terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Capítulo 81

O
s olhos de todos os meus amigos se voltaram contra mim.
Eu não estava mais conseguindo disfarçar a minha tensão e precisava dar um jeito dos amigos do meu irmão gêmeo não me encontrarem naquele lugar...



- Está tudo bem? – Gabriel ergueu as sobrancelhas e ficou com ar de preocupado.
- Troca de lugar comigo!
- O quê? – ele fez cara de interrogação.
- Troca de lugar comigo, já disse!
- Por quê?
- Troca logo e não me faz perguntas, Gabriel!
Ele levantou sem entender nada e atendeu o meu pedido. Eu precisava ficar no lugar dele porque iria ficar de costas pro grupo do Cauã e assim não correria o risco deles perceberem a minha presença no interior daquele estabelecimento comercial.
- Será que dá pra explicar o que está acontecendo, porra? – Janaína interveio e esbravejou de uma vez só.
Eu estava nervoso. As minhas mãos ainda tremiam. Seria coincidência demais encontrar meu gêmeo naquele lugar. Isso não poderia acontecer, não naquele momento.



- Estão vendo aqueles garotos que estão na mesa que está mais longe da nossa?
- Hã? O que é que tem?
- Eles são os amigos do meu irmão, não quero que me vejam aqui!
Pronto! Eu ia ficar o resto da noite preocupado.
- E por que não? – perguntou Alexia.
- Pelo simples fato que a minha família não pode saber que eu estou aqui, Alexia!
- E por que eles não podem saber que você está aqui? Isso é esquisito demais pro meu gosto!
- É mesmo, Caio! Por que eles não podem saber? – perguntou Gabriel.
- Eu sempre quis saber dessa história também – falou Janaína.
- Abre o jogo, Caio! O que você esconde da gente? O que tem de errado no seu passado? Por que você teve que sair de São Paulo e por que a sua família não pode saber que você está aqui? – Alexia me bombardeou de perguntas.
Fiquei sufocado com tantos questionamentos. Eu não podia falar a verdade para eles, não naquele lugar, nem naquela circunstância!
- É algo... particular! Eu não posso falar...
- Não confia na gente por acaso? – Janaína perguntou.
- Confiar eu confio, só não posso explicar ainda. Tentem entender, por favor...
Naquele exato momento eu percebi que mais cedo ou mais tarde, eu teria de abrir o jogo com eles. E também com os caras da república. É como diz aquele velho ditado: “A verdade sempre aparece”.




- Hoje você está muito estranho, Caio – comentou Alexia. – Primeiro entrou em contradição, agora vem com essa que sua família não pode saber que você está aqui... Tem algo de muito errado nisso tudo!
- Eu não entrei em contradição – fiquei nervoso. – Só não consegui me expressar direito. E eu não quero mais falar sobre a minha família, pode ser?
- Não, não pode – ela estava brava. – Eu odeio essas criancices.
- Não é criancice, Alexia! Eu tenho problemas com meus pais e com meu irmão e não quero falar sobre isso! Será que é pedir demais para vocês não tocarem mais nesse assunto? Já estou tenso com esses moleques aqui e vocês ainda ficam me atolando de perguntas!!!
- Nós somos seus amigos, se é que você não percebeu. Só queremos te ajudar – disse Janaína.
- Você está sendo injusto com a gente – completou Gabriel. – Nós só queremos o seu bem.
- Se querem tanto o meu bem, me deixem na minha. Eu não quero mesmo falar sobre isso. Dói só de relembrar tudo o que aconteceu.
- Deve ter sido algo bem grave mesmo, né Caio? – Janaína insistiu no assunto. – Eu nunca te vi assim antes.
- Foi grave sim, muito grave pelo menos pra mim. Depende do ponto de vista. Por favor, podem mudar de assunto?
- Melhor a gente ir embora daqui – disse Alexia. – Pra mim já deu!
- Ótima ideia – concordei e senti meu coração bater aliviado. – Isso é tudo o que eu quero também.
- Então esperem aí que eu vou pagar a conta – falou Gabriel.
- Nós combinamos que íamos rachar, lembra? – comentou Janaína.
- Eu pago aqui e vocês me dão depois. O Caio está com pulga na cueca e quer ir embora!
Eu queria ir embora mesmo. Ficar naquele lugar só ia me deixar irritadiço e preocupado.
- Estou chateada com você, viu? – falou Alexia.
- Sinto muito! Eu não fiz nada demais. Simplesmente não posso abrir a minha vida assim  do nada.
- Você fala como se nós fossemos duas estranhas, Caio – Janaína me repreendeu.
- Sei que não são estranhas, meninas, mas tentem entender que eu tenho que ter a minha particularidade, minha privacidade. Confio demais em vocês duas, amo vocês de paixão, mas ainda não me sinto pronto para falar sobre o meu passado! Entendem? Não é questão de falta de confiança nem nada parecido; é a minha intimidade e eu tenho direito de preservá-la.
- Nâo te conto mais nada à partir de hoje – Alexia estava bem séria.
- Depois eu é que sou criança, né? Você que está sendo imatura.
- - Chega de briga! Nós vamos embora, os amigos do seu irmão não vão te ver e vai dar tudo certo – falou Janaína.
- Obrigado, Jana!
Enquanto o Gabriel não apareceu, eu fiquei com meus ouvidos bem abertos. Como disse, conseguia ouvir direitinho o que eles estavam falando, porque o tom de voz deles estava bem elevado.
- Alguém liga pro Cauã? – falou um deles.
Eu arregalei meus olhos e meu coração foi parar na garganta! Meu irmão...


