S
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O meu coração bateu mais forte do que nunca e eu senti uma espécie de
formigamento em todo o meu corpo. Minhas mãos e meus pés ficaram frios e meu
estômago ficou mais gelado do que a toca de um urso polar.
Eu fiquei totalmente paralisado. Não era possível que depois de tanto tempo o meu sonho estava se tornando realidade!

Incrédulo, porém feliz. Era assim que eu me sentia naquele momento de glória.
Notei que o Caio me olhou com ar de curiosidade. Acho que ele estava esperando algum

posicionamento de minha parte, mas o choque me impediu de tomar qualquer decisão de imediato.
- Isso não é mesmo um sonho? – essa foi a pergunta que eu consegui fazer.
- Se isso for um sonho, eu não quero acordar nunca mais – o descendente de italiano me deu um selinho e em seguida beijou o meu pescoço.
- Caio, isso é sério?
- É mais do que sério, isso é tudo o que eu mais quero nessa vida – aqueles olhos castanhos grudaram com os meus. Ele parecia sincero.
Eu puxei aquele filho da mãe e com as lágrimas caindo dos meus olhos a gente começou a girar pela cama, mas não aconteceu mais nada. Acho que nós estávamos esgotados fisicamente falando para acontecer mais sexo naquela noite de segunda-feira.
- VOCÊ SABE QUANTO TEMPO EU ESTOU ESPERANDO POR ISSO? – eu gritei de felicidade e abracei o meu Caio com o máximo de força que consegui.
- Sei sim, é o mesmo tempo que eu estou esperando, amor!
“Amor”... Eu não acreditei no que estava acontecendo!
- EU TE AMO, CAIO! EU TE AMO!!!

- Eu também te amo, amor da minha vida!!!
Foi impossível segurar a emoção. Só Deus e eu sabíamos por quanto tempo eu esperei aquele momento, por quanto tempo eu lutei para aquilo se tornar realidade. Fiz bem em não ter desistido tão facilmente. No fundo, bem lá no fundo, eu sabia que isso iria acontecer mais cedo ou mais tarde e graças a Deus aconteceu naquele momento!
- Aceita? – a voz dele saiu baixa. Nós estávamos com as testas grudadas e nossos lábios estavam separados por um milímetro. Ou menos.

- Lógico que eu aceito, lógico! É tudo o que eu mais quero nessa vida também...
Rolou um beijo. Meu namorado. Finalmente ele era novamente meu namorado. E nunca mais deixaria de ser, nunca mais.
Felicidade? Mais do que isso. Eu tinha a sensação de estar pisando nas nuvens de tão feliz que eu estava.
Para mim aquele momento veio como uma consagração por todo o meu sofrimento daqueles últimos 3 anos.
Era como se eu estivesse sendo premiado pela minha perseverança, pela minha determinação e pela minha força de vontade em conquistá-lo novamente.
Desde que eu me entendia por gente, acho que nunca eu senti uma felicidade tão grande como a que passei a sentir naquele momento.
- Meu namorado – ele acariciou o meu rosto com muita suavidade.
- Meu namorado – eu repeti e fechei os olhos.

Não poderia ter sido melhor. Depois de uma noite incrível como aquela, finalmente nós estávamos juntos outra vez. Eu não poderia querer mais nada da vida à partir daquele momento.
Eu tinha um emprego razoável, uma vida estável, estudava e tinha o homem da minha vida ao meu lado. O que poderia ser melhor que isso?
Para a minha felicidade ficar completa de verdade, só o que faltava era meu pai, mas isso infelizmente eu nunca mais teria.
Mas como dizem por aí, ninguém é feliz totalmente e eu não poderia exigir mais nada. O Caio era suficiente e estar novamente com ele, já era bom demais.
Nosso beijo durou mais de uma hora, porque eu ouvi o relógio apitar duas vezes e mais uma vez me perguntei quanto tempo havia passado.
Pela primeira vez naquela noite, eu passei a sentir sono, muito sono e acho que o mesmo aconteceu com o Caio.
- Vamos tomar outro banho? – ofereci.
- Só se você me der um beijo.

Um? Eu dei vários beijos. Um melhor do que o outro. Quando nos demos por satisfeitos, levantamos, seguimos novamente pro banheiro e tomamos outro banho juntos. Eu já tinha perdido as contas de quantos nós havíamos tomado naquela noite.
Mais uma vez lavei meus cabelos e ele ensaboou todo o meu corpo. Quando chegou no meu pau, ele segurou com força e eu fiquei mais uma vez excitado, mas eu não ia conseguir gozar mais. Meu pênis estava sensível e dolorido. Será que o dele também estava assim?
- Te amo, príncipe – falei baixinho.
- Eu te amo mais!
- Duvido.
Um beijo.
- Vem, vamos pra cama.
Confesso que fiquei com vontade de fazer mais uma rodada de sexo com meu namorado, mas deduzi que ele teria que trabalhar naquele dia e só por causa disso – e também pelo meu cansaço –, resolvi não fazer mais nada naquela noite. Haveria tempo pra isso no futuro.

Troquei a roupa da cama porque estava imunda e forrei o meu edredom preferido. Naquela noite nós íamos dormir abraçadinhos de novo e eu estava contando os segundos para isso acontecer.
Uma vez deitados, ficamos abraçados e em silêncio, um curtindo a presença do outro, mas de repente ele começou a falar:
- Príncipe, vamos conversar um pouquinho? – Caio acariciou o meu rosto com suavidade.
- Uhum. Deixa eu apagar a luz e ligar o abajur, é rapidinho.
Eu nem precisei sair da cama para desligar a luz. Apenas ergui o corpo, passei a mão no interruptor e só quando fui ligar o abajur percebi que o mesmo estava caído no chão:
- Nossa... O abajur caiu e eu nem vi!
- Caiu? – ele perguntou com a voz divertida.
- E quebrou todinho – eu gargalhei.

Como eu não vi aquele objeto estraçalhado na hora de arrumar a cama? Será que fui eu o culpado? Ou teria sido ele? Ou nós dois, talvez?
- Será que fui eu? – ele ficou sem graça.
