quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Capitulo 14

 O  Willian, o Vinícius e o Fabrício chegaram em casa depois das 11 da noite. Eles nos
contaram como foi o 1º dia de aula enquanto jantavam. Nada muito fora do habitual.

- O que foi, Caio? – Vini sondou. – Por que está com essa cara?
- Briguei com a minha mãe hoje cedo.
- Ah, entendi.
Ele não tocou mais no assunto. Eu precisava bolar um jeito de conseguir a minha certidão de nascimento, mas como?

Desde que eu tinha conquistado aquele notebook, era a primeira vez que eu via o meu irmão gêmeo conectado ao MSN no mesmo horário que eu. Será que aquilo era um sinal de Deus?
Chamá-lo ou não chamá-lo? Aquela era a minha dúvida. Depois de muito pensar, respirei fundo, criei coragem e abri a janela de bate-papo:
“Podemos conversar?” – digitei rapidamente.
Pausa. Eu fiquei esperando ele responder, mas não aconteceu. Quando estava quase desistindo e fechando a janela, ele teclou:
“O que você quer?”
Minha garganta deu um nó. Ele tinha me respondido!!!
“Preciso de sua ajuda” – expliquei.
Ele mandou um monte de pontos de interrogação e eu entendi que deveria continuar:
“Preciso me alistar no exército e preciso da minha certidão de nascimento, você pode pegar pra mim?”
Outra pausa, porém esta foi um pouco menor que a primeira.
“E por que eu faria isso?”
“Você pode ou não pode pegar pra mim?”
“Depende.”
“Do quê?”
“O que eu vou ganhar em troca?”
“Prometo que te deixo em paz pro resto da vida. Nunca mais vai ouvir falar o meu nome”
Ele riu.
“Isso seria bom demais pra ser verdade.”
“Estou falando mais do que sério, Cauã.”
“E como eu faço pra te entregar isso?”
“Não estou na cidade. Você teria que entregar pro Víctor.”
“Pro viado? Nem pensar...”
Bufei de raiva. Eu não devia ter pedido a ajuda dele.
“POR FAVOR, Cauã. Você pode me ajudar? Eu nunca te pedi nada antes...”
“E por que você não vem buscar?”
“Você é cego? Qual a parte que você não entendeu que eu não estou na cidade?”
“E custa a dondoca sair de onde está e vir aqui pegar?”
“Custa. Custa muito. Primeiro porque eu não tô a fim de ver nenhum de vocês, segundo porque nem no estado eu tô...”
“Hum e tá aonde? Tá rodando bolsinha fora do país é?”
Se ele queria me irritar, ele estava conseguindo.
“Não vou perder meu tempo mais. Obrigado por não fazer nada...”
“Como faço pra te mandar essa porcaria e me ver livre de você sem ser por aquele viadinho?”
Seria uma luz no fim do túnel?
“Se você não quiser entregar pra ele, entrega pra qualquer pessoa que possa deixar nas mãos dele. Eu tô te pedindo, por favor, preciso disso o quanto antes...”
“Beleza, maninha. Eu faço isso por você. Só pra eu ter o prazer de nunca mais te ver pintado de ouro na minha frente.”
Aquilo fez meu coração diminuir de tamanho. Ele realmente me odiava.
“Pode ficar tranquilo, Cauã. Eu costumo cumprir as minhas palavras. Nós nunca mais vamos nos ver, pode ter certeza disso.”
“Essa é a melhor notícia que você poderia me dar. Amanhã mesmo eu entrego sua certidão, fica tranquila maninha!”
Preferi não retrucar. Eu precisava daquele documento.
“Muito obrigado.”
“Mas não esqueça de sua promessa!”
“Não vou esquecer, pode ficar tranquilo. Pode me bloquear agora, se você quiser.”
“Excelente ideia. ADEUS!”
Cauã não me bloqueou, porque continuou on-line por muito tempo. Não tive coragem de responder mais nada. As lágrimas desceram sem que eu precisasse fazer esforços.

