D
|
evo ter feito uma cara de espanto e horror, porque o
Bruno caiu na gargalhada.
Ele só poderia estar brincando, né? Ou será que estava falando a verdade?
Seria uma boa ideia, eu tinha sim vontade de transar no avião, mas eu sabia que aquilo era praticamente impossível.
- Bebeu, foi? – acho que fiquei muito vermelho.
- Não. Ainda não! Mas é brincadeira, amor. É e não é.
- É ou não é brincadeira?
- Não, não é brincadeira. Eu queria fazer mesmo, mas como não dá, é melhor deixar pra lá.
- Esse meu namorado é doido!
- Vai dizer que você não sente vontade?
- Claro que eu sinto, mas que nem você disse: não dá!
- O que é uma pena. Quem sabe um dia.
- Quem sabe um dia!
- Vai deixar eu sentar na janelinha ou não?
- Não! Nem adianta me chantagear, mocinho.
- E se eu te der um chocolate?
- Não. Não sou tão barato assim.
- Um drinque?
- Não. Depende. Qual?
- O que você quiser!
- Não. Drinque não vai matar a minha vontade.
- E se eu te pagar um jantar?
- Ainda não.
- E se eu te der uma caixa de bombons?
- Não!
- Uma cesta de chocolates?
- Nem pensar. Quer me engordar?
- Você fica lindo de qualquer jeito, amor.
- Obrigado, mas não.
- Que tal uma roupa nova?
- Não, obrigado. Eu já tenho roupa demais.
- E um celular novo?
- Está melhorando, mas não.
- Um DVD?
- Ui, meu sonho. Mas nem com isso você me tira daqui.
- E se eu te der um beijo?
- Agora você está começando a falar a minha língua!
- Hum... Vem aqui, vem?
- Não esquece que tem uma velha do seu lado.
- Eu sei. E se eu te der uma mordidinha assim na orelha?
- Não!
- E se eu te der uma arranhada nas costas mais tarde?
- Só isso?
- Posso te fazer uma massagem também...
- E que mais?
- Posso beijar todo o seu corpo...
- Hum... E que mais, hein?
- Posso fazer carinho em toda a sua pele...
- Só carinho?
- Posso beijar também...
- É?
- Posso lamber...
- Ui, que delícia...
- Posso cheirar seu pescoço assim, ó...
- Para, eu to ficando...
- Posso segurar bem devagar no seu...
- Só segurar? Segurar não vale!
- Daí eu posso fazer carinho...
- Só isso? Como você está mão de vaca hoje!
- Posso colocar ele todinho dentro da minha boca...
- E depois?
- E depois eu posso chupar bem devagar...
- É? Você vai fazer isso mesmo?
- Faço isso e tudo mais o que você quiser!
- É? Eu posso cobrar?
- Pode...
- Eu vou cobrar, hein?
- Pode cobrar, meu gato gostoso!
- Safado!
- Agora você deixa eu sentar no seu lugar, hum?
- Deixo não!
Eu quis rir.
- Então eu retiro tudo o que eu disse!
- Como você é besta. Era só brincadeira. Eu ia deixar você sentar aí desde o começo!
- Como é? Quer dizer que eu falei tudo aquilo à toa?
- À toa não. Agora você vai ter que cumprir cada promessa!
- Trapaceiro. Eu não vou pagar nada, só de raiva!
- Isso é o que nós vamos ver.
Ainda bem que a velha que estava dividindo a fileira com a gente não falou nada em nenhum momento. Ela ficou na dela, com os olhos fechados. Mas eu duvidava que ela estivesse dormindo.
Olhei pela janela do avião e vi a cidade do tamanho de formigas. Tudo estava minúsculo demais e eu senti a maior vontade de pular daquela altura toda.
- Dá uma vontade de pular...
- Ah, é? Você gosta disso, é? – ele perguntou.
- Eu tenho vontade sim.
- Legal. Não conhecia esse seu lado aventureiro.
- Eu gosto de altura. Não tenho medo não.
- Nem eu – ele falou.
Troquei de lugar com o Bruno em definitivo. A qualquer momento a aeromoça iria comer nosso toco por causa daquele troca-troca de lugares.
Já não chovia mais lá fora. Eu sabia que aquela chuva era isolada. Pelo menos era essa a impressão que eu tinha.
Bruno e eu não falamos muito no avião. A gente queria fazer. Eu fiquei com tanta vontade de dar um beijo no meu namorado que quase não me controlei.
- Aqui não – ele desviou o rosto. – Eu tenho medo de represálias.
Ele estava certo, mas a vontade de ficar com o meu love estava cada segundo mais forte.
Eu tentei desviar a minha atenção e fiquei olhando para todos os lados. Fiquei analisando os passageiros e encontrei um mais divertido do que o outro.
A própria senhora que estava do nosso lado não era das mais bonitas. Ela era cheia de rugas, tinha os cabelos crespos e muito brancos, usava um óculos de aro quadrado, uma blusa na cor azul-marinho, uma saia vermelha, um sapato de pano preto e um lenço de xadrez amarrado no pescoço.
A velhota continuava com os olhos fechados, mas daquela vez estava com a boca aberta e por incrível que pareça, ela estava babando.
- Que nojo!
- O que foi?
- Olha pra sua direita.
- Credo!
E nesse mesmo momento a mulher roncou. Foi um ronco alto, que fez a maioria dos passageiros calarem a boca.
- Era só o que me faltava – Bruno bufou.
- Calma!
Continuei analisando o pessoal que viajava com a gente. Ainda na mesma fileira, porém após o corredor, havia uma jovem um tanto gordinha que usava uma saia branca. Eu olhei pras coxas da mulher e perdi as contas de quantas celulites ela tinha na pele.
A aeromoça me chamou bastante a atenção. Ela era estilo modelo. Linda pra valer. Mesmo sendo gay, fiquei admirando a beleza daquela mulher.
Ela passou oferecendo lanches, mas nem eu, nem o Bruno aceitamos. Eu estava saciado depois daquele delicioso almoço que a Dona Inês preparou.
- Será que falta muito? – ele perguntou.
- Não sei. Acho que não.
- Acho que sim. Lembra que vai ter conexão em Salvador?
- Ah, é verdade!
Eu nem tinha me lembrado daquele detalhe. Chegando cedo ou tarde em Fortaleza, eu não estava me importando. O importante mesmo era ficar ao lado do Bruno durante as nossas férias, passasse o tempo que passasse, demorasse o quanto tivesse que demorar.
- Vamos tirar uma foto? – ele sugeriu.
- Boa ideia!
Já que não tinha nada pra fazer, aquele seria um bom passatempo. Eu tirei a máquina fotográfica da minha sacola, coloquei as pilhas e juntei a minha cabeça com a do Bruno.
- Sorria – eu falei rindo.
O flash da máquina quase me cegou. Eu selecionei a foto que tirei e percebi que ela ficou horrorosa.
- Credo. Não gostei. Fiquei com cara de morto. Tira você!
- Você ficou lindo.
- Olha as minhas olheiras. Não gostei.
- Deixa eu tirar então.
Passei a máquina do Bruno e ele tomou conta da seção de fotos. As dele ficaram muito melhor que a minha.
- As suas estão legais. Não gostei. Isso é preconceito só porque eu sou preto!
- No dia que você for preto eu não sei o que será da raça negra do mundo, Caio.
- Você está me maltratando. Isso é bullying, vou te processar!
- Processa. Eu não ligo – ele beijou meu rosto.
- Quero beijo, mas na minha boca. Não na bochecha.
- Na boca só mais tarde, safadinho.
Mostrei a minha língua.
- Tira foto das nuvens?
- E do mar também.
Bruno estava cada dia mais palhaço. Ele apertou o botão da máquina várias vezes e fez várias fotos do mar e das nuvens ao nosso redor.
- Nem tem muito o que fotografar, só tem água lá embaixo.
- Já pensou se isso daqui cai? – brinquei.
- Deus me livre. Eu não quero morrer queimado ou afogado não. Quero morrer bem velhinho e de preferência com você do meu lado, amor.
- Não, não. Vai ser o contrário. Eu que vou morrer do seu lado. Não quero que você morra antes de mim não. Não tenho vocação pra ser viúvo!
- Quem disse que eu aceito isso?
- E você lá tem que aceitar alguma coisa? Já fiz meus planos com Deus e Ele não vai me decepcionar!
- Que história é essa? Nem vem que não tem!
- É sim. Eu não vou querer ficar viúvo nunca não.
- E eu posso, né?
- Você pode!
- Não quero!
- Quer saber de uma coisa? É melhor a gente mudar de assunto e deixar essa história de morte pra lá.
- É vero. Deixa isso pra lá. Sorri, eu vou tirar uma foto sua!
Fiz o que ele pediu e mais uma vez o flash me cegou.
- Credo, Caio. Olha que foto horrível!
Ficou feia porque a velha saiu no fundo com a boca aberta. Eu dei muita risada. Eu estava horroroso naquele dia, mas nem me importei.
- Essa vai direto pro Orkut quando eu voltar pro Rio.
- Vai queimar seu notebook. Nem sei como não queimou a máquina.
- Malvado!
Depois de mais um período de conversa, o piloto avisou que nós íamos aterrissar na Bahia. Eu me preparei para o pouso e senti o maior frio na barriga quando o avião desceu na pista.
- Que delícia! – quase soltei um grito.
- É muito gostoso andar de avião. Um dia eu quero andar de asa delta. Vamos?
- Certeza que sim!
A aeronave ficou parada por um tempo e depois o piloto avisou que nós íamos decolar novamente. Quando o avião subiu, mais uma vez eu senti frio na barriga e este foi ainda mais intenso que o anterior.
- Acho que agora não falta muito – comentei.
- É verdade. Eu estou muito ansioso!
- Pois então somos dois.
E o nosso raciocínio estava correto. Não demorou muito de Salvador para Fortaleza e quando o avião finalmente chegou ao nosso destino, eu fui o primeiro a levantar do banco.
- Que pressa, hein? – ele me fitou.
- Quero conhecer a cidade logo.
- Só nascendo de 7 meses mesmo, viu?
- Está me chamando de prematuro ou é impressão minha?
- Estou! Algum problema?
- Olha que eu faço greve, hein?
- NÃO! – ele me segurou. – É brincadeira, amor!
- Agora já foi. Greve de 2 meses.
- Quer que eu morra, né?
- Não!
- Mas é o que parece. Eu nunca vou conseguir ficar 2 meses sem...
- Você ficou quase 3 anos!
- Mas foi diferente!
- Não me importa. Quem conseguiu ficar 3 anos, consegue ficar 60 dias.
- Ah, é? Pois eu bem quero ver se você vai conseguir suportar tanto tempo.
- Claro que eu consigo!
Uma vez com a bagagem nas mãos, Bruno e eu nos dirigimos para a saída do aeroporto e não foi nada difícil encontrar um táxi que nos levasse até a pousada onde iríamos ficar hospedados.
- É muito longe do aeroporto, moço? – eu perguntei.
- É não – logo de cara deu pra notar o sotaque nordestino do motorista. – Não é muito longe não.
Eu fui olhando pra um lado, fui olhando pro outro e fiquei literalmente perdido. Eu nunca tinha ido pro Ceará e estava me sentindo igual a um cego no meio de um tiroteio.
Numa primeira impressão, a cidade parecia ser linda. Eu ainda não tinha visto nenhuma praia e estava pra lá de curioso pra saber quais eram a beleza daquela cidade até então desconhecida para mim.
Bruno foi falando com o motorista e perguntando os pontos turísticos da metrópole. Eu fiquei na minha, perdido nos meus pensamentos e olhei atentamente a paisagem ao meu redor.
- Nós chegamos, é nessa rua aqui – o cara falou.
Eu voltei ao mundo real e olhei com muita atenção a pousada onde nós iríamos ficar.
Era simples, mas parecia ser muito aconchegante. O motorista parou, eu olhei o taxímetro. Era a hora do Bruno pagar a rodada.
O homem abriu o porta luvas do automóvel, separou umas notas de dinheiro e entregou o troco.
- Muito obrigado – ele agradeceu.
- Eu é que agradeço.
Descemos e o condutor abriu o porta malas. Peguei a minha bagagem, Bruno pegou a dele e nós entramos na pousada cujo nome eu não me recordo mais. Era realmente tudo muito simples, mas bem aconchegante. Eu gostei do local.
- Boa noite – disse uma mulher. O sotaque dela também era bem característico.
- Boa noite – eu respondi. – Temos uma reserva.
- No nome de quem?
- Bruno Silva e Caio Monteiro.
- Ah, sim. É verdade tem mesmo. Vão ficar quantos dias?
- 20 – respondeu o meu príncipe.
- Certo. Vamos fazer a ficha de vocês.
Deixei o Bruno tomar a frente do negócio. Ele preencheu a ficha e eu efetuei o pagamento dos 20 dias que ali ficaríamos.
Bruno e eu entramos em um acordo. Como ele tinha pago as passagens de ida e volta, eu paguei a hospedagem. A comida nós dividiríamos.
- Vocês oferecem café da manhã, não é isso? – perguntou Bruno.
- Exatamente. É servido no salão de refeições. Eu mostro já, já.
- Qual é o nosso quarto? – questionei.
- É logo ali, moço.
- Como a senhora se chama? – questionou Bruno.
- É Minerva – eu adorei o sotaque da mulher. Ela era xará de uma das minhas professoras da faculdade.
- Só pra saber... – o meu anjo ficou sem graça.
- Certo! Venham comigo.
- Ei, mamãe? Eles vão ficar no mesmo quarto, é? – questionou um moleque de mais ou menos 10 anos de idade.
- Não é da tua conta, “Guilérme”. Venham comigo, por favor.
Bruno e eu nos entreolhamos. Aquele moleque parecia ser preconceituoso.
Nosso quarto era grande e bem arejado. Ele não ficava perto da entrada, ficava alojado nos fundos da pousada e não havia muitos outros quartos ao redor.
- Aqui é bem calmo, visse? – disse a mulher. – Podem ficar à vontade!
- Obrigado, Dona Minerva – eu agradeci. – Por gentileza, onde fica o banheiro?
- É bem aqui ao lado, nessa portinha branca.
- Perfeito – meu namorado respondeu. – Eu adorei o lugar. Aqui é muito bonito.
- Obrigada, meu “quérido”. Vou deixá-los a sós. Qualquer coisa é só chamar.
- E o salão do café da manhã? – perguntei.
- Ah, é verdade. Venham cá, venham?
Deixamos as nossas coisas e seguimos a dona da pousada. O local do café da manhã era longe do nosso quarto.
- É aqui, visse? Eu sirvo o café às 7 horas.
- Perfeito. Obrigado, Dona Minerva – Bruno agradeceu.
- De nada. Qualquer coisa me chamem.
- Pode deixar.
Assim que a mulher deu as costas, nós dois nos olhamos e sem pestanejar, seguimos de volta para os nossos aposentos.
Assim que eu entrei, encostei a porta, passei a chave e não pensei duas vezes em começar a beijar o meu namorado naquele momento mesmo.
- Agora somos eu e você – falei.
- Enfim sós!
Como eu queria fazer aquilo. Rolou no chão mesmo, de tão apressados que nós estávamos. Ele fez ativo primeiro e depois os papéis se inverteram.
- Putz... – eu caí deitado ao lado dele, totalmente sem fôlego. – Que calor!
- Aqui é quente, né?
- Pra caramba.
Nos beijamos, mas parou nisso. A gente precisava conhecer a cidade.
- Não, não – ele sorriu. – Vamos dar uma volta primeiro!
- Ah... – fiz bico.
- Vem, vamos tomar um banho...
- Está doido? A gente não pode tomar banho juntos!
- Ah... É mesmo... Que merda, hein?
- Não tem problema. Eu te espero. Pode ir na frente se você quiser.
- Eu não demoro, prometo.
- Ei, não está esquecendo de nada?
- O quê?
- A sua roupa e o meu beijo!
Primeiro ele me beijou, depois pegou a roupa.
- Agora sim – eu aprovei. – Não demora.
- Pode deixar.
Caí de novo no chão do quarto. Eu estava me sentindo feliz. Aquela viagem com o Bruno com certeza iria renovar o nosso relacionamento.
Era bom fazer coisas novas, ainda mais ao lado dele. Eu queria conhecer Fortaleza o mais rápido possível, ainda mais sabendo que ele estaria o tempo todo comigo. Aquilo era praticamente um sonho!
O meu gostoso voltou rápido mesmo. Quando ele chegou, eu levantei, peguei uma roupa limpa, me enrolei em uma toalha e parti para o banheiro para poder tomar um banho gelado.
A única parte chata daquela pousada foi o banheiro não ser acoplado ao quarto, mas tudo bem.
E a temperatura estava maravilhosa. Eu deixei a água cair no meu corpo por um longo período e só desliguei o chuveiro quando alguém bateu na porta.
- Já vai!
Me sequei, peguei as minhas coisas, me enrolei na toalha e saí. Quem estava esperando para entrar era um cara muito esquisito.
- Boa noite – ele me cumprimentou.
- Boa noite – eu respondi.
Fui pro quarto e encontrei um Bruno arrumado para sair. Ele foi rápido ao se aprontar.
- Já?
- Uhum! O Víctor te ligou, amor.
- Você atendeu?
- Sim. Tem problema?
- Claro que não, amor. Eu não tenho segredos com você, você sabe disso.
Ele ficou vermelho e foi me dar um abraço.
- Eu estou tão feliz por estar com você, sabia?
- Eu estou mais feliz – comecei a briga.
- Não está não!
A guerra foi armada. A gente sempre ficava com essas brincadeiras e no fim das contas ninguém dava o braço à torcer.
- Ei, onde nós vamos? – eu perguntei.
- Quer jantar?
- Só se for isopor, porque fome mesmo eu não estou sentindo.
- Palhaço! Eu também não estou com fome. Vamos pra praia então?
- Demorou! Mas qual delas?
- Aí eu já não sei, anjo. A gente vê no caminho. Vamos ver se tem alguma praia perto daqui.
Mas não tinha. As praias ficavam pro outro lado da cidade. A gente teve que pegar um ônibus para chegar até elas.
- Sinto o cheiro do mar – Bruno respirou fundo.
- Pois então somos dois. Vamos descer?
- Vamos!
Saímos do banco e eu dei o sinal para o ônibus parar. O veículo andou mais alguns metros e parou na frente de uma banca de jornal, que já estava fechada.
- Trouxe o celular, amor? – perguntei.
- Trouxe. Você não?
- Esqueci – dei risada. – Eu posso ligar pro Víctor do seu? Depois eu coloco crédito pra você...
- Ah, por favor, né? – ele revirou os olhos e passou o aparelho. – Até parece que eu vou cobrar uma ligação sua, Caio. Que neura!
Fiquei sem graça. Como ele era fofo, meu Deus! Olhei pro relógio do aparelho do meu namorado e levei o maior susto. Como estava tarde!
- Putz, a gente nem deveria ter saído tão tarde assim, amor!
- Não, bebê! Esqueceu que aqui não tem horário de verão? Tem que diminuir uma hora aí.
- Ah, é verdade!
Eu havia esquecido desse detalhe. Não estava tão tarde, mas como eu não conhecia a cidade, não sabia se ela era segura ou não, fiquei receoso em acontecer algo com a gente.
Se fosse no Rio eu não sentiria esse medo. Nem em São Paulo. Porém, as ruas ainda estavam movimentadas e eu não vi nada de anormal nos arredores. Pelo jeito não tinha problema sair à noite em Fortaleza.
- Alô? – a voz de taquara rachada do Víctor estava irreconhecível.
- Víctor? – uni as sobrancelhas.
- Caio?
- Que voz de homem é essa, bicha? – eu brinquei.
Bruno deu risada e nós andamos pela calçada.
- Eu sou homem, seu viado! E aí, como vai?
- Eu bem e você?
- Bem também. Feliz ano novo, né?
- Pra você também, garoto! E como andam as coisas por aí em Sampa City?
- Tudo em ordem por aqui. E aí no Rio?
- Eu não estou no Rio!
- Não? Onde você está?
- Em Fortaleza!
- Como assim, criança? Que história é essa?
- Eu vim passar as férias aqui com o Bruh. Acabamos de chegar!
- Por isso que ele atendeu seu celular então... Entendi! Quer dizer que você está em lua de mel?
- É – eu ri. – Pode-se dizer que sim.
- E vocês estão bem?
- Maravilhosamente bem – eu olhei pra ele.
- Que bom, Caio. Eu fico feliz.
- E você? Com alguém?
- Uhum. Arranjei um doido aí que me quis.
- Ah, que da hora! Como ele se chama?
- Rian. Ele é tão lindo!
- Depois eu vejo no Orkut. E seus pais como estão?
- Bem, obrigado por perguntar.
Minha língua coçou para perguntar notícias da minha família, mas eu não fiz isso.
- E quando você vai me visitar lá no Rio, hein?
- Então, eu queria falar sobre isso com você...
- Fala!
- Posso ir no começo do mês que vem?
- Claro! Lógico que pode! Vai ficar quanto tempo?
- Uns 10 dias por aí. Tem como?
- Claro, é só me avisar a data certa.
- Mas dessa vez eu não vou ficar na sua casa, viu? – ele riu.
- Posso ser sincero?
- Uhum.
- Nem tem como. Eu mudei, entrou gente nova na república... Ficar lá ia ser impossível. Eu te recomendo uma hospedaria, fica sussa.
- Beleza então. Eu ligo e aviso se eu for mesmo. Vou levar o Rian!
- Ah... Então é por isso que você não ia ficar em casa, safado!
- Lógico – ele riu.
- Víctor, bom falar com você, mas eu tenho que desligar. Depois a gente se fala mais.
- Beleza, amigo.
- Ah, Víctor... Por que não vai pro Rio em março? Daí você aproveita e vai na minha formatura da faculdade!
- Pô... É uma boa ideia! Quando você se forma?
- No começo de março. Eu preciso desligar, a gente se fala por torpedo depois, tá? Beijo! Fica com Deus...
- Amém, você também. Feliz ano novo.
- Pra você também!
Desliguei e entreguei o aparelho pro Bruno.
- Obrigado, amor.
- Por nada. Poderia ter falado mais com seu amigo.
- Que nada, ele fala mais que uma maritaca. Eu iria gastar todos os seus créditos.
- Não teria problema nenhum. Ele vai pro Rio, é?
- Uhum. Queria ir no mês que vem com o namorado, mas acho que ele vai esperar pra minha formatura!
- Ai que lindo – ele fez cócegas no meu corpo. – Meu namorado vai se formar já!
- É... Eu nem acredito.
- Você é muito esforçado, eu tenho orgulho de você!
- Obrigado, amor.
Caminhamos em ritmo lento por uma calçada reta e depois de um tempo perguntamos como fazíamos para chegar em uma das praias da cidade. E não é que elas estavam bem pertinho da gente? Bastava atravessar a rua e seguir reto.
- Uau! – eu fiquei atônito com a beleza da praia que ficou diante dos meus olhos.
- Nossa... Que lugar lindo!
- Eu preciso entrar no mar, Bruno!
- Então vamos, bebê – ele riu.
Já havia escurecido há muito, mas mesmo assim eu queria entrar no mar. Fui de sunga justamente para isso.
- Licença, moça – o Bruno tocou no ombro de uma mulher. – Como se chama essa praia?
- Essa é a Iracema – disse a moça com cordialidade.
Eu tirei meus chinelos e praticamente corri até o mar, mas algo me parou abruptamente no meio do caminho.
Eu vi um menino alto, com cabelos pretos, olhos castanhos e com o rosto praticamente idêntico ao meu. Ele estava sem camisa e estava acompanhado por um grupo de pessoas.
Meu coração disparou, minhas pernas amolegaram e o meu estômago ficou gelado. Não era possível que fosse ele...
- Que foi, príncipe?
A minha boca ficou aberta, mas eu não consegui falar nada. A única coisa que eu consegui fazer foi olhar para aquele garoto, que parecia até ser o meu clone!
- Caio? Aconteceu alguma coisa?
- Hã?
- O que você tem? Está passando mal? Você está pálido!
- Não estou passando mal...
- O que você tem então?
- Eu acho que... Eu estou vendo o meu... Irmão gêmeo!
Ele só poderia estar brincando, né? Ou será que estava falando a verdade?
Seria uma boa ideia, eu tinha sim vontade de transar no avião, mas eu sabia que aquilo era praticamente impossível.
- Bebeu, foi? – acho que fiquei muito vermelho.
- Não. Ainda não! Mas é brincadeira, amor. É e não é.
- É ou não é brincadeira?
- Não, não é brincadeira. Eu queria fazer mesmo, mas como não dá, é melhor deixar pra lá.
- Esse meu namorado é doido!
- Vai dizer que você não sente vontade?
- Claro que eu sinto, mas que nem você disse: não dá!
- O que é uma pena. Quem sabe um dia.
- Quem sabe um dia!
- Vai deixar eu sentar na janelinha ou não?
- Não! Nem adianta me chantagear, mocinho.
- E se eu te der um chocolate?
- Não. Não sou tão barato assim.
- Um drinque?
- Não. Depende. Qual?
- O que você quiser!
- Não. Drinque não vai matar a minha vontade.
- E se eu te pagar um jantar?
- Ainda não.
- E se eu te der uma caixa de bombons?
- Não!
- Uma cesta de chocolates?
- Nem pensar. Quer me engordar?
- Você fica lindo de qualquer jeito, amor.
- Obrigado, mas não.
- Que tal uma roupa nova?
- Não, obrigado. Eu já tenho roupa demais.
- E um celular novo?
- Está melhorando, mas não.
- Um DVD?
- Ui, meu sonho. Mas nem com isso você me tira daqui.
- E se eu te der um beijo?
- Agora você está começando a falar a minha língua!
- Hum... Vem aqui, vem?
- Não esquece que tem uma velha do seu lado.
- Eu sei. E se eu te der uma mordidinha assim na orelha?
- Não!
- E se eu te der uma arranhada nas costas mais tarde?
- Só isso?
- Posso te fazer uma massagem também...
- E que mais?
- Posso beijar todo o seu corpo...
- Hum... E que mais, hein?
- Posso fazer carinho em toda a sua pele...
- Só carinho?
- Posso beijar também...
- É?
- Posso lamber...
- Ui, que delícia...
- Posso cheirar seu pescoço assim, ó...
- Para, eu to ficando...
- Posso segurar bem devagar no seu...
- Só segurar? Segurar não vale!
- Daí eu posso fazer carinho...
- Só isso? Como você está mão de vaca hoje!
- Posso colocar ele todinho dentro da minha boca...
- E depois?
- E depois eu posso chupar bem devagar...
- É? Você vai fazer isso mesmo?
- Faço isso e tudo mais o que você quiser!
- É? Eu posso cobrar?
- Pode...
- Eu vou cobrar, hein?
- Pode cobrar, meu gato gostoso!
- Safado!
- Agora você deixa eu sentar no seu lugar, hum?
- Deixo não!
Eu quis rir.
- Então eu retiro tudo o que eu disse!
- Como você é besta. Era só brincadeira. Eu ia deixar você sentar aí desde o começo!
- Como é? Quer dizer que eu falei tudo aquilo à toa?
- À toa não. Agora você vai ter que cumprir cada promessa!
- Trapaceiro. Eu não vou pagar nada, só de raiva!
- Isso é o que nós vamos ver.
Ainda bem que a velha que estava dividindo a fileira com a gente não falou nada em nenhum momento. Ela ficou na dela, com os olhos fechados. Mas eu duvidava que ela estivesse dormindo.
Olhei pela janela do avião e vi a cidade do tamanho de formigas. Tudo estava minúsculo demais e eu senti a maior vontade de pular daquela altura toda.
- Dá uma vontade de pular...
- Ah, é? Você gosta disso, é? – ele perguntou.
- Eu tenho vontade sim.
- Legal. Não conhecia esse seu lado aventureiro.
- Eu gosto de altura. Não tenho medo não.
- Nem eu – ele falou.
Troquei de lugar com o Bruno em definitivo. A qualquer momento a aeromoça iria comer nosso toco por causa daquele troca-troca de lugares.
Já não chovia mais lá fora. Eu sabia que aquela chuva era isolada. Pelo menos era essa a impressão que eu tinha.
Bruno e eu não falamos muito no avião. A gente queria fazer. Eu fiquei com tanta vontade de dar um beijo no meu namorado que quase não me controlei.
- Aqui não – ele desviou o rosto. – Eu tenho medo de represálias.
Ele estava certo, mas a vontade de ficar com o meu love estava cada segundo mais forte.
Eu tentei desviar a minha atenção e fiquei olhando para todos os lados. Fiquei analisando os passageiros e encontrei um mais divertido do que o outro.
A própria senhora que estava do nosso lado não era das mais bonitas. Ela era cheia de rugas, tinha os cabelos crespos e muito brancos, usava um óculos de aro quadrado, uma blusa na cor azul-marinho, uma saia vermelha, um sapato de pano preto e um lenço de xadrez amarrado no pescoço.
A velhota continuava com os olhos fechados, mas daquela vez estava com a boca aberta e por incrível que pareça, ela estava babando.
- Que nojo!
- O que foi?
- Olha pra sua direita.
- Credo!
E nesse mesmo momento a mulher roncou. Foi um ronco alto, que fez a maioria dos passageiros calarem a boca.
- Era só o que me faltava – Bruno bufou.
- Calma!
Continuei analisando o pessoal que viajava com a gente. Ainda na mesma fileira, porém após o corredor, havia uma jovem um tanto gordinha que usava uma saia branca. Eu olhei pras coxas da mulher e perdi as contas de quantas celulites ela tinha na pele.
A aeromoça me chamou bastante a atenção. Ela era estilo modelo. Linda pra valer. Mesmo sendo gay, fiquei admirando a beleza daquela mulher.
Ela passou oferecendo lanches, mas nem eu, nem o Bruno aceitamos. Eu estava saciado depois daquele delicioso almoço que a Dona Inês preparou.
- Será que falta muito? – ele perguntou.
- Não sei. Acho que não.
- Acho que sim. Lembra que vai ter conexão em Salvador?
- Ah, é verdade!
Eu nem tinha me lembrado daquele detalhe. Chegando cedo ou tarde em Fortaleza, eu não estava me importando. O importante mesmo era ficar ao lado do Bruno durante as nossas férias, passasse o tempo que passasse, demorasse o quanto tivesse que demorar.
- Vamos tirar uma foto? – ele sugeriu.
- Boa ideia!
Já que não tinha nada pra fazer, aquele seria um bom passatempo. Eu tirei a máquina fotográfica da minha sacola, coloquei as pilhas e juntei a minha cabeça com a do Bruno.
- Sorria – eu falei rindo.
O flash da máquina quase me cegou. Eu selecionei a foto que tirei e percebi que ela ficou horrorosa.
- Credo. Não gostei. Fiquei com cara de morto. Tira você!
- Você ficou lindo.
- Olha as minhas olheiras. Não gostei.
- Deixa eu tirar então.
Passei a máquina do Bruno e ele tomou conta da seção de fotos. As dele ficaram muito melhor que a minha.
- As suas estão legais. Não gostei. Isso é preconceito só porque eu sou preto!
- No dia que você for preto eu não sei o que será da raça negra do mundo, Caio.
- Você está me maltratando. Isso é bullying, vou te processar!
- Processa. Eu não ligo – ele beijou meu rosto.
- Quero beijo, mas na minha boca. Não na bochecha.
- Na boca só mais tarde, safadinho.
Mostrei a minha língua.
- Tira foto das nuvens?
- E do mar também.
Bruno estava cada dia mais palhaço. Ele apertou o botão da máquina várias vezes e fez várias fotos do mar e das nuvens ao nosso redor.
- Nem tem muito o que fotografar, só tem água lá embaixo.
- Já pensou se isso daqui cai? – brinquei.
- Deus me livre. Eu não quero morrer queimado ou afogado não. Quero morrer bem velhinho e de preferência com você do meu lado, amor.
- Não, não. Vai ser o contrário. Eu que vou morrer do seu lado. Não quero que você morra antes de mim não. Não tenho vocação pra ser viúvo!
- Quem disse que eu aceito isso?
- E você lá tem que aceitar alguma coisa? Já fiz meus planos com Deus e Ele não vai me decepcionar!
- Que história é essa? Nem vem que não tem!
- É sim. Eu não vou querer ficar viúvo nunca não.
- E eu posso, né?
- Você pode!
- Não quero!
- Quer saber de uma coisa? É melhor a gente mudar de assunto e deixar essa história de morte pra lá.
- É vero. Deixa isso pra lá. Sorri, eu vou tirar uma foto sua!
Fiz o que ele pediu e mais uma vez o flash me cegou.
- Credo, Caio. Olha que foto horrível!
Ficou feia porque a velha saiu no fundo com a boca aberta. Eu dei muita risada. Eu estava horroroso naquele dia, mas nem me importei.
- Essa vai direto pro Orkut quando eu voltar pro Rio.
- Vai queimar seu notebook. Nem sei como não queimou a máquina.
- Malvado!
Depois de mais um período de conversa, o piloto avisou que nós íamos aterrissar na Bahia. Eu me preparei para o pouso e senti o maior frio na barriga quando o avião desceu na pista.
- Que delícia! – quase soltei um grito.
- É muito gostoso andar de avião. Um dia eu quero andar de asa delta. Vamos?
- Certeza que sim!
A aeronave ficou parada por um tempo e depois o piloto avisou que nós íamos decolar novamente. Quando o avião subiu, mais uma vez eu senti frio na barriga e este foi ainda mais intenso que o anterior.
- Acho que agora não falta muito – comentei.
- É verdade. Eu estou muito ansioso!
- Pois então somos dois.
E o nosso raciocínio estava correto. Não demorou muito de Salvador para Fortaleza e quando o avião finalmente chegou ao nosso destino, eu fui o primeiro a levantar do banco.
- Que pressa, hein? – ele me fitou.
- Quero conhecer a cidade logo.
- Só nascendo de 7 meses mesmo, viu?
- Está me chamando de prematuro ou é impressão minha?
- Estou! Algum problema?
- Olha que eu faço greve, hein?
- NÃO! – ele me segurou. – É brincadeira, amor!
- Agora já foi. Greve de 2 meses.
- Quer que eu morra, né?
- Não!
- Mas é o que parece. Eu nunca vou conseguir ficar 2 meses sem...
- Você ficou quase 3 anos!
- Mas foi diferente!
- Não me importa. Quem conseguiu ficar 3 anos, consegue ficar 60 dias.
- Ah, é? Pois eu bem quero ver se você vai conseguir suportar tanto tempo.
- Claro que eu consigo!
Uma vez com a bagagem nas mãos, Bruno e eu nos dirigimos para a saída do aeroporto e não foi nada difícil encontrar um táxi que nos levasse até a pousada onde iríamos ficar hospedados.
- É muito longe do aeroporto, moço? – eu perguntei.
- É não – logo de cara deu pra notar o sotaque nordestino do motorista. – Não é muito longe não.
Eu fui olhando pra um lado, fui olhando pro outro e fiquei literalmente perdido. Eu nunca tinha ido pro Ceará e estava me sentindo igual a um cego no meio de um tiroteio.
Numa primeira impressão, a cidade parecia ser linda. Eu ainda não tinha visto nenhuma praia e estava pra lá de curioso pra saber quais eram a beleza daquela cidade até então desconhecida para mim.
Bruno foi falando com o motorista e perguntando os pontos turísticos da metrópole. Eu fiquei na minha, perdido nos meus pensamentos e olhei atentamente a paisagem ao meu redor.
- Nós chegamos, é nessa rua aqui – o cara falou.
Eu voltei ao mundo real e olhei com muita atenção a pousada onde nós iríamos ficar.
Era simples, mas parecia ser muito aconchegante. O motorista parou, eu olhei o taxímetro. Era a hora do Bruno pagar a rodada.
O homem abriu o porta luvas do automóvel, separou umas notas de dinheiro e entregou o troco.
- Muito obrigado – ele agradeceu.
- Eu é que agradeço.
Descemos e o condutor abriu o porta malas. Peguei a minha bagagem, Bruno pegou a dele e nós entramos na pousada cujo nome eu não me recordo mais. Era realmente tudo muito simples, mas bem aconchegante. Eu gostei do local.
- Boa noite – disse uma mulher. O sotaque dela também era bem característico.
- Boa noite – eu respondi. – Temos uma reserva.
- No nome de quem?
- Bruno Silva e Caio Monteiro.
- Ah, sim. É verdade tem mesmo. Vão ficar quantos dias?
- 20 – respondeu o meu príncipe.
- Certo. Vamos fazer a ficha de vocês.
Deixei o Bruno tomar a frente do negócio. Ele preencheu a ficha e eu efetuei o pagamento dos 20 dias que ali ficaríamos.
Bruno e eu entramos em um acordo. Como ele tinha pago as passagens de ida e volta, eu paguei a hospedagem. A comida nós dividiríamos.
- Vocês oferecem café da manhã, não é isso? – perguntou Bruno.
- Exatamente. É servido no salão de refeições. Eu mostro já, já.
- Qual é o nosso quarto? – questionei.
- É logo ali, moço.
- Como a senhora se chama? – questionou Bruno.
- É Minerva – eu adorei o sotaque da mulher. Ela era xará de uma das minhas professoras da faculdade.
- Só pra saber... – o meu anjo ficou sem graça.
- Certo! Venham comigo.
- Ei, mamãe? Eles vão ficar no mesmo quarto, é? – questionou um moleque de mais ou menos 10 anos de idade.
- Não é da tua conta, “Guilérme”. Venham comigo, por favor.
Bruno e eu nos entreolhamos. Aquele moleque parecia ser preconceituoso.
Nosso quarto era grande e bem arejado. Ele não ficava perto da entrada, ficava alojado nos fundos da pousada e não havia muitos outros quartos ao redor.
- Aqui é bem calmo, visse? – disse a mulher. – Podem ficar à vontade!
- Obrigado, Dona Minerva – eu agradeci. – Por gentileza, onde fica o banheiro?
- É bem aqui ao lado, nessa portinha branca.
- Perfeito – meu namorado respondeu. – Eu adorei o lugar. Aqui é muito bonito.
- Obrigada, meu “quérido”. Vou deixá-los a sós. Qualquer coisa é só chamar.
- E o salão do café da manhã? – perguntei.
- Ah, é verdade. Venham cá, venham?
Deixamos as nossas coisas e seguimos a dona da pousada. O local do café da manhã era longe do nosso quarto.
- É aqui, visse? Eu sirvo o café às 7 horas.
- Perfeito. Obrigado, Dona Minerva – Bruno agradeceu.
- De nada. Qualquer coisa me chamem.
- Pode deixar.
Assim que a mulher deu as costas, nós dois nos olhamos e sem pestanejar, seguimos de volta para os nossos aposentos.
Assim que eu entrei, encostei a porta, passei a chave e não pensei duas vezes em começar a beijar o meu namorado naquele momento mesmo.
- Agora somos eu e você – falei.
- Enfim sós!
Como eu queria fazer aquilo. Rolou no chão mesmo, de tão apressados que nós estávamos. Ele fez ativo primeiro e depois os papéis se inverteram.
- Putz... – eu caí deitado ao lado dele, totalmente sem fôlego. – Que calor!
- Aqui é quente, né?
- Pra caramba.
Nos beijamos, mas parou nisso. A gente precisava conhecer a cidade.
- Não, não – ele sorriu. – Vamos dar uma volta primeiro!
- Ah... – fiz bico.
- Vem, vamos tomar um banho...
- Está doido? A gente não pode tomar banho juntos!
- Ah... É mesmo... Que merda, hein?
- Não tem problema. Eu te espero. Pode ir na frente se você quiser.
- Eu não demoro, prometo.
- Ei, não está esquecendo de nada?
- O quê?
- A sua roupa e o meu beijo!
Primeiro ele me beijou, depois pegou a roupa.
- Agora sim – eu aprovei. – Não demora.
- Pode deixar.
Caí de novo no chão do quarto. Eu estava me sentindo feliz. Aquela viagem com o Bruno com certeza iria renovar o nosso relacionamento.
Era bom fazer coisas novas, ainda mais ao lado dele. Eu queria conhecer Fortaleza o mais rápido possível, ainda mais sabendo que ele estaria o tempo todo comigo. Aquilo era praticamente um sonho!
O meu gostoso voltou rápido mesmo. Quando ele chegou, eu levantei, peguei uma roupa limpa, me enrolei em uma toalha e parti para o banheiro para poder tomar um banho gelado.
A única parte chata daquela pousada foi o banheiro não ser acoplado ao quarto, mas tudo bem.
E a temperatura estava maravilhosa. Eu deixei a água cair no meu corpo por um longo período e só desliguei o chuveiro quando alguém bateu na porta.
- Já vai!
Me sequei, peguei as minhas coisas, me enrolei na toalha e saí. Quem estava esperando para entrar era um cara muito esquisito.
- Boa noite – ele me cumprimentou.
- Boa noite – eu respondi.
Fui pro quarto e encontrei um Bruno arrumado para sair. Ele foi rápido ao se aprontar.
- Já?
- Uhum! O Víctor te ligou, amor.
- Você atendeu?
- Sim. Tem problema?
- Claro que não, amor. Eu não tenho segredos com você, você sabe disso.
Ele ficou vermelho e foi me dar um abraço.
- Eu estou tão feliz por estar com você, sabia?
- Eu estou mais feliz – comecei a briga.
- Não está não!
A guerra foi armada. A gente sempre ficava com essas brincadeiras e no fim das contas ninguém dava o braço à torcer.
- Ei, onde nós vamos? – eu perguntei.
- Quer jantar?
- Só se for isopor, porque fome mesmo eu não estou sentindo.
- Palhaço! Eu também não estou com fome. Vamos pra praia então?
- Demorou! Mas qual delas?
- Aí eu já não sei, anjo. A gente vê no caminho. Vamos ver se tem alguma praia perto daqui.
Mas não tinha. As praias ficavam pro outro lado da cidade. A gente teve que pegar um ônibus para chegar até elas.
- Sinto o cheiro do mar – Bruno respirou fundo.
- Pois então somos dois. Vamos descer?
- Vamos!
Saímos do banco e eu dei o sinal para o ônibus parar. O veículo andou mais alguns metros e parou na frente de uma banca de jornal, que já estava fechada.
- Trouxe o celular, amor? – perguntei.
- Trouxe. Você não?
- Esqueci – dei risada. – Eu posso ligar pro Víctor do seu? Depois eu coloco crédito pra você...
- Ah, por favor, né? – ele revirou os olhos e passou o aparelho. – Até parece que eu vou cobrar uma ligação sua, Caio. Que neura!
Fiquei sem graça. Como ele era fofo, meu Deus! Olhei pro relógio do aparelho do meu namorado e levei o maior susto. Como estava tarde!
- Putz, a gente nem deveria ter saído tão tarde assim, amor!
- Não, bebê! Esqueceu que aqui não tem horário de verão? Tem que diminuir uma hora aí.
- Ah, é verdade!
Eu havia esquecido desse detalhe. Não estava tão tarde, mas como eu não conhecia a cidade, não sabia se ela era segura ou não, fiquei receoso em acontecer algo com a gente.
Se fosse no Rio eu não sentiria esse medo. Nem em São Paulo. Porém, as ruas ainda estavam movimentadas e eu não vi nada de anormal nos arredores. Pelo jeito não tinha problema sair à noite em Fortaleza.
- Alô? – a voz de taquara rachada do Víctor estava irreconhecível.
- Víctor? – uni as sobrancelhas.
- Caio?
- Que voz de homem é essa, bicha? – eu brinquei.
Bruno deu risada e nós andamos pela calçada.
- Eu sou homem, seu viado! E aí, como vai?
- Eu bem e você?
- Bem também. Feliz ano novo, né?
- Pra você também, garoto! E como andam as coisas por aí em Sampa City?
- Tudo em ordem por aqui. E aí no Rio?
- Eu não estou no Rio!
- Não? Onde você está?
- Em Fortaleza!
- Como assim, criança? Que história é essa?
- Eu vim passar as férias aqui com o Bruh. Acabamos de chegar!
- Por isso que ele atendeu seu celular então... Entendi! Quer dizer que você está em lua de mel?
- É – eu ri. – Pode-se dizer que sim.
- E vocês estão bem?
- Maravilhosamente bem – eu olhei pra ele.
- Que bom, Caio. Eu fico feliz.
- E você? Com alguém?
- Uhum. Arranjei um doido aí que me quis.
- Ah, que da hora! Como ele se chama?
- Rian. Ele é tão lindo!
- Depois eu vejo no Orkut. E seus pais como estão?
- Bem, obrigado por perguntar.
Minha língua coçou para perguntar notícias da minha família, mas eu não fiz isso.
- E quando você vai me visitar lá no Rio, hein?
- Então, eu queria falar sobre isso com você...
- Fala!
- Posso ir no começo do mês que vem?
- Claro! Lógico que pode! Vai ficar quanto tempo?
- Uns 10 dias por aí. Tem como?
- Claro, é só me avisar a data certa.
- Mas dessa vez eu não vou ficar na sua casa, viu? – ele riu.
- Posso ser sincero?
- Uhum.
- Nem tem como. Eu mudei, entrou gente nova na república... Ficar lá ia ser impossível. Eu te recomendo uma hospedaria, fica sussa.
- Beleza então. Eu ligo e aviso se eu for mesmo. Vou levar o Rian!
- Ah... Então é por isso que você não ia ficar em casa, safado!
- Lógico – ele riu.
- Víctor, bom falar com você, mas eu tenho que desligar. Depois a gente se fala mais.
- Beleza, amigo.
- Ah, Víctor... Por que não vai pro Rio em março? Daí você aproveita e vai na minha formatura da faculdade!
- Pô... É uma boa ideia! Quando você se forma?
- No começo de março. Eu preciso desligar, a gente se fala por torpedo depois, tá? Beijo! Fica com Deus...
- Amém, você também. Feliz ano novo.
- Pra você também!
Desliguei e entreguei o aparelho pro Bruno.
- Obrigado, amor.
- Por nada. Poderia ter falado mais com seu amigo.
- Que nada, ele fala mais que uma maritaca. Eu iria gastar todos os seus créditos.
- Não teria problema nenhum. Ele vai pro Rio, é?
- Uhum. Queria ir no mês que vem com o namorado, mas acho que ele vai esperar pra minha formatura!
- Ai que lindo – ele fez cócegas no meu corpo. – Meu namorado vai se formar já!
- É... Eu nem acredito.
- Você é muito esforçado, eu tenho orgulho de você!
- Obrigado, amor.
Caminhamos em ritmo lento por uma calçada reta e depois de um tempo perguntamos como fazíamos para chegar em uma das praias da cidade. E não é que elas estavam bem pertinho da gente? Bastava atravessar a rua e seguir reto.
- Uau! – eu fiquei atônito com a beleza da praia que ficou diante dos meus olhos.
- Nossa... Que lugar lindo!
- Eu preciso entrar no mar, Bruno!
- Então vamos, bebê – ele riu.
Já havia escurecido há muito, mas mesmo assim eu queria entrar no mar. Fui de sunga justamente para isso.
- Licença, moça – o Bruno tocou no ombro de uma mulher. – Como se chama essa praia?
- Essa é a Iracema – disse a moça com cordialidade.
Eu tirei meus chinelos e praticamente corri até o mar, mas algo me parou abruptamente no meio do caminho.
Eu vi um menino alto, com cabelos pretos, olhos castanhos e com o rosto praticamente idêntico ao meu. Ele estava sem camisa e estava acompanhado por um grupo de pessoas.
Meu coração disparou, minhas pernas amolegaram e o meu estômago ficou gelado. Não era possível que fosse ele...
- Que foi, príncipe?
A minha boca ficou aberta, mas eu não consegui falar nada. A única coisa que eu consegui fazer foi olhar para aquele garoto, que parecia até ser o meu clone!
- Caio? Aconteceu alguma coisa?
- Hã?
- O que você tem? Está passando mal? Você está pálido!
- Não estou passando mal...
- O que você tem então?
- Eu acho que... Eu estou vendo o meu... Irmão gêmeo!










Um comentário:
Reclamações e mais reclamações das pessoas terem preconceito com sua sexualidade, mas nao se importa em proliferar gordofobia, xenofobia, preconceito com mais velhos entre outras coisas, enfim a hipocrisia, espero que desde o ano escrito vc tenha melhorado.
Postar um comentário