Não sabia se falava alguma coisa, se fazia alguma coisa, se respondia, ou se simplesmente ia embora. Fiquei parado, olhando naqueles olhos castanhos tão irreconhecíveis por causa das olheiras, abri a minha boca no intuito de responder alguma coisa, qualquer coisa que fosse, mas nada saiu dos meus lábios.
- Eu... – falei baixinho.
Aquele “eu te amo” ecoou na minha cabeça. A minha vontade era de abraçar o Rodrigo com toda a minha força e de cuidar dele pro resto da minha vida!
- Eu já disse que o horário de visitas acabou – a enfermeira foi novamente ao meu encontro. – Por favor, se retire senão eu serei obrigada a tomar outras atitudes. Aqui não é um quarto comum, aqui é uma UTI e você não pode exceder o horário. São as regras do hospital.
- Sim, eu já vou – falei, ainda olhando pra ele. – Depois... a gente se fala, Digow...
Ele permaneceu intacto. Suas bochechas já não estavam mais tão amareladas, elas estavam avermelhadas. Será que ele estava com vergonha?
Eu saí daquela UTI muito melhor do que eu entrei. Ele estava bem apesar de tudo. Obviamente não estava 100%, mas já estava muito melhor. E eu sabia que com o passar dos dias, ele iria se recuperar totalmente.
Todavia, o que me deixou mais feliz, alem de vê-lo um pouco reestabelecido, com certeza foi o fato dele ter dito o que disse pra mim pouco antes da minha saída.
Era muito bom saber que ele sentia o mesmo que eu sentia por ele. Sim, porque eu o amava. De todo o meu coração, eu o amava.
Ele era meu irmão, meu irmãozinho mais velho, meu melhor amigo, meu cúmplice e simplesmente a pessoa mais importante da minha vida naquele momento. Como não amá-lo? Como não amar uma pessoa tão linda como o Rodrigo? Impossível! Eu ganhei o dia depois que ouvi aquele “eu te amo” da boca dele!
- E aí? – Dona Inês foi ao meu encontro. – O que você achou dele?
- Está bem melhor que ontem. Só achei que ele está um pouco amarelo e com a barriga muito inchada.
- Também achei isso.
- Ah, antes que eu me esqueça – olhei para meus pés e tirei o celular do Rodrigo do bolso da minha calça. – O celular dele.
- Ah, obrigada!
- Onde os senhores estão hospedados?
- Em um hotel lá em Ipanema – disse o pai do Rodrigo.
- Ah, entendi. Vão ficar quantos dias?
- Eu só volto quando ele se recuperar totalmente – disse a mãe do meu amigo. – Nem que pra isso eu venha morar nessa cidade.
- Imagino que senha sido um baque receber essa notícia, não?
- Foi sim. Quando você ligou e me contou, eu senti que o mundo estava desabando nas minhas costas.
- Faço ideia, mas graças a Deus agora está tudo bem. E vai ficar cada vez mais.
- Não tenho palavras para agradecer tudo o que você tem feito por ele – ela falou de novo.
- Não precisa me agradecer, eu faço de coração!
Quando os meus amigos chegaram da faculdade, a primeira coisa que fiz foi falar com eles para dar notícias do Rodrigo e também para contar a ideia que tive:
- Mas você acha que a mãe dele vai aceitar morar aqui com a gente? – perguntou Vinícius.
- Acho que ela aceita sim. Tudo o que ela quer é ficar perto do filho.
- Mas e ela vai caber? Tem cama pra ela? – perguntou Maicon.
- Algum de nós pode passar uns dias no sofá – dei de ombros. – Eu mesmo posso fazer isso.
- Não vejo problema algum – disse Éverton. – Se for bom pra ele, eu aceito.
- Eu também – concordou Fabrício.
- Mas aí vamos ter um porém – falou Vini.
- Que porém? – perguntei.
- Somos todos homens. Ela é mulher. Normalmente a gente anda de cueca pela casa, sem camisa, às vezes até pelados. Enquanto ela estiver aqui, teremos que nos policiar.
- Ah, isso é uma verdade – falou Maicon.
- O Fabrício por exemplo – continuou o médico. –Não vai mais poder dormir pelado. A não ser que feche a porta do quarto com a chave.
- Verdade – concordou meu colega de quarto.
- Vai ser bom e ruim. Iremos perder a nossa privacidade – terminou Vinícius.
- Mas é por uma boa causa – eu estava decidido.
- Mas e o pai dele? – perguntou Éverton. – Vai ficar aqui também?
- Não – falei. – Acredito que ele volte pro Paraná nos próximos dias.
- Será?
- Alguém vai ter que trabalhar naquela família, né? É o pai dele que ajuda com as despesas dele aqui no Rio.
- Hum.
- Então todos estão de acordo?
- Sim – eles falaram e eu fiquei bem contente. Tinha certeza que a Dona Inês ia ficar feliz com o meu convite para passar uns dias na república com a gente.
Ainda naquela noite, o Carlos e eu ficamos trocando mensagens de texto no celular até altas horas da madrugada. Se eu não tivesse dado um basta no assunto, tenho certeza que teríamos conversado até o sol raiar.
Por conta disso, acordei sentindo muita dor de cabeça na manhã seguinte. Quando abri as pálpebras e a claridade invadiu meus olhos, me senti muito incomodado.
E mais uma vez acordei com minha garganta doendo. Eu ia esperar uns dias, se essa dor chata não me deixasse de vez, eu ia acabar procurando um médico.
