu amor e quando enjoa põe um fim!
.
Agora não estou mais disposto a te dar meu mel
Procure logo um novo alguém pra te levar pro céu
Você seguiu outros caminhos eu fiquei chorando aqui...
Com sua vida de aventuras você vai seguir!
.
Voa beija-flor
Vai dar seu calor pra quem não te conhece
Sai da minha vida
Busque um novo amor
Você não me merece
.
Voa beija-flor
Você não vai mais sugar do meu amor
Vai sentir o amargo de outras bocas
Lembrando o meu sabor...”
.
Os cantores iam cantando e eu ia assimilando a letra daquela canção. Fiquei simplesmente alucinado. Como poderia existir uma letra tão perfeita como aquela?
- E esses foram Jorge e Mateus com “Voa Beija-Flor” – disse o locutor da rádio.
- Jorge e Mateus? – falei baixinho.
- Não conhece? – Jonas parou no farol vermelho.
- Não! Quem são?
- Uma dupla sertaneja lá de Itumbiara.
- Onde fica isso?
- Goiás eu acho. Todas as duplas sertanejas são de lá.
Isso era uma verdade e também um preconceito.
- Muito boa essa letra. Muito boa mesmo.
- É a primeira vez que ouço.
- Eu também...
Se a outra se encaixava em mim, essa então nem se falava. Era a minha cara e a cara do idiota do Bruno. Essa música também poderia ser do Carlos Henrique, mas era mais pro Bruno do que pra ele.
E então eu fiquei pensando nele. Será que algum dia eu ia ter a oportunidade de jogar tudo na cara dele? De me vingar do Bruno?
Nesse momento o meu celular vibrou. Era mais uma mensagem do número desconhecido:
.
“Boa noite, gato! Eu não posso me identificar ainda, mas você me conhece.”.
E daí? Grande coisa! Eu queria saber quem era, só isso.
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“Isso me deixou mais curioso ainda. Fala logo quem é, por favor.”.
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No começo eu me irritei, mas confesso que depois dessa mensagem, fiquei muito curioso. Se eu conhecia a pessoa, significava que era alguém que estava ao meu redor, mas quem?
.
“Não vou te falar ainda. É surpresa! Você está bem?”.
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Surpresa? Quanto mistério... É, eu deixei toda a raiva de lado e a curiosidade falou mais alto. Talvez não fosse uma brincadeira, talvez alguém estava mesmo a fim de mim e queria fazer uma surpresa...
.
“Eu estou bem sim, mas ficaria muito melhor se você falar quem é!”.
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Quem seria? Isso estava rondando a minha cabeça. Será que era alguém muito próximo a mim? Será que era algum cara da república?
.
“Tenha paciência, na hora certa você vai saber quem é!”
.
- Só nas mensagens, hein? – Jonas me olhou rapidamente.
.
- Só nas mensagens, hein? – Jonas me olhou rapidamente.
- Pois é.
Eu resolvi não responder mais, não queria parecer “fácil”. Se a pessoa estava mesmo interessada em mim, iria ter que me conquistar e me provar isso.
Olhei pro lado do Jonas e algo me chamou a atenção. Havia algo diferente no colo dele e os meus olhos foram puxados pra lá automaticamente. Quando eu vi o zíper da calça social aberto e vi que ele estava sem cueca, meu coração disparou.
Será que ele também não usava cueca? Ele era louco? Ficar sem cueca com calça social era o mesmo que falar: “Ei, olhem pra mim, eu estou sem cueca!”...
Fiquei olhando um tempinho. Não estava conseguindo ver nada direito, só um monte de pelos por todos os lados. Engoli em seco, desviei os olhos e disse:
- Jonas?
- Hum?
- Hã... Assim... O zíper da sua calça está aberto.
- Hã?
Ele olhou pra baixo imediatamente.
- Opa...
O louco largou o volante, puxou a calça pra baixo e fechou o zíper. Eu fiquei com as bochechas muito vermelhas e percebi isso pelo espelho do retrovisor.
