sábado, 24 de janeiro de 2015

Capítulo 90

E
u não sabia o que pensar, nem se devia corresponder àquele beijo.


Embora eu desconfiasse que ele estava a fim de ficar comigo, jamais imaginei que o cara tivesse tanta atitude daquele jeito.
Foi um beijo simples, mas aparentemente cheio de sentimento; pelo menos da parte dele. Ele acariciou a minha nuca com a mão direita, ao mesmo tempo que deslizou a esquerda pelas minhas costas.
Quando nos separamos, eu fiquei sem saber o que fazer. Uni meus lábios e continuei sentindo o sabor daquele beijo por mais alguns segundos.
- É... – ele tentou falar alguma coisa, mas não conseguiu.
Eu também não falei nada. Acho que não tinha nada para ser dito naquele momento. Eu só estava surpreso, nada mais.
- Bom, acho que já vou indo... – ele levantou da cama de chofre.
- Já?
- Sim...
- É cedo, fica mais um pouco – eu olhei nos olhos dele e segurei em sua mão direita.
- Não sei se devo...
- Por que não? Não gostou?
- Gostei, claro que gostei... Mas é que...
- Posso te fazer uma pergunta?
- Pode...
- Como você sabia? – estava curioso.
- Como eu sabia o quê?! – Carlos não entendeu a minha pergunta,
- Como você sabia que eu curto?
- Ah! Eu te vi na boate GLS lá no Rio!
- Me viu? – me choquei com aquela afirmação.
- Várias vezes...
- Várias vezes?
- É que eu trabalhava lá, sabe?
- Ah, é? Sério mesmo?
- É sim – ele assentiu com a cabeça. – Nunca me viu lá?
- Sinceramente não – falei. – Não que me lembre.



- Desde a primeira vez que eu te vi, estou com vontade de ficar com você... – as bochechas do garoto ficaram vermelhas.
- É? – também fiquei com vergonha.
- Uhum. Você é lindinho!
- Valeu... – fiquei ainda mais constrangido.
- E quando te vi saindo da loja, fiquei encantado. Acho que é o destino, sei lá...
- Também gostei de você desde o começo. Seu sorriso me fascina, sabia?
- Ah, é? – ele sorriu.
- É sim. E se eu soubesse que seu beijo é tão bom, teria tomado iniciativa há muito tempo!
Ele sentou novamente ao meu lado e não foi necessário falar mais nada. nossos lábios se uniram novamente e eu me senti no paraíso. Fazia muito tempo que eu não me sentia bem daquele jeito.
Foram vários beijos. Um melhor do que o outro. Depois de um tempo, ele me deitou na cama e subiu em cima de mim. Eu senti meu coração disparar e fiquei completamente sem ar. Não seria cedo demais para aquilo?
- O que foi? Você não quer?
- Querer eu quero, mas aqui?
- Onde mais? Quer um lugar melhor que esse?
- Seria perfeito, Carlos, mas o Gabriel pode chegar a qualquer momento.
- Hum... Eu não tinha pensado nisso.
- Melhor a gente se conter, beleza?
- Então me dá mais um beijo, vai?
- Só um? – abri um sorriso.
Ele beijava muito bem. Além de bonitinho, o carinha era carinhoso demais. Um verdadeiro cavalheiro, um gentleman!
Eu queria saber quanto tempo faltava pro Gabriel voltar. Se ele entrasse e nos visse naquela situação, com certeza ficaria contra mim e eu não queria que aquilo acontecesse.
- É melhor a gente parar – falei depois de pouco tempo. – O Gabriel já deve estar voltando.
- Como você sabe?
- Eu não sei, mas acho que ele já está para chegar.
- Nâo quero parar de te beijar, Caio!
- Nunca imaginei que você fosse gay, Carlos...
- Sei disfarçar muito bem os meus interesses.
- Percebi!
- Acho que o Gabriel não chega agora...