- Tudo bem, moleque? – perguntou Vinícius.
- Não.
- O que houve? Preocupado com seu amigo?
- Não, não é isso. Eu estou com uma dor de garganta chata. Ela vem, passa, vem, passa. Não estou aguentnando mais.
- Deve ser reflexo da amidalite que você teve em São Paulo. Abre o bocão, deixa eu dar uma olhada?
- Sério mesmo?
- Abre logo, porra.
Abri a boca e fiquei olhando pro teto. Ele não tinha feito aquilo, tinha?
- Coloca a língua pra fora, não estou vendo nada!
Obedeci e suspirei. Só o Vini mesmo para fazer uma consulta em casa.
- Está inflamada, garoto. Isso daí vai encher de pus de novo.
- Ai, não fala isso.
- Vai por mim! Eu estudo, sei o que estou falando.
- Mas por que isso, hein? Não aguento mais aquela dor não, minha gente.
- Qual o medicamento que você tomou?
- Benzetacil. Quase fiquei manco por causa dela.
- Só? Não tomou uma injeção própria para a infecção?
- Você quer um remédio mais potente que esse? Fiquei dois dias com a bunda doendo!
- Ah, vai dizer que você não gosta? – ele diminuiu o tom de voz e abriu um sorriso safado.
- Adoro, mas quando trata-se de outro tipo de picadura, não essa daí que é horrível.
- Adora uma “picadura”, né?
- Com certeza! Ainda mais se for a sua!
- Safado! Mas hein, deixa eu te perguntar: quer que eu cuide disso aí pra você?
- Claro que eu quero, mas como vai fazer isso?
- Primeiro, vamos esperar uns dois dias para ver se são as amidalas mesmo. Se for e se ficar pior, eu vou trazer as injeções para você tomar, tá bom?
- Injeções no plural? – ergui as sobrancelhas.
- No plural. São pelo menos quatro dias seguidos para poder fazer efeito. Ou você prefere outra Benzetacil? Que vai surtir efeito, mas que mais pra frente a inflamação pode voltar ainda pior?
- Não, não e não. Outra daquelas eu não aguento.
- Então pronto.
- Mas onde você vai conseguir essa medicação?
- Consigo com meu professor que é médico em um hospital muito bom aqui no Rio. Meu chapa, eu já estagiei com ele.
- Se você está dizendo, quem sou eu para discordar?
- Então estamos combinados.
- Mas então, e se não melhorar? E se essa dor do cão voltar mais uma vez?
- Se não melhorar ou se ela voltar, talvez você tenha que tirar as amídalas.
- VOU TER QUE OPERAR?!
- Exato!
- Não. Mais um operado nessa casa não dá certo!
- Mas é simples. Não vai te fazer nenhum mal não.
- Não, de faca eu saio correndo.
- Mais de “picadura” não, né?
- Depende da “picadura”. Se for uma pica dura mesmo eu corro, mas é pra cima dela.
Como eu já estava mais tranquilo, tive humor para ficar conversando o dia inteiro com o meu novo namorado. Ele me fez rir praticamente o expediente inteiro, contando piadas e fazendo comentários sobre a vestimenta de alguns clientes que apareceram na nossa filial.
- Olha aquela mulher ali – ele falou em dado momento do dia.
- O que tem?
- Os peitos dela parecem peitos de macaca!
Eu quase fiz xixi nas calças de tanto rir. Até o Jonas foi ver o que estava acontecendo.
- Do que você está rindo? – ele abriu um sorriso.
- O Carlos não presta, ele fica fazendo uns comentários desnecessários aqui.
- Que comentários? De quem vocês estão falando mal?
- Da minha tia, Jonas – Carlos mentiu. – Ele está rindo só porque eu disse que os peitos dela parecem peitos de macaca!
E meu gerente também riu. Riu mais do que eu inclusive.
- Quanto amor pela sua tia, hein? Mas deem uma disfarçada, meninos. Se o Tácio entra aqui e vê vocês rindo desse jeito, vai sobrar pra gente.
- Pode deixar, a gente vai maneirar – sequei uma lágrima. – Desculpa!
- Não tem problema, podem conversar e rir sim, mas moderadamente.
- Tu é nota mil, patrão! – exclamou o Henrique.
- Valeu, fera.
- Quando o senhor vai visitar meu casebre novamente?
- Ah, quando o dono da casa me convidar!
- Pode ser domingo? Ou sábado?
- Pode sim, mas que horas?
- Vai querer trabalhar domingo?
- Claro, quero muita hora extra.
- Vai ficar rico desse jeito.
- Essa é a minha intenção!
- Bom, se tu vai fazer extra, tem que ser depois do expediente.
- Por mim está mais que perfeito.
- Então está combinado. Vê se não vai furar, hein?
- Pode deixar que não furarei.
Faltando pouco menos de 20 minutos para a minha saída, a Alexia e eu tivemos oportunidade de trocar umas palavrinhas. Fazia tempo que a gente não conversava:
- Que cara de preocupada é essa?
- Estou mesmo, amigo.
- Aconteceu alguma coisa?
- Acho que sim.
- O que foi? Quer desabafar?
- Quero, estou precisando!
- Estou ouvindo. Chora que eu te escuto, mas só por 15 minutos.
- Já vai, né?
- Daqui a pouco, graças a Deus. O que aconteceu?
- Ah, não sei se é coisa da minha cabeça ou não, mas acho que o Gabriel está mudado comigo.