- Por que tem que ser assim? – funguei.
Quando o Rodrigo entrou no quarto, ele se assustou ao me ver chorando:
- O que foi, Caio? Aconteceu alguma coisa?
- Nada demais – tentei me acalmar.
- Se não tivesse acontecido alguma coisa você não estaria assim – ele se aproximou de mim e sentou na minha cama. – Anda, desabafa. Sou seu amigo... Vai te fazer bem.
- Não foi nada, Rodrigo. De verdade. Só um desentendimento com meu irmão.
- Falou com ele?
- Uhum.
- Que chato, velho. Se precisar de alguma coisa, pode contar comigo, viu?
- Valeu – eu sequei as lágrimas. – Vai ficar tudo bem.
- Melhor você desabafar mesmo. Faz bem pra alma.
- É. Toma, pode usar. Não quero mais ver esse notebook hoje.
- Tem certeza?
- Absoluta.
- Vai lavar o rosto, beber uma água...
- Não, eu tô bem.
- Quer ficar sozinho?
- Não, não se preocupa. Eu vou tentar dormir.
- Tudo bem. Se precisar de mim, é só chamar.
- Obrigado, parceiro.
Depois que eu arrumei a minha cama, deitei de costas pro Rodrigo e tentei pegar no sono, mas o choro voltou com força total.

Por que eu tive que nascer assim? Por que logo comigo? Por que eu não podia ser normal? Ser heterossexual? Ter namorada? Casar? Ter filhos? Constituir uma minha família? Por que eu tinha que gostar de homens? Ser diferente da maioria da sociedade? E por que eu tinha que passar por tantas humilhações? Por que? Por quê???
Se eu fosse um garoto normal de 17 anos, as coisas não teriam acontecido daquele jeito. Eu estaria na minha casa, com minha mãe, meu pai, meu irmão e seria feliz... Por mais que as coisas estivessem dando certo na minha vida, sempre faltava alguma coisa. Sempre faltava o colo de mãe, o abraço de pai e as brincadeiras de irmãos. Sempre faltava o calor do lar, a segurança da estabilidade, sempre faltava os laços de sangue...
E se a minha família não fosse tão preconceituosa? E se meus pais me aceitassem? E se eu tivesse o apoio do meu irmão gêmeo? Será que as coisas seriam diferentes? Será que eu seria um pouco mais... Feliz?
Como seria a minha vida dali há 10 anos? Será que eu ainda ia estar no Rio de Janeiro? Longe do seio da minha família e vivendo em uma casa com 5 desconhecidos? Será que eu ainda estaria me matando de trabalhar pra conseguir comer?
Ou será que as coisas iam ser diferentes? Será que eu estaria melhor? Bem de vida? Com a minha própria casa, meu carro e com alguém que me amasse de verdade? Será que as coisas iam se solucionar? Será que todos os meus problemas tinham solução?
E por que o tempo sempre era meu inimigo? Por que as minhas perguntas nunca tinham resposta? Por que eu conseguia enxergar a felicidade nas outras pessoas e não conseguia ver ela me alcançando?
Eu me fiz tantas perguntas naquela noite que a minha cabeça explodiu de dor. Já havia se passado 6 meses. Meio ano. E eu ainda era cheio de perguntas. Perguntas que rodavam dentro do meu cérebro. Rodavam, rodavam, rodavam e voltavam  pro ponto de partida. Perguntas que aparentemente não tinham respostas e que estavam me deixando louco. Até quando seria daquele jeito?
- Acorda, Caio – Rodrigo me cutucou nas costas. – Você vai se atrasar pro colégio.
- Que horas são? – perguntei com a voz grogue de sono.
- 6h00.
Ainda era cedo.
- Só mais 5 minutinhos.
- Beleza, depois não diz que eu não te avisei.
Eu me virei pra um lado e pro outro, mas o sono fez questão de me deixar sozinho. Com raiva, eu sentei na cama e cocei os olhos. Odiava acordar cedo.
- Que bela vida que eu tenho – reclamei sozinho.
Fiquei de pé e rapidamente arrumei a cama. O Rodrigo não estava no quarto e eu aproveitei a oportunidade pra me arrumar ali mesmo.
Troquei de roupa e ajeitei a mochila. Quando olhei no celular, já passava das 6h30 da manhã.
- Pensei que não ia levantar – Rodrigo comentou quando entrou no quarto.
- Bem que eu queria ficar na cama mesmo.
- Paciência, fera. A vida segue em frente.
- Pois é.
Fui ao banheiro, joguei uma água no rosto e escovei os dentes. Como deixei a porta aberta, o Ricardo entrou sem nem pedir permissão.
- Bom dia – ele me cumprimentou.
- Bom dia – respondi ainda com a escova dentro da boca.
Ele levantou a tampa do vaso, ficou de costas e começou a fazer xixi. Era só o que me faltava! Bem que o Rodrigo tinha dito que não ia ter muita privacidade naquela casa.