Mas ele chegou. O meu amigo abriu a porta e entrou já sem camiseta, totalmente suado e com cara de cansaço.
- Opa... – o bombadão nos cumprimentou.
- Já vou indo, Caio – falou Carlos Henrique.
- O que é isso? Já vai só porque eu cheguei? – Gabo perguntou. – Pode ficar à vontade aí, cara.
- Não, não é porque você chegou. Já usei a internet... Tenho que ir agora...
- Beleza, Carlos. A gente se fala – fitei aqueles olhos expressivos.
- Uhum. Até mais e obrigado por ter me deixado usar o lap.
- Por nada.
Ele saiu rapidinho e nem tivemos tempo de nos despedir. Quando eu fechei a porta, fiquei encostado nela, pensando em tudo o que tinha acontecido. Será que era uma nova fase que estava iniciando na minha vida?
- Pode passar aquele creme nas minhas costas de novo? – perguntou Gabriel.
- Posso. Queimou no sol de novo?
- Que sol? E aqui faz sol por acaso? Está quase nevando lá fora!
- Você e a Janaína podem dar as mãos e sair andando. Hoje nem está fazendo frio!
- Imagina se estivesse. Onde está minha Alexia que não atende o telefone?
- Ela saiu com a Jana. Foram passear, mas não me pergunte onde foram.
- Como assim? E ela não me fala nada?
- Aí você tem que se entender com ela, meu querido.
- Vou tomar um banho e mais tarde ela vai se ver comigo.




Revirei meus olhos e resolvi mexer na internet. Quem sabe o Rodrigo estava online pra gente conversar um pouco?
E não é que ele estava mesmo?
- Não trabalha mais não? – perguntei quando ele apareceu na webcam, mais uma vez sem camiseta.
- Trabalhar pra quê? Isso cansa!
- E aí, como estão as coisas?
- Tudo em ordem e com você?
- Tudo indo. Tive uns problemas com minha mãe.
- Que problemas?
- Não posso explicar por aqui.
- Tem gente aí?
- Tem.
- Coloca o fone de ouvido que eu vou falando com você então, não quero que ninguém nos escute.
- Mas eu não vou poder falar, oras.
- Mas você pode digitar. Ou não?
- Ah, é mesmo...
- Às vezes você é mais sonso que uma ameba, Caio.
- Obrigado pela parte que me toca.
- Onde você vai? Vai me abandonar aqui? Vai me deixar falando com essa parede branca aí? EI, VOLTA AQUI!
- Calma, seu carente. Eu vou roubar o fone de ouvido do Gabriel!
- Ah! Mas não demora, to com saudades de você!



Fui até o criado mudo e peguei o fone que estava no celular do meu amigo. Ele estava cantarolando enquanto tomava banho e eu nem me preocupei em pedir emprestado. Será que ia ter problema?
- Pronto – voltei e encaixei o fone no local correspondente.
- Está me ouvindo? – meu amigo perguntou.
- Perfeitamente. Que sotaque carioca é esse?
- Eu moro no Rio, esqueceu?
- Mas é Paranaense! E você não tinha sotaque até eu sair daí. Bom, só um pouquinho.
- Deixa meu falso sotaque em paz e me conta o que houve com a sua mãe?
- Prepare-se.
Enquanto eu digitei, ele ficou calado, mas fez caras e bocas. Meu amigo estava tão lindinho que me deu uma vontade louca de ultrapassar a tela do meu notebook e abraçá-lo bem forte.
Depois que eu coloquei o ponto final, ele falou o que achava daquela história e é claro que ele ficou do meu lado:



- Não importa o que aconteça daqui pra frente, o que importa de verdade é que você fez a sua parte, você tentou. Ela não pode reclamar de nada, você deu o primeiro passo. Eu estou orgulhoso de você!
Perguntei o motivo.
- Porque você teve coragem e iniciativa. Você deu o primeiro passo, engoliu o orgulho e foi atrás da sua mãe. Eu sei o quanto ela te fazia falta. Eu sei disso. E me sinto orgulhoso por você ter tentado quebrar esse gelo, esse abismo que existe entre vocês dois. Parabéns!
Gabriel abriu a porta e como de costume, estava só de cueca. Por que ele não ficava peladinho na minha frente, hein?
- Pode fazer aquela parada agora, por favor? – perguntou o bonitão.
- Uhum. Já volto, Digow.
- O que você vai fazer...?
Nem tive tempo de responder meu amigo. Coloquei o fone em cima da mesa, levantei e fui atrás do Gabriel.
- Não passa muito não, beleza?
- Pode deixar.
A pele dele estava quente como se tivesse ficado debaixo do sol o dia inteiro.
- Está com febre, meu filho?
- Não, por quê?!
- Está quente...
- Estou vivo, porra. Queria que eu fosse gelado?
Abri um sorriso. Não precisava ser grosso daquele jeito.
Enquanto passei o creme, obviamente dei uma conferida em todo o material. Ele não tinha nada fora do lugar, era impressionante como o corpo era em forma. Em forma até demais, diga-se de passagem.
- Só não deixa cair na minha bunda, moleque.
Bem que eu poderia deixar mesmo. Ia ser delicioso sentir aquelas nádegas...
- Já tá bom, moleque – ele se mexeu.
- Ainda não absorveu tudo, tá tudo branco.
- Que merda é essa? Só passo porque ainda está seca demais, senão...
- Estranho a pele das suas costas ser seca. Normalmente essa parte do corpo é oleosa...
- Minha pele nunca foi oleosa. Graças a Deus não sofri com espinhas.
- Eu também não sofri muito não. Mas isso porquê eu tive uma alimentação bem balanceada.
- Falou, nutricionista!
- É verdade, eu sempre cuidei da minha estética. Embora não pareça!
- Não parece mesmo, nem treinar você vai.
- Quando eu voltar pro Rio eu volto pra academia. Lá onde eu fazia antes, quero continuar com o Felipe.
- Tô ligado.
- Pronto, agora foi.
- Valeu, mano. Você é muito gentil.
- Dez reais. Estou anotando.
- Te pago tudo no final do ano.
- Onde é que você estava? – Rodrigo parecia entediado.
Expliquei que fui passar hidratante nas costas do meu amigo e ele começou a rir feito um desvairado.
- Do que está rindo? – perguntei.
- Caio, vou comprar comida, beleza?
- Beleza, Gabo.
- Quer alguma coisa?
- Quero, pode comprar pra mim também?
- Posso. O que você quer?
- Qualquer coisa que não seja peixe.
- Você e essa sua mania de não comer peixe. E ainda fala que tem uma alimentação balanceada.
- Odeio peixe – fiz cara de nojo.
- Fresco! Já volto.
- Falou.
- Quem é esse tal de Gabo mesmo? – Rodrigo perguntou, com cara de irritado.
- É o cara que divide quarto comigo. Meu amigo, pô.
- E você estava passando creminho nas costas dele?
- Aham... Qual o problema?
- É amigo mesmo, Caio? – ele abriu aquele sorriso que eu já conhecia de cor e salteado.
- É sim, ele não curte. Infelizmente.
- Por que infelizmente? Já quer dar uns pegas?
- Certeza. Ia falar uma merda agora, mas como você também não curte, é melhor deixar quieto.
- To fora!!! Deixa eu com as minhas meninas mesmo.
- Como assim “suas meninas”? Desde quando você tem mais de uma?
- Desde que me entendo por gente – ele gargalhou.
- Até parece. Lesado do jeito que você é...
- Você que pensa que eu sou lesado. Eu só como quieto, pelas beiradas.
- Uhum, vou fingir que acredito. E os meninos, como estão?
- Todos bem!
- Alguma novidade por aí?
- Não, tudo na mesma. Muito sol, muita cerveja, muito trabalho na faculdade, provas chegando... Tudo na mesma!
- Manda um salve pra rapaziada. Daqui uns dias eu estou de volta.
- Que dia você chega?
