quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Capítulo 23

Bruno tentou ser o mais carinhoso possível, mas como eu estava tenso com tudo o que estava acontecendo, senti uma dor insuportável quando ele começou a me penetrar.
- Se você não relaxar, nós não vamos conseguir – ele falou no meu ouvido e beijou o meu rosto.
Eu estava com medo. Sabia que aquilo ia doer e ia me machucar.
- Não fica com medo, amor – Bitch tentou me consolar. – Eu não vou te machucar.
Tentei relaxar a minha musculatura ao máximo. depois de um tempo, ele introduziu a cabeça de novo.
- Tá doendo?
- Um pouco – confessei.
- Relaxa – ele pediu de novo e começou a me beijar.
Com o beijo, eu fiquei mais calmo e relaxei mais um pouco, o que facilitou a entrada de mais alguns centímetros.

Fiquei me perguntando como alguém podia sentir prazar com aquilo, sendo que doía tanto?
Foi muito difícil e demorado, mas quando ele me possuiu por completo, eu me senti aliviado. Queria dar prazer ao Bruno na mesma proporção que ele me proporcionava. Não era justo só eu me satisfazer, ele também precisava.
À partir daquele momento eu matei todas as minhas curiosidades a respeito do sexo anal. Com muita maestria, ele começou o vai-e-vem com o quadril e quase que instantaneamente, eu comecei a sentir prazer.
Não sei se era porquê ele não era lá muito dotado, mas a dor foi indo embora aos poucos e em seu lugar, ficou o fogo e o tesão, o que me deixou completamente aliviado e totalmente relaxado.
Ele não meteu com muita força, ao contrário: todos os seus movimentos foram perfeitos. Cautelosos, carinhosos, na medida certa. Parecia que ele entendia do assunto.
Comecei a gemer. Era um prazer diferente de todos os outros que eu já tinha sentido na minha vida. Algo novo, inusitado e ao mesmo tempo esquisito.
- Tá doendo? – ele perguntou de novo.
- Não – falei baixinho. – Continua...
Grudamos as nossas testas e nos fitamos. Vez ou outra nossos lábios se tocavam, mas o que eu queria mesmo é ver ele entrando e saindo de dentro de mim.
Sempre quis fazer aquilo e no momento em que consegui concretizar, parecia que nem estava acontecendo.

Não que eu sonhasse em ser passivo. Eu sonhava em ter um amor verdadeiro e que nós ficássemos juntos para sempre e fossemos felizes juntos.
Parecia que eu tinha alcançado esse sonho. Um sonho muitas vezes distante, mas que com a chegada daquele garoto, quase se tornou tangível.
Eu estava cego. Cego de amor, cego de paixão, cego de desejo, de tesão. E talvez por essa cegueira eu não tenha conseguido enxergar a realidade.
Será mesmo que eu ia ser feliz com o Bruno?
Será que duas pessoas tão parecidas como nós íam conseguir levar aquele relacionamento adiante?
Reza o velho ditado que “os opostos se atraem”. O que eu e o Bruno tínhamos de oposição?
Nada. A gente vivia a mesma realidade. A mesma triste realidade da falta de aceitação de nossas famílias.
Tínhamos quase a mesma idade e estávamos condenados ao mesmo destino. Ele vinha de uma família conservadora. Eu também.
A família dele tinha posses. A minha também. Ele foi obrigado a trabalhar para sobreviver. Eu também.
Talvez a única coisa que nós tivéssemos de diferente, fosse a maneira com a qual enxergávamos a vida. Eu era realista, embora que com uma frequência um tanto rotineira, eu me permitia sonhar.
Ele era frívolo. Tentava se esconder da sua realidade em uma máscara que não me descia pela garganta.
Será que pela primeira vez eu estava começando a pesar os prós e os contras daquele namoro?
Tentei me concentrar no sexo. Ele continuava me penetrando e eu estava sentindo que algo dentro de mim endurecia sem parar.

Não demorou para ele anunciar o orgasmo. Não houve tempo nem de tirar o pênis de dentro de mim. Ele ejaculou dentro da camisinha.
Nos beijamos. Eu fiquei fazendo carinho no rosto dele até ele tombar ao meu lado, cansado, sem fôlego e suado.

Minha primeira vez sendo passivo tinha acontecido. Dali em diante eu tive a certeza que, mesmo que nós não ficássemos juntos por muito tempo, eu sempre ia levar o Bruno na minha vida.
Ia leva-lo como a minha primeira paixão, o meu primeiro amor e a pessoa com a qual eu perdi a minha virgindade.

Nossos destinos estavam cruzados para sempre. Eu nunca ia conseguir esquecê-lo. Nunca.
Deitei a minha cabeça em seu peito e fiquei ouvindo o seu coração voltar a bater em um ritmo normal. Ele me abraçou e beijou o meu cabelo. Eu senti vontade de chorar.
- O que foi? – ele perguntou. – Não gostou?
- Eu amei – falei com sinceridade. Tinha sido perfeito.
- Então por que está tão quietinho?
- Estou pensando.
- Posso saber em quê?
- Em você.
- Em mim?
Eu me apoiei nos cotovelos e olhei em seus olhos azuis:
- Pensando que mesmo que um dia a gente não fique mais junto, você sempre vai morar dentro do meu coração e da minha memória.
- Por que diz isso? Está pensando em terminar comigo?
Sorri e baleancei a cabeça negativamente.
- É lógico que não. Eu falo pelo fato de você ter sido minha primeira paixão. Meu primeiro amor. Meu primeiro namorado... Meu primeiro... Homem...
- É sério mesmo que você era virgem, amor?
- É sim. Nunca tinha transado com ninguém.
Ele me puxou e me deu um beijo mais apaixonado que nunca.
- Pois eu quero que você saiba – ele começou –, que você também se tornou inesquecível para mim. E eu te amo demais!
- Também te amo. Quero ficar com você pro resto da minha vida.
- Eu também.
Nos beijamos mais uma vez. Era bom ficar com ele. Me sentia em paz e todos os meus problemas fugiam da minha cabeça.
- Você gostou da sua primeira vez? – ele perguntou, um pouco tímido.
- Foi maravilhoso, Bruno. Eu nunca vou esquecer desse dia.
- Eu também não vou esquecer. Você foi o melhor.
- Fui?
- Sim. Porque foi com amor. Não foi simplesmente sexo. Foi amor. E eu nunca tinha feito amor antes.
Não me segurei e o beijei novamente.
- É nesses momentos que eu sinto falta de um cigarrinho – ele disse com as bochechas vermelhas.
- Se quiser, pode fumar – eu falei. – Nâo quero que você se prive por minha causa.
- Não vou fazer isso. Eu sei que você não gosta e eu disse que por você eu paro de fumar.
Achei aquele gesto lindo. Embora eu não estivesse acreditando que ele ia conseguir segurar a vontade por muito tempo.
- Você é muito lindo – acariciei seu rostinho. Ele fechou os olhos.
- Você que é lindo, amor.
Bruno e eu ficamos abraçados na cama por cerca de meia hora. Quando ele percebeu que o meu tesão tinha voltado, voltou a ação e começou a me chupar de novo.

- Não cansa não? – perguntei.
- Não – ele passou a língua em toda a extensão do meu cacete e depois colocou tudo dentro da boca. Gozei pela 4ª vez aquele dia.
- Preciso ir, gatinho – olhei no meu celular e vi que já estava tarde. – Amanhã não posso fugir da aula.
- Quando você vem dormir aqui?
- Quando você quiser.
- Que tal na sexta? Sábado não tem aula mesmo, daí você pode acordar mais tarde.
- Não tenho aula, mas tenho que trabalhar na Dona Elvira – fiz bico.
- Ah, é verdade, que chato, hein?
- Preciso de dinheiro...
- Eu sei, amor. Eu sei e te entendo. Não tem problema. Não faltarão oportunidades.
- Eu quero muito passar a noite com você.
- Eu também amor.

Rolaram beijos e mais beijos até eu ir embora de vez. A noite tinha caído e a temperatura também. Eu senti um pouco de frio.

- Vou te acompanhar até a estação.
- Não precisa...
- Faço questão – ele me puxou pela cintura e me deu um baita beijo. Minhas pernas tremeram.
- Como eu te amo!!! – ele exclamou.
- Ama mesmo?
- Tem dúvidas?
- Não – menti. É claro que eu tinha. – Eu te amo também.
- Você quer comer alguma coisa? Deve estar morrendo de fome...
- Não. Onrigado. Eu preciso mesmo ir. Já está tarde e eu estou com sono...
- Não é pra menos... Você gastou todas as suas energias hoje.
- A culpa é sua.
Rimos e demos o último beijo, mal sabia eu que aquele era o nosso último beijo de verdade.
A gente desceu a rua juntos, mas quase não falamos nada. Eu estava muito pensativo, parecia que alguma coisa de errado ia acontecer...

- O que você tanto pensa, hein? – Bruno perguntou.
- Estou com um mau pressentimento.
- Como assim?
- Sei lá. Como se alguma coisa estivesse pra acontecer...
- Credo. Vai em uma igreja.
- Estou precisando mesmo.
- Pois então vá.
- Acho que vou seguir o seu conselho.
- Sempre é bom buscar conforto em Deus.
- É verdade.
Eu concordava com ele. No momento em que eu mais precisei, Deus não me virou as costas.
- Chegamos – falei.
- Chegamos – ele me olhou com a fisionomia séria.
Que vontade de beijá-lo, de abraçá-lo... Mas para o meu grande azar, nós não estávamos sozinhos. Tinha um casal se agarrando em menos de um metro de distância.
- Eu vou descer senão não vou me segurar, tá bom?
Ele sorriu.
- Vai. Estou quase te agarrando.
Eu também sorri. Ele era bobo demais.
- Até amanhã então – falei. – E muito obrigado por tudo.
- Até amanhã, vai com cuidado.
- Pode deixar. Depois a gente acerta aquele dinheiro lá.
- Vai ver se eu tô lá na esquina!!!
Não ia deixar ele gastar dinheiro comigo.
- É sério.
- Eu também estou falando sério – ele comentou.
- Depois a gente vê isso. Até amanhã.
- Até amanhã.
- Te amo – dissemos juntos.
Nossos olhos não se desgrudavam. Eu só comecei a descer a escada rolante quando uma senhora mal educada pediu para eu sair da frente.
- Grossa – reclamei.
- Vai te catar – ela esbravejou.
Velha nojenta. Tinha quebrado todo o meu clima. Acenei pro meu namorado e um segundo depois ele desapareceu de vista.


- Já estava preocupado – disse Rodrigo.
- Você sempre se preocupa comigo? – perguntei.
- Tá mal-humorado?
- Não – como eu poderia estar mal-humorado depois de tudo o que tinha acontecido? – Só fiz uma pergunta.
- Ah, você demorou... Me preocupo com você, pô.
- Valeu, parceiro. Mas está tudo bem. Por que não me ligou se estava preocupado?
- Porque não tenho crédito – ele riu.
- Explicado.
- Tomei a liberdade de usar o note, beleza?
- Já disse que pode usar quando quiser.
O que eu queria esconder do Rodrigo estava protegido com senha.
- Como foi o passeio?
- Sensacional – caí de costas na cama. Seus olhos azuis apareceram na minha mente.
- Foram em muitos lugares?
Eu relatei o trajeto que nós tínhamos percorrido, mas não contei todos os detalhes.
- Tem alguma coisa pra comer? – indaguei.
- O Will deixou um cachorro quente pra você no micro-ondas.
- Arrasou!!!
Eu dei um salto da cama e fui direto pro banho, que não demorou muito tempo porque eu estava faminto.

Esquentei meu lanche e comi tranquilamente. Estava muito bom. Eu me perguntei como ele tinha deixado sendo que ele não tinha chegado da faculdade ainda.

- Como ele deixou se ele nem está aqui?
- Foi no café da manhã, esqueceu?
Eu tinha esquecido completamente que o Willian tinha feito hot dog no café.
- Ah, é verdade...
- Está no mundo da lua hoje?
- Acho que sim.
Caí de novo na cama. Por que eu estava com uma sensação tão ruim?

- Conversei com os meninos – disse Rodrigo.
- Sobre?
- Sobre a comida. Achamos melhor a gente dividir uma despesa. O que acha?
- Por mim tudo bem. Desde que não seja muito caro...
- Acho que um R$ 100,00 para cada no máximo. Como somos em 6, acho que é mais que suficiente.
Não era lá um valor muito baixo, mas eu acebei concordando.
- Quando pretendem fazer a despesa? – sondei.
- No domingo. É o único dia que estamos todos em casa.
- Pode crer.
Eu fiquei olhando pro teto do meu quarto por muito tempo. A sensação que algo ia acontecer não estava me deixando ficar tranquilo. Será que seria alguma coisa com meu irmão ou com meus pais?
E como estariam eles? Será que já tinham acostumado com a nova realidade? Será que o Cauã realmente não estava sentindo minha falta? Será que meu pai já tinha me esquecido? E a minha mãe? Será que já tinha se conformado com a minha homossexualidade?
Não quis entrar na internet naquela noite. Precisava dormir, afinal estava mais que cansado. Estava exausto.
Me enrolei em meu edredom e fiquei pensando no meu amor. Meu Bruno... Como eu o amava.
E naquela noite, mais uma vez ele foi o protagonista de todos os meus sonhos. Desde os mais baixos até os mais belos contos de fadas que passavam em minha mente.

- Pensei que não ia aparecer mais – disse Rogério. – Que aconteceu? Ficou com vergonha por causa da chupada no pescoço?
Ele era lindo, mas muito idiota.
- Claro que não.
- Então por que faltou?
- Porque precisei faltar. Perdi alguma coisa?
- Perdeu matérias.
- Você pode me emprestar?
- Posso. O que eu ganho em troca?
- Um muito obrigado.
Ele pareceu decepcionado. Será que aquele garoto estava com segundas intenções?
- O que você queria em troca? – provoquei.
- Dinheiro – ele sorriu. – Brincadeira.
- Ah, bom. Mercenário.
Por sorte tive uma aula vaga aquele dia e consegui colocar um pouco da matéria dos dias anteriores em ordem. Tive um pouco de dificuldade para entender os garranchos do Rogério.




- Vamos almoçar? – perguntou Rodrigo.
- Vamos, parceiro. Estou com muita fome.
- Queria jogar uma bolinha no domingo. O que acha?
- Vamos ver. Se eu não for sair a gente pode marcar.
- Ah, é. Esqueci que agora você é um homem comprometido.
- Palhaço.
Ele riu.
Eu estava com tanta fome que senti vontade de repetir o prato de bife que pedi. Só não o fiz por falta de tempo.
- Não saciou? – ele se espantou.
- Não – ri.
- Caralho, que poço sem fundo!
- Estou em fase de crescimento.
- Ah, é. Você é um neném ainda.
Eu dei uma porrada na nuca dele e ele gargalhou.
- Me respeita, palhaço.
- Você que tem que me respeitar, sou mais velho que você.
- Ancião.
- Neném. Nenénzinho.
Rodrigo era muito doidinho. Eu gostava muito dele. Nunca seria capaz de esquecer a ajuda que ele me deu ao ofertar a minha mudança pra república.




Quando eu cheguei na minha PA, ele não estava mais na dele e aquilo me deixou um pouco grilado.
Quando eu estava no meio do expediente, percebi vários papeis embaixo do meu teclado. Não contive a minha curiosidade e abri de um em um:
“Queria beijar seus lábios de mel mais uma vez...”
Eu achei aquilo muito esquisito. Para quem seriam os bilhetinhos?
“Você não sabe como está me fazendo feliz.”
Que letra era aquela? Será que era...
“Ficar com você me faz esquecer de todos os problemas...”
Será que o Bruno tinha escrito tudo aquilo?
“Te amo para sempre, amor.”
Quanto romantismo...
“Não esquece disso. Beijos, muitos beijos. Bitch”
Meu coração palpitou. Que lindo!!! Ele tinha escrito aquilo pra mim...
Eu li e reli aqueles recadinhos tantas vezes que consegui decorá-los. A cada segundo que passava, eu sentia que amava mais aquele garoto. Como ele estava sendo bonitinho comigo...
- Que foi? – perguntou Leonardo. – Viu um passarinho verde?
- Que foi? Dormiu de calça jeans? – retruquei.
- Não começa com suas provocações, hein?
- Você que começou com suas brincadeirinhas idiotas.
- Não tô a fim de brigar com você.
- Tampouco eu quero brigar com você!!!
- Então estamos quites. Por que o senhor nunca mais dormiu lá em casa? Posso saber?
- Porque você nunca mais me convidou. Simples assim.
- Pois está convidado. Dorme lá hoje?
- Hoje? Ah, hoje não. Não trouxe roupa e não tô a fim de ir lá em casa pra depois voltar pra sua.
- Que dia então?
- Vamos combinar pra semana que vem.
- Ah, beleza, meus pais vão viajar de novo daí fica melhor.
- Fechou. É só você me avisar com antecedência.
- Pode deixar.
Depois que eu mudei para a república, minha amizade com o Léo já não era mais a mesma. Não tínhamos mais o mesmo elo nem a mesma cumplicidade.
- E como anda a sua vida? – ele perguntou. – Nunca mais conversamos...
- Na mesma santa rotina de sempre.
- Tem certeza?
- Absoluta.
- Ah...
- E você?
- Na mesma santa rotina também.
Ele estava me olhando com um olhar um tanto quanto esquisito. O que ele estava tentando descobrir?


Conversei muito com o Bruno pela internet na noite da quinta-feira. A primeira coisa que fiz quando o vi conectado, foi agradecer pelos recadinhos que ele tinha deixado embaixo do meu teclado.
Conversamos e combinamos de nos ver no domingo à noite. Ia ser o mesmo esquema do domingo passado: a avó dele ia sair pra missa e a gente ia poder ficar sozinhos. Só de pensar na possibilidade, eu já fiquei excitado.
Depois da meia noite, a gente se despediu e eu passei o computador pro meu amigo. Mesmo ainda estando com um pressentimento negativo, eu estava feliz. Meu namoro até que estava indo bem, embora estivesse namorando há menos de uma semana.
Fui pra sala. Os companheiros de quarto Fabrício e Vinícius estavam assistindo televisão

- E aí? – cheguei e sentei ao lado do Fabrício.
- Como vai? – ele perguntou.
- Muito bem.
Vinícius e eu nos fitamos. Ele estava com o rosto muito sexy e pra variar, só de cueca.

- Você vai trabalhar domingo? – Vini perguntou.
- Aham. Por quê?
- Porque a gente tem que fazer compras, lembra?
- Sim. Não pode ser à tarde?
- É que o supermercado fecha meio dia.
- Ah, é? Pensei que íamos fazer em um que ficasse aberto até de noite. Sendo assim tudo bem. Eu falo com a Dona Elvira e explico o ocorrido.
- Certeza?
- Sim.
- Olha lá, hein? Nâo vai deixar a gente na mão.
- Relaxa. Eu tenho palavra!!!
Nós três ficamos vendo televisão até uma hora da manhã. Depois que o Fabrício desligou o televisor, eu fui direto pro meu quarto e capotei na minha cama. O sono chegou rapidamente.


O único acontecimento bacana da sexta-feira foi a chegada do meu crachá de acesso para a academia. Eu me perguntei por que teria que ser um crachá.
- Com isso você vai se identificar na academia e garantir seu desconto. É com isso que você vai passar pela catraca. Entendeu? – perguntou Michel.
- Sim.
Estava explicado. Rodrigo e eu resolvemos fazer a matrícula aquele dia mesmo, depois do expediente.
- Está com seu exame aí? – ele perguntou.
- Na minha carteira e o seu?
- Também.
- Então fechou!
Mandei uma mensagem pro Bruno falando que ia pra academia, mas ele não me respondeu de imediato. Fiquei decepcionado.

- Será que lá é legal? – Rodrigo perguntou.
- Não sei. Nunca entrei em uma academia.
- Caraca...
- É sério.
- Você vai adorar. Tem muita mulher gostosa pra gente ficar olhando.
Dei risada. Ele não era muito de falar sobre mulheres. Eu até pensava que ele era gay!
O que eu queria mesmo era ver o vestiário... Será que eu ia ver algum homem pelado?



Quando a gente chegou no estabelecimento, nosso queixo caiu. Não era simplesmente uma academia. Era “a academia”. Enorme e repleta de equipamentos.
- Pois não? – perguntou uma mocinha.
- Olá... Nós viemos nos matricular...
- Ah, sim. Venham comigo, por favor.
Nós entramos em uma saleta e ficamos lá por mais ou menos meia hora. Ela nos explicou como funcionava a rotina do local e nos indicou o que teríamos que fazer:
- Podem procurar o instrutor. Ele se chama Felipe.
- Como vamos saber quem é ele? – Rodrigo questionou.
- Ele está com uma camiseta amarela com o nome da academia.
- Ah, tudo bem. Obrigado, moça.
Passamos pela catraca e eu varri meus olhos a procura do treinador, mas não o encontrei.
- Vamos dar uma volta? – Rodrigo perguntou.
- Vamos. Quero ver o vestiário.
Nós andamos pelas laterais e demos de cara com uma escada. Subimos e no segundo piso encontramos o vestiário.
Era grande, espaçoso e cheio de armários. Estava absolutamente vazio, mas eu estava ouvindo barulho de água caindo no chão. Alguém estava tomando banho.
Percorri todo o vestiário até encontrar as duchas. Não sei se era bom ou ruim, mas existia cabine. Fiquei um pouco aborrecido.
- Vamos descer, quero conhecer o professor...
- Vamos – concordei.
Descemos e rapidamente o localizamos. Ele estava falando com um homem de meia idade.
Quando eu me aproximei do Felipe, meu coração disparou e a minha boca ficou cheia de água. Que homem gostoso...
Todo musculoso, com os cabelos loiros arrepiados e os olhos magnificamente verdes. Incrivelmente lindo. Lindo até demais.
Ele tinha uma tatuagem saindo pela manga da camiseta que estava colada ao bíceps. Se eu já estava com calor antes, naquele momento me senti no meio de um deserto com sol de 50º C. Comecei a suar frio.

- Boa noite – disse Rodrigo. – Você é o Felipe?
- Isso – que voz máscula ele tinha.
- Nós somos novos... A moça pediu pra gente falar com você...
- Ah, beleza. Como se chamam?
- Rodrigo.
Ele me olhou. Eu abri a boca, mas não soube o que responder.
- E você?
- Hã? Ah, Caio.
- Bem-vindos, rapaziada – ele apertou a nossa mão. Que mão forte ele tinha... – Vão começar quando?
- Acho que na segunda-feira, né? – meu amigo me olhou, mas eu não tirei os olhos daquele ser magnífico.
- Aham – concordei, mesmo sem ter entendido muito bem.
- Beleza. E vocês vão querer o quê? Ganhar massa? Perder gordura?
- Ganhar massa – respondeu Rodrigo.
- E você? – ele me olhou de novo.
- Também – respondi. Que homem maravilhoso...
- Já fizeram academia antes?
- Já – respondeu meu amigo.
- Não – eu respondi em seguida.
Rodrigo e Felipe ficaram conversando por um tempo, depois eles voltaram a me incluir no assunto:
- Vou montar uma ficha de treino para vocês. Na segunda-feira vocês me procuram que a gente começa, beleza?
- Sim – falamos juntos.
Se eu pudesse, começava naquele momento só para desfrutar daquela visão dos céus!!!
- Que horas vocês vão chegar, mais ou menos?
- Ah, por volta desse horário – respondeu Rodrigo.
- Então eu vou esperar por vocês. Bem-vindos novamente.
- Obrigado – nós respondemos e nos despedimos.
Por que o papo não demorou mais? Quando eu coloquei os pés pra fora da academia, me arrependi amargamente de ter pensado tanto no Felipe. Como ficava o Bruno nessa história?


Dona Elvira não se opôs quando eu disse que não iria no domingo, mas eu não expliquei qual era o real motivo pelo qual ia faltar.
- Não se preocupe, querido – disse ela. – Imagino que você precise descansar um pouco.
- Preciso sim, Dona Elvira. Me sinto muito cansado ultimamente.
- E não é pra menos. Você tem trabalhado demais, coitadinho...
- Preciso de dinheiro.
- Dinheiro não é tudo. Em primeiro lugar fica a nossa saúde. Nunca esqueça disso.
- A senhora tem razão.
Bruno e eu quase não nos falamos no sábado. Quando eu entrei na operação, ele e os demais operadores da manhã foram quase expulsos pelo meu então supervisor.
- Eu te ligo – ele falou.
- Eu espero.
E ele ligou mesmo, mas não ficamos conversando por muito tempo pois naquela época as ligações entre celulares, mesmo sendo da mesma operadora, não eram baratas como hoje em dia.
- Nos vemos amanhã – ele falou.
- Estarei aí no horário combinado – prometi.
Eu mal podia esperar pra ficar a sós com ele novamente, mas o que eu não sabia, é que nós não íamos mais ficar sozinhos durante muito tempo.

Saímos de casa às 10 da manhã. Era a primeira vez que eu saia com os 5 ao mesmo tempo. Parecia até uma excursão.
Quando chegamos no supermercado, pegamos um carrinho e o Fabrício ficou responsável pela direção.

- Por que eu? – ele reclamou.
- Porque sim – respondemos juntos.
- Acho bom alguém me ajudar.
Acabamos fazendo um rodízio. Cada hora um dirigia por entre as prateleiras.
- Vamos comprar carne? – perguntou Ricardo.
- Acho bom né? – disse Willian. – Vamos comer arroz com feijão o mês inteiro?
- Mas quanto a gente compra?
- Compra pro mês inteiro logo – disse ele. – A gente deixa no freezer...
- Boa ideia – concordou Rodrigo. – Mas o que a gente compra?
- Vamos ter que debater – disse o chefe da cozinha. – Todos comem frango, não?
- Sim – concordamos.
Ficamos debatendo o que comprar, até chegar em um acordo coletivo. A única coisa que eu não queria que eles comprassem era peixe. Não sou muito fã de nada que venha do mar...
- Então a gente diminui no peixe porque o Caio não gosta – disse Willian.
- Por mim podem comprar à vontade...
- Não, a gente tem que economizar e pensar em todos – ele colocou um ponto final no assunto.
- E quanto de carne vermelha? – indagou Fabrício.
- Coloca uns 3 quilos de carne moída. Quero fazer lasanha e o Caio vai fazer macarronada pra gente.
- Vou?
- Vai – ele riu.
- Engraçado, ninguém pergunta se eu quero fazer... Já vão impondo...
- É assim que funciona. Coloca também uma costela e uns 2 quilos de bife de coxão mole...
- Se não fosse o Will a gente ia estar fodido – falou Vinícius.
- Já disse que eu faço isso para a minha sobrevivência – falou o rapaz.
Compras feitas, hora de passar no caixa. A soma passou do valor que tínhamos imaginado, mas não abalou o meu orçamento. A parte mais difícil foi levar tudo pra casa.
Cada um ficou responsável por duas sacolas de feiras que estavam muito pesadas. Ricardo, Rodrigo e eu tivemos mais dificuldade em carregar as compras que os outros.
- Dá para vocês esperarem? – Ricardo reclamou.
- Vocês estão andando muito devagar – Vinícius comentou.
- O peso não está ajudando, sabia? – também reclamei.
- Molengas!!!
Quando eu cheguei em casa, caí exausto em cima do sofá. Eu não estava mais sentindo meus braços.
- Misericórdia – Rodrigo reclamou e tirou a camiseta. Ele estava lavado de suor. – Mês que vem vou alugar uma carriola...
- Boa ideia – concordei, completamente sem ar.
- Preciso de um banho – disse Ricardo.
- Somos dois, fera – concordei.
Depois de recompor as minhas energias, tomei banho e fui colocar minhas lições em dia. Só parei de copiar as matérias para almoçar e na hora de ir pra casa do Bruno.

Antes de sair, tomei outro banho e coloquei uma roupa limpa. Eu queria que tudo estivesse perfeito pro meu amorzinho.



O metrô estava tão lento naquele domingo que eu acabei me atrasando. Quando eu coloquei a mão na campainha, a porta da sala abriu e a Dona Terezinha apareceu na garagem.

- Boa noite, Dona Terezinha. O Bruno está?
- Olá. Está sim. Pode entrar, ele está no quarto...
- Com licença.
Resolvi não chamá-lo. Queria fazer uma surpresa. A Dona Terezinha saiu para ir a missa e eu subi as escadas o mais silenciosamente possível.
Quando eu cheguei na porta do quarto do Bruno, percebi que a mesma não estava trancada e me aproximei lentamente, mas parei abruptamente quando ouvi vozes saindo de dentro daquele ambiente:

- Para – era a voz dele, mas não parecia normal. – O Caio vai chegar...
- Ele está atrasado – eu reconheci a voz do Léo imediatamente.
O que o Leonardo estava fazendo ali? Meu coração disparou e minha garganta deu um nó. Eu dei mais dois passos e encostei o ouvido na porta.
- Já disse pra você parar, porra – era a voz dele de novo.
- Que é? Tá com medo do idiota do seu namoradinho descobrir?
- Não fala assim dele!!!
- Vai defendê-lo agora? – Leonardo perguntou.
O que eles estavam fazendo? Eu apurei os ouvidos e ouvi estalos de beijo. Não. Não era possível. O Bruno não podia estar me...
Eu abri a porta do quarto com muito cuidado para não fazer barulho. Sim. Ele estava me traindo. Me traindo com o meu melhor amigo...
Eles estavam deitados na cama e se beijavam. Eu não sabia o que fazer. Parecia que o mundo tinha desmoronado nas minhas costas. Eu senti um peso enorme nas minhas pernas e uma vontade monstra de chorar.
Me traindo. O Bruno estava me traindo!!!
Eu segurei o choro e fiquei olhando aquela cena nojenta. Como ele pôde ser capaz...?
- Para Léo...
Bruno empurrou Leonardo com a mão esquerda e em seguida percebeu a minha presença. Ele ficou mais branco do que já era e sentou na cama rapidamente.

- Caio...
Meu melhor amigo virou e arregalou os olhos quando me viu. Ele levantou da cama e ficou de pé rapidamente.

- Caio, amor... Eu... Eu posso... Eu posso explicar – disse Bruno.

Explicar? Explicar o quê? Explicar o inexplicável? Explicar o que não tinha explicação?
Será que ele achava que eu era idiota? O que ele queria me explicar? Que ele estava me traindo com o meu melhor amigo?
E o Leonardo? O que ia justificar? Eu não tinha sido traído. Eu tinha sido duplamente traído. Eu senti uma dor do tamanho do universo – ou talvez um pouco maior – invadir o meu peito. Nem quando eu fui espancado pelo meu pai eu senti uma dor tão forte, tão intensa e tão horrível como aquela que estava sentindo naquele momento.

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