sexta-feira, 17 de abril de 2015

Capítulo 98²

Até eu estava perplexo com a minha semelhança com o Cauã.

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Não era à toa que todos estavam me confundindo com o Cauã. Acho que depois de tanto tempo separados, eu acabei me esquecendo o quanto nós éramos idênticos em tudo, até na hora de escolher as roupas, até na hora de deixar a barba por fazer.
Passado o choque inicial, meu irmão entrou no quarto e fechou a porta com suavidade.
Meu coração, que já estava esgotado de receber um golpe atrás do outro, voltou a ficar acelerado quando ele se aproximou da cama e ficou perto de mim.

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- Oi, Caio.
- Como vai, Cauã?
- Não esperava te ver por aqui. Estou surpreso.
- Eu também estou.
- Ela está dormindo?
- Pegou no sono faz pouco tempo.
- Você chegou que horas?
- Cheguei de madrugada, mas aqui no hospital eu cheguei faz pouco tempo.
- Por que não me ligou avisando que tinha chegado? Eu teria te buscado.
- Não, não. O Víctor foi me buscar.
- Entendo. E como ela reagiu?
- Passou mal. Ficou emocionada e a pressão subiu.
- Mas ela está bem, não está?
- Vieram medicar e deram um calmante.
- Você... Está bem?

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- Não sei o que posso considerar como bem nesse momento. Recebi um golpe atrás do outro e estou muito espantado por ela estar esperando gêmeos de novo.
- Já está sabendo?
Só nesse momento eu notei que ele também estava usando aparelho. Não deu pra acreditar nisso. Por que existiam tantas coincidências ligando nós dois? Por quê?
- Ela me contou. Não esperava por essa.
- Ninguém esperava.
Meu irmão deu um beijo em nossa mãe e suspirou.
Eu fiquei olhando pra ele e ele pra mim. Como eu queria dar um abraço naquele garoto!
Cauã estava com o mesmo tipo físico que eu. Ele estava com os músculos definidos, mas não exageradamente. Nós dois estávamos magros, embora tivéssemos músculos espalhados pelo corpo. Até nisso a gente estava combinando.
Eu olhei o meu irmão minuciosamente e não encontrei nada que pudesse nos diferenciar. Na verdade, a única coisa que faria com que nós fôssemos facilmente reconhecidos era a minha tatuagem. Eu tinha uma tatuagem e ele não. Pelo menos eu achava que não.
Mas como a minha tattoo era em um local escondido, quem nos visse e não visse o meu tornozelo provavelmente não saberia quem era quem.

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E eu tirei a prova dos 9 quando a mesma enfermeira que falou comigo mais cedo entrou no quarto. Ela olhou pra nós dois e ficou nitidamente confusa.
- Ai que coisa estranha. Quem é quem aqui?
- Eu sou o Caio.
- E eu sou o Cauã.
- Jesus acende a luz. Como essa mulher pode engravidar duas vezes de gêmeos? Essa daí gosta de ter filho, pelo amor de Deus. Como ela está?
- Dormindo – nós dois respondemos ao mesmo tempo. Um olhou para a cara do outro.
Eu estava de um lado e Cauã do outro. A gente se olhava, se encarava, mas não falávamos nada. Não tivemos coragem para tal, pelo menos naquele momento.
Depois de algum tempo eu me acostumei com a presença do meu irmão no quarto, mas ainda estava perplexo com a novidade que eu teria dois irmãozinhos, ao invés de um. Eu queria entender porquê as coisas estavam acontecendo daquele jeito.
- A pressão dela abaixou. Agora está 13 por 9. Bem melhor! Eu vou almoçar. Qualquer coisa chamem qualquer enfermeiro.
- Tudo bem – meu irmão foi quem falou. – Obrigado.
Como ele estava agindo com diplomacia naquele momento. Será que seria assim para sempre dali em diante?