- Não é da sua conta. Quero fazer surpresa.
- Fala logo? – ele ficou irritado.
- Não vou falar.
- Beleza, nem queria mesmo. Quem disse que eu ia te esperar no aeroporto?
- Você ia me esperar mesmo?
- Ia, mas já que você não vai falar a data...
- Você é foda! – eu sorri. – Mas nem ia adiantar, vai ter uma van da empresa nos esperando.
- Ah, é? Bom saber, pelo menos não perco meu tempo então.
- Quer dizer que ia ser perca de tempo me esperar?
- Ué. Quem está rejeitando a minha presença é você, meu querido!
- Até parece, sinto a sua falta.
- Não é o que parece. Mas volta logo, nós queremos comer seu bolo de chocolate.
- Querem é?
- Sim. O Vini e eu estávamos lembrando dele esses dias.
- Vou fazer pro Vini então.
- Pro Vini, filho da puta? E pra mim não?
- Não, você não merece! – brinquei.
- Depois dessa eu vou até me retirar, boa noite!
Dei risada porque ele fez um bico incrivelmente fofo!
- Brincadeira, seu sentimental.
- Já ouviu falar que toda brincadeira tem um fundo de verdade?
- Mas a minha não, é brincadeira mesmo. Sabe que eu te amo, né?
- Espero que você me ame apenas como amigo, hein? – ele sorriu.
- Adoraria te amar de outra forma, mas sei que é impossível!
- Ainda bem que você sabe.
- Se um dia mudar de ideia, lembra de mim aqui, hein?
- Pode ter certeza que nunca vou mudar de ideia – ainda bem que o Rodrigo levava minhas brincadeiras na esportiva.
- Que pena, você dá um belo caldo.
- Se liga, viado – ele deu um soco na tela do computador. – Me respeita!
- Não mesmo. Você está sozinho aí?
- Como sempre. Todos me abandonanm nessa casa!
- Como aguenta?
- Já me acostumei. Minha companhia é o computador, a televisão, os livros...
- Coragem! Precisa de um emprego.
- Estou procurando estágio, mas está difícil.
- Seus pais estão te bancando?
- Aham.
- Aí sim, hein? Isso que é família...
Nunca na vida que a minha família ia fazer o mesmo por mim!!!
- O que está fazendo aí?
- Nada – respondi. – E você?
- Vendo umas gatas aqui.
- Conta outra.
- Verdade.
- Onde?
- Na web, pô.
- Não sabia que você é do tipo de cara que fica em sala de bate-papo, Digow!
- Eu disse que estou no bate-papo? To vendo elas pelo MSN, Mané!
- Ah é, é? E onde as conheceu?
- Por aí, por aí.
- Por isso que você está sem camisa desse jeito?
- Também. E também por causa do calor.
- Não vai ficar pelado pra elas não, né?
- Não, não sou burro. Vai que alguma filma e coloca nesses sites aí. To fora!
- Ah, tá! Já ia te xingar.
- Mas então, voltando ao assunto da sua mãe, eu fiquei contente que você tenha tomado a iniciativa.
- Obrigado, mas de nada adiantou.
- Quem disse que não? E o sonho que você teve? Foi com Nossa Senhora, certeza!
- Você é o segundo que me fala isso, sabia?
- Quem mais te falou?
- A Janaína.
- Então é verdade, pô. Foi um recado pra você. E isso é lindo!
- Verdade. Se foi isso mesmo é realmente lindo.
- Você ainda tem dúvidas?
- Pior que não, Digow. Pior que não.
Era verdade. Eu já tinha certeza que aquele sonho não foi um sonho qualquer. E sabia que a protagonista era a Mãe de Jesus!
O bombadão abriu a porta com duas sacolas na mão direita. O cheiro de comida invadiu o quarto e minha barriga deu um pulo de ansiedade.
- Vou jantar, Digow. Daqui a pouco eu to aí pra gente trocar ideia.
- Beleza, vai lá e se cuida, firmeza?
- Pode deixar, você também.
Desliguei rapidinho e fui logo atrás do meu rango. O que será que ele havia comprado pra mim?
- O que você trouxe?
- Filé de peixe.
- Oi?
- Isso mesmo, vai aprender a comer peixe na marra!
- Só se for daqui a mil encarnações!
- É sério, eu trouxe isso mesmo!
- Se você trouxe isso mesmo eu vou jogar em cima da sua cabeça! – exclamei.
Mas é claro que ele estava brincando. O que ele trouxe, na verdade foi contra filé com fritas. Meu coração bateu aliviado.
- Isso sim é uma comida descente!