- Opa... Valeu pelo toque e desculpa aí.
- Não tem problema.
Nós quase não falamos mais nada até eu chegar em casa. Jonas estacionou em frente ao bazar, eu tirei o cinto e disse:
- Muito obrigado pela carona, Jonas!
- Imagina, Caio. Sempre à disposição. Amanhã eu trago de novo e prometo que não vou deixar meu zíper aberto, beleza?
Ele sorriu e eu também.
- Sem grilo.
- Desculpa mesmo.
- Sem crise, relaxa. Pelo menos ninguém mais viu.
- Espero que não.
- Boa noite então.
- Boa noite. Bom descanso.
- Pra você também.
Desci, bati a porta e fui logo abrindo a portinha da minha casa. Jonas buzinou e acelerou o automóvel, eu ainda estava incrédulo por ele não usar cueca com calça social. Era um louco mesmo.
Subi as escadas pensando na minha cama. Senti meu celular vibrar de novo, mas nem peguei para ver de quem era o SMS.
Éverton estava deitado no sofá com a mão enfiada dentro da cueca. Parece que era uma coisa me cutucando, se já não bastasse ver o Jonas sem cueca, agora estava sendo obrigado a presenciar o nanico segurnaod o pau.
- E aí? – ele me olhou.
- Tudo em ordem?
- Aham.
Não falamos mais nada. Eu fui direto pro meu quarto. Rodrigo estava sozinho.
- Caio!
- Digão!
- Como foi seu dia? – ele me olhou.
- Cansativo pra cacete e o seu?
- Normal. Me matriculei, viu?
- Ah, é? Que bom! Começa amanhã?
- Isso. Começo amanhã.
- Ah, que bom. Vai ser ótimo ter você por perto ali na academia.
- Não consegue viver sem mim, né?
- Não consigo – falei. – Onde estão os meninos?
- Vinícius foi dormir na namorada e o Fabrício saiu. Foi dormir na casa de um amigo dele porque iam fazer um trabalho pra faculdade.
- De madrugada? Aham, e eu sou o Bozo!
- Pois é.
- Isso significa que nós estamos sozinhos? – sorri.
- Sim, estamos sozinhos. Por quê?
- Por nada, besta. Tem alguma coisa pra comer aí?
- Tem comida. O Miguel fez comida. Hoje é seu dia de lavar a louça, viu? A pia está cheia!
- Sério, Digão? Logo hoje que eu tenho um monte de lição pra fazer?
- Pois é! Se quiser eu te ajudo, mano.
- Você faria isso por mim?
- Você ainda pergunta? – Rodrigo continuou me olhando.
- Você é demais! Eu te amo, porra.
- Eu também, idiota – ele jogou um travesseiro em cima de mim.
- Me ama? – fiquei muito feliz.
- Como irmão, entenda isso.
- Já é um começo! Vou tomar banho, depois eu janto e depois eu vou colocar as matérias em ordem.
- Será que tem muita coisa?
- Pelo que folheei aí tem sim.
- Boa sorte. Isso eu não posso fazer por você.
- Você lavando a louça já me ajudará muito.
- Isso eu faço com prazer.
Enquanto ele falava comigo, ele mexia no celular. No mesmo momento que o meu amigo colocou o aparelho embaixo da travesseira o meu aparelho vibrou e tocou.
.
“Não vai me responder?”.
.
Essa foi a primeira mensagem.
.
“Hoje eu vou dormir pensando em você, sabia?”
.
E essa era a segunda mensagem. Fiquei cada vez mais curioso. Quem seria aquele “admirador secreto”?
- Quem será você, meu Deus?
- Hã? – Rodrigo me deu um soco no braço.
- Tem alguém me mandando mensagens anônimas, dizendo que é meu “admirador secreto”. Eu queria saber quem é.
- Que coisa mais antiga, né?
- Verdade. No começo eu fiquei com raiva, mas agora a curiosidade está falando mais alto.