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Eu confesso que estava ficando muito inquieto naquela situação. Eu estava do lado do meu irmão, do lado da minha mãe e não podia falar nada, não podia resolver tudo aquilo que estava preso na minha garganta. Isso já estava me deixando sufocado.
O tempo foi passando e ela não acordava. Nem eu, nem o meu gêmeo estávamos falando nada, nem fazendo nada. ele ficou sentado em uma cadeira, eu fiquei sentado na outra e nós não conversamos mais, mas é claro que tínhamos muito o que falar, muito o que resolver, mas infelizmente aquele não era o momento para isso.

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Eu tampouco sabia se a minha situação com eles seria resolvida. Eu fui à São Paulo para ver a minha mãe, é verdade, mas a situação em que ela se encontrava era tão peculiar e ao mesmo tempo tão grave, que não ousei em falar nada do passado naquele momento.
Se eu ia resolver a situação ou não, eu não sabia, todavia o fato era que eu estava mesmo ficando inquieto em ver o Cauã e a minha mãe ali na minha frente e não poder soltar nada do que estava preso na minha garganta.
- Caio?
- Cauã?
- Você por acaso... Não viu o nosso pai?
- Vi – confessei –, mas ele pensou que eu era você. Todos pensaram que eu era você.
- Até a mãe?

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- Não. Ela não. Ela foi a única que me reconheceu.
- Ah, tá. E o pai não falou nada?
- Eu fiquei tão... Paralisado que nem prestei atenção se ele disse alguma coisa, Cauã.
- Eu imagino.
Era verdade. Naquele momento eu não me lembrava de nada do que o meu pai disse, eu só fui lembrar depois, quando fiquei mais calmo.
Eu estava nervoso com aquela situação toda. Era coisa demais acontecendo e tudo ao mesmo tempo. Qualquer pessoa que estivesse no meu lugar ficaria do mesmo jeito que eu fiquei.
- E como acontece pra ficar alguém com ela? – questionei.
- Normalmente eu revezo com o meu pai e de vez em quando minha namorada e minha sogra também ajudam, mas não é sempre que elas podem.
- Entendi.
Será que a namorada dele ainda era a Joyce? Eu fiquei curioso, mas resolvi não perguntar.
Passei a sentir fome. Olhei no relógio e notei que já era quase 13 horas. Resolvi almoçar neste momento.
- Você vai ficar aqui? Eu vou almoçar.
- Fico. Pode ir tranquilo, Caio. Você volta?
- Volto sim.

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Não me despedi dele e não falei com ela porque ela ainda estava dormindo. Simplesmente saí e enfim pude respirar um pouco e pude ficar longe daquele quarto que tinha o clima completamente tenso.
A primeira coisa que fiz quando coloquei os pés na rua foi pegar o celular e ligar pro Bruno. Notei que tinha algumas mensagens do Víctor, mas não as li de imediato. Eu queria primeiro falar com meu namorado.

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- Oi, amor? – ele atendeu no primeiro toque. – E aí? Como estão as coisas?
- Amor... Eu queria tanto que você estivesse aqui comigo...
- E eu queria estar aí com você. Por que está com essa vozinha triste? Falou com sua mãe?
- Sim...
- E como foi? Quer me contar?
É óbvio que eu ia contar. Eu contava tudo pro Bruno, absolutamente tudo.

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- Quando eu voltei pro quarto depois daquela hora que falei com você ela estava dormindo, mas depois ela acordou e me reconheceu...
- Sério, bebê? Ela te reconheceu assim de primeira?
- Uhum. Ela me reconheceu sim, ao contrário do meu pai.
- Aquele desgraçado!!! – Bruno bufou.
- É. Aí ela começou a chorar, levantou e me deu um abraço!
- Eita! E aí? Você abraçou também?
- Não, amor. Eu não consegui. E não consegui chamá-la de mãe também. Eu fiquei muito travado, sabe?
Eu ainda estava com vontade de chorar.
- Não é pra menos. Eu também não conseguiria não. Eu nem teria ido eu acho. Mas e depois?
- Ela passou mal. Ficou sem ar, não conseguiu respirar, ficou toda vermelha e aí eu tive que chamar uma enfermeira. A pressão dela ficou alta e ela teve que ir pro calmante.
- Jesus amado! A velha vai morrer!
Eu ri porque foi muito sem planejar essa frase dele. Só ele pra me fazer rir numa hora daquelas.
- Daí aos poucos ela se acalmou e foi examinada pela obstetra. Eu falei com a médica e descobri que ela corre o risco de abortar. A coisa não está muito fácil devido a idade e a hipertensão.
- Conforme a gente já imaginava.
- Isso, mas o negócio é um pouquinho mais embaixo. Adivinha o que eu descobri falando com a minha mãe?
- O quê?
- Você está sentado?
- Não. É tão chocante assim?
- Muito! Pasme: eu não vou ter um irmão, eu vou ter dois irmãos. Minha mãe está grávida de gêmeos de novo e são dois meninos.
- COMO É QUE É?