A manhã estava cinzenta, o que era quase um milagre tratando-se do Rio de Janeiro. Eu caminhei mais rápido que o normal, senão ia me atrasar pra 1ª aula.
O clima na escola era de animação, coisa típica de regresso das férias de fim de ano. Pra todos os lados que eu olhava, via os adolescentes entusiasmados, conversando entre si e contando como havia sido as férias.
- Licença? – alguém tocou nas minhas costas.
Quando eu virei, quase caí de susto. O garoto era simplesmente lindo. Mais lindo que o Bruno.

- Sim?
- Pode me ajudar?
- Fala aí.
- Pode me dizer onde fica a sala 16?
- 3º B? – sondei.
- Isso.
- É a minha sala também. É só subir as escadas. É a primeira sala á direita.
- Ah, valeu.
- Novo aqui?
- Pois é, tô todo perdido – ele disse.
- Sei bem o que é isso. Estou aqui só há 6 meses. Ainda não consegui me acostumar.
- Como você se chama?
- Caio e você?
- Rogério.
- Boa sorte então, Rogério.
- Obrigado.
Quando ele saiu, eu analisei discretamente o corpo do garoto. Ele mexeu comigo. Que delícia que ele era...
Quando cheguei na operação naquela terça-feira, tive uma notícia que acabou com o meu dia.
- Eu tenho uma coisa pra te contar – o Bruno me puxou pela mão.
Meu corpo arrepiou quando nossas peles encostaram.
- O que foi? – fiquei curioso.
- Eu vou começar a trabalhar de manhã.
- Hã? – arregalei os olhos.
Ele fez carinha de triste.
- A super me convidou e eu aceitei.
- Por que? – eu estava incrédulo. – E a sua escola?
- Eu vou mudar pra noite – ele explicou. – É que eu quero fazer um curso e ele só tem à tarde...
Parecia que o chão tinha sumido. Meu coração estava menor que um grão de areia.

- Não acredito, Bi...
- É que é melhor pra mim...
- Fiquei triste agora – eu estava arrasado, isso sim. E não fiz questão de esconder dele.
- Mas a gente não vai perder o contato, seu bobo.
- Mas não vai ser a mesma coisa...
- Não fica assim, tá partindo meu coração.
- Nâo muda não, fica a tarde...
Eu estava quase chorando.
- Já dei meu nome. E as meninas vão também.
- Nossa, todo mundo vai me abandonar, é isso mesmo?
Ele sorriu.
- Eu nunca vou te abandonar.
Senti vergonha quando ele falou aquilo.
- Vai sim. Você é muito chato.
- Sou nada.
- Claro que é...
- Tá bravo comigo?
- Chateado – aquela era a palavra certa.
- É que é melhor pra mim, entende?
Suspirei.
- Se você diz. Não posso fazer nada, né?
Ele me fitou. Seus olhos estavam brilhando. Um brilho diferente.
- A gente não vai perder o contato, prometo.
- Mesmo assim, não vai ser mais a mesma coisa – reclamei. E pra mim não seria mesmo.
- Fica calmo. Você não vai me perder!
Por que ele tinha dito aquilo? Será que ele sabia que eu estava interessado nele? Será que ele também estava interessado em mim? Será que aquele beijo que ele me mandou pelo Messenger não tinha sido por hábito e sim proposital?
- Vamos entrar? – ele perguntou.
- Fazer o que, né?
Nós entramos, mas foi muito difícil me concentrar naquela tarde. Eu estava desolado.
A pior parte foi na hora da despedida. Depois que nos despedimos, eu fiquei me sentindo esquisito. Parecia que estava faltando uma parte de mim...
- Acredita que eu já tenho trabalho? – Rodrigo falou, mas eu nem me atentei.
- O quê? Desculpa, tô no mundo da lua hoje.
- Tá triste por que os meninos mudaram de horário?
- Pra falar a verdade eu tô sim. Eu me acostumo com as pessoas e quando elas vão embora eu sinto falta.
- Mas eles só vão mudar de horário...
- Mesmo assim, não é mais a mesma coisa.
- Se você diz.
- O que você dizia?
- Já me passaram um trabalho, acredita?
- Faculdade é assim mesmo, fera. Boa sorte.
- E as suas aulas, como estão?
- Chatas – fui franco. – Odiando.
- Só mais esse ano.
- Saudade da minha escola antiga.
- Tinha muitos amigos lá?
Por um fio, por muito pouco eu não abro a minha boca e coloco tudo a perder. Quase disse ao Rodrigo que tinha muitos amigos, até eles saberem que eu era gay.
- Até que tinha.
Fui salvo pelo gongo. Quando ele abriu a boca pra me perguntar mais alguma coisa, meu celular começou a tocar. Era o Víctor.