- Mudado? Mas mudado em qual sentido?
- Ah, sei lá! Ele está tão frio de dois dias pra cá...
- Frio?
- É! Quase não vem falar comigo, quase não olha na minha cara... Nem me esperar mais ele está me esperando!
- Acho que é coisa da sua cabeça.
- Não, não é. Ele está muito diferente comigo.
- Mas aconteceu alguma coisa para ele ficar assim? Vocês brigaram? Tiveream uma discussão ou qualquer coisa do tipo?
- Não, pelo contrário. Está, ou pelo menos estava, tudo muito bem. Eu até...
- Você até o quê?
- Eu até fui pra cama com ele... – ela ficou muito, mas muito vermelha mesmo.
- Mentira? Sério?
- É, mas pelo amor de Deus, não conta pra ninguém.
- Não, não vou contar. Isso não é do meu feitio. Mas é sério mesmo que rolou?
- Rolou sim. E foi mágico. Pelo menos pra mim. Ele foi tão carinhoso, sabe?
- Ah, que bom que rolou e que você gostou. Tenho certeza que ele também gostou.
- Será? É esse o meu medo, sabe? Eu acho que ele não gostou.
- Por que você acha isso?
- Porque a frieza dele está acontecendo desde então. Já no dia seguinte ele mudou comigo.
- Jura? – eu comecei a ficar preocupado. – Acho que é coisa da sua cabeça, amiga.
- É não, Caio! Eu estou falando sério, ele está muito esquisito e isso está me machucando.
- Fica calma. Quer que eu converse com ele?
- Você faria isso por mim?
- Você ainda pergunta? Claro que faço!
- Você é um amigão, hein Caio?
- Eu só gosto de ver meus amigos felizes. Vou esperar um tempo, uns dois dias para ver se ele melhora. Se não melhorar, eu falo com ele. Pode ser?
- Pode ser sim. Se você fizer isso, eu vou ficar muito grata.
- Claro que faço, não tenha dúvidas.
- Você é demais mesmo. Muito obrigada!
- Nem precisa agradecer. Agora eu vou nessa, tenho que correr pro hospital para ver o Rodrigo.
- E ele já está melhor?
- Graças a Deus está melhor sim. Foi um milagre ele sair dessa.
- Posso imaginar. Não o conheço, mas manda um beijo pra ele por mim.
- Mando sim. pode deixar.

Mais uma vez me encontrei com os pais dele no corredor. Será que essa seria a nossa rotina diária? Por quantos dias isso iria continuar acontecendo? Quantos dias ele ia continuar internado?
- Pode ser o mesmo esquema de ontem? – perguntou o pai dele. – Nós entramos e depois você entra?
- Claro que sim. Sem problema algum!
- Então nós já voltamos.
Eu estava sentindo fome. Deveria ter comido alguma coisa antes de ir pro hospital.
O casal saiu com um sorriso nos lábios. Aquilo significava que o Rodrigo estava cada vez melhor.
- Ele está bem? – sondei.
- Na mesma – disse a mãe dele. – Os médicos disseram que a infecção não melhorou, mas também não piorou.
- Ele está acordado?
- Está sim, vai lá vê-lo, rapaz – o genitor dele deu um tapinha nas minhas costas.
- Ah, obrigado.
Fui quase correndo. Só não corri de verdade porque o ambiente não me permitia.
- Caio! Você veio!
- Lógico que sim. E aí, como se sente?
- Na mesma. Minha barriga está doendo um pouco hoje.
- Deve ser por causa da infecção no estômago.
- É sim, o médico disse que é. E eu estou louco para sair desse lugar. Muita gente está morrendo perto de mim, isso é horrível!
- Sério? Sério mesmo?
- Sério, Caio. Já morreram dois hoje e um ontem. Não tem nada pior. Graças a Deus que eu não vejo nada, mas ouço o sofrimento, o barulho da maquininha do coração parando... É muito ruim.
- Deus me livre de ficar aqui. Quando você vai pro quarto?
- Acho que em dois dias. A infecção tem que melhorar primeiro.
- E vai melhorar, você vai ver.
- Ontem eu esqueci de pedir para você trazer umas roupas pra mim...
- Putz, Digow. Pode crer, eu nem pensei nisso. Você está pelado aí, cara?
- Não estou mais, meu pai comprou umas cuecas pra mim. Eu estava morrendo de vergonha.
- Imagino. Eu também ficaria. Você já é todo tímido por natureza...
- Pois é. Quando as enfermeiras vinham, eu ficava todo grilado. Prefiro mil vezes que seja um enfermeiro e um médico do que seja uma mulher.
- Ah, é verdade. Amanhã de manhã eu passo aqui e deixo algumas roupas com sua mãe, tá bom?
- Por favor, te agradeço muito se fizer isso.
- Faço sim, mano. Pode ter certeza.
- O mais chato é na hora de fazer xixi. Eu morro de vergonha.
- Faz aqui na cama? – me espantei.
- Faço nesse bagulho aí que está embaixo da minha cama. Nesse troço de aço.
- Credo, parece uma garrafa de café com bico!
- Pois é. Pior de tudo é encaixar o pau dentro desse buraco. Horrível.
Eu dei risada e fiquei imaginando a cena.
- Mas ninguém te ajuda?
- Tem que ajudar senão eu não consigo. Alguém tem que ficar segurando.
- Daí são as mulheres que vêm?