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Bruno gritou tão próximo do telefone que meu ouvido ficou doendo.
- É isso mesmo que você ouviu. A minha mãe está grávida de gêmeos! É mole?
- JESUS ME AMARROTA PORQUE EU FIQUEI PASSADO! ESTOU BRANCO EMPANADO NA FARINHA DE TRIGO!
O Bruno estava pegando as maninas da Janaína e quando ele disse isso mais uma vez eu caí na risada, mas no fundo eu ainda queria chorar.
- Mas calma, tem mais. Nem bem eu me recuperei desse choque e tive mais um: Cauã apareceu no quarto usando praticamente as mesmas roupas que eu.
- Ah, vá?
- Juro por Nossa Senhora Aparecida! A gente está praticamente igual. A mesma cor de camiseta, a mesma calça, a mesma cor de tênis, o cabelo tá igualzinho e pra finalizar ele também está usando aparelho e também tem aliança de compromisso na mão direita. Eu estou simplesmente passado! Em choque, essa é que é a verdade.
- Gente... Passado estou eu! Vou ter dois cunhados novos? É isso mesmo, diretor?
- É isso mesmo! Dá pra acreditar? Não, né?
- De jeito nenhum! Eu só acredito porque é você que está falando. Queria muito estar aí pra te apoiar, muito mesmo!

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- E eu queria você aqui pra me abraçar. Estou aqui morrendo de vontade de chorar...
- Ô, meu Deus... E como você está reagindo?
- Não sei, Bruh. Sinceramente eu não sei. Eu estou muito confuso, muito chocado com tudo o que está acontecendo. É muita novidade ao mesmo tempo, é muita coisa nova! Uma emoção atrás da outra!
- É, amor! Quem diria que isso ia acontecer, né?
- É verdade. Eu estou pasmo!!!
- Mas vai dar tudo certo, amor. Vai dar tudo certo e vai ficar tudo em paz. Eu tenho certeza. Confie em Deus...
- É...
- Mas vocês já conversaram? Sei lá, você e o Cauã?
- Falamos muito pouco, apenas o básico. Não quero conversar com ninguém agora. Não é o momento.
- É realmente. Nisso você tem razão.
- E por aí? Como andam as coisas? Estudou direitinho?
- Uhum. Indo aqui pro trabalho.
- Coitadinho! Sentindo tanto a sua falta, bebê!
- E eu a sua. Muito, muito!
Parecia que a gente não se via há anos e não há apenas algumas horas, mas eu realmente estava com saudades do meu namorado.
Conversei com ele por mais ou menos meia hora, até encontrar um restaurante bacaninha pra almoçar. Depois que desliguei a ligação do Bruno, liguei imediatamente pro Rodrigo, mas mais uma vez o celular dele estava na caixa postal. O que estava acontecendo com meu irmão postiço?
Mandei uma mensagem e pedi pra ele me retornar assim que possível. Eu precisava contar ao Digão o que estava acontecendo em São Paulo. Ele merecia saber, porque foi um dos primeiros que me estendeu a mão no Rio de Janeiro.
Comi em paz e não deixei de pensar na novidade dos gêmeos um segundo sequer. De todos as porradas que eu levei da vida naquele dia, essa foi a pior de todas.
É claro que aquela gravidez de gêmeos tinha algum motivo e esse motivo era desconhecido. Infelizmente, porque eu realmente queria saber porquê aquilo estava acontecendo.
Mas eram os designios de Deus e ninguém pode entender ou compreender os designios de Deus. Essa é uma resposta que nós nunca teremos.
Mas nós podemos cogitar possibilidades, só que naquele momento eu não cogitei nenhuma. Estava tão pensativo, tão fechado no meu casulo que sequer consegui pensar com um pouco de coerência a respeito do que estava acontecendo ao meu redor.
Eu chorei. Chorei em silêncio, chorei na solidão da minha existência naquela cidade que eu amava tanto.