- São muitas mensagens? – ele prensou um lábio no outro.
.
- Algumas. Você sabe quem é?
- Não! Claro que não.
- Tem certeza que você não sabe quem é? Se souber me avisa, pelo amor de Deus...
- Não sei – ele me olhou. – De verdade. Não faço ideia de quem seja.
- Sério mesmo?
- Sério, pô! Não desconfia de ninguém?
- Ainda não.
- Será que é alguém daqui? O Kléber?
- Você acha? Eu não tenho o celular dele.
- Então investiga. Ou sei lá, pode ser algum amigo... Aquele amigo do Bruno, como se chama mesmo?
- O Vítor? Não. O número dele não é esse.
- E daí? Isso não quer dizer nada.
- Hã?!
- Ele pode estar mandando as mensagens de outro número pra te despistar.
- Será? – fiquei encucado. – Será que é ele?
- Vai saber! – Digow deu de ombros.
- Agora você me deixou encafifado. Será que é o Vítor?
- Sei não. Pode ser. Deixa isso pra lá!
Fiquei pensativo. Será que era ele mesmo? E se fosse? Era bem capaz, porque na balada ele disse que queria ficar comigo...
Sendo ou não sendo o Vítor, deixei esse assunto amortecido naquele momento. Eu tinha outras prioridades pra pensar naquele instante.
- Eu vou pro banho que ganho mais. Esquenta a minha comida? – fiz bico.
Rodrigo sorriu e suspirou.
- Esquento, mas só porque gosto de você senão não esquentaria.
- Você é demais! Eu te amo – falei.
Rodrigo suspirou e saiu andando. Não entendi o motivo daquele suspiro, mas tudo bem.
-Não pode ser o Vítor, não pode – falei comigo mesmo.
Entrei no banheiro, tirei a roupa e fui direto pro chuveiro. Estava tão cansado que nem consegui ficar muito tempo debaixo da água morna. Desliguei a ducha assim que terminei de enxaguar o meu corpo.
- Droga! Deixei a toalha lá fora.
Empurrei a porta do box e saí. Fui pegar a minha toalha no gancho que estava próximo da porta, mas antes mesmo de fazê-lo, fui surpreendido pelo Kléber, que abriu a porta do banheiro abruptamente:
- Ui – ele deu um gritinho e arregalou os olhos quando me viu pelado.
- KLÉBER! – eu reclamei e cobri minhas partes íntimas com as mãos. – PODERIA TER BATIDO NA PORTA...
- De-desculpa, Caio... Eu pensei que era meu irmão que estava aqui...
- MENTIRA SUA! – fiquei muito bravo. – SEU IDIOTA, SAI DAQUI QUE EU QUERO ME VESTIR!
- De-desculpa... De-desculpa de ve-verdade... – ele não parou de olhar pro meu corpo um segundo sequer.
- Sai daqui – eu falei com raiva.
- Já vou, já vou...
Ele virou, mas antes de sair deu mais uma olhada no meu corpo.
- SAI DAQUI, KLÉBER!
Quando o moleque saiu, eu puxei a porta articulada com tanta ferocidade que o puxador até quebrou na minha mão. Ele não deveria ter feito isso, não mesmo!
- Idiota...
- Tudo bem aí, Caio? – perguntou Éverton.
- Tudo. Não entra aqui!
- Calma, não vou entrar – ele riu. – Que gritaria foi essa?
- O Kléber que entrou aqui e me viu pelado.
Percebi que o Éverton ficou dando risada. Eu não achei a menor graça.
Me vesti, peguei a minha roupa suja e fui pra lavanderia. Joguei a roupa na máquina, a cueca e as meias no balde, pendurei a minha toalha no varal e fui pra cozinha.
- Sua comida está no forno – disse Rodrigo. – Aconteceu alguma coisa no banheiro?
- Obrigado, Digão. O Kléber que abriu a porta e me viu pelado.
- Sério?
- Aham!
- Por isso eu não tomo banho com a porta aberta.