- Não, eu seguro até vir um cara. Com mina eu ia travar totalmente.
- Você é vergonhoso demais, Digow – baguncei os cabelos dele.
- Pra essas coisas eu sou. Só não sou na hora do sexo mesmo, mas de resto...
- Palhaço, já está pensando nisso? – sorri.
- Claro, sou homem porra!
- Você não pode levantar pra ir ao banheiro?
- Até posso, mas só faço isso na hora do banho porque eles falam que eu preciso de repouso absoluto. Uma frescura que nunca vi igual!
- Vcoê tem que obedecer!
- Eu obedeço, sou um bom menino!
Que fofo!
- Quando você for ficar no quarto, quem vai ficar contigo?
- Minha mãe.
- Seu pai não vai ficar no Rio muito tempo, né?
- Não. Ele vai embora daqui a pouco já. Ele tem que trabalhar, né?
- Imaginei mesmo. Eu posso fazer um convite pra sua mãe?
- Convite? Que convite?
- Eu queria convidá-la para ficar com a gente na república até ela voltar pro Paraná...
- Na república? Mas onde?
- Em alguma cama. Eu e os meninos podemos revezar no sofá ate ela ir embora...
- Ah, não sei se é uma boa ideia não.
- Mas Digow, ela não vai querer ir embora até você ficar bem. Disso eu tenho certeza. E é muito ruim deixar a coitada ficar pagando hotel.
- Nisso você tem razão. E os caras toparam?
- Toparam.
- Por mim não tem problema. Vê com ela, se ela aceitar beleza.
- Demorou então. Agora vai descansar que a enfermeira já está vindo me expulsar.
- Já? Já acabou o horário?
- Já sim. Eu volto amanhã de noite, tá?
- Estarei te esperando. E os caras não vêm me ver não? Eles me odeiam tanto assim?
- Claro que eles não te odeiam. Eles só não estão vindo por causa que as visitas são restritas, mas tenho certeza que quando você for pro quarto eles vão vir te visitar.
- Assim espero, poxa.
- O horário de visitas acabou, por favor, se retire – disse a mulher de branco.
- Já estou indo. Boa noite, maninho. Descansa bastante e se recupera logo, hein?
- Estou tentando. Boa noite, obrigado pela visita.
- Já disse que não tem nada que agradecer.
Ele apertou minha mão bem forte.
- Te amo, moleque! – ele repetiu a frase do dia anterior e aquilo me deixou completamente feliz e emocionado.
- Oh, Digow – fiquei radiante. – Eu te amo também!
- Saia, eu já disse – falou a mulher.
- Já vou, mal-educada!
- Se continuar aqui eu vou chamar os seguranças!
- Vai, Caio. Vai embora antes que você apanhe!
- Até amanhã então, Digow.
- Até, Caio!
Eu saí quase que saltitando daquele lugar. A cada dia ele estavamelhor e isso era bom demais...
- O que você achou? – perguntou a mãe dele.
- Em questão de aparência ele está bem melhor.
- Eu também achei.
- Mas com relação a parte clínica, não sei informar.
- Você viu os pontos?
- Não.
- Estão muito inflamados. Eu estou preocupada com isso. Na hora que entramos, eles estavam trocando o curativo.
- Ah, está recente ainda, né? Logo volta ao normal.
- Assim espero.
- Dona Inês, eu quero lhe fazer um convite.
- Que convite?
- Gostaria de saber se a senhora toparia passar uns dias na nossa república, pelo menos até ele se recuperar.
- Na república? – ela olhou pro marido. – Mas lá tem lugar pra mim?
- Para ser sincero, todas as camas estão ocupadas, mas os meninos e eu podemos dormir no sofá por enquanto.
- Imagina, Caio. Eu não quero causar nenhum problema.
- Não vai ser nenhum problema, Dona Inês. Pelo contrário. Será um prazer ter a senhora conosco e por um lado vai ser bom que a senhora não vai precisar ficar gastando dinheiro com hotel.
- Mas só mora homem lá, né? – perguntou o marido dela.
- É, mas eu prometo que nós iremos respeitá-la muito. E tem outra: todo mundo fica fora o dia inteiro. A gente só fica lá para dormir mesmo.
- E aí, amor? – ela perguntou.
- Desde que você seja respeitada, por mim tudo bem.
- Disso não tenha dúvidas. Eu tive essa ideia e já falei com todos, inclusive o Rodrigo e todos estão de acordo.
- Ah, sendo assim eu acho que vou aceitar porque não tenho condições de ficar pagando hotel mesmo.
- Então. Daí a senhora pode ir quando quiser.
- Poxa, muito obrigada! Me quebraram um galhão enorme.
- Que nada, vai ser um prazer.
- Então amanhã eu vou pra lá...
- Combinado então> Agora deixem-me ir, ainda nem jantei e estou faminto.
- Obrigada mais uma vez, Caio.
- Imagina!
- Caio, vou me despedindo. Eu já vou voltar pro Paraná – disse Vagner, o pai do Digow. – Alguém tem que trabalhar nessa família.
- Eu imaginei que o senhor já iria voltar...
- Vou, mas meu coração fica aqui com ele.
- Imagino, mas vai ficar tudo bem.
- Te agradeço imensamente por tudo, garoto. Você salvou o meu filho.
- Não agradeça, já disse que faria tudo de novo se fosse preciso. Mas se Deus quiser não será preciso nunca mais,
- Amém – disse a mãe dele.