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Eu tinha tantas pessoas ao meu redor e me sentia sozinho. Bruno e Rodrigo estavam longe, não estavam ali pertinho de mim e por mais que eu falasse com eles por telefone, não era a mesma coisa.
Eu tinha visto todos. Meu pai, minha mãe e meu irmão. Meu pai nem sabia que eu era eu, minha mãe mostrou-se provavelmente arrependida e Cauã não explicitou nenhum sentimento além de surpresa por me ver tão de repente. Eu estava triste.
Triste e extremamente irritado. A minha garganta estava quase explodindo de tanta coisa que eu tinha pra falar para aquelas três pessoas e eu não podia fazer nada.
Isso me deixou amargurado, me deixou angustiado. Eu queria falar, queria soltar tudo o que estava preso e não conseguia, mas ao mesmo tempo algo dentro de mim pedia para eu ter calma e falava que o momento de conversar chegaria.

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Mas quando isso ia acontecer? Quando eu ia falar com minha mãe e com meu irmão? Com meu pai eu não falaria, a não ser que ele se metesse a engraçadinho pra cima de mim!
Não sei por quanto tempo eu fiquei sentado na mesa do restaurante, chorando e pensando na época em que fui feliz ao lado deles. Se é que eu poderia chamar aquela época de feliz.
Claro que podia. Independente de qualquer coisa que tivesse acontecido no passado, eu tive meus momentos de felicidade ao lado do meu pai, da minha mãe e principalmente do meu irmão.
Acho que dentre os três, o Cauã era o que eu mais precisava fazer as pazes. A ligação que eu tinha com ele era tamanha que naquele momento ele era mais importante até que a minha mãe, porém menos importante que o Rods e o Bruno.
Não que Fátima não fosse importante para mim. Ela era, mas o Cauã era diferente porque com ele eu tinha uma ligação especial. E pra falar a verdade, depois do dia em que a minha mãe me renegou, eu não senti mais a mesma coisa por ela.
É claro que eu estava preocupado, mas a preocupação era apenas preocupação. Com o Cauã era diferente. Ele também me renegou, mas eu sentia a falta dele.
Eu não estava conseguindo organizar os meus pensamentos, muito menos os meus sentimentos. Eu estava confuso, estava inquieto comigo e com a minha família. E isso me deixou muito mais angustiado. Muito mais mesmo.
Foi difícil parar de chorar. Eu não cheguei a soluçar, nem a ficar desesperado como acontecera no passado. As lágrimas caíram em silêncio, mas em abundância. E foi ótimo, porque só assim eu consegui aliviar um pouco a raiva, a mágoa e a tristeza que estava sentindo naquele dia.
Saí da mesa e fui pro banheiro pra lavar o rosto e assoar o nariz, que já estava bem entupido. Eu me recompus dentro do toalete e só depois fui pagar a conta pra voltar pro hospital. Fiquei mais de três horas na rua.

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Quando voltei pro hospital a minha mãe já estava acordada e já tinha até almoçado. Ela estava sozinha, porque o Cauã tinha saído pra comer. Acho que eu acabei atrasando o almoço dele, mas não me importei. Eu precisava de um tempo pra mim.
- Filho... Filho... Pensei que não ia voltar...
- Eu fui almoçar.
- Mas você demorou muito...
Ela estava carente, coitada. Pelo que eu estava percebendo, ela queria que eu ficasse por perto o máximo de tempo possível e eu até poderia fazer isso, já que não sabia quando ia voltar para aquela cidade novamente.