- Agora você vai tomar porque eu fiquei com raiva e o puxador da porta quebrou.
- Não acredito? – ele me olhou.
- Pois é, mas acho que dá pra prender lá.
- Caramba, Caio. Não precisava de tanto.
- Fiquei com raiva.
- Mas não precisava quebrar a porta.
- Foi mal.
Comi rapidamente e depois fui pro quarto. Havia muita louça mesmo, porque eu saí pro quarto e o Rodrigo continuou lavando os pratos. Tadinho.
- Hoje não é seu dia de lavar a louça? – perguntou Éverton.
- Sim.
- Já viu a pia como está?
- O Rodrigo lavou pra mim.
- É um idiota mesmo.
- Ei, não fala ssim dele, hein? Ele me ajudou porque eu tenho um monte de coisa da faculdade pra fazer.
- Só o Rodrigo pra acreditar nisso. Primeiro dia de aula foi hoje, você nem tem nada pra fazer.
- Quer ver o caderno da menina como está cheio de coisas? Eu estou atrasado nas matérias, idiota.
- Se você diz – ele deu de ombros e fitou a televisão.
- Garoto imbecil – falei baixinho. Quem ele pensava que era pra xingar o Digow?
Se já estava com raiva pelo Kléber ter entrado no banheiro sem perguntar quem estava lá dentro, fiquei com mais raiva ainda depois que o Éverton chamou o meu melhor amigo de idiota. Idiota era ele, isso sim.
Peguei o caderno da Marcela e resolvi começar copiando as matérias de acordo com a divisão que ela fez no caderno dela. Havia mesmo muita coisa atrasada.
Rodrigo entrou no quarto cerca de 15 minutos depois da minha chegada no nosso dormitório. Ele passou a chave na porta e começou a tirar a roupa. Eu parei tudo o que estava fazendo para olhar pro corpo dele.
- Você está me deixando sem graça – ele falou e ficou com a bochecha vermelha.
- É mais forte que eu, desculpa.
- Que carinha é essa? Ainda bravo com o Kléber?
- Sim, mas também fiquei com raiva do Éverton. Ele disse que você é idiota.
- Disse? Por quê?
- Porque eu falei que você ia lavar a louça pra mim.
- Ah, só por isso? Olha a minha cara de preocupado! Deixa esse pintor de rodapé pra lá, Cacs.
- É melhor. Quer tirar a cueca também não? – sorri.
Ele abriu a boca pra responder, mas não falou nada e ficou ainda mais vermelho.
- Palhaço... – Rodrigo falou depois de um minuto.
- Estou brincando – olhei nos olhos dele.
- Sei! Já começou a copiar?
- Já copiei 3 páginas.
- Caraca! Você é rápido.
- Sou sim. Não quero ficar muito tempo com o caderno dela.
- Ah, entendi.
Meu melhor amigo subiu na beliche dele e pelo que eu ouvi, pegou o celular debaixo do travesseiro.
Ouvi o barulho dos dedos dele no teclado do aparelho e no mesmo momento que ele parou de digitar, uma nova mensagem chegou no meu celular:
.
“Que vontade de te ver, Caio...”.
.
NÃO ERA POSSÍVEL! Primeiro, o Digão guardou o celular embaixo do travesseiro e a mensagem chegou e depois, ele parou de digitar e a mensagem chegou...
Nos últimos dias, ele estava me olhando de uma forma muito esquisita e estava tendo algumas atitudes estranhas.
Nós passamos muito tempo abraçados depois da faculdade e ele disse que eu estava cheiroso... Aquilo não era normal...
Nem consegui terminar a cópia das informações que estavam no caderno da Marcela, a única coisa que eu conseguia fazer era pensar no Rodrigo.
Será, meu Deus? Será que eu estava ficando louco e imaginando coisas? Ou será que o que eu estava pensando era real? Será que o meu “admirador secreto” estava mais próximo do que eu imaginava? Será que o meu “admirador secreto” na verdade não era secreto? Será que ele era o... Rodrigo???

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