- Te devo uma enorme. Faço questão que vá nos visitar quando o Rodrigo for no final do ano, viu?
- Vou ver se consigo, agora eu estou trabalhando e vai ficar um pouco mais difícil.
- Ah, é? E está trabalhando com o quê?
- Vendas. Em uma loja de móveis em um shopping na Barra da Tijuca.
- Que bacana, fico contente. Parabéns, você é tão novo e já tem tanta responsabilidade.
- Obrigado... – fiquei constrangido.
- Gostaria muito de conhecer a sua família – disse a mulher. – Quero parabenizar sua mãe pelo filho lindo que ela tem.
- Eu não tenho família, Dona Inês. A minha família me abandonou recentemente. Eles não querem mais saber de mim. Eles não gostam de mim.
- Como assim te abandonaram?
- Eles me expulsaram de casa.
- Te expulsaram? – perguntou o pai do Digow. – Por que? O que você aprontou?
- Na verdade nada de mais. Acontece que eles nunca gostaram de mim.
- Impossível, Caio – Dona Inês ficou inconformada. – Impossível uma família rejeitar um filho.
- Impossível não, Dona Inês. Recentemente eu estive em São Paulo e fui procurar a minha mãe e sabe o que ela me disse?
- Não?!
- Que não queria me ver. Que não quer me ver nunca mais.
- Minha Nossa Senhora!
- Pois é. Por isso eu falo que não tenho família. Eles me odeiam!
- Minha nossa, estou chocada! Sua mãe não é mãe, é uma cobra!
Lembrei da Janaína.
- Já me falaram isso, mas eu acostumei. Se ela não quer o meu amor, o que eu posso fazer?
- Oh, meu querido! Pois saiba que agora você tem uma família! Não é de sangue, mas nós te queremos muito bem, viu?
- Obrigado. Obrigado mesmo.
- Se precisar de alguma coisa, não hesite em me procurar, Caio – o cara apertou meu ombro.
- Agora sou eu que digo que estou imensamente grato.
NO DIA SEGUINTE...
Ficou combinado que o Vinícius ia visitar o Rodrigo e consecutivamente, ia levar as roupas que ele havia solicitado. Eu separei várias cuecas, algumas camisetas e algumas bermudas. Nada muito extravagante e luxuoso.
- Já está bom – falou o médico.
- Beleza.
Minha rotina de trabalho estava pra lá de consolidada. Todos os dias eu fazia as mesmas coisas e como já estava há mais de duas semanas na função, já estava me sentindo um pouco mais seguro e também já estava conseguindo inserir as compras no sistema com mais facilidade.
- Vai querer parcelar a compra? – perguntei ao cliente.
- Não, é à vista.
À vista? Pelo jeito o cara era cheio da grana. Não é todo mundo que consegue pagar uma lavadora de roupas à vista.
- Perfeito. Então é só passar no caixa com esse papel e efetuar o pagamento. A entrea está agendada para daqui 4 dias úteis.
- Tudo isso? Não tem como antecipar não?
- Infelizmente não, todos os caminhões das outras datas já estão cheios.
- Mas eu paguei à vista! Ou melhor, vou pagar...
- Entendo, senhor, mas independente da forma de pagamento, o procedimento é o mesmo.
- Que merda é essa? É assim mesmo? Não tem escolha?
- Por favor, olhe aqui no sistema...
Eu abri uma tela no meu sistema que mostrava claramente qual era a data mais próxima para entrega na região do cliente. Vendo aquilo, ele não tinha como contestar mais nada.
- Como o senhor pode ver, a data mais próxima foi a que eu disse: daqui 4 dias úteis.
- Isso é um absurdo! É tempo demais! Minha mulher está grávida e não pode ficar lavando roupa na mão todo esse tempo.
- Compreendo, senhor, mas essa é a data que nós temos disponível.
- Onde está o gerente? Eu quero falar com o gerente!
- Ele vai passar a mesma informação.
- Não me importa, eu quero falar com ele agora!
- Aguarde só um instante. Sente-se por favor...
Era só o que me faltava! Mais um pouco e o vagabundo ia dar um tapa na minha cara...
- Eduarda ou Jonas, tem um cliente querendo falar com um de vocês.
- Por qual motivo? – perguntou Eduarda.
- A data de entrega dele saiu para daqui 4 dias úteis e ele não aceita.
- Já tentou antecipar? – perguntou Jonas.
- Não tem cubagem.
- E aí? É meu ou seu? – perguntou o magricela.
- É meu, vai. Vou quebrar essa pro Caiô.
- Caiô? – Jonas abriu um sorriso. – E é esse seu apelido, é Caio?
- Sei lá. Não entendo porquê me chamam assim.
- Porque é chique de doer os ossos! – Duda levantou e saiu andando. – Vamos lá, onde ele está?
- Lá na minha mesa.
Engraçado que quando a Eduarda falou o mesmo procedimento, o cliente aceitou. Eu fiquei muito puto da vida...
- Por favor, compareça ao caixa e efetue o pagamento para sua compra ser liberada em sistema.
- Tudo bem, moça. Obrigado.
- Vagabundo – eu sibilei quando ele se afastou o suficiente para não me ouvir. Eduarda gargalhou.
- É sempre assim, nem se preocupa!
A Janaína foi a próxima a ter um pepino para resolver. Um cliente dela não aceitou o prazo de montagem e também solicitou falar com a gerência.