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- Eu me perdi no tempo, mas aqui estou eu.
Minha mãe suspirou e fechou os olhos. Será que ela estava se sentindo mal?
- Sente-se bem?
- Sim. Eu estou bem.
- Que bom.
Ficamos sem assunto. Tínhamos tanta coisa pra falar e no fim das contas ficamos sem assunto porque não podíamos simplesmente resolver o nosso passado com ela naquela situação.
O jeito foi ficar calado, mexendo no celular para a hora passar. Ela ficou a maior parte do tempo com os olhos fechados e só falou comigo para me pedir um copo de água.
- Obrigada... Meu filho!
- De nada.
Novamente não consegui falar a palavra “mãe”. Pelo jeito aquela palavra não sairia nunca mais na minha boca. Ou seria questão de tempo?
Se eu demorei na rua, meu gêmeo demorou ainda mais. Ainda bem que eu não me importei com nada e não fiquei com remorso por ter ficado fora por um tempão. O filho da puta deve ter feito de propósito só para me irritar, mas ele não conseguiu causar nenhuma reação em mim.
- Meus dois filhos... Pertinho de mim... Como eu sonhei com esse momento...
Dona Fátima voltou a chorar e Cauã ficou todo irritado e preocupado com a nossa mãe. Eu também me preocupei, mas não fiz nada comparado ao que ele fez.
- Mãe, mãe... Quer parar de chorar, mãe? Vai fazer mal pra você e pros bebês... Mãe, se acalma!
Foi difícil a nossa mãe parar de chorar e mais uma vez ela teve que ir pro calmante. Será que seria assim durante todo o tempo em que eu ia ficar ali perto dela?
Depois que ela se acalmou e voltou a dormir, eu fiquei olhando pela janela do quarto e voltei a mergulhar nos meus pensamentos mais escuros e secretos.
Já estava anoitecendo e nada de chuva.
Pelo visto, a nuvem negra que eu vi no céu paulista mais cedo não era nada além de poluição.
A sensação de nostalgia voltou a tocar no meu peito e mais uma vez eu fiquei perdido na paisagem de Sampa City. Como era bom estar ali de novo depois de tanto tempo!
A cidade continuava a mesma, exatamente a mesma. Eu não conseguia encontrar nada de diferente desde a época que eu tinha saído de lá, 7 anos antes.
Vi os mesmos carros, os mesmos prédios, a mesma correria de sempre, o mesmo trânsito, as mesmas poucas árvores, a mesma poluição... São Paulo era a mesma, mas eu tinha mudado.
Eu e todos eles. Ninguém permanecia igual ao passado. O tempo deixou suas marcas na minha vida, na vida do meu irmão e na vida da minha mãe. Principalmente nela, acredito eu.
Continuei pensando em tudo, mas de repente senti uma mão tocar o meu ombro com muita suavidade. Eu me virei e o vi. Era ele. O que será que ele queria comigo?
- Podemos conversar?
Meu irmão estava sério. Foi a primeira vez que ele tocou em mim desde que nós nos vimos naquele mesmo dia, porém mais cedo. Sentir o toque dele no meu ombro foi bem difícil pra mim.
Conversar? O que ele queria falar comigo? Será que era algo referente ao passado? Será que ele queria pedir perdão?

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- Sobre? – eu ergui as sobrancelhas.
- Você sabe muito bem, Caio.