- Cauã é seu irmão, não é? – indagou Janaína.
- Sim.
- Cauã? – era outra voz dessa vez. – E aí, cara? Onde você está? Nós estamos te esperando aqui...
Pausa. Eu consegui ouvir os batimentos do meu coração dentro da minha cabeça. Fazia tempo que não ficava tão tenso como naquela noite.
- Ah, já está chegando? Beleza então, a gente te espera aqui. Abraço!
- A gente precisa ir embora daqui... – eu me mexi na cadeira e encostei minha testa nos braços que estavam em cima da mesa.
- Calma! – Janaína me tranquilizou. – O Gabo já está chegando.
- Vamos? – meu amigo falou depois de um segundo.
- Vamos! – dei um pulo da cadeira e passei na frente de todos eles. Não queria trombar com meu irmão, não queria mesmo!
- Nossa, ele está mesmo com medo – comentou Gabriel.
- Frescura – ouvi a Alexia cochichando com eles.
Frescura? Queria ver ela ter passado por tudo o que eu passei! A única coisa que eu queria, era evitar mais uma humilhação em público, porque eu tinha certeza que se eu encontrasse com o Cauã, isso seria a primeira coisa que ele iria fazer!
- Espera a gente, Caio – Janaína me puxou pelo braço.
- Vamos embora, por favor?
- Calma, não precisa correr! Já estamos fora do bar...



Alexia e Gabriel estavam distantes e andavam sem muita pressa. Será que eles estavam fazendo de propósito?
- Acho que agora não tem mais perigo – soltei todo o ar que estava dentro dos meus pulmões pela boca. Que alívio!
- Depois eu quero falar com você, viu mocinho? – ela acariciou o meu rosto bem de leve.
- Prometo que vou contar tudo, Jana! Prometo, confia em mim. Eu tenho um motivo muito forte para não querer encontrar com o Cauã!
- Eu acredito em você, bebê! Fica tranquilo, tá?
- Jà estou mais calmo, de verdade.
- Que bom. Não gosto de te ver assim, sabia?
- Obrigado! Eu gosto muito de você.
- Também, amigo. Eu te amo!
- Obrigado, Jana! Também te amo.
- Cadê o desespero? – sondou Alexia. – Só faltou tirar o pai da forca e agora está aí, todo relaxado!
- Qual a parte você não entendeu que eu não quero encontrar com os amigos do meu irmão? Eles estão aqui por acaso? Não! Então não preciso mais ficar nervoso.
- Quanta criancice.
- Alexia, cala a boca. Eu sei da minha vida, então fica na tua e me deixa em paz!
- Sem brigas, meninos – Janaína segurou na minha mão e entrelaçou os dedos nos meus. – Essa discussão não vai adiantar de nada. O melhor que temos a fazer é ir pro hotel, dormir e esquecer tudo o que aconteceu.



E foi o que fizemos. Chegamos no hotel por volta das 2 da madrugada e cada um foi pro seu respectivo quarto. Alexia e eu não nos falamos mais pelo resto da noite.