- Ah, deixa pra lá – voltei e o abracei com tanto carinho que até fiquei mole.
- Eu vou te dar outro, tá?
- Não precisa, príncipe. Deixa que depois eu compro outro. O que você quer falar comigo?
Será que ele ia pedir desculpas?
- Eu queria te pedir desculpas, Bruno.
Fiquei calado, apenas processando aquela informação. Finalmente!
- Eu queria te pedir perdão, porque eu fui um verdadeiro crápula com você e você não merecia isso.
- Tudo bem...
- Não, não está tudo bem – ele interveio. – Não está tudo bem. Eu fui um idiota, eu fui um insensível, eu fui um tonto, um burro por não ter acreditado em você...
- Caio, você teve seus motivos – me afastei e grudei as nossas testas. – Eu sei que você teve seus motivos.
E teve mesmo. Talvez se eu estivesse no lugar dele, teria feito a mesma coisa. Talvez pior.
- Mas meus motivos deveriam ter acabado à partir do momento que a sua sobrinha confirmou a sua versão, mas não... Eu ainda continuei com a minha raiva, com a minha teima...
- Eu fiquei tão chateado com você, Caio...
Fiquei mesmo. Chateado até demais. Ele soube da verdade com duas provas. Primeiro, ouvindo a minha conversa com meu melhor amigo no banheiro do shopping. Segundo, ouvindo da boca da minha sobrinha que eu tinha sido expulso de casa pelo pai dela. O que mais ele queria?
- Me perdoa, por favor... Eu estava cego pelo meu orgulho, pela minha arrogância, pelo meu egoísmo... Eu estou tão envergonhado, amor...
Que lindo! Derreti nesse momento.
- Ei... Não fica assim...
- Fico sim – meus olhos lacrimejaram. – Eu não queria ter feito tudo isso, porque eu te amo, Bruno! Eu te amo, sempre te amei, nunca deixei de te amar...

- Eu também nunca deixei de te amar...
- Durante esse tempo que você ficou fora, não teve um dia em que eu não tenha pensado em você...
- Eu também pensei em você todos os dias, Caio. Todos os dias!
Isso era realmente verdade. lembrei das noites insuportavelmente geladas da Europa em que eu era obrigado a dormir em um colchão no quartinho dos fundos da casa do meu padrinho e que eu só ficava pensando no Caio.
- Mas quando você voltou, a minha razão falou mais alto e eu não conseguia admitir o quanto você é crucial na minha vida, entende?
- Entendo, amor. Eu também errei em não ter falado nada pra você naquela época, eu também errei em sair assim sem mais nem menos, sem pelo menos te dar uma satisfação. Eu também tenho que te pedir perdão.
- Você já pediu tanto – Caio suspirou. – E eu nunca quis te ouvir...
Nesse instante rolou um selinho.
- Ah, Bruno... Eu fui tão idiota, amor...
- Já passou. E você está aqui agora.
- O Vítor me entregou o vídeo hoje e quando eu vi, eu fiquei desesperado. Você ia mesmo embora?
Grande Vítor! Eu devia uma a ele!
- Ia sim – garanti. – Eu não aguentava mais te ver e não poder ficar contigo.
- Ô, meu Deus – o pobrezinho chorou. – Como eu fui idiota. Como eu fui orgulhoso...
- Não chora, príncipe – só que as minhas lágrimas também caíram. – Vai ficar tudo bem agora, não vai?
- Vai... Vai sim, vai sim... Eu prometo que vai ficar tudo bem, eu prometo!!! – senti firmeza na voz dele.
- Desculpa...
- Nâo, eu é que te peço desculpas! Se você tivesse ido embora por minha causa, eu jamais me perdoaria. Jamais!
- Eu ia sim, mas eu não sei se ia ficar lá por muito tempo. Eu te amo tanto, Caio, que talvez eu voltasse do aeroporto mesmo.
- Deus é tão bom que Ele ouviu as minhas preces. Eu pedi, eu implorei pra dar tempo de te encontrar e deu tempo... Deu tempo, amor... Você não foi... Graças a Deus, graças a Deus...
- Eu fiquei tão feliz quando te vi, Caio...
- Não mais do que eu, acredite. Me perdoa, Bruno? Me perdoa, por favor...
- Seu bobo – eu sequei as lágrimas dele e o beijei. – Eu te perdoo sim, eu te amo, menino lindo!
- Eu te amo mais... Eu te amo muito, muito mais...
Nos beijamos e foi um beijo salgado, porque ambos choramos. Era impossível controlar a emoção porque nós dois sofremos muito naquela vida, porque eu esperei por aquele acontecimento por muito tempo e provavelmente isso também aconteceu com ele.
- Me perdoa... – ele sussurrou.

- Te perdoo, seu bobo lindo que eu tanto amo!
Que felicidade tomou conta de mim! Meu coração acelerou e gritou de felicidade e a minha razão ficou acuada, coagida no meu cérebro. Ela não abriu a boca e não falou nada. Finalmente o nosso amor tinha vencido, finalmente.
E finalmente também ele tinha caído em si. Finalmente ele tinha percebido que eu mudei por causa dele e que eu o amava com todas as forças da minha alma. Finalmente ele tinha pedido perdão pelos seus erros e finalmente eu pude perdoá-lo, finalmente ele pôde me perdoar e finalmente as coisas voltaram ao normal, do jeito que sempre foram e do jeito que sempre teriam que ser.
- Você ia pra Espanha de novo? – indagou.
- Ia sim. Eu ia pra casa do meu padrinho novamente. Só assim eu ficaria longe o suficiente de você.
- Nem sei o que eu faria se isso tivesse acontecido, sabia?
- Eu também não. Eu estava sofrendo tanto que nem comia mais direito.
- Coitadinho... – Caio pareceu chateado.
- E eu odiava te ver com o Murilo. Pronto, falei.
- E eu odiava ficar com ele – meu anjo abriu o jogo. – Mas nós já terminamos.
- Ah, já não era sem tempo. Esse namorico já durou demais pro meu gosto.
Não nego. Eu morria de ciúmes quando via o meu Caio com meu ex-priminho surfista. Aliás, não só quando o Caio estava com o Murilo, mas quando ele ficava com qualquer um que não fosse eu!