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Então era do passado. Cauã continuava sério e não parava de me fitar um segundo sequer. Eu fiquei surpreso com aquele convite. Confesso que não esperava por nada daquilo naquele momento.
- Eu não sei se é uma boa ideia.
- Vamos?! É rápido. Eu não vou tomar muito o seu tempo.
- Não, Cauã. Não quero falar sobre nada agora. Não vim pra isso. Eu vim ver a Fátima e só isso. Agora não é a hora.
- Eu sei disso, mas eu preciso te falar tudo o que está preso na minha garganta. Vamos? Por favor?
- Não. Eu tenho que ir, já está anoitecendo e eu quero sair antes que o seu pai chegue e me veja aqui.
- Ele não vai chegar agora. Ele nem deve ter saído do trabalho ainda!
Suspirei. Eu confesso que fiquei balançado. Soltar o que estava preso na minha goela seria maravilhoso, mas... Eu tinha medo.
Minha mãe acordou e começou a tossir. Nossa atenção foi desviada e ambos ficamos novamente ao lado dela. Ela estava com sede e pediu água.
- Aqui... – Cauã entregou o copo. – Bebe com cuidado...
Ele estava muito atencioso com a nossa mãe, mais atencioso do que eu poderia sonhar em toda a minha vida. O Cauã sempre foi muito ligado ao meu pai. Não que ele não fosse com a minha mãe, mas eu não imaginei que ele fosse ficar tão cuidadoso e preocupado com ela daquele jeito.
- Hã... Está meio tarde e eu... Tenho que ir – falei.
- Ah, filho... Já? – minha mãe ficou chateada. – Ainda é cedo...
- Não é não. Já está tarde e eu preciso descansar. Viajei muito em cima da hora e preciso recuperar o sono.
- Eu entendo, filho. Você volta amanhã, né? Por favor... Diz que você vai voltar... Diz que você não vai me abandonar, por favor...
Agora? Agora ela estava pedindo para eu ficar? Quando foi para ela me defender, quando foi para ela me proteger das garras asquerosas do meu pai ela não fez nada! E naquele momento ela estava pedindo para eu ficar?
- Olha, eu não deveria. Eu deveria voltar pra minha cidade, pra minha casa, pra minha rotina. Mas já que eu vim, eu vou ficar os 5 dias, pra não parecer mais ruim do que já devo parecer. Eu volto sim, não se preocupa. Amanhã de manhã eu volto.
Ela ficou calada e muito tensa com o que eu disse, mas eu fui obrigado a fazê-lo. Pra mim já era demais aguentar muita coisa calado. Eu precisava soltar um pouco do que estava sentindo, senão eu ficaria louco.
- Bom, melhoras pra você. Se cuida, viu? Não é pra ficar fazendo coisa errada. Obedeça aos médicos, tá bom? Prometo que amanhã eu volto.
- Sim... Obrigada, meu filho! Obrigada por ter vindo, por ter parado a sua vida por minha causa...
- De nada. Faça valer a pena. Tchau. Tchau, Cauã.
Ele não falou nada e tampouco ela se pronunciou. Eu abaixei os olhos, dei meia volta e me dirigi até a porta. Saí e eles continuaram mudos e sem reação. Acho que fui grosso demais com a minha mãe!
Eu respirei fundo algumas vezes seguidas e segui até a saída do hospital. Eu ainda permanecia com a mente confusa e com o coração perdido no meio de tantos sentimentos. Muita coisa tinha acontecido só naquele dia e eu jamais poderia sonhar que a minha volta pra São Paulo seria tão cheia de emoções como estava sendo...
Eu estava quase passando a porta pra chegar na calçada quando ouvi a voz do meu irmão me chamando. Eu virei e vi que ele estava indo na minha direção e com cara de pouquíssimos amigos:
- O que foi? Eu tenho que ir.
- Escuta aqui, moleque... – meu irmão estava bravo. – Vê muito bem o jeito que você fala com a minha mãe, entendeu?
Eu entreabri meus lábios. Quer dizer que ele ia se meter a gostosão pra cima de mim?
- Ela está doente, ela está entre a vida e a morte e ela não pode passar por emoções fortes!
- Eu sei! Eu sei disso, meu querido! Eu vi, eu fiquei aqui o dia todo se é que você não percebeu.
Nós estávamos na calçada, bem na entrada do hospital.