Como estava de folga no sábado, pude acordar a hora que quis. Não me importei em perder o café da manhã, tudo o que eu queria naquele dia era descansar e colocar a minha cabeça no lugar.
Acordei e percebi que o Gabriel não estava no quarto. Será que estava nas meninas? Liguei no ramal delas, mas ninguém atendeu. Onde será que eles estavam?
Levantei, tomei banho, escovei meus dentes, me arrumei e fiquei sem saber o que fazer. Não tinha telefone pra ligar para um deles, não sabia onde eles estavam, nem o que estavam fazendo. Fiquei me sentindo extremamente solitário. Aquilo tudo seria raiva pelo que havia acontecido na noite anterior?
Minha única opção foi entrar na internet e caçar o que fazer. Quando abri o notebook, me deparei com um papel dobrado e fiquei me perguntando o que seria aquilo.
“Nós fomos pra piscina. Gabriel.”
Ah, então era essa a chave do mistério! Eles estavam na piscina... Mas, onde ficava a piscina? Dei de ombros e não quis procurá-los. O melhor que eu tinha a fazer, era mexer na internet e ficar tranquilo. Mais cedo ou mais tarde eles iriam aparecer.


Menos de meia hora depois que comecei a teclar com o Vinícius pelo Messenger, a minha fome apertou. Eu precisava urgentemente de comida; afinal, não havia me alimentado durante toda a manhã.
Me despedi do meu amigão, fechei o note, peguei meu VR, o cartão da porta do meu quarto e saí em busca do que comer.







Como eu já conhecia a região, não tive dificuldade em localizar um bom restaurante. Pedi um marmitex de bife com batatas fritas e automaticamente me lembrei de quando cheguei no Rio de Janeiro. O marmitex era praticamente idêntico ao que eu comia na Cidade Maravilhosa!
- Me vê uma latinha de Coca-Cola, por favor.
- Quer garfo e faca? – perguntou o cara.
- Por favor!!!
Ainda bem que ele ofereceu, eu nem tinha pensado em pedir. Queria ver como ia comer depois!
- Obrigado, moço – eu peguei meu cartão e a 2ª via do comprovante que saiu da maquininha de débito, dei meia volta e saí do restaurante. Fazia um dia lindo de sol, mas eu tinha certeza que ia chover novamente.
Comi sem preocupação enquanto assistia televisão. Antes de terminar o almoço, Gabriel chegou e se surpreendeu com o que eu estava fazendo.
- Comendo na cama, Caio?
- Qual o problema?
- Onde você arranjou essa comida?
- Em um restaurante aqui perto!
- Poxa vida, nem me esperou, né? Estou morrendo de fome!
O cara estava com o cabelo todo molhado. Eu precisava saber onde era a piscina...
- Não sabia que horas vocês iam voltar, não sei onde é essa piscina e não aguentei de fome, mas se quiser eu te levo lá pra você comprar um marmitex também.
- Claro que eu quero! É muito longe daqui?
- 10 minutos andando.
- Ah, tranquilo! Vou esperar você terminar de comer então.
- Já terminei. Já podemos ir se você quiser. Assim eu aproveito e jogo isso fora.
- É caro?
- Que nada, baratinho. Liga para as meninas e vê se elas vão querer também.
- Acho que vão sim.
Não deu outra! Cada um escolheu o que queria comer e em seguida nós voltamos pro hotel.
- Até quando você vai ficar com essa cara de bunda, Alexia? – não aguentei mais e desabafei.
- Até quando eu quiser – ela foi estúpida.
- Não liga, Caio. Ela está com TPM.
- Problema é dela! Não tenho nada a ver com a TPM dela.
- Você foi um grosso ontem comigo!
- Eu? Imagina! Não fui grosso em momento algum. Só falei a verdade. Quando eu quiser e me sentir pronto, eu vou contar tudo pra você. É só você esperar!
Ela não falou mais nada e despareceu rapidamente quando o elevador abriu a porta.
- Também estou curioso para saber o que aconteceu, Caio – Gabriel comentou.
- Eu te conto também, mas só quando eu estiver pronto.
- Se precisar de algo, sabe que pode contar comigo!
- E vice-versa!