- É hoje, é hoje – Jonas suspirou. – Pode deixar que dessa vez eu vou, Duda!
- Obrigada, querido.
Notei que a Alexia continuava um pouquinho jururu. É claro que eu fui conversar com ela para entender se o incidente com o Gabriel continuava:
- Continua sim – ela assentiu. – E está piorando. Agora nem me atender mais ele atende!
- Estranho! Eu juro que eu vou conversar com ele ainda hoje.
- Promete?
- Prometo!
E foi isso mesmo que eu fiz. Não sei de onde eu arranjei tempo para trocar umas palavras com o bombadão, mas eu dei um jeito e consegui conversar rapidamente com ele, quando nós já estávamos quase indo embora:
- O que foi? – ele perguntou.
- Eu odeio rodeios, então vou direto ao ponto: o que houve entre você e a Alexia?
- Nada, por quê?!
- Porque ela está chateada, triste e magoada. E eu quero saber o que aconteceu!
- Ela já foi chorar com você? – ele revirou os olhos.
- Não. Eu que percebi que ela está triste. E mesmo que ela tenha vindo chorar comigo, isso não vem ao caso. Eu quero saber o que aconteceu.
- Nada, Caio! Está tudo normal entre nós.
- Não foi isso que ela me falou. Ela disse que nem atender as ligações dela você está atendendo.
- Nem estou vendo o celular tocar.
- Ah, conta outra, Gabriel! – fiquei irritado. – Essa não cola não.
- Ah, quer saber? Eu vou falar a verdade!
- Por favor...
- Eu não quero mais, Caio!
- Não quer mais o quê?
- Ficar com ela. Cansei.
- Não quer mais? Mas não quer por quê?
- Não quero. Cansei, enjoei. Estou em outra.
- Fácil assim?
- Fácil como dois e dois são quatro.
- Não acredito que você vai fazer isso com a Alexia, Gabriel!
- E qual é o problema? Já consegui o que eu queria mesmo, agora eu vou pra outra. A fila anda.
- Não, eu não ouvi isso – fiquei extremamente revoltado. – Eu não ouvi isso!
- Ouviu sim, é a verdade, oras.
- Eu só não te dou um soco aqui e agora, porque estamos no nosso ambiente de trabalho, mas a minha vontade é de quebrar a sua cara!
- Por que? – ele riu. – Porque eu comi e joguei fora? Bem-vindo ao meu mundo, esse sou eu, Caio.
- Parabéns! Lindo o mundo que você vive. Lindo mundo! Você caiu totalmente no meu conceito, Gabriel. Totalmente...
- Ah, que pena, cara. Nem Jesus agradou à todos!
Bufei de raiva e pensei em falar um monte de coisas para ele, pensei em falar tudo o que estava preso na minha garganta, mas eu não consegui. Não consegui pelo simples fato de estar no trampo, porque se não estivesse, eu teria soltado tudo o que queria e mais um pouco.
Quem ele pensava que era? Quem ele pensava que era pra brincar com os sentimentos das mulheres daquela forma? Toda a imagem que eu tinha dele foi por água abaixo naquele momento. E aquela amizade que eu julgava que fosse verdadeira, pra mim não existia mais.
No que dependesse de mim, a Alexia iria esquecê-lo muito facilmente. Eu só não sabia como ia fazer para contar aquilo pra minha amiga sem magoá-la, se é que isso seria possível...
.
Fiquei tão irritado com o que o Gabo fez com a Alexia que sequer notei a presença de Dona Inês na sala de espera.
- Caio?
- Ah, olá, Dona Inês! Desculpe não tê-la cumprimentado, estou no mundo da lua.
- Não tem problema. Está tudo bem com você?
- Sim, sim. Só estou preocupado com um problema na loja.
- Entendo. Caio, eu poderia te pedir um favor?
- Claro que sim, Dona Inês!
- Eu posso ir pra sua casa com você? É que eu não sei andar sozinha aqui nessa cidade.
- Claro que pode, será um prazer!
- E teria como você me levar até a praia, Caio? Eu fiquei sabendo que é aqui perto, é verdade?
- Sim. Tem uma aqui perto mesmo. Posso levá-la quando a senhora quiser.
- O que acha se a gente for depois que sairmos daqui do hospital?
- Por mim está perfeito!
- Então estamos combinados. Eu vou entrar agora, não demoro.
- Tudo bem, Dona Inês.
Enquanto a mulher entrou na UTI para visitar o filho, eu fiquei remoendo o que descobri a respeito do Gabriel. Qual seria a melhor forma de falar para a Alexia o que estava acontecendo?
Canalha! Era isso que aquelo saco de músculos era. Se antes eu tinha qualquer tipo de admiração, carinho ou respeito por aquele troglodita, naquele momento eu não tinha mais.
Fiquei tão enfurecido com a sacanagem que aquele trouxa fez com minha amiga, que mais uma vez não percebi quando a Dona Inês se aproximou de mim:
- Caio? Não vai ver o Rodrigo?
- Hum? Ah, a senhora já voltou?! Eu vou sim, claro! Não demoro.
- Está bem, querido.
Naquele dia ele estava um pouco pálido e aparentemente muito inquieto. Será que estava sentindo alguma coisa?
- Oi... – ele me olhou com os olhinhos tristonhos.
- Oi! O que foi? Está sentindo alguma coisa?
- Dor – choramingou. – Cuida de mim?
Meu coração gelou e ao mesmo tempo bateu acelerado.