- Então se você viu você tem noção do quanto ela está precisando de cuidados. Vê se tem bom senso e toma cuidado com o que você fala!
- Escuta aqui, Cauã, eu não vou perder o meu tempo discutindo com você não. Primeiro de tudo: eu não sou obrigado a concordar com tudo calado. Eu tenho muita coisa presa aqui na minha garganta pra falar pra ela e eu não aguentei ela pedindo para eu não abandoná-la!
- Ei, fala baixo!
- Fala baixo é o caralho! Eu estou me segurando pra não falar mais alto. Eu não sou obrigado a concordar com o que ela disse. Depois de 7 anos vocês me ligaram e só me ligaram porque ela está aí numa cama de hospital. Se não fosse por isso, nem lembrariam que eu existo!!!
- Fala baixo!
- Cala a boca que eu ainda não acabei! Eu não vou tolerar que vocês pisem em cima de mim de novo, entendeu? Não vou! Agora eu sou obrigado a sair de casa e ela não me estende a mão no momento em que eu mais preciso dela e agora ela fica aí, toda carente pedindo para eu ficar? Se eu fosse outro eu nem teria vindo, meu querido! Se liga, vê se pensa um pouco!
- Caio, ela está morrendo!
- Ela não está morrendo porcaria nenhuma! A médica mesmo disse que ela vai sair dessa caso se cuide e ela está se cuidando. Vocês queriam que eu viesse, aqui estou eu, mas não me peçam pra ser bonzinho com ninguém porque eu não vou ser. Eu estou com muita coisa presa e eu não sou de ferro, Cauã, eu sou de carne e osso. Se pisar no meu calo, se falarem algo que eu não gostar, eu não vou aguentar calado. Eu sei que ela está sofrendo com essa gravidez, eu já entendi, mas eu não sou obrigado a aguentar tudo calado. E se você não tem mais nada pra me falar eu vou embora porque eu quero descansar. Já estou cansado de ter ficado o dia inteiro nesse hospital.
- Eu só quero que você pense um pouco nela, só isso!
- E ela pensou em mim por acaso? Você pensou em mim por acaso? Não, não pensaram. Então não me peçam o impossível. Eu tenho um coração aqui dentro de mim, se é que vocês não sabem. Eu não sou uma máquina, eu sou um ser humano e mereço respeito e isso ninguém teve comigo naquela época.
- Você mesmo disse que não queria falar sobre isso agora.
- É, só que eu estou quase explodindo. Se eu não falar é capaz que eu tenha um enfarto. Eu vou sim respeitar a sua mãe...
- Nossa mãe!
- SUA mãe, porque eu não posso chamar aquela senhora de mãe, não depois dela ter me negado um abraço. Um abraço, eu só queria um abraço, você entende o que é isso?
- Calma, Caio... Vamos conversar...
- A gente já está conversando e não vem me pedir calma. Eu não vou ter calma. O meu limite começa onde o de vocês termina. Eu vim, eu estou aqui, mas eu tomaria muito cuidado se fosse vocês, porque eu não sou mais o mesmo idiotinha de 7 anos atrás.
- Calma, Caio... Você está muito nervoso...
- E como você queria que eu estivesse? Queria que eu tivesse trazido flores? Presentinhos? Que eu viesse e desse um abraço em cada um como se nada tivesse acontecido? Ah. Faça-me o favor!!! Agora dá licença que eu tenho que ir embora. Amanhã eu volto e acho que a gente se vê, Cauã. Boa noite pra você e passar muito bem.
Nesse momento eu me virei, mas parei imediatamente. As minhas pernas travaram totalmente quando eu vi o meu pai vindo em nossa direção.
E quando ele percebeu que eu e meu irmão gêmeo estávamos juntos, ele também parou.
Parou e me olhou. Parou e olhou para o meu irmão. Meu pai ficou estático, assim como eu fiquei. Ele desviava os olhos de um para o outro. Eu fiquei tenso, muito tenso. O que será que ia acontecer naquele momento? Como será que o meu pai ia reagir por ter percebido que eu estava de volta, depois de 7 anos que ele me expulsara de casa?

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Um comentário:

Unknown disse...

Caio pq você parou na melhor parte? Ai sem or #ansioso