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uando eu cheguei na casa do meu amigo, percebi que tinha um carro
na garagem. Carro aquele que eu nunca havia visto antes. Achei aquilo estranho.
Seria alguma visita?

- Conseguiu? – Víctor foi me recepcionar com um sorriso nos lábios.
- Consegui. Está tudo aqui nesse saco de lixo. É assim que eles me tratam, como se eu fosse um lixo...
Meu melhor amigo ficou sério e suspirou profundamente.
- Tem alguém aí? – questionei.
- Meus pais chegaram de viagem.
- Seus pais? – eu me assustei e me preocupei.
- Sim, mas fique tranquilo. Eu contei pra eles e eles não se opuseram a sua presença, pelo contrário. Vão te ajudar.
- Fico muito grato...
- Vem, vou te apresentar.
Nós entramos e eu vi um casal jovem, muito jovem no sofá da sala. Eles eram muito bonitos.
- Mãe, pai, esse é o Caio, meu amigo.
- Oi – quase não soube o que dizer.
- Muito prazer, Caio. Eu sou a Susana. É um prazer conhecê-lo.
- O prazer é todo meu.
- E eu sou o Roberto. O Víctor nos contou o que aconteceu. Pode contar com o nosso apoio.
- Eu estou muito agradecido, de verdade. Podem contar com a minha ajuda no que for preciso e quando eu tiver algum dinheiro, vou pagar todo o tempo que estou aqui, podem confiar.
- Não tem que pagar coisa nenhuma, é um prazer poder ajudar – a mãe do meu amigo falou. – O que aconteceu com você foi bem grave...
- Você tinha que ter ido na polícia, Caio – disse Roberto. – Isso é um crime!!!
- Não, por favor, não... é melhor não mexer mais nesse assunto. Já aconteceu, eu vou dar a volta por cima...
- No que precisar, pode contar conosco – Susana abriu um sorriso sincero.
- Obrigado, muito obrigado mesmo. De coração.
Eles me deixaram bem à vontade. A família do meu amigo era muito unida e eu fiquei com um pouco de inveja dele. Se eu tivesse pais como os do Víctor, com toda certeza as coisas seriam bem diferentes.
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uando eu saí da secretaria da escola e coloquei os pés na rua, dei
de cara com o meu irmão.

- Olha só, quem eu vejo... o viadinho da família – ele zombou.
- Acho que agora você está satisfeito, né? Finalmente conseguiu se livrar de mim...
- Você não tem noção de como eu estou feliz. Agora é tudo só pra mim. Não tenho que dividir nada com você!!!
- Pois então faça bom proveito, infeliz. Você merece a família que tem, eu não.
- Nós é que não merecemos ter uma pessoa como você dentro de casa. Meus pais estão com vergonha de sair na rua por sua causa.
- Não diga? Eles deveriam ter vergonha do que são, isso sim.
Cauã deu risada.
- Vira homem, bicha nojenta!
- Eu sou homem e muito mais homem do que você imagina!
- É homem porra nenhuma, você não passa de um inseto, um verme daqueles bem nojentos. Boiola...
- Antes ser boiola do que ser como você é, irmãozinho!!! E se você quer ver um verme, é só olhar no espelho!
- Seu arrombado do caralho... ainda bem que você sumiu da minha casa, seu micróbio!
- Ainda bem. Ainda bem mesmo. Muito bom saber que eu estou livre de você.
- Digo o mesmo. Arrombado!!!
- Cala a boca, idiota. Vai correr atrás dos seus amiguinhos e procura outro pra você azucrinar!
Não esperei por nenhuma resposta e atravessei a rua.
- ARROMBADO DOS INFERNOS. BICHA. VIADO, BOIOLA. MARIQUINHA... VIRA HOMEM, PORRA!
Virei pra ele e mostrei o dedo do meio. Não estava disposto a deixar nenhuma ofensa barato. Como eu e o Cauã éramos tão idênticos e ao mesmo tempo tão diferentes??? Como aquilo era possível?
- Você tem certeza que quer fazer isso? – ele perguntou pela
enésima vez.
- Absoluta, Víctor. Não posso mais ficar nessa cidade. Não aguento mais ter que ficar preso dentro da sua casa, não me sinto à vontade saindo nas ruas e correndo o risco de encontrar algum conhecido a qualquer momento...
- Mas você não conhece nada no Rio, Caio.
- Mas eu preciso tentar!!!
- Bom se é isso que você quer, eu te apoio.
- Muito obrigado, amigo. Pode ter certeza que eu vou devolver tudo o que você me emprestou, tá? Eu juro que devolvo centavo por centavo e com jurus.
- Não seja idiota, garoto. Não tô falando por causa do dinheiro.
- Mas eu me sinto na obrigação de devolver tudo. E prometo que assim que tiver condições eu vou fazer isso.
- Não se preocupa. De verdade.
- Absoluta, Víctor. Não posso mais ficar nessa cidade. Não aguento mais ter que ficar preso dentro da sua casa, não me sinto à vontade saindo nas ruas e correndo o risco de encontrar algum conhecido a qualquer momento...
- Mas você não conhece nada no Rio, Caio.
- Mas eu preciso tentar!!!
- Bom se é isso que você quer, eu te apoio.
- Muito obrigado, amigo. Pode ter certeza que eu vou devolver tudo o que você me emprestou, tá? Eu juro que devolvo centavo por centavo e com jurus.
- Não seja idiota, garoto. Não tô falando por causa do dinheiro.
- Mas eu me sinto na obrigação de devolver tudo. E prometo que assim que tiver condições eu vou fazer isso.
- Não se preocupa. De verdade.
Dei um abraço de urso nele. Víctor estava me ajudando demais.
O meu melhor amigo teve a decência de me emprestar todas as economias que tinha guardado. Mais de 600 reais. Acho que durante toda a minha vida, eu seria grato pelo que ele estava fazendo por mim. Se não fosse aquele menino, eu nem teria onde ficar, não teria o que comer e provavelmente teria ficado na rua, debaixo de uma ponte.
No dia da minha viagem, Víctor me acompanhou até a rodoviária. Meu ônibus ia sair às 11 da noite.
- Vou ser eternamente grato por tudo o que você fez por mim, Víctor. Sempre. Pra sempre. Nunca vou esquecer de nada. Nada mesmo.
- Foi um prazer te ajudar. Conte comigo sempre que quiser, sempre. Se precisar de qualquer coisa, é só você me ligar.
- Muito, mas muito obrigado.
- Não tem nada que agradecer. Os amigos são pra essas coisas.
Nós nos abraçamos, mas aquele não foi um abraço qualquer. Foi um abraço demorado. Longo até demais.
- Te adoro – falei em seu ouvido.
- Eu te adoro também, gatinho. Muito mesmo.
- Obrigado por tudo...
- Se cuida. Cuidado lá no Rio... Procura um lugar bacana pra você ficar, hein?
- Pode deixar. Assim que eu arrumar um emprego eu te pago, tá? Prometo.
- Não se preocupa com isso. Seu ônibus chegou. Vai lá, garoto. Boa sorte.
Não consegui segurar a emoção e dei mais um abraço nele. O que seria de mim sem o Víctor?
- Obrigado. Obrigado mesmo.
- Não tem que agradecer – ele repetiu. – Vai lá. Vai lutar pelos seus ideais.
- Obrigado. Eu te ligo quando chegar lá.
- Vou ficar esperando.
Peguei a minha mala e a minha mochila e fui até o ônibus. Entreguei a passagem, o motorista colocou as minhas coisas no bagageiro e eu subi. Um novo caminho ia começar. E eu estava rezando para que tudo desse certo.
Do local onde estava sentado, pude ver meu melhor amigo me observando. Um nó tomou conta de minha garganta e só o que eu pude fazer foi acenar.
Víctor retribuiu e no mesmo momento em que o ônibus deu ré pra pegar a estrada, eu pude ler em seus lábios o “boa viagem” que ele disse. Aquela foi a última imagem que tive do Víctor por anos.
Foram exatas 6 horas de viagem e tudo transcorreu normalmente no
caminho. Quando desembarquei ainda estava escuro. Assim que peguei minhas
coisas, a dúvida surgiu. Para onde ir? Onde ficar? Qual caminho seguir?
- Moço, por favor? Pode me ajudar? Sabe onde tem um albergue por aqui?
- Albergue?
- Ou uma hospedaria que não seja cara...
- Tem algumas lá em Copacabana.
- Qual ônibus eu pego pra chegar lá?
- Tem que atravessar a rua e ir até o terminal que fica do outro lado.
- Ah, tá. Beleza. Obrigado.
Não foi difícil encontrar o terminal que ele tinha falado. Quando entrei, fiz a mesma pergunta e um fiscal me indicou qual era o ponto que eu ia ter que ficar.
Meia hora depois o coletivo estacionou e eu entrei. Paguei a passagem, passei na roleta e me sentei na cadeira que ficava mais próxima ao cobrador.
- Amigo, quando chegar em Copacabana você me avisa?
- Copacabana? Mas esse ônibus não passa em Copa.
- Nâo? – eu arregalei os olhos.
- Ele vai pro Largo do Machado – o cara informou.
- E agora? Qual eu pego?
- Você tinha que ter pego o do ponto de trás.
- Mas foi indicação do fiscal!!!
- Acho que você entendeu errado.
- Conhece alguma hospedaria nesse tal Largo do Machado?
- Tem que perguntar lá.
- Quando chegar me avisa, por favor?
- É o ponto final.
- Obrigado.

Meu coração acelerou. O que eu ia fazer, meu Deus? Aos poucos eu comecei a ficar desesperado e senti vontade de descer daquele ônibus, mas respirei fundo e segui adiante. Pedi em pensamento pro meu anjo da guarda me guiar. Se eu tinha entrado naquele ônibus, não tinha sido por acaso. Tudo ia dar certo, de um jeito ou de outro. Só não adiantava me precipitar.
Quando eu desci do veículo, fiquei ainda mais preocupado, Me vi em uma praça com algumas árvores e uma banca de jornal. A rua estava completamente sem movimento.
O que fazer? Para onde andar? Que rumo pegar?

Muitas perguntas rondavam a minha cabeça e pela primeira vez, eu achei que tinha tomado a decisão errada. Talvez eu não tivesse que ter saído da minha cidade para ir a um lugar até então desconhecido. Será que tinha sido um erro?
Tentei não me precipitar e usar o raciocínio. Já estava feito. Eu estava no Rio de Janeiro e não podia simplesmente voltar pra São Paulo sem ao menos tentar a sorte. Eu não podia desistir. Onde estava a minha determinação e força de vontade?

Entrei na primeira rua à esquerda e comecei a caminhar. Depois de alguns minutos, uma mulher apareceu e o meu coração bateu aliviado. Talvez ela pudesse me ajudar.
- Com licença? Bom dia, pode me dar uma informação?
- Qual é? – o sotaque dela era bem acentuado.
- Sabe onde tem uma hospedaria por aqui? Um albergue ou qualquer coisa do tipo?
- Segue reto, lá na frente tem uma hospedaria.
- Como se chama?
- Não sei. Olha as placas – a moça saiu andando e não me deu mais atenção.
- Muito obrigado.
Que grosseria!!!
Mas eu fiz o que ela falou. Segui adiante e depois de aproximadamente 15 minutos caminhando, vi uma placa onde estava escrito: “Hospedaria Oásis – Quartos Para Cavalheiros”. Meu coração bateu aliviado. Graças a Deus eu tinha encontrado um lugar para ficar. Subi as escadas e me deparei com uma recepção. O prédio era bem velho.
- Bom dia, vocês tem vaga?
- É para você? – perguntou o rapaz da recepção.
- Supostamente.
- Nâo, não tem.
A preocupação voltou de imediato.
- Sabe me dizer onde tem outra hospedaria?
- Bem ao lado.
- Tudo bem, muito obrigado.
Eu desci e continuei andando. A “Hospedaria Glória” era realmente ao lado, mas também estava lotada. Comecei a ficar realmente preocupado e me arrependi de ter feito aquela loucura.
- Moço, por favor, sabe onde tem uma hospedaria ou um albergue por aqui?
- Tem uma aí atrás.
- Eu acabei de sair de lá, estão sem quartos.
- Bom, então tem uma lá na Lapa.
- Fica muito longe daqui?
- Que nada, uns 10 minutos andando. É só seguir reto.
- Sabe o nome de lá?
- “H Souto”. Lá tem ar condicionado e tevê com acesso a filme pornô.
Meu rosto esquentou. Quem disse que eu queria aquilo? Eu só queria um lugar pra ficar.
- Tudo bem, obrigado.
Continuei andando e rapidamente me deparei com o local informado. Abri a porta e subi a escada de madeira. Aquele local era muito estranho. Quando toquei a campainha, o portão abriu e eu continuei subindo. Definitivamente, aquilo não era uma hospedaria.
- Olá, você tem um quarto?
- Vai desocupar daqui meia hora, mas tem gente na sua frente – disse o homem.
Eu virei pra trás e vi dois jovens sentados no chão.
- Quanto é a diária?
- Diária?
- É, me indicaram aqui como hospedaria.
- A diária é R$ 170,00.
R$ 170,00? Se eu pagasse tudo aquilo, ficaria sem dinheiro em menos de uma semana!
- Sabe onde tem uma hospedaria por aqui?
- Não, não sei.
- Obrigado.
Aquilo era um motel. De 5ª categoria, mas era um motel. E eu nunca tinha entrado em um. Não tinha nem dado meu primeiro beijo com um garoto, que dirá ter tido a minha 1ª vez...
Quando eu cheguei na esquina daquela rua, encontrei outra hospedaria, onde estava escrito: “Quartos para Rapazes”. Bati na janela e um senhor de idade foi me atender.
- Bom dia, o senhor tem um quarto?
- Não. Está lotado.
- Ai meu Deus... Sabe onde tem algum lugar por aqui? Que seja barato?
- Não faço ideia.
Respirei fundo.
- E em outro bairro, o senhor conhece?
- Bem, até tem um quarto; é o último, mas não tem ventilador nem televisão.
- Tudo bem, tudo bem, não tem problema – meu coração foi parar no lugar do cérebro de tanto alívio. – Quanto é a diária?
- R$ 20,00.
Ótimo preço, mas eu ia tentar um descontinho.
- Eu quero ficar aqui por um bom tempo, não tem como me dar um desconto? É que eu vou morar aqui no Rio e não tenho muito dinheiro...
- Quanto tempo você pretende ficar?
- Alguns meses, eu acho...
- Já que é assim, posso fazer pela metade do preço, mas você tem que pagar adiantado.
- Tudo bem, tudo bem. Fica R$ 300,00 pelo mês todo, né?
- Isso. Preenche essa ficha.
O velhinho me deu uma caneta e um papel com algumas perguntas. Coloquei meu nome, data de nascimento e os outros dados e depois entreguei o dinheiro. Com aquele gesto, me restou bem pouca grana.
- Vou levá-lo até o seu quarto. Me acompanhe.
- Aqui só mora homem? – perguntei.
- É. Não pode trazer visitas.
- Não tenho ninguém pra trazer mesmo.
Nós subimos quatro lances de escada e ele abriu uma porta de madeira. O quarto era muito pequeno. Tinha só um armário de duas portas, uma mesa e uma cama de solteiro – além de uma pia que ficava ao lado do guarda-roupa.
- Os banheiros ficam ali na frente.
- Tudo bem. Como o senhor se chama?
- Manollo.
- Muito obrigado, Seu Manollo. O senhor salvou a minha vida, de verdade.
- Ah, que bom, que bom.
Ele saiu e me deixou com a chave daquele quarto que praticamente não tinha ventilação. Eu abri a minha mala, peguei uma toalha, meu xampu e sabonete e procurei o banheiro pra poder tomar um banho e depois dormir. Confesso que estava me sentindo bem mais tranquilo depois que encontrei aquele lugar pra ficar. Não era um hotel cinco estrelas, mas era o que eu podia pagar naquele momento.
Eram dois banheiros juntos. Os dois tinham um vaso sanitário e um chuveiro, mas um deles estava sem água. Quando eu abri a ducha, a água fria caiu sobre o meu corpo, fazendo com que eu desse um pulo de susto.
- AI – gritei por causa da água fria.
Tomei um banho rápido e me sequei. Meus lábios estavam tremendo de frio. Coloquei a cueca e enrolei a toalha na cintura. Quando entrei no quarto, tranquei a porta, coloquei a chave sobre a mesa e deitei na cama. Não tinha cobertor, só um lençol fino e foi com ele que eu me cobri, mas não consegui me esquentar.
Acordei só depois do meio dia. A minha barriga estava roncando
muito, mas eu não tinha nada para comer. Precisava procurar um lugar onde
pudesse almoçar e que não fosse muito caro.
- Vai sair, rapaz? – perguntou Seu Manollo.
- Aham. Onde tem um restaurante por aqui?
- Segue reto que você vai encontrar. Quando você for sair, deixe a chave aqui na recepção, porque se você perdê-la não temos como abrir a porta.
- Vai sair, rapaz? – perguntou Seu Manollo.
- Aham. Onde tem um restaurante por aqui?
- Segue reto que você vai encontrar. Quando você for sair, deixe a chave aqui na recepção, porque se você perdê-la não temos como abrir a porta.
- Ah, tudo bem. Obrigado.
Eu entreguei a chave e saí. O sol estava forte, embora fosse inverno. Depois de almoçar, eu precisava ir até a praia. Sempre gostei muito do mar, desde pequeno e já que estava no Rio de Janeiro, ia aproveitar ao máximo.
Encontrei um bar onde servia almoço e entrei. Pedi bife com batata frita por ser o prato mais barato, mas ainda assim achei caro. Eu precisava arrumar um emprego logo, senão o dinheiro que o Víctor tinha me emprestado ia acabar logo e depois eu não tinha com o que me virar...
Uma moça me explicou como devia fazer pra chegar na praia e eu segui as suas instruções. Tive que pegar o metrô, porque eu queria conhecer Copacabana. Não foi difícil chegar ao meu destino.
Assim que ouvi o barulho do mar, não consegui resistir: tirei o meu chinelo e saí correndo pela areia. Ali eu tinha certeza que ia conseguir renovar as energias. E era exatamente daquilo que eu precisava.
Fiquei com a água até a cintura. Aquilo era bom demais pra ser verdade. Eu estava no Rio de Janeiro e na Praia de Copacabana. Um dos lugares mais visitados do mundo e onde eu sempre quis estar.
Meus olhos se perderam naquela imensidão azul. Que lugar maravilhoso era aquele. Lindo, perfeito. Eu nunca tinha visto um lugar tão bonito como aquele. Todos os elogios eram poucos. Um lugar realmente muito lindo. Mágico, eu diria.
Fiquei sentado na frente do mar até a noite cair. Quando começou a esfriar, eu resolvi voltar pra minha nova “casa” e quase me perdi, mas felizmente consegui encontrar o local onde estava morando.
Como eu estava com o dinheiro mais do que contado, não podia me dar ao luxo de jantar. Eu tinha que economizar ao máximo, ao máximo mesmo e por causa disso decidi que na manhã seguinte iria começar a procurar um emprego. Precisava arrumar dinheiro, senão a minha situação ia ficar muito complicada.
E assim eu fiz. Acordei cedo e saí pelas ruas da Lapa a procura de qualquer coisa que me gerasse uma pequena renda, mas ninguém quis me ajudar.
Os dias foram passando e o dinheiro acabando. Tive que comprar sabão em pó pra poder lavar as minhas roupas, pois já não tinha o que vestir. Na hospedaria não tinha nem onde secar as roupas, por isso eu as colocava na janela mesmo. Tudo bem precário e improvisado.
Por mais que eu tentasse, não conseguia nada. Nem um emprego, nem um bico, nada. E o dinheiro já tinha acabado. Nem comer eu estava comendo mais. Uma situação realmente difícil, que eu nunca tinha imaginado que ia passar.
Como se já não bastasse, os 30 dias que foram pagos já tinham passado e o Seu Manollo estava ameaçando me expulsar de lá.
- Pelo amor de Deus, Seu Manollo, não faz isso comigo... Eu não tenho mais dinheiro; tô procurando emprego, mas não tô encontrando...
- Vou te dar uma semana. Uma semana. Se não pagar vai ter que sair.
- Por favor, não faz isso comigo, tente me entender... Eu prometo que pago tudo depois, quando eu tiver dinheiro...
- Uma semana – ele repetiu.
Me desesperei. Eu chorei tanto naquela noite que o lençol que me cobria ficou ensopado. O que eu ia fazer, meu Deus? Como eu ia me virar? Se arrependimento matasse, naquele momento eu teria morrido. Não deveria ter saído de São Paulo pra me aventurar no Rio de Janeiro... Aquilo foi definitivamente um erro. O erro da minha precipitação. O erro da minha falta de coragem de enfrentar as pessoas. Um erro que estava custando caro.
E se o Seu Manollo realmente me mandasse sair? E a fome que eu estava sentindo? A única coisa que estava me sustentando era a água da pia e um pacote de bolachas de maisena, que eu tinha que economizar. Uma situação deplorável... Mas eu ainda tinha fé que ia sair daquela situação. Eu estava no fundo do poço, contudo, eu acreditava e confiava que ia dar a volta por cima. Só precisava de um pouco de paciência e fé.
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