- Se eu pudesse, tiraria as suas dores com a mão!
- O médico disse que a infecção não está sendo controlada com o antibiótico que eu estou tomando.
- E agora? – me preocupei.
- Ele trocou o remédio. Disse que esse é mais forte que o outro.
- E qual o nome desse remédio?
- Não sei! O que foi? Você está chateado?
- Um pouco – não tive como negar.
- É comigo? Eu fiz alguma coisa de errado?
- Claro que não, seu bobo! – eu me derreti. – É com outra pessoa, uma pessoa lá da loja. Depois eu te conto tudo, quando você estiver melhor.
- Hoje eu pude andar um pouco por aqui...
- Jura?! Nossa, que massa! Ainda bem, né?
- Sim. Eu fiquei feliz.
- Que bom, mano! Assim que eu gosto de te ver.
- Eu estava... – ele me olhou e em seguida ficou calado.
- Estava o quê?
- Sentindo sua falta!
Notei que ele ficou um pouco vermelho.
- Eu também estava sentindo a sua.
- Pensei que você não ia vir hoje. Você demorou muito!
- Eu nunca vou deixar de te visitar, Rodrigo. Coloca isso na sua cabeça.
- Nem que se passem mil anos eu vou conseguir esquecer o que você fez por mim, sabia?
- Eu já disse que nós estamos quites, Digow. Você também faria o mesmo por mim. Ou eu estou enganado?
- Claro que não. Eu faria isso e muito mais!
- Então para de graça, seu cachorro!
- Não me xinga! – ele ficou boquiaberto. – Eu estou aqui todo... sentimental pra cima de você e você me xinga? Assim não vale!
- Bobo – eu fiquei todo derretido por dentro. – Eu estou brincando!
- Acho bom! Como está a república?
- Te esperando ansiosamente.
- Minha mãe vai pra lá agora, né?
- Aham.
- Cuida dela pra mim?
- Cuido sim. Eu tenho uma novidade pra você!
- Que novidade?
- Sabe aquele gato que você viu?
- Sei. O que tem aquele desgraçado dos infernos?
- Eu peguei ele pra mim!!! – brinquei e ri da cara que ele fez.
- Como é? Você não enfiou um gato pulguento e cheio de sarna dentro da minha casa não, né?
- Coloquei sim! E ele dorme na sua cama!
- Tá louco?!
- É sério! O nome dele é Nicolau!
- Eu vou dar o Nicolau na sua cara já, já, garoto! Inventa de pegar um gato pra você ver o que acontece!
- Já ficou todo bravinho, né? – eu ri de novo.
- Claro! Eu odeio gatos!
- Bobo! É brincadeira. Eu não faria isso sem a permissao de vocês, nunca!
- Acho bom! – ele ficou com a cara feia.
Eu coloquei a mão em cima da mão dele e novamente ele entrelaçou os nossos dedos.
- Queria voltar pra casa. Não aguento mais ficar nesse lugar. Hoje morreu mais uma aqui.
- Deus me livre! Mas fica calmo, logo você volta.
- Eu espero. É muito ruim ficar aqui. Sem contar que eu estou perdendo muitas aulas na faculdade e que isso pode comprometer a minha bolsa de estudos.
- Relaxa. Logo você volta e recupera o tempo perdido.
- Deus te ouça. Falando nisso, você está estudando pro Enem, né?
- Estudando? Com que tempo? Só se eu estudar enquanto estiver tomando banho!
- Depois eu é que sou bobo, né? Faz favor de estudar , hein? Quero ver você estudando ano que vem.
- Outra hora a gente conversa sobre isso.
- A propósito, não esqueci aquele assunto que a gente tem pendente, viu?
- Que assunto? O do ridículo do Bruno?!
- Esse mesmo. Eu tenho que...
- Você não tem nada! Já falei que a gente fala sobre isso em uma outra hora, em um outro local, quando você estiver totalmente recuperado. Antes disso, sem chance!
- Acontece que não é só isso que eu tenho pra falar – ele soltou de vez e desviou os olhos dos meus.
- E o que mais então?
- Agora você quer saber o que é?
- Me deixou curioso, pra ser sincero.
- Pois agora então eu não falo mais.
- Eu nem queria saber mesmo! – dei de ombros.
- Você nunca viu meus pontos, né Caio?
- Não!
Ele afastou o lençol e eu quase desmaiei quando vi aquele corte extremamente enegrecido e todos aqueles pontos imensos e cheios de pus.
- Ai minha mãe... – eu me espantei de verdade.
Rodrigo cobriu a barriga e suspirou. Percebi que ele estava com os olhos cheios de lágrimas.
- Por que isso está assim, Rodrigo? – me preocupei de verdade.
- O médico falou que é porque não cicatrizou. Eles estão pingando um líquido vermelho em cima do corte. Arde um pouco.
- Mas isso daí não deveria estar enrolado em um curativo?
- É que eu acabei de tomar banho e eles ainda não vieram colocar o curativo.
- Meu Deus do céu... Sua mãe viu isso?
- Não. Eu não tive coragem de mostrar pra ela.
- Espero que isso sare logo. Não quero te ver aqui por muito tempo, não quero!
- Eu também não quero ficar aqui por muito tempo. A minha vontade é de sair correndo desse lugar.
- Não faça isso. Você sabe que não pode fazer uma coisa dessas.
- Vontade não me falta.
Silêncio. Eu ainda estava um pouco chocado com o que tinha visto há poucos minutos.
- Caio?
