sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Capítulo 36

F
oi como mergulhar em um precipício. Parecia que o chão tinha desaparecido e o meu corpo tinha sido sugado por um buraco negro sem fundo.
- Você o quê?
Ele tremeu e se desesperou.
- Você o quê? – eu não estava acreditando. Só podia ser uma pegadinha!
- Meu ex tá com AIDS – ele falou por fim. – E eu tô com medo de ter pegado!
Pronto. Aquela frase foi determinante para eu sentir o mundo nas minhas costas. Só era o que faltava!
E se eu também estivesse? Foi em uma fração de segundos que todos os meus problemas deram vazão para o que estava acontecendo. Eu poderia estar contaminado com o HIV!
- Bruno, pelo amor de Deus me diz que você usava camisinha com ele – meu coração estava tremendo ao invés de bater.
- Usava – ele choramingou. – Mas você sabe que... Nem sempre a gente usa...
- Como assim nem sempre a gente usa? Bruno você é louco? Você não pensa? O que você tem na cabeça? Merda de galinha?! Você tá vendo o que você faz com a minha vida? Caralho, você é muito inconsequente, garoto!
- CALA A BOCA, CAIO! – ele gritou.
- Não eu não calo não! Você tem noção do que você está me falando? Você tem noção da gravidade do que você está me falando, Bruno?
- Não seu idiota, eu não tenho. Eu não tenho noção. Sou uma criança!
- É o que parece. É o que parece mesmo... Você não mede as consequências dos seus atos!
- CALA A BOCA! CALA A BOCA!
- Eu não acredito nisso... Eu não acredito... – minhas mãos estavam tremendo. Eu queria sair dali o mais rápido possível...
- A última coisa que eu preciso é que alguém me dê lição de moral nesse momento – ele falou.
- E o que você quer que eu faça? Que passe a mão na sua cabeça? Você viu o que você fez comigo? Você acabou com a minha vida!
- CALA A BOCA! – ele gritou e algumas pessoas nos olharam.
- Eu... – o que eu tinha que fazer? – Eu preciso... Sair daqui! Eu nunca mais quero te ver... Eu... Você acabou com a minha vida...
Eu levantei e com um pouco de dificuldade comecei a andar até a calçada. Meus pés atolaram na areia e eu quase caí de tanto medo e nervoso que estava sentindo...
- Eu não... Eu não posso... – eu tremia mais que vara verde.
“Eu posso estar com AIDS...”
Aquela frase ecoou na minha cabeça sem parar. Será que aquilo era verdade? Será que ele estava mesmo contaminado e será que eu... Eu também estava?
- CAIO – eu ouvi ele me chamar, mas não me virei para falar com ele.
Eu precisava ficar sozinho e precisava de uma solução para o que estava acontecendo. Mas o que eu tinha que fazer?
- CAIO, ME ESPERA! – ele gritou de novo.
Eu tentei correr, mas as minhas pernas não me obedeceram. Por que tudo tinha que cair nas minhas costas, meu Deus?
Eu senti ele puxar o meu braço e fui obrigado a me virar. Ele ainda estava chorando e parecia tão desesperado quanto eu.
- Por favor, me perdoa – ele falou.
- Me deixa em paz, Bruno. Me deixa em paz...
- Me perdoa... Me perdoa por ter estragado a sua vida... Me perdoa!
- Me solta... Me solta e me deixa em paz...
- Por favor...
Eu puxei o meu braço para trás e andei o mais rápido que eu pude. A última coisa que eu precisava naquele momento era dele atrás de mim.
AIDS... Eu não poderia estar com AIDS... Aquilo não poderia ser verdade. Se eu já estava com nojo do meu corpo antes, que dirá naquele momento!
Eu precisava pensar. Eu tinha que encontrar uma solução para tudo aquilo que estava acontecendo, mas qual?
O que eu tinha que fazer? Como eu deveria proceder? Como eu podia tirar aquela dúvida que estava me matando por dentro?
Será que eu ia morrer? Será que eu estava mesmo infectado com aquela doença? E o seu seria de mim dali pra frente? Será que eu ia viver condenado aos coquetéis? Não... Eu era jovem demais para ter aquele destino! Eu só poderia estar sonhando...
Antes mesmo de chegar em casa encontrei com o Rodrigo. Quando o garoto me viu, foi logo perguntando:
- O que é que você tem?
- Pelo amor de Deus, me ajuda...
- O que houve?
- Me ajuda... Eu preciso de ajuda...
- Tá eu te ajudo, mas o que você tem?
- Não posso te contar aqui...
- E esses olhos? Andou chorando?
- Não posso te contar aqui...
Eu estava sentindo falta de ar e o mundo estava começando a rodar. Eu tive uma leve impressão que ia desamaiar.
- Caio?
- Me... Ajuda...
- Vamos para casa! Você não está nada bem...
Depois de beber um copo com água e me recompor, eu consegui ficar um pouco mais calmo e contei tudo o que estava acontecendo.
- Você precisa fazer o teste, cara – ele disse, também preocupado.
- E onde eu faço isso?
- Em um posto de saúde, mas a essa hora não tem nenhum aberto!
- Eu não vou aguentar até amanhã!
- Não tem muita escolha, Caio. A essa hora você não vai conseguir fazer esse teste!
- E agora, Rodrigo? O que eu faço?
- O melhor que você tem a fazer é se acalmar. Por mais que seja difícil, você tem que ficar calmo.
- Eu não consigo! Eu não consigo ficar calmo!
- Vocês usaram camisinha?
- Claro que sim, mas...
- Então? Qual a preocupação?
A preocupação era enorme. E se eu tivesse contaminado?
- Não tem que se preocupar. Se vocês se preveniram... – ele terminou a frase.
- Ai, Rodrigo...
- Calma, Caio. Vai dar tudo certo!
Não consegui trabalhar naquela madrugada. Expliquei tudo o que estava acontecendo pro Breno e ele me apoiou muito, me ajudando e me acobertando.
- Vai para a sua casa, descansa e amanhã você vai ao médico.
- Mas eu não quero faltar...
- Nâo vou colocar falta para você. Pode deixar que eu justifico seu dia aqui.
- Jura que você faria isso por mim, Breno?
- Claro! Eu posso imaginar qual o tamanho dessa sua angústia... Vá para casa e descanse. Você não está com cabeça para trabalhar.
Na manhã seguinte...
Eu estava suando frio tamanho o medo que estava sentindo. Quando a agulha entrou na minha veia e o sangue começou a sair, o meu coração foi parar dentro da boca de tanta expectativa.
- Pronto – disse a enfermeira. – Agora é só aguardar o resultado

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