NA MANHÃ SEGUINTE...
Eu fui o primeiro a entrar na van e quando ele entrou, foi logo me olhando e dizendo:
- Bom dia!
- Bom dia – não me contive e abri um sorriso. – Tudo bom?
- Ótimo e você?
- Bem.
Foi um dia de troca de olhares muito intensos. Acho que até os meus amigos perceberam a clima que estava acontecendo entre nós dois.

NO OUTRO DIA...
Eram nada mais, nada menos que cem perguntas. E para piorar, para passar no treinamento e fazer parte da empresa, teríamos que acertar pelo menos 85% da prova e talvez aquilo não fosse tão fácil assim.
Só era liberado para o almoço quem terminasse a prova. A Nilva nos deu um tempo máximo de 6 horas para finalizá-la e isso era tempo suficiente.
Fiquei com meu pescoço doendo de tanto que fiquei olhando pra baixo, mas depois de 4 horas, eu finalmente consegui responder a última pergunta e pude relaxar um pouquinho.
- Boa sorte – minha instrutora olhou nos meus olhos. – E pode ir almoçar.
- Obrigado!



Fui o penúltimo a sair dentre os meus amigos. Só quem ficou para trás foi a Alexia, mas ela logo apareceu e nós pudemos comer em paz.
- Faz tempo que estão aqui?
- 20 minutos – falou Gabriel.
Ele e a Janaína saíram no mesmo momento, um atrás do outro.
- Eu cheguei não faz nem 5 minutos – falei.
- Onde vamos almoçar?
- Queria ir em um shopping – falou Janaína.
- Não acho que seja uma boa ideia, porque a gente pode se atrasar. É melhor a gente comer por aqui mesmo e no final do dia nós jantamos em algum lugar melhor para celebrar a nossa despedida.
- Boa ideia, Caio – Gabriel me apoiou.
Acabou que nós fomos em um restaurante de rua muito simpático e com a comida muito boa.
- Delícia de comida caseira – Alexia elogiou.
- Boa mesmo, principalmente essa batata frita aqui – falei.
- Cadê a alimentação balenceada? – Gabo riu.
- Cala a boca, hein?
Às 16 horas em ponto, a Nilva deixou a sala sozinha para corrigir as 25 provas. Ela deixou um filme de comédia rodando no projetor e a sala ficou numa gargalhada só.
Ela só voltou por volta das 17:20, com as provas nos braços e com uma baita expressão de cansaço no rosto.
- Gostaram do filme?
- Muito bom – a maioria falou.
- Já corrigi todas as provas, agora vou devolvê-las para vocês terem ciência das notas. Quem tirou abaixo de 85%, conversarei em particular amanhã.
Fiquei na expectativa. Qual teria sido a minha nota? Eu fui um dos últimos a receber porque estava no fundo da sala, bem longe do Carlos. Nesse dia nós quase não nos falamos.
- Caio... – ela entregou as sulfites e meu coração disparou. – Janaína...
Para passar, eu tinha que acertar pelo menos 85 perguntas. Achei uma meta um pouco exagerada, mas a empresa era bem rígida nesse quesito e não tivemos como argumentar.
Foi por pouco. Acertei 86. Meu coração bateu aliviado.
- Quantas? – perguntou Janaína.
- 86 e você?
- 91. Eu sou demais, fala aí?
- Menos, hein?
O casal estava um pouco distante da gente, portanto não tivemos como perguntar o resultado da prova deles, mas eu tinha certeza que eles haviam passado.
- Bom, então é isso – a Nilva suspirou. – Finalizamos o treinamento. Para quem atingiu a meta, meus parabéns e sejam bem-vindos. Para quem não atingiu, amanhã conversaremos.
Acordamos os últimos detalhes para a nossa festinha de despedida e em seguida ela nos liberou, mas como sempre, tivemos que esperar o horário para marcar o ponto.