Fiquei o dia todo falando com o Vini. Ele era um tremendo de um palhaço! O cara teve a cara de pau de ligar a webcam e ficar se exibindo pra mim!
- Dá pra parar de fazer careta? – dei risada.
- É que é muito ruim ficar olhando pra sua cara feia.
- Cala a boca, hein? Você aproveita porque eu estou longe, né?
- Claro! Quando volta mesmo?
- Daqui duas semanas.
- Já?! Tão rápido assim?
- Quer mesmo me ver longe, né?
- Claro que não, idiota. Não lembrava quanto tempo era seu treinamento.
- 21 dias. Já se passaram 5, faltam 16.
- Logo, logo você está de volta então.
- Se Deus quiser!
Eu quase caí da cadeira, tamanho foi o meu susto quando eu ouvi o barulho do trovão.
- O que foi isso, Caio? – ele gargalhou.
- Um trovão! Você ouviu?
- Ouvi sim. Parece até o fim do mundo, que horror.
- Vem pra cá, Vini! Você vai gostar da chuva.
- Tô fora!
- E aí no Rio? Tem chovido?
- Um pouco. Choveu quase a semana inteira.
- Danou-se.
Eu ouvi a voz do Rodrigo e fiquei contente em poder falar com meu amigo. Ele deu um empurrão no Vinícius, sentou na frente do computador e disse:
- Como você está?
- Bem e você?
- Bem também. Já aprontou muito aí?
- Claro que não, você sabe que eu sou um santo!
- Deixa os santos saberem disso. Deixa eu te falar, eu te inscrevi no Enem, viu?
- Você o quê?!
- Te inscrevi no Enem – Rodrigo repetiu.
- Como assim, Rodrigo? Com autorização de quem? Posso saber?
- Com a minha autorização! Você vai estudar ano que vem ou eu não me chamo Rodrigo!
- Calma aí, como você me inscreveu? Você tem meus dados por acaso?
- Você é tão inteligente, Caio, que deixou um monte de xérox dos seus documentos comigo. Lembra?
- Ah, é! Mas por que você fez isso? Eu não quero fazer Enem não! Já me basta o do ano passado...
- Não perguntei se você quer fazer, eu estou falando que você vai fazer!
- Você não pode simplesmente decidir isso por mim, garoto.
- Só estou fazendo isso pro seu bem! Você vai fazer a prova, vai tirar nota boa, vai conseguir uma bolsa e vai fazer faculdade.
- Não estou  nem um pouco interessado em faculdade, não nesse momento.
- Mas você precisa, Caio! Você precisa estudar, precisa ocupar sua mente.
- Já ocupo a minha mente demais com meu trabalho e meus problemas!
- Justamente por isso que você tem que ocupar mais a sua mente. Vai estudar sim; se quiser ser alguém na vida vai ter que estudar e estudar muito!
Eu suspirei. Ele era decidido demais pro meu gosto.
- E quando é a prova?
- Final de agosto – ele respondeu.
- Ah, tá! Bem na época do meu aniversário? Até parece que eu vou fazer essa prova!
- Ah, vai sim! E se eu fosse você, começava a estudar desde já. Não aceito menos que uma bolsa integral no ProUni!
- Às vezes eu tenho a impressão que você é meu pai, sabia?
- Bem que poderia ser, te garanto que eu não teria feito o que o seu pai de verdade fez com você. E eu já disse mil vezes que sou seu irmão mais velho.
- Nós somos – corrigiu Vinícius.
- Você ainda está aí, Vini? – perguntei.
- Claro, o quarto é meu – ele riu.
- Ah, é! Você viu o que o Rodrigo aprontou?
- Vi e eu assino embaixo. Ano que vem você vai entrar na faculdade!
- Eu mereço... Se já não me bastasse um, agora são dois!
- O que seria de você sem a gente? – Rodrigo sorriu.
- Sinceramente? – perguntei. – NADA!
Outro trovão rugiu no céu de São Paulo e eu achei melhor desligar o notebook, mas os meninos continuaram falando comigo e retardaram a minha saída da internet.
- Eu preciso desligar, caralho – falei pela milésima vez.
A porta do quarto foi aberta e o Gabriel entrou nos nossos aposentos. Ele parecia um pouco incomodado.
- Caio, vou tomar banho e já volto.
- Uhum.
- Quem está aí? – perguntou Vinícius.
- O Gabriel.
- Ah, sim! Manda um abraço pra ele.
- Pode deixar. Começou a chover. Eu preciso desligar, se meu note queimar vocês vão comprar outro.
- Não deixa ele queimar não, Caio. Ele está me fazendo muita falta! – exclamou Rodrigo.
- Cara de pau! Depois a gente se fala melhor. Cuidem-se. Até mais!
- Juízo – eles falaram ao mesmo tempo.
- É meu sobrenome!
E assim eu me despesdi. O Rodrigo era doido, só podia! Como ele teve a capacidade de me inscrever no Enem sem falar comigo antes?
Eu estava certo quando pensei que aos poucos o Gabo estava se soltando comigo. Primeiro, ele só aparecia de roupa na minha frente; depois, já conseguiu ficar sem camisa e naquele momento, me surgiu apenas de cueca branca...
O que era aquilo? Seria um sonho? Uma miragem? Aquilo estava mesmo acontecendo? Eu não consegui tirar meus olhos do volume na cueca dele. Ou eu estava ficando míope, ou o negócio era um tanto quanto... Pequeno?!
- Caio, me faz um favor?
- Diga?
- Você pode passar creme nas minhas costas? Acho que vou descascar por causa do sol...


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