- Lindo, lindo, lindo – ele beijou meu ombro.
- Você que é, seu chato!
Ele era mesmo um chato! Se tivesse ouvido o coração desde o começo, nós dois teríamos voltado há muito tempo! Mas mesmo sendo chato eu o amava com todas as forças do meu coração!
- Ei... Como foi esse período que você ficou fora, hein?
Era a hora de contar tudo o que eu tinha feito naquele tempo que morei em Madrid e em Barcelona.
- Foi horrível, Caio. Eu cheguei lá em um dia e no outro o meu padrinho já me obrigou a trabalhar com ele.
- Te obrigou? – percebi que ele estava curioso.
- Uhum. Ele disse que ia me acolher, mas eu teria que trabalhar para me sustentar.
- Que maldito... E o que você fez?
Suspirei.
- Eu trabalhei no restaurante dele.
- Como garçon?
- Eu fiz de tudo um pouco, mas eu ficava principalmente com a faxina. Eu lavava os banheiros imundos e lavava o chão também.
Só de lembrar disso eu fiquei com o coração apertado. Não foi fácil passar por tanta humilhação.
- Ai... Que dó... – notei que ele ficou com pena de mim.
- Era tão ruim... Eu chorava tanto...
- Ô, meu Deus...
- Mas foi graças a isso que eu juntei dinheiro. Depois que eu peguei experiência, eu procurei um emprego melhor e aí comecei a ganhar um dinheirinho extra. Foi com isso que eu juntei grana pra voltar pra cá.
- Como em tudo nessa vida, há sempre um lado bom e um lado ruim.
- Sim, mas houve mais momentos ruins do que bons. E eu sofria demais lá em Madrid e em Barcelona. Eu não tinha ninguém pra conversar e vivia em um quarto escuro, que nem janelas e cama tinha.
- Não tinha cama? Nem janelas? E você dormia onde?
- NO chão! Em um colchonete fino.
- Ai, Bruno... – a voz do Caio embargou. – Por que não te deram uma cama, um quarto descente?
- Porque era o único que tinha. Os filhos dos meus padrinhos não gostam de mim e não me receberam bem.

- Pobrezinho!!!
- Eu entrei em depressão – continuei. – Porque eu pensei muito em você. Te procurava e você não me respondia e isso só me deixava ainda mais pra baixo. Eu estava me sentindo culpado, porque o Vítor me disse que você estava mal.
- Ele disse isso?
- Disse. E eu também via isso pelo seu Orkut e pelas frases que você postava no MSN. Eu me senti um lixo, sabe? Eu não queria ter te abandonado, de verdade.
Nosso abraço foi ainda mais forte.
- Agora eu acredito em você. Espero que não seja tarde demais...
- Não, amor – eu me afastei e o beijei com suavidade. – Nunca é tarde demais para se arrepender e pedir perdão.
- Seu lindo... – suspirou.
- Eu morei em Madrid e em Barcelona.


- Ah, é?
- Uhum. Madrid eu morei na casa do meu padrinho e em Barcelona eu morei sozinho em uma quitinete. Eu consegui um trabalho lá em um restaurante também. Eles pagavam bem e eu fazia de tudo um pouco. Juntei um bom dinheirinho com isso, até deu pra dar entrada no meu carro juntando com um pouco da herança do meu pai!
- Que bom, amor. Pelo menos isso, né? Então foi um bom dinheiro mesmo.
- Sim porque lá eles pagam em Euro aí deu pra valorizar bem aqui, mas eu também me matei de trabalhar. Eu não folguei nenhum dia e trabalhava mais de 12 horas diariamente.
- Coitadinho...
- Não foi fácil, Caio – eu suspirei. – Mas passou. Agora eu estou aqui e é isso o que importa. E o melhor de tudo é você estar aqui comigo, amor!
- Eu nunca mais quero sair de perto de você, nunca mais...
- Promete? Promete que a gente vai ficar juntos pra sempre?
- Prometo! Prometo, é claro que eu prometo. Pra sempre!
- Pra sempre!
Selamos a nossa promessa com um beijo e quase partimos pro 9º round, mas fomos vencidos pelo nosso cansaço.
- Bruno?
- Oi, amor?
- Por que você demorou tanto pra voltar?

- Por dois motivos básicos, Caio. Primeiro: eu tinha que terminar meus estudos lá em Barcelona. E segundo: porque eu precisava juntar bastante dinheiro pra fazer um pé de meia aqui no Brasil. Se dependesse de mim, eu teria voltado mais cedo, mas eu tinha que focar nos meus projetos também.
- Entendi!
- Só voltei no começo do ano passado porque enfim consegui terminar os estudos e já tinha dinheiro suficiente. E é claro, também porque não estava mais aguentando de saudades suas.
- Eu também não! E vem cá, por que inventou aquela história de admirador secreto?
- Porque foi a única forma que eu encontrei de preparar o terreno, Caio – eu ri. – Se eu aparecesse na sua frente assim de uma hora pra outra, você provavelmente tacaria um cabo de vassoura na minha orelha!
- Ai que vergonha! Eu faria isso mesmo...
- Cara, você é muito bravo! Você não era assim antes, sabia?
- Você me deixou assim, mocinho! A culpa disso tudo é sua!
- Adoro te ver bravo. Você fica lindo demais!
- Bobo – ele fez cafuné na minha cabeça. – E posso saber como você descobriu que eu estava vestido de vermelho e cheiroso?
- Ah! É que coincidentemente nesse dia eu te vi de longe. Fiquei tão feliz! E quanto ao perfume, apenas deduzi. Você sempre foi cheiroso, sempre!
Era verdade. O Caio se cuidava muito e sempre andava perfumado da cabeça aos pés! Uma delícia!
- Cachorro – ele deu um peteleco na minha orelha. – Eu cheguei a pensar que poderia ser você, mas isso foi em uma única vez.
- Sério?
- É! Porque eu fui esgotando as minhas possibilidades uma a uma. Só que aí você disse que tinha de 20 à 30 anos e eu fiquei confuso...