- Oi. Víctor. Tudo bom?
- Bem e você?
- Vivendo.
- Preciso falar rapidinho, meus créditos estão acabando. Seu irmão mandou me entregar a sua certidão de nascimento. O que eu faço com isso?
- Desculpa não ter te ligado pra te avisar, tô falido de créditos. Preciso que você me mande pelo correio, por favor.
- E pra que é?
- Pra me alistar no exército.
- Ah, é verdade. Pro mesmo endereço de antes?
- Não. Anota o novo.
Perguntei meu novo endereço ao meu amigo e quando o Víctor terminou de anotar, ele desligou.
- Pelo menos isso foi resolvido, né?
- Um problema a menos – suspirei aliviado. Ainda bem que o Cauã cumpriu a palavra dele.
- Tô moído – Rodrigo comentou ao se espreguiçar. Eu ouvi algum de seus ossos estalando. – Ainda não me acostumei com a nova rotina.
- Logo acostuma.
Eu já estava pra lá de acostumado. Desde que tinha sido expulso da casa dos meus pais, a minha vida não estava sendo nada fácil.
- Preciso de uma massagem. Vou pedir pro Willian fazer quando chegar em casa.
- E ele faz é? – me interessei.
- Faz. Muito boa a massagem dele.
- Tem curso?
- Nada, faz porque gosta mesmo, mas reclama um pouco quando a gente pede. Ele prefere fazer nas garotas.
- Óbvio, né?
- É de se entender, mas mesmo assim ele faz.
- Qualquer dia vou querer experimentar.
Só de pensar ele tocando o meu corpo, meu pênis criou vida. Tive que disfarçar com a mochila.

“Ainda está chateado comigo?” – ele perguntou pela janela do MSN.
“Um pouco.” – confessei.
“Bobo, você não vai me perder e eu não vou perder você!”
“Assim espero”
Quando a gente conversava pela internet, eu não tinha vergonha de falar as coisas e me insinuava mesmo. Ele precisava saber que eu gostava dele.
“Nós podemos conversar por mensagem no celular o dia todo se você quiser...”
“Eu não tenho o número do seu celular” –
manei um rostinho triste pra ele e em seguida, Bruno me retrucou mandando o número.
Tratei de salvar no meu aparelho rapidamente.
“Agora você tem!”
“E já está salvo.”
“Acho bom!”
Nós ficamos teclando por mais um tempinho. Eu estava me sentindo tão triste por ele ter mudado de horário que troquei a frase do meu usuário pela letra de uma música.
“Essa letra é pra mim?” – ele me perguntou e enviou o emotion com carinha de vergonha.

“E se for?” – provoquei.
“É ou não é?”

Mas eu não respondi. Eu queria que ele percebesse a minha intenção, não que eu falasse com todas as letras o que estava sentindo.
Nós terminamos o papo daquela noite com ele pedindo pra eu enviar uma mensagem no seu celular.
“E espero que ela seja muito boa!”
Pronto. Fiquei sem saber o que fazer. O que eu ia mandar pra ele? Pensei em várias coisas e me lembrei da parte de uma música em espanhol pela qual eu era apaixonado. Era tudo ou nada...
Desliguei o notebook, me preparei pra dormir e quando já estava deitado, comecei a digitar a mensagem de texto:
“Me enamoro sin querer...
Cuando menos lo esperaba...
Cambió mi forma de ser...
Me enseño a amar com el alma...”