- Hum?
- Promete que vai conversar comigo quando eu receber alta?
- Já falei que prometo, Digow!
- E promete também que vai fazer meu bolo?
- Prometo, Digow – sorri. – Prometo!
- Eu te amo, tá? – ele me olhou e o rosto dele ficou muito vermelho.
- Ama? – engoli em seco.
- Amo... – ele sussurrou.
- Eu também te amo – sussurrei.
Nossos olhos ficaram grudados por um segundo. Como não amar o meu irmão mais velho?
- A visita acabou – disse a mesma enfermeira mal-educada de sempre. – Hora de sair, tchau!
- Eu já estou indo.
- Anda, anda, anda logo. Hora de ir embora, hora de sair...
- Eu sei, sua mal-educada. Deixa só eu me despedir do meu irmão em paz?
- Nem mais um segundo! Anda, circulando, circulando!
- Mal-educada – eu falei de novo e fiz questão que ela ouvisse.
- Mal-comida, isso sim – Rodrigo bufou de raiva.
- Louco! – eu sorri. – Só você mesmo. Deixa eu ir, tá bom? Amanhã eu volto. Promete que vai se comportar direitinho?
- Prometo. Promete que vem amanhã me ver?
- Não tenha dúvidas disso, digow!
- Saindo, saindo – a mulher voltou. – Senão eu chamo o segurança.
- Eu já vou, desgraça! Tchau, Rodrigo. Até amanhã!
.
- Gostou mesmo da praia, Dona Inês? – perguntei quando chegamos na república.
- Adorei. É muito linda. Quero visitar agora no período da manhã.
- É bem mais bonito.
- Imagino.
Eu pigarreei e senti a minha garganta ficar tampada. Algo me dizia que ela ia mesmo ficar cheia de pus novamente.
Ainda bem que o Vini foi prevenido e trouxe as injeções que ele havia prometido. Depois que ele jantou, ele pediu para eu deitar na cama e ficou analisando a minha garganta com muito cuidado.
- É, está pior mesmo. Vamos para as injeções.
- Já? Assim, sem direito de escolha?
- Assim sem direito de escolha. Ou você quer que isso daí piore?
- Não, é óbvio que não!
- Então não seja covarde e encare a picadura.
Bendita hora que o Fabrício inventou de dormir no sofá e deixou a cama pro Vinícius. Como nós estávamos sozinhos e no passado já havíamos tido um trelelê, eu não tinha motivos para esconder nada e fui logo falando:
- Encaro só a sua pica dura, meu caro.
- A minha? A minha não. A minha está mole e só sobe pra Bruna agora!
- Tem certeza? – perguntei com uma mordida nos lábios.
- Absoluta.
- É?
- Claro!
- Que pena então, você ia gostar...
- Eu vou... Eu vou preparar o remédio e pegar álcool. Tá bom?
- Uhum, mas não demora. Eu quero ver a pica dura...
- Besta – ele abriu um sorriso sem graça.
Não tardou e ele voltou. Quando passou, Vinícius fechou a porta com a chave e disse:
- Abaixa as calças. É agora que você vai levar injeção.
- É só pra abaixar ou eu posso tirar? – não sei de onde tirei coragem para fazer essa pergunta.
- É você que sabe. Fica a critério do freguês – ele brincou.
- Deixa eu te perguntar uma coisa: normalmente quem aplica injeção são apenas enfermeiros, correto?
- Não necessariamente. Na sua grande maioria sim.
- E você por acaso sabe fazer isso?
- Claro que sei, Caio. Eu cheguei a cursar enfermagem por um tempo.
- E aprendeu a enfiar a pica dura?
- Isso eu aprendi desde a minha adolescência, seu idiota! Agora deixa eu ver essa bunda, quero dizer, deixa eu aplicar a injeção logo, porra.
Abaixei a calça e deixei só o começo da minha nádega à mosra. Vinícius passou um algodão molhado com álcool na minha pele e logo em seguida eu senti a agulha entrar na minha carne.
Não foi uma dor como a dor da Benzetacil, mas mesmo assim eu fiquei bastante incomodado.
- Prontinho, meu paciente. Já apliquei. Agora só faltam mais 3 doses.
- Tudo isso, doutor?
- Tudo isso.
- Como esse doutor é mau...
- Sou nada, sou muito bom!
Quando o gostosão levantou, foi impossível não notar a excitação que ele estava. Bastou isso para meu pau criar vida e eu ficar com a boca cheia d’água e com vontade de colocar tudo aquilo pra fora da cueca do garanhão.
- Hum, e não é que ele ficou com a pica dura mesmo...
- Sempre.
Eu levantei, fui até onde ele estava e não resisti. Tive que colocar a minha mão naquele volume delicioso por cima da bermuda que ele estava usando.
- Que delícia, hein? – passei a língua nos lábios.
- Hoje você está muito safadinho pro meu gosto, Caio.
- Eu não estou, eu sou safadinho. E você sabe muito bem disso!
- Sei?
- Sabe...
- Se você diz – ele se fez de desentendido.
- Posso ver?
- Não!
- Só ver? Só ver e mais nada?
- Não sei... Eu namoro agora, cara.
- Eu também namoro! É só uma olhada, não vai matar ninguém...
Ele mordeu o lábio e ficou olhando nos meus olhos. Será que ele ia deixar?
- Deixa, vai? Só uma olhadinha rápida... Faz muito tempo que eu não vejo sua pica dura...
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