- Finalmente vou poder voltar ao meu Rio de Janeiro – suspirou Janaína.
- Nem me fala, não aguento mais ficar sem praia – falou Gabriel.
- Falta pouco agora, o pior já passou – falei.
A sala que utilizamos para fazer a nossa festa não foi a mesma onde ficamos durante todo o treinamento. Ao invés das mesas com computadores, nos deparamos com uma mesa enorme, repleta de doces, salgados, refrigerantes, balas, guloseimas e um bolo de 5 quilos.
A luz não era a mesma. No centro do teto, havia um globo daqueles de balada, que jogava luzes coloridas por todos os lados e para finalizar, havia um som incrível, que já estava ligado em uma música muito animada.
- E aí, gostaram? – a mini-mulher perguntou com um sorriso nos lábios.
- Incrível – eu amei. – Ficou sensacional.
Naquele dia, não foi preciso almoçar, mas mesmo assim cumprimos nosso horário de almoço. Meus amigos e eu saímos da loja e fomos dar uma volta pela cidade, para finalizar o nosso último dia livre antes de voltar ao Rio de Janeiro.
Fomos até a igreja da Sé. Eu senti uma vontade tão grande de entrar que nem pensei duas vezes e deixei todo mundo pra trás.
- Espera aí, menino – Janaína saiu correndo atrás de mim.
Que igreja fenomenal. Imensa, linda e com uma baita arquitetura. Sem sombra de dúvidas, era a igreja mais bonita da minha cidade, quiçá do Brasil!
- Olha sua mãezinha ali, oh... – Janaína apontou discretamente com o dedo.
Meu coração até disparou e eu quase chorei de emoção. A imagem era muito parecida com a mulher que eu vi nos meus sonhos. Foi a prova dos nove para eu ter certeza que tinha mesmo sonhado com Ela...
Minha amiga e eu fizemos uma oração e eu agradeci por tudo ter dado certo, embora tivesse tido aquele contratempo com a minha mãe. Embora isso tenha me deixado muito pra baixo, a minha ida à São Paulo foi muito proveitosa. Conheci pessoas novas, tive a oportunidade de rever meus amigos, de rever meus familiares – mesmo sendo à distância –... Fazendo um balanço geral, a viagem foi boa.
- Vamos? – perguntei.
- Vamos! – ela concordou.
Quando saímos, os dois estavam agarrados e se beijando.
- Na frente da igreja? – Janaína puxou a orelha dos dois. – Que coisa mais feia. Vamos embora...
Quando a gente entregou o presente que compramos pra Nilva, ela caiu no choro. Nós descobrimos que ela era louca por cães e compramos um cachorro que respirava. Ela ficou muito emocionada.
Finalizamos o treinamento com um brinde de champanhe. Achei muito bacana a empresa ter liberado a bebida alcoolica, isso mostrava que ela confiava nos empregados que tinha.
- Tchau, Jana – a instrutora abraçou minha amiga. – Parabéns e boa sorte...
- Obrigada!
- Tchau, Caio – ela foi ao meu encontro com os braços abertos. – Bom retorno e tudo de bom pra você!
- Obrigado, Nilva. Obrigado mesmo!
- Tchau, Alexia... Boa sorte...
- Obrigada!
- Tchau, Gabriel... Boa sorte também...
- Obrigado, teacher.
Senti vontade de chorar. Eu estava muito emotivo pro meu gosto!
- Missão cumprida! – exclamou Janaína. – Agora é tocar o barco, né?
- Com certeza...
A Mary nos recepcionou para o encerramento da conta do hotel. Ela agradeceu pelo nosso comprometimento e disse que não recebeu nenhuma sinalização de mau comportamento por parte do hotel.




Nós entramos na van faltando 5 minutos para às 20h00. Nosso voo estava marcado para às 22h00, mas como poderíamos pegar trânsito, tivemos que sair mais cedo.
Assim como ocorreu na chegada, eu sentei na janela e fiquei olhando as ruas da minha cidade. Aos poucos São Paulo foi ficando pra trás e eu estava me perguntando quando eu iria voltar? Quando eu iria pisar de novo na “Terra da Garoa”?
- Sente-se bem? – ela deitou a cabeça no meu ombro.
- Não sei – senti um nó enorme na garganta. – É a minha cidade, sabe?
- Te entendo – a Jana suspirou. – Deve doer deixar tudo aqui, né?
- Muito. Muito mesmo.
- Não chora, hein? Você prometeu que não ia chorar mais.
Prometi mesmo. Prometi e cumpri. Apertei meus dentes uns contra os outros e não deixei nenhuma lágrima escapolir. Eu não ia chorar. Não ia chorar porque a minha vida naquele momento era no Rio. São Paulo fazia parte de um passado, um passado incrível, lindo e ao mesmo tempo não tão bonito assim.
Se um dia eu fosse voltar, talvez eu pudesse escrever uma história diferente, com novos protagonistas. Se eu não voltasse, a felicidade com certeza me abraçaria, independente da cidade onde eu estivesse morando.
Logo quando desci no aeroporto Santos Dumont senti a diferença na atmosfera. Em Sampa, o clima estava um pouco gélido e no Rio, a atmosfera estava agradabilíssima.
- Isso que eu chamo de cidade – Janaína foi logo se desfazendo da blusa de frio. – Calor, sol, gente bonita...
- Tiroteio, favelas, assassinatos... – eu completei a frase.
- Você cala a boca, hein? Não fala mal da minha cidade não, hein?
Dei risada.
- Brincadeira, amor.
- Acho bom!
A Eduarda nos recebeu com os braços abertos. Enquanto a van nos levou até a Barra da Tijuca, ela foi perguntando como tinha sido o treinamento e nós não paramos de falar um segundo sequer.
- Então vocês vão começar na segunda – ela falou quando a gente chegou no estacionamento do shopping. – Cada um no seu respectivo horário.
Pelo menos a gente ia ter um tempinho de folga para descansar a cachola. Como nenhum de meus amigos morava perto de mim, me despedi deles quando o meu ônibus se aproximou.
- Até segunda, meninos. Foi bom demais passar esse tempo com vocês!
- Até, Caio! Se cuida, viu? – Jana me deu um beijo.
- Pode deixar. Beijos, abraços... Fui!





A república estava escura e muito silenciosa. Será que os meninos não estavam em casa?
Abri a porta com muito cuidado e entrei rapidamente. Como era bom estar em casa de novo.
Nenhuma luz acesa. Ou todos estavam dormindo, ou eles tinham saído. Cheguei depois da 0 hora, porque nós tivemos que ir até o Barra Shopping e ele não era lá muito perto da minha casa.
Acendi a luz da sala e fui direto pro banheiro. Tirei a água dos joelhos e vi que havia duas cuecas espalhadas pelo chão. De quem seria?
Voltei pra sala, peguei a mala e fui pro meu quarto. Abri a porta muito devagar e confoeme imaginara, percebi que o Fabrício estava dormindo. Ele estava pelado como sempre e deitado de bruços. As pernas estavam levemente abertas e eu consegui ter uma visão perfeita dos testículos do cara...
- Lar, doce lar – falei para mim mesmo.
Era tentação demais chegar em casa depois de mais de um mês e me deparar logo com aquela cena... Fiquei de pau duro na hora.
Abri a mala que o Rodrigo me emprestou e procurei uma cueca limpa. eu precisava de um banho e da minha cama!
Deixei a água do chuveiro cair em cima do meu corpo, sem me preocupar com quanto tempo iria ficar ali. Só desliguei a ducha depois que gozei. A bunda do Fabrício era linda demais...
Entrei nos meus aposentos fazendo o menor barulho possível. Eu não queria acordá-lo e no fim das contas, tudo deu certo.
Deitei na minha cama e foi gratificante sentir o cheirinho do meu travesseiro e a delicadeza do meu colchão. Claro que a cama do hotel era boa, boa até demais, mas a minha era minha. Tinha o meu jeito, meu número e meu corpo se moldava perfeitamente à ela. Não tinha comparação.
Aos poucos deixei a escuridão tomar conta de mim e fui relaxando cada vez mais. Tudo o que eu precisava era descansar, descansar e descansar. Algo me dizia que, daquele dia em diante, eu ia ter uma vida agitada demais, portanto eu queria e merecia aproveitar cada segundo de folga, até a segunda-feira chegar.

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