Estava feito. Respirei fundo, criei coragem e enviei. A sorte estava lançada.
Não sei se dormi uma, duas horas ou se dormi naquela noite. Acordei com muito sono na manhã seguinte, mas mesmo assim fui pra escola.


A professora de Química estava falando pelos cotovelos, mas suas palavras ressonavam na minha cabeça e saíam sem que eu conseguisse fixar nenhuma de suas palavras.
- Caio? Caio? – alguém atrás de mim me cutucou?
- Hum?
- Seu celular está tocando...
Eu levantei a cabeça. Estava zonzo e enxergando tudo turvo. A minha sorte é que o toque do meu telefone não era muito alto.
Eu peguei o objeto no bolso da calça, esfreguei o olho esquerdo, bocejei e levei um susto quando vi o nome que estava estampado no visor...
BRUNO.
Naquele momento, todo o meu sono se exauriu. Eu arregalei os olhos e rapidamente abri a mensagem de texto:
“Bom dia”
Era tudo o que dizia, mas foi mais que suficiente pra fazer com que o meu dia ficasse melhor. Muito, mas muito melhor.
Eu respondi com outro “bom dia” e à partir daí, consegui prestar atenção em todas as outras aulas, afinal eu estava na expectativa de receber outro SMS dele, o que não aconteceu.

Nós só voltamos a nos falar na troca de turno. Eu estava entrando e ele estava saindo. Quando ele me viu, abriu um sorriso e disse:
- Tchau, Caio. Bom trabalho.
Minhas pernas tremeram. O que ele tinha aquele dia? Por que estava tão atencioso comigo ultimamente?
- Tchau – eu respondi, meio que sem reação.
Eu o acompanhei com os olhos e só fui me sentar quando a minha supervisora me chamou a atenção:
- ACORDA, CRIATURA – ela gritou no meu ouvido. Eu dei um pulo de susto e medo. – Tá dormindo, é?
- Acho que sim – respondi. Será que aquilo era um sonho?
- Pois eu te digo que isso aqui não é sonho, já pra sua PA! Andando, andando...
Eu me sentei, mas não sabia o que tinha que fazer. Estava tão extasiado que tinha me esquecido de tudo.
Quando eu estava na 4ª ligação, senti meu celular vibrar dentro do bolso e não pensei duas vezes: derrubei a ligação discretamente e coloquei uma pausa. Eu precisava ir ao banheiro. E se fosse uma mensagem dele?
E realmente era. Meu coração acelerou a tal ponto que a minha cabeça até latejou.
“Você está lindo hoje.”
Pronto. Bastou aquele pequeno gesto pra eu ganhar o resto da semana. Ele tinha me achado lindo... Lindo...
Fiquei tão sem saber o que fazer que nem sequer respondi a mensagem. Depois de uns minutos, respirei fundo e voltei pro meu atendimento, todo feliz da vida.
- Onde você estava? – Márcia perguntou.
- Desculpa, super. Eu tive que ir ao banheiro, senão ia acontecer um acidente.
- Da próxima vez me sinalize, por favor.
- Não vai mais acontecer.
- Volte pro seu atendimento, nós estamos com fila.
- Pode deixar.
Foi um martírio atender aquela tarde. A mensagem dele ficou na minha cabeça o resto do dia. Era simplesmente inacreditável.
- Viu um passarinho verde hoje? – Leonardo sondou.
- Hoje nada me tira do sério – eu estava até me sentindo leve. Ele disse que eu era lindo...
- Hum, posso saber por quê?
- Não, não pode. Curiosidade matou o gato.
- Sem graça. Pensei que fossemos amigos.
- E somos, mas nem por isso vou te contar tudo o que acontece na minha vida.
- Acho que isso está me cheirando a Bruno...
Dei risada.
- Nem as suas piadinhas vão me deixar mal-humorado hoje...
- Hum, aí tem, aí tem...

Por sorte, quando o Rodrigo chegava do trabalho ele ia direto pra cama e não queria saber de mais nada. Aquilo me proporcionava mais tempo teclando com o Bruno.
Quando nós começamos a trocar ideia, eu me senti um pouco acuado porque não sabia como reagir perante o que tinha acontecido, mas como ele não tocou no assunto, nós conversamos normalmente, como se nada tivesse acontecido.
Porém o fato é que tinha acontecido sim. Ele estava demonstrando interesse em mim e aquilo era notório. Se ele não estivesse interessado, não estaria me tratando tão bem e não teria dito que eu estava lindo. Ou será que eu estava imaginando coisas?
Não. Eu não estava imaginando coisas e eu pude tirar todas as minhas dúvidas quando ele pediu para eu escutar duas músicas.
Cliquei no link que ele mandou e em seguida a primeira canção começou a tocar:
“Eu só quero estar no teu pensamento
Dentro dos teus sonhos e no teu olhar
Tenho que te amar só no meu silêncio
Num só pedacinho de mim
Eu daria tudo pra tocar você
Tudo pra te amar uma vez
Já me conformei, vivo de imaginação
Só não posso mais esconder
Que eu tenho inveja do sol que pode te aquecer
Eu tenho inveja do vento que te toca
Tenho ciúme de quem pode amar você
Quem pode ter você pra sempre

Eu tenho inveja do sol que pode te aquecer
Eu tenho inveja do vento que te toca
Tenho ciúme de quem pode amar você
Quem pode ter você pra sempre
Eu daria tudo pra tocar você
Tudo pra te amar uma vez
Já me conformei, vivo de imaginação
Só não posso mais esconder
Que eu tenho inveja do sol que pode te aquecer
Eu tenho inveja do vento que te toca
Tenho ciúme de quem pode amar você
Quem pode ter você pra sempre...



Eu não sabia se tremia, se ria, se chorava ou se gritava de felicidade. Com as mãos trêmulas, cliquei no segundo link e a outra música começou a tocar:
“Esse turu, turu, turu aqui dentro
Que faz turu, turu, quando você passa
Meu olhar decora cada movimento
Até seu sorriso me deixa sem graça
Se eu pudesse te prender
Dominar seus sentimentos
Controlar seus passos
Ler sua agenda e pensamento
Mas meu frágil coração
Acelera o batimento
E faz turu, turu, turu, turu, turu, turu, tu
Se esse turu tatuado no meu peito
Gruda e o turu, turu, turu, não tem jeito
Deixa sua marca no meu dia-a-dia
Nesse misto de prazer e agonia
Nem estou dormindo mais
Já não saio com os amigos
Sinto falta dessa paz,
Que encontrei no seu sorriso
Qualquer coisa entre nós,
Vem crescendo pouco a pouco
E já não nos deixa sós
Isso vai nos deixar loucos...
Esse turu, turu, turu aqui dentro
 Que faz turu, turu, quando você passa eu olhar decora cada movimento
Até seu sorriso me deixa sem graça
Nem estou dormindo mais
Já não saio com os amigos
Sinto falta dessa paz,
Que encontrei no seu sorriso
Qualquer coisa entre nós,
Vem crescendo pouco a pouco
E já não nos deixa sós
Isso vai nos deixar loucos...
Se é amor, sei lá...
Só sei que sem você, parei de respirar
E é você chegar
Pra esse turu, turu, turu, turu, vir me atormentar
Se esse turu tatuado no meu peito
Gruda e o turu, turu, turu, não tem jeito
Deixa sua marca no meu dia-a-dia
Nesse misto de prazer e agonia
Eu desisto de entender
É um sinal que estamos vivos
Pra esse amor que vai crescer
Não há lógica nos livros
E quem poderá prever
Um romance imprevisível
Com um turu, turu, turu, turu, turu, turu, tu...”
Se esse turu tatuado no meu peito
Gruda e o turu, turu, turu, não tem jeito

Nem estou dormindo mais
Já não saio com os amigos
Sinto falta desse turu, turu, turu, turu, turu, tu.”


Simplesmente eu não sabia o que fazer. Não sabia o que responder. Não sabia o que pensar.
Não era possível que ele estava correspondendo ao meu sentimento... Aquilo não podia ser verdade!!!
Eu estava completa e perdidamente apaixonado pelo Bruno, mas não estava acreditando que ele também estivesse apaixonado por mim.
Por que ele tinha me mandado aquelas músicas? O que aquilo significava? Ele estava apaixonado por mim? Será que era aquela mensagem que ele queria me passar? Será que ele queria ficar comigo do mesmo jeito que eu queria ficar com ele? Seria com o Bruno a minha primeira experiência homossexual???

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