- Ah, é. Eu falei mesmo. E falei só pra você não desconfiar que era eu. Se falasse a idade verdadeira, você sacaria na hora.
- Seu safado!
O sono estava ficando cada vez mais forte.
- Bruno? Posso te fazer uma pergunta indiscreta?
- Claro – falei.
- Como você consegue... Ser passivo... Depois de tudo o que te aconteceu?
Eu sabia que mais cedo ou mais tarde aquela pergunta iria acontecer.
- Consigo porque fiz 5 anos de acompanhamento psicológico. Só por causa disso.
- Ah... Foi mesmo muito difícil pra você, não é?
- Sim, Caio. Muito difícil. Eu perdi os melhores anos da minha adolescência por causa desse trauma.
- Você disse que ele foi preso, né?
- É, mas ficou só um ano e pouco na prisão. Sabe como é a justiça brasileira, né?
- Maldito! Mas vem cá, como a sua família aceitou aquele traste em casa? Eu não entendo isso, juro por Deus!
- Foi um plano do Márcio e do Luciano. Eles combinaram que o Márcio ficaria uns dias lá no apartamento só pra eu ter motivos pra ir embora do Brasil e deu certo.
- Mas e a sua cunhada? Ela deve odiá-lo? Ou não?
- Sim, ela odeia! Mas a coitada não tem voz ativa naquela casa. Ela é obrigada a aceitar os caprichos do meu irmão. por isso ela não pôde me ajudar em nada, coitada.
- Vocês se falam?
- Às vezes. Eu não tenho nada contra ela e os meus sobrinhos. O meu problema mesmo são com os meus irmãos.
- São só vocês três?
- É! Só nós três.
- É muita sacanagem da parte deles fazer isso com vocês.
- Eles me odeiam, Caio. Nenhum dos dois gosta de mim, mas a recíproca é verdadeira.
- Que nem na minha família. Meus pais e meu irmão também me odeiam.
Nós dois suspiramos ao mesmo tempo.
- Você percebe que a nossa história se repete em muitos aspectos, Caio?
- Verdade – ele concordou.
E se repetia mesmo! Caio e eu fomos expulsos de casa, nossos familiares nos odiavam e nós fomos obrigados a ir para cidades que não conhecíamos.
Nós dois sofremos a dor da rejeição e a dor da separação, no entanto, cada um tinha uma particularidade com relação a outros sofrimentos.
Eu, por minha vez, sofri com a história da minha origem. Eu não era filho de quem achava ser e na verdade daquele que eu julgava ser meu avô, o homem que eu mais amei em toda a minha vida.
Já o Caio, sofreu com a minha traição no comecinho do nosso namoro. Traição essa que eu não perdoava nunca, mesmo que só tivesse sido alguns beijos em um momento frágil da minha vida. Nada jusrificava.
E o sofrimento da separação que ambos vivemos teve duas vertentes.
Pra ele foi mais difícil porque eu saí sem ter tempo de me despedir, sem dar satisfação. E pra mim, talvez tenha sido menos complicado porque eu sabia a razão da minha saída, todavia, sabia também que ele sofria e muito com a situação e isso atenuava a minha culpa, o que me fazia me sentir ainda pior.
Nossos destinos se cruzaram e nossas histórias se misturaram. Eu queria entender por qual motivo nós nos parecíamos tanto.
Nós nos aprofundamos na tragédia. Eu contei como foi o meu tratamento e como consegui vencer aquele trauma.
Não foi um processo nada fácil, mas no decorrer daqueles 5 anos, dia após dia, eu fui conseguindo voltar à vida e enfim pude passar uma borracha em tudo o que tinha acontecido.
Obviamente, eu ainda sentia aquela dor maldita dentro do meu peito, mas eu já conseguia conviver com ela de uma forma tranquila.
Eu só não conseguia perdoar o Márcio. Isso eu não conseguia mesmo. Talvez nunca fosse possível fazer isso.
Ele acabou com a minha vida e ainda por cima foi responsável pela morte do meu pai. Isso pra mim não tinha perdão jamais!
- Eu queria saber como foi a sua vida aqui também – eu deitei a cabeça no peitoral do meu namorado.
- Eu te conto tudo, mas agora a gente precisa dormir.
- Você trabalha hoje?
- Uhum e você?
- Eu também. Vou entrar às 13 horas.
- Mesmo horário que eu, amor.
- Deixa eu ver que horas são aqui no celular...
Me surpreendi com o avanço das horas. Já era bem tarde.
- Quase 5 já. Melhor a gente dormir, né?
- Infelizmente – eu bocejei. – Bruno? Se você vai trabalhar hoje, como você ia viajar?
- Eu ia abandonar tudo, Caio. Só isso!
Ele ficou calado.
- Te amo, meu príncipe lindo – subi no tronco dele e beijei seus lábios.
- Você que é meu príncipe, seu bobo. E eu nunca mais vou largar você, nunca mais. Obrigado por me perdoar, amor... E me desculpa de novo por ser tão cabeça dura.
- Me desculpa também por eu não ter falado nada e por ter te abandonado nas vésperas de seu aniversário. Eu me arrependo muito.
- Eu me arrependo de tudo o que eu te causei também. Me perdoa...
- Lógico que eu te perdoo, lógico!
A gente voltou a trocar um beijo apaixonado, mas este foi o último daquela incrível noite que passamos juntos.
Tanto eu, como Caio estávamos pra lá de cansados, estávamos exaustos. A noite tinha sido perfeita e ia ficar pra história, mas era a hora de descansar, porque nós tínhamos que tocar a nossa vida da melhor forma possível daquele dia em diante.
E eu ia tocar, eu tinha certeza. Com o Caio ao meu lado, as coisas iam ser muito mais fáceis de serem resolvidas.
Eu conseguiria ultrapassar mais facilmente os obstáculos, conseguiria vencer mais facilmente os meus inimigos e conseguiria encarar com mais força as dificuldades da vida.
Estar ao lado do meu homem ia me tornar mais forte em todos os sentidos possíveis e inimagináveis.
E a felicidade seria constante à partir daquele momento. Eu não ia deixar o Caio escapar mais das minhas mãos. Nós íamos ficar juntos para sempre, para sempre. No que dependesse de mim, nós não separaríamos nunca mais. E eu tinha mais do que certeza que todos esses planos iam dar certo.

Eu fiquei totalmente paralisado. Não era possível que depois de tanto tempo o meu sonho estava se tornando realidade!
Incrédulo, porém feliz. Era assim que eu me sentia naquele momento de glória.
Notei que o Caio me olhou com ar de curiosidade. Acho que ele estava esperando algum
posicionamento de minha parte, mas o choque me impediu de tomar qualquer decisão de imediato.
- Isso não é mesmo um sonho? – essa foi a pergunta que eu consegui fazer.
- Se isso for um sonho, eu não quero acordar nunca mais – o descendente de italiano me deu um selinho e em seguida beijou o meu pescoço.
- Caio, isso é sério?
- É mais do que sério, isso é tudo o que eu mais quero nessa vida – aqueles olhos castanhos grudaram com os meus. Ele parecia sincero.
Eu puxei aquele filho da mãe e com as lágrimas caindo dos meus olhos a gente começou a girar pela cama, mas não aconteceu mais nada. Acho que nós estávamos esgotados fisicamente falando para acontecer mais sexo naquela noite de segunda-feira.
- VOCÊ SABE QUANTO TEMPO EU ESTOU ESPERANDO POR ISSO? – eu gritei de felicidade e abracei o meu Caio com o máximo de força que consegui.
- Sei sim, é o mesmo tempo que eu estou esperando, amor!
“Amor”... Eu não acreditei no que estava acontecendo!
- EU TE AMO, CAIO! EU TE AMO!!!
- Eu também te amo, amor da minha vida!!!
Foi impossível segurar a emoção. Só Deus e eu sabíamos por quanto tempo eu esperei aquele momento, por quanto tempo eu lutei para aquilo se tornar realidade. Fiz bem em não ter desistido tão facilmente. No fundo, bem lá no fundo, eu sabia que isso iria acontecer mais cedo ou mais tarde e graças a Deus aconteceu naquele momento!
- Aceita? – a voz dele saiu baixa. Nós estávamos com as testas grudadas e nossos lábios estavam separados por um milímetro. Ou menos.
- Lógico que eu aceito, lógico! É tudo o que eu mais quero nessa vida também...
Rolou um beijo. Meu namorado. Finalmente ele era novamente meu namorado. E nunca mais deixaria de ser, nunca mais.
Felicidade? Mais do que isso. Eu tinha a sensação de estar pisando nas nuvens de tão feliz que eu estava.
Para mim aquele momento veio como uma consagração por todo o meu sofrimento daqueles últimos 3 anos.
Era como se eu estivesse sendo premiado pela minha perseverança, pela minha determinação e pela minha força de vontade em conquistá-lo novamente.
Desde que eu me entendia por gente, acho que nunca eu senti uma felicidade tão grande como a que passei a sentir naquele momento.
- Meu namorado – ele acariciou o meu rosto com muita suavidade.
- Meu namorado – eu repeti e fechei os olhos.
Não poderia ter sido melhor. Depois de uma noite incrível como aquela, finalmente nós estávamos juntos outra vez. Eu não poderia querer mais nada da vida à partir daquele momento.
Eu tinha um emprego razoável, uma vida estável, estudava e tinha o homem da minha vida ao meu lado. O que poderia ser melhor que isso?
Para a minha felicidade ficar completa de verdade, só o que faltava era meu pai, mas isso infelizmente eu nunca mais teria.
Mas como dizem por aí, ninguém é feliz totalmente e eu não poderia exigir mais nada. O Caio era suficiente e estar novamente com ele, já era bom demais.
Nosso beijo durou mais de uma hora, porque eu ouvi o relógio apitar duas vezes e mais uma vez me perguntei quanto tempo havia passado.
Pela primeira vez naquela noite, eu passei a sentir sono, muito sono e acho que o mesmo aconteceu com o Caio.
- Vamos tomar outro banho? – ofereci.
- Só se você me der um beijo.
Um? Eu dei vários beijos. Um melhor do que o outro. Quando nos demos por satisfeitos, levantamos, seguimos novamente pro banheiro e tomamos outro banho juntos. Eu já tinha perdido as contas de quantos nós havíamos tomado naquela noite.
Mais uma vez lavei meus cabelos e ele ensaboou todo o meu corpo. Quando chegou no meu pau, ele segurou com força e eu fiquei mais uma vez excitado, mas eu não ia conseguir gozar mais. Meu pênis estava sensível e dolorido. Será que o dele também estava assim?
- Te amo, príncipe – falei baixinho.
- Eu te amo mais!
- Duvido.
Um beijo.
- Vem, vamos pra cama.
Confesso que fiquei com vontade de fazer mais uma rodada de sexo com meu namorado, mas deduzi que ele teria que trabalhar naquele dia e só por causa disso – e também pelo meu cansaço –, resolvi não fazer mais nada naquela noite. Haveria tempo pra isso no futuro.
Troquei a roupa da cama porque estava imunda e forrei o meu edredom preferido. Naquela noite nós íamos dormir abraçadinhos de novo e eu estava contando os segundos para isso acontecer.
Uma vez deitados, ficamos abraçados e em silêncio, um curtindo a presença do outro, mas de repente ele começou a falar:
- Príncipe, vamos conversar um pouquinho? – Caio acariciou o meu rosto com suavidade.
- Uhum. Deixa eu apagar a luz e ligar o abajur, é rapidinho.
Eu nem precisei sair da cama para desligar a luz. Apenas ergui o corpo, passei a mão no interruptor e só quando fui ligar o abajur percebi que o mesmo estava caído no chão:
- Nossa... O abajur caiu e eu nem vi!
- Caiu? – ele perguntou com a voz divertida.
- E quebrou todinho – eu gargalhei.
Como eu não vi aquele objeto estraçalhado na hora de arrumar a cama? Será que fui eu o culpado? Ou teria sido ele? Ou nós dois, talvez?
- Será que fui eu? – ele ficou sem graça.
- Ah, deixa pra lá – voltei e o abracei com tanto carinho que até fiquei mole.
- Eu vou te dar outro, tá?
- Não precisa, príncipe. Deixa que depois eu compro outro. O que você quer falar comigo?
Será que ele ia pedir desculpas?
- Eu queria te pedir desculpas, Bruno.
Fiquei calado, apenas processando aquela informação. Finalmente!
- Eu queria te pedir perdão, porque eu fui um verdadeiro crápula com você e você não merecia isso.
- Tudo bem...
- Não, não está tudo bem – ele interveio. – Não está tudo bem. Eu fui um idiota, eu fui um insensível, eu fui um tonto, um burro por não ter acreditado em você...
- Caio, você teve seus motivos – me afastei e grudei as nossas testas. – Eu sei que você teve seus motivos.
E teve mesmo. Talvez se eu estivesse no lugar dele, teria feito a mesma coisa. Talvez pior.
- Mas meus motivos deveriam ter acabado à partir do momento que a sua sobrinha confirmou a sua versão, mas não... Eu ainda continuei com a minha raiva, com a minha teima...
- Eu fiquei tão chateado com você, Caio...
Fiquei mesmo. Chateado até demais. Ele soube da verdade com duas provas. Primeiro, ouvindo a minha conversa com meu melhor amigo no banheiro do shopping. Segundo, ouvindo da boca da minha sobrinha que eu tinha sido expulso de casa pelo pai dela. O que mais ele queria?
- Me perdoa, por favor... Eu estava cego pelo meu orgulho, pela minha arrogância, pelo meu egoísmo... Eu estou tão envergonhado, amor...
Que lindo! Derreti nesse momento.
- Ei... Não fica assim...
- Fico sim – meus olhos lacrimejaram. – Eu não queria ter feito tudo isso, porque eu te amo, Bruno! Eu te amo, sempre te amei, nunca deixei de te amar...
- Eu também nunca deixei de te amar...
- Durante esse tempo que você ficou fora, não teve um dia em que eu não tenha pensado em você...
- Eu também pensei em você todos os dias, Caio. Todos os dias!
Isso era realmente verdade. lembrei das noites insuportavelmente geladas da Europa em que eu era obrigado a dormir em um colchão no quartinho dos fundos da casa do meu padrinho e que eu só ficava pensando no Caio.
- Mas quando você voltou, a minha razão falou mais alto e eu não conseguia admitir o quanto você é crucial na minha vida, entende?
- Entendo, amor. Eu também errei em não ter falado nada pra você naquela época, eu também errei em sair assim sem mais nem menos, sem pelo menos te dar uma satisfação. Eu também tenho que te pedir perdão.
- Você já pediu tanto – Caio suspirou. – E eu nunca quis te ouvir...
Nesse instante rolou um selinho.
- Ah, Bruno... Eu fui tão idiota, amor...
- Já passou. E você está aqui agora.
- O Vítor me entregou o vídeo hoje e quando eu vi, eu fiquei desesperado. Você ia mesmo embora?
Grande Vítor! Eu devia uma a ele!
- Ia sim – garanti. – Eu não aguentava mais te ver e não poder ficar contigo.
- Ô, meu Deus – o pobrezinho chorou. – Como eu fui idiota. Como eu fui orgulhoso...
- Não chora, príncipe – só que as minhas lágrimas também caíram. – Vai ficar tudo bem agora, não vai?
- Vai... Vai sim, vai sim... Eu prometo que vai ficar tudo bem, eu prometo!!! – senti firmeza na voz dele.
- Desculpa...
- Nâo, eu é que te peço desculpas! Se você tivesse ido embora por minha causa, eu jamais me perdoaria. Jamais!
- Eu ia sim, mas eu não sei se ia ficar lá por muito tempo. Eu te amo tanto, Caio, que talvez eu voltasse do aeroporto mesmo.
- Deus é tão bom que Ele ouviu as minhas preces. Eu pedi, eu implorei pra dar tempo de te encontrar e deu tempo... Deu tempo, amor... Você não foi... Graças a Deus, graças a Deus...
- Eu fiquei tão feliz quando te vi, Caio...
- Não mais do que eu, acredite. Me perdoa, Bruno? Me perdoa, por favor...
- Seu bobo – eu sequei as lágrimas dele e o beijei. – Eu te perdoo sim, eu te amo, menino lindo!
- Eu te amo mais... Eu te amo muito, muito mais...
Nos beijamos e foi um beijo salgado, porque ambos choramos. Era impossível controlar a emoção porque nós dois sofremos muito naquela vida, porque eu esperei por aquele acontecimento por muito tempo e provavelmente isso também aconteceu com ele.
- Me perdoa... – ele sussurrou.
- Te perdoo, seu bobo lindo que eu tanto amo!
Que felicidade tomou conta de mim! Meu coração acelerou e gritou de felicidade e a minha razão ficou acuada, coagida no meu cérebro. Ela não abriu a boca e não falou nada. Finalmente o nosso amor tinha vencido, finalmente.
E finalmente também ele tinha caído em si. Finalmente ele tinha percebido que eu mudei por causa dele e que eu o amava com todas as forças da minha alma. Finalmente ele tinha pedido perdão pelos seus erros e finalmente eu pude perdoá-lo, finalmente ele pôde me perdoar e finalmente as coisas voltaram ao normal, do jeito que sempre foram e do jeito que sempre teriam que ser.
- Você ia pra Espanha de novo? – indagou.
- Ia sim. Eu ia pra casa do meu padrinho novamente. Só assim eu ficaria longe o suficiente de você.
- Nem sei o que eu faria se isso tivesse acontecido, sabia?
- Eu também não. Eu estava sofrendo tanto que nem comia mais direito.
- Coitadinho... – Caio pareceu chateado.
- E eu odiava te ver com o Murilo. Pronto, falei.
- E eu odiava ficar com ele – meu anjo abriu o jogo. – Mas nós já terminamos.
- Ah, já não era sem tempo. Esse namorico já durou demais pro meu gosto.
Não nego. Eu morria de ciúmes quando via o meu Caio com meu ex-priminho surfista. Aliás, não só quando o Caio estava com o Murilo, mas quando ele ficava com qualquer um que não fosse eu!
- Lindo, lindo, lindo – ele beijou meu ombro.
- Você que é, seu chato!
Ele era mesmo um chato! Se tivesse ouvido o coração desde o começo, nós dois teríamos voltado há muito tempo! Mas mesmo sendo chato eu o amava com todas as forças do meu coração!
- Ei... Como foi esse período que você ficou fora, hein?
Era a hora de contar tudo o que eu tinha feito naquele tempo que morei em Madrid e em Barcelona.
- Foi horrível, Caio. Eu cheguei lá em um dia e no outro o meu padrinho já me obrigou a trabalhar com ele.
- Te obrigou? – percebi que ele estava curioso.
- Uhum. Ele disse que ia me acolher, mas eu teria que trabalhar para me sustentar.
- Que maldito... E o que você fez?
Suspirei.
- Eu trabalhei no restaurante dele.
- Como garçon?
- Eu fiz de tudo um pouco, mas eu ficava principalmente com a faxina. Eu lavava os banheiros imundos e lavava o chão também.
Só de lembrar disso eu fiquei com o coração apertado. Não foi fácil passar por tanta humilhação.
- Ai... Que dó... – notei que ele ficou com pena de mim.
- Era tão ruim... Eu chorava tanto...
- Ô, meu Deus...
- Mas foi graças a isso que eu juntei dinheiro. Depois que eu peguei experiência, eu procurei um emprego melhor e aí comecei a ganhar um dinheirinho extra. Foi com isso que eu juntei grana pra voltar pra cá.
- Como em tudo nessa vida, há sempre um lado bom e um lado ruim.
- Sim, mas houve mais momentos ruins do que bons. E eu sofria demais lá em Madrid e em Barcelona. Eu não tinha ninguém pra conversar e vivia em um quarto escuro, que nem janelas e cama tinha.
- Não tinha cama? Nem janelas? E você dormia onde?
- NO chão! Em um colchonete fino.
- Ai, Bruno... – a voz do Caio embargou. – Por que não te deram uma cama, um quarto descente?
- Porque era o único que tinha. Os filhos dos meus padrinhos não gostam de mim e não me receberam bem.
- Pobrezinho!!!
- Eu entrei em depressão – continuei. – Porque eu pensei muito em você. Te procurava e você não me respondia e isso só me deixava ainda mais pra baixo. Eu estava me sentindo culpado, porque o Vítor me disse que você estava mal.
- Ele disse isso?
- Disse. E eu também via isso pelo seu Orkut e pelas frases que você postava no MSN. Eu me senti um lixo, sabe? Eu não queria ter te abandonado, de verdade.
Nosso abraço foi ainda mais forte.
- Agora eu acredito em você. Espero que não seja tarde demais...
- Não, amor – eu me afastei e o beijei com suavidade. – Nunca é tarde demais para se arrepender e pedir perdão.
- Seu lindo... – suspirou.
- Eu morei em Madrid e em Barcelona.
- Ah, é?
- Uhum. Madrid eu morei na casa do meu padrinho e em Barcelona eu morei sozinho em uma quitinete. Eu consegui um trabalho lá em um restaurante também. Eles pagavam bem e eu fazia de tudo um pouco. Juntei um bom dinheirinho com isso, até deu pra dar entrada no meu carro juntando com um pouco da herança do meu pai!
- Que bom, amor. Pelo menos isso, né? Então foi um bom dinheiro mesmo.
- Sim porque lá eles pagam em Euro aí deu pra valorizar bem aqui, mas eu também me matei de trabalhar. Eu não folguei nenhum dia e trabalhava mais de 12 horas diariamente.
- Coitadinho...
- Não foi fácil, Caio – eu suspirei. – Mas passou. Agora eu estou aqui e é isso o que importa. E o melhor de tudo é você estar aqui comigo, amor!
- Eu nunca mais quero sair de perto de você, nunca mais...
- Promete? Promete que a gente vai ficar juntos pra sempre?
- Prometo! Prometo, é claro que eu prometo. Pra sempre!
- Pra sempre!
Selamos a nossa promessa com um beijo e quase partimos pro 9º round, mas fomos vencidos pelo nosso cansaço.
- Bruno?
- Oi, amor?
- Por que você demorou tanto pra voltar?
- Por dois motivos básicos, Caio. Primeiro: eu tinha que terminar meus estudos lá em Barcelona. E segundo: porque eu precisava juntar bastante dinheiro pra fazer um pé de meia aqui no Brasil. Se dependesse de mim, eu teria voltado mais cedo, mas eu tinha que focar nos meus projetos também.
- Entendi!
- Só voltei no começo do ano passado porque enfim consegui terminar os estudos e já tinha dinheiro suficiente. E é claro, também porque não estava mais aguentando de saudades suas.
- Eu também não! E vem cá, por que inventou aquela história de admirador secreto?
- Porque foi a única forma que eu encontrei de preparar o terreno, Caio – eu ri. – Se eu aparecesse na sua frente assim de uma hora pra outra, você provavelmente tacaria um cabo de vassoura na minha orelha!
- Ai que vergonha! Eu faria isso mesmo...
- Cara, você é muito bravo! Você não era assim antes, sabia?
- Você me deixou assim, mocinho! A culpa disso tudo é sua!
- Adoro te ver bravo. Você fica lindo demais!
- Bobo – ele fez cafuné na minha cabeça. – E posso saber como você descobriu que eu estava vestido de vermelho e cheiroso?
- Ah! É que coincidentemente nesse dia eu te vi de longe. Fiquei tão feliz! E quanto ao perfume, apenas deduzi. Você sempre foi cheiroso, sempre!
Era verdade. O Caio se cuidava muito e sempre andava perfumado da cabeça aos pés! Uma delícia!
- Cachorro – ele deu um peteleco na minha orelha. – Eu cheguei a pensar que poderia ser você, mas isso foi em uma única vez.
- Sério?
- É! Porque eu fui esgotando as minhas possibilidades uma a uma. Só que aí você disse que tinha de 20 à 30 anos e eu fiquei confuso...
- Ah, é. Eu falei mesmo. E falei só pra você não desconfiar que era eu. Se falasse a idade verdadeira, você sacaria na hora.
- Seu safado!
O sono estava ficando cada vez mais forte.
- Bruno? Posso te fazer uma pergunta indiscreta?
- Claro – falei.
- Como você consegue... Ser passivo... Depois de tudo o que te aconteceu?
Eu sabia que mais cedo ou mais tarde aquela pergunta iria acontecer.
- Consigo porque fiz 5 anos de acompanhamento psicológico. Só por causa disso.
- Ah... Foi mesmo muito difícil pra você, não é?
- Sim, Caio. Muito difícil. Eu perdi os melhores anos da minha adolescência por causa desse trauma.
- Você disse que ele foi preso, né?
- É, mas ficou só um ano e pouco na prisão. Sabe como é a justiça brasileira, né?
- Maldito! Mas vem cá, como a sua família aceitou aquele traste em casa? Eu não entendo isso, juro por Deus!
- Foi um plano do Márcio e do Luciano. Eles combinaram que o Márcio ficaria uns dias lá no apartamento só pra eu ter motivos pra ir embora do Brasil e deu certo.
- Mas e a sua cunhada? Ela deve odiá-lo? Ou não?
- Sim, ela odeia! Mas a coitada não tem voz ativa naquela casa. Ela é obrigada a aceitar os caprichos do meu irmão. por isso ela não pôde me ajudar em nada, coitada.
- Vocês se falam?
- Às vezes. Eu não tenho nada contra ela e os meus sobrinhos. O meu problema mesmo são com os meus irmãos.
- São só vocês três?
- É! Só nós três.
- É muita sacanagem da parte deles fazer isso com vocês.
- Eles me odeiam, Caio. Nenhum dos dois gosta de mim, mas a recíproca é verdadeira.
- Que nem na minha família. Meus pais e meu irmão também me odeiam.
Nós dois suspiramos ao mesmo tempo.
- Você percebe que a nossa história se repete em muitos aspectos, Caio?
- Verdade – ele concordou.
E se repetia mesmo! Caio e eu fomos expulsos de casa, nossos familiares nos odiavam e nós fomos obrigados a ir para cidades que não conhecíamos.
Nós dois sofremos a dor da rejeição e a dor da separação, no entanto, cada um tinha uma particularidade com relação a outros sofrimentos.
Eu, por minha vez, sofri com a história da minha origem. Eu não era filho de quem achava ser e na verdade daquele que eu julgava ser meu avô, o homem que eu mais amei em toda a minha vida.
Já o Caio, sofreu com a minha traição no comecinho do nosso namoro. Traição essa que eu não perdoava nunca, mesmo que só tivesse sido alguns beijos em um momento frágil da minha vida. Nada jusrificava.
E o sofrimento da separação que ambos vivemos teve duas vertentes.
Pra ele foi mais difícil porque eu saí sem ter tempo de me despedir, sem dar satisfação. E pra mim, talvez tenha sido menos complicado porque eu sabia a razão da minha saída, todavia, sabia também que ele sofria e muito com a situação e isso atenuava a minha culpa, o que me fazia me sentir ainda pior.
Nossos destinos se cruzaram e nossas histórias se misturaram. Eu queria entender por qual motivo nós nos parecíamos tanto.
Nós nos aprofundamos na tragédia. Eu contei como foi o meu tratamento e como consegui vencer aquele trauma.
Não foi um processo nada fácil, mas no decorrer daqueles 5 anos, dia após dia, eu fui conseguindo voltar à vida e enfim pude passar uma borracha em tudo o que tinha acontecido.
Obviamente, eu ainda sentia aquela dor maldita dentro do meu peito, mas eu já conseguia conviver com ela de uma forma tranquila.
Eu só não conseguia perdoar o Márcio. Isso eu não conseguia mesmo. Talvez nunca fosse possível fazer isso.
Ele acabou com a minha vida e ainda por cima foi responsável pela morte do meu pai. Isso pra mim não tinha perdão jamais!
- Eu queria saber como foi a sua vida aqui também – eu deitei a cabeça no peitoral do meu namorado.
- Eu te conto tudo, mas agora a gente precisa dormir.
- Você trabalha hoje?
- Uhum e você?
- Eu também. Vou entrar às 13 horas.
- Mesmo horário que eu, amor.
- Deixa eu ver que horas são aqui no celular...
Me surpreendi com o avanço das horas. Já era bem tarde.
- Quase 5 já. Melhor a gente dormir, né?
- Infelizmente – eu bocejei. – Bruno? Se você vai trabalhar hoje, como você ia viajar?
- Eu ia abandonar tudo, Caio. Só isso!
Ele ficou calado.
- Te amo, meu príncipe lindo – subi no tronco dele e beijei seus lábios.
- Você que é meu príncipe, seu bobo. E eu nunca mais vou largar você, nunca mais. Obrigado por me perdoar, amor... E me desculpa de novo por ser tão cabeça dura.
- Me desculpa também por eu não ter falado nada e por ter te abandonado nas vésperas de seu aniversário. Eu me arrependo muito.
- Eu me arrependo de tudo o que eu te causei também. Me perdoa...
- Lógico que eu te perdoo, lógico!
A gente voltou a trocar um beijo apaixonado, mas este foi o último daquela incrível noite que passamos juntos.
Tanto eu, como Caio estávamos pra lá de cansados, estávamos exaustos. A noite tinha sido perfeita e ia ficar pra história, mas era a hora de descansar, porque nós tínhamos que tocar a nossa vida da melhor forma possível daquele dia em diante.
E eu ia tocar, eu tinha certeza. Com o Caio ao meu lado, as coisas iam ser muito mais fáceis de serem resolvidas.
Eu conseguiria ultrapassar mais facilmente os obstáculos, conseguiria vencer mais facilmente os meus inimigos e conseguiria encarar com mais força as dificuldades da vida.
Estar ao lado do meu homem ia me tornar mais forte em todos os sentidos possíveis e inimagináveis.
E a felicidade seria constante à partir daquele momento. Eu não ia deixar o Caio escapar mais das minhas mãos. Nós íamos ficar juntos para sempre, para sempre. No que dependesse de mim, nós não separaríamos nunca mais. E eu tinha mais do que certeza que todos esses planos iam